
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:JOANILDA BEZERRA DOS SANTOS
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: MARCELO AGUIAR GASPAR - MA9644-A
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1016284-71.2023.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Cuida-se de apelação interposta pelo INSS, de sentença na qual foi julgado procedente o pedido de salário-maternidade a trabalhadora rural.
Em suas razões, Autarquia suscita preliminar de nulidade da sentença, em razão da ausência de fundamentação e, também, em decorrência de cerceamento de defesa, por ter sido o pedido julgado antecipadamente e sem a produção de prova testemunhal. No mérito, pugna pela reforma da sentença.
Sem contrarrazões.
É o relatório

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Da nulidade da sentença - falta de fundamentação
Verifica-se que a sentença está devidamente fundamentada, não exigindo o artigo 93, IX, da Constituição Federal que se discorra sobre todas as teses jurídicas apresentadas pelas partes, bastando que seja apresentados, de modo claro, os motivos que conduziram à formação do livre convencimento do julgador.
Rejeito, portanto, a preliminar de nulidade da sentença, em razão da ausência de fundamentação.
Da nulidade da sentença por vício de procedimento.
Na sentença, o pedido foi julgado antecipadamente, nos termos do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil, sob fundamento de que estão presentes os requisitos necessários à concessão do benefício
O INSS, ora apelante, suscita a nulidade processual, sustentado a existência de vicio de procedimento, em razão do julgamento antecipado da lide, pois entende indispensável a produção de prova testemunhal.
Todavia, tal preliminar se confunde com o mérito e juntamente com ele será analisada.
O salário-maternidade
A Constituição Federal de 1988 garante, no artigo 7º, inciso XVIII, a licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de 120 (cento e vinte) dias.
O benefício de salário-maternidade está previsto no art. 71 da Lei n. 8.213/91, que assim dispõe:
"Art. 71. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade."
Em relação à segurada especial, o art. 39, parágrafo único, do mesmo diploma legal, assim estabelece:
"Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do caput do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:
(...)
Parágrafo único. Para a segurada especial fica garantida a concessão do salário-maternidade no valor de 1 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao do início do benefício."
Dessa forma, para a concessão do benefício, sem que haja a necessidade de recolhimento de contribuições previdenciárias, é indispensável a comprovação de efetivo exercício de atividade atribuída legalmente ao segurado especial, assim definida na Lei n. 8.213/91:
"Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(...)
VII – como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade:
1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais;
(...)
§ 1º Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes."
A par disso, o aludido dispositivo legal exige a comprovação do efetivo desempenho da atividade em regime de economia familiar, nos moldes nele referidos, o que reivindica a existência de prova material passível de ser confirmada através de robusta prova testemunhal.
No caso do salário-maternidade, o exercício de atividade rural deve ser devidamente comprovado durante o período de carência legalmente indicado para a concessão do benefício.
Das provas – qualidade de segurado
Registre-se que “A jurisprudência pátria, considerando a situação peculiar do trabalhador rural e a dificuldade encontrada por esses trabalhadores em comprovar a atividade rural, em qualquer de suas formas, permite que outros documentos (dotados de fé pública) não especificados em lei, sejam considerados para fins de concessão do benefício previdenciário” (AC 0031039-78.2012.4.01.9199, DESEMBARGADOR FEDERAL PEDRO BRAGA FILHO, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 20/03/2023 PAG.).
Ademais, é pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o rol do art. 106 da Lei n. 8.213/91 tem natureza meramente exemplificativa (AgRG no REsp 1073730/CE), sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além daqueles nele indicados.
Do caso concreto
Conforme se observa dos elementos contidos nos autos, a parte autora ajuizou a presente ação em 011/03/2013, após o indeferimento do seu requerimento administrativo de benefício, apresentando os seguintes documentos: a) cópia da certidão de nascimento da filha Ana Júlia dos Santos Batista, ocorrido em 25/08/2014, sem informações da qualificação profissional dos genitores; b) carteira sindical da autora, com data de cadastro em 25/05/2013; c) certidão eleitoral emitida em 11/03/2013, em que consta a profissão da autora como trabalhadora rural; d) recibos de pagamentos sindicais emitidos pelo Sindicato dos trabalhadores (as) na agricultura familiar do Município de Chapadinha-MA.
Na sentença, o douto Juízo sentenciante, entendendo que a autora possuía os requisitos para concessão do benefício, julgou antecipadamente a lide, sem a devida produção de prova testemunhal.
Da análise dos autos, apesar de o início de prova material apresentado estar submetido a dúvida, o julgamento em segunda instância, que é colegiado, permite a apresentação de variados pontos de vista e, nesse sentido, a prova testemunhal deve existir nos autos, quando a sua análise é imprescindível, pois assim entendo, ante a fragilidade da prova documental produzida.
De fato, somente com a completa instrução do processo será possível a conclusão a respeito da suficiência ou não da prova produzida, o que acontece, de modo obrigatório, quando a prova documental não é plena, à semelhança do que acontece na hipótese ora apreciada.
Nesse mesmo sentido, vale ainda conferir o seguinte precedente desta Corte Regional:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. AUSÊNCIA DE PROVA TESTEMUNHAL. PROCEDÊNCIA. SENTENÇA ANULADA. 1. Os requisitos para a concessão de aposentadoria por idade de trabalhador rural estão dispostos no art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91, quais sejam: contar com 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e comprovar o efetivo exercício de atividade rural, no período de carência, por meio de início razoável de prova material corroborada por prova testemunhal idônea, não se admitindo, portanto, prova meramente testemunhal (Súmulas 149 e 27 do STJ e TRF da 1ª Região, respectivamente). 2. Na hipótese, após a fase de especificação de provas, na qual houve reiteração do pedido de realização da audiência de instrução e julgamento, o juízo a quo proferiu sentença de procedência, sob o fundamento de que a documentação apresentada comprovaria a condição de segurada especial da autora. 3. Processo instruído com documentos que, em princípio, podem ser considerados como início de prova material do labor rural que se visa comprovar, não constituindo prova plena, razão pela qual mostra-se equivocada a sentença que julga procedentes os pedidos formulados antes da produção da prova testemunhal que seria necessária à eventual comprovação da atividade rural durante o período de carência. 4. Apelação do INSS provida para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem para regular instrução, em face da inaplicabilidade do procedimento previsto no art. 1.013, §3º, do CPC. (AC 1024205-52.2021.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 20/01/2022 PAG.)
Com esses fundamentos, dou parcial provimento à apelação do INSS para anular a sentença, determinando o retorno dos autos à origem para o regular processamento e prosseguimento do feito, mediante a reabertura da fase instrutória.
É como voto.
Brasília, 24 de julho de 2024.
Desembargadora Federal NILZA REIS
Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1016284-71.2023.4.01.9999
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
JOANILDA BEZERRA DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: MARCELO AGUIAR GASPAR - MA9644-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. AUSÊNCIA DE PROVA TESTEMUNHAL. INICIO DE PROVA MATERIAL. NECESSIDADE DE INSTRUÇÃO PROBATÓRIA. SENTENÇA ANULADA. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
1. A segurada especial definida no art. 39, parágrafo único, da Lei n. 8.213/91, faz jus ao benefício de salário-maternidade, mediante a comprovação do exercício de atividade rural nos últimos 10 (dez) meses imediatamente anteriores ao parto (art. 71 da Lei 8.213/91 e art. 93, § 2º. do Decreto 3.048/99).
2. O efetivo exercício da atividade campesina deve ser comprovada pelo menos através de um início de prova material, hipótese na qual deve ser corroborado através de prova testemunhal.
3. É nulo o julgamento antecipado da lide, sem a produção da prova testemunhal, pois somente com a completa instrução do processo é que se pode realizar exame a respeito da suficiência, ou não, da prova produzida.
4. Apelação do INSS parcialmente provida para, acolhendo a preliminar, declarar a nulidade da sentença, com retorno dos autos à origem para o regular prosseguimento.
ACÓRDÃO
Decide a nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do voto da relatora.
Brasília, 24 de julho de 2024.
Desembargadora Federal NILZA REIS
Relatora
