
POLO ATIVO: SANDRA DIAS DE SOUSA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: HELBA RAYNE CARVALHO DE ARAUJO - TO6219-S e CAMILO DA SILVA COSTA - TO9456-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):EULER DE ALMEIDA SILVA JUNIOR

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1006521-80.2022.4.01.9999
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
Trata-se de recurso de apelação, interposto pela parte autora, com a finalidade de obter a reforma da sentença (ID 195786516 - Pág. 72 a 78) que não concedeu o benefício de salário-maternidade, à segurada especial, pelo RGPS.
Sem tutela provisória.
O recurso foi recebido e processado em ambos os efeitos.
Nas razões recursais (ID 195786516 - Pág. 81 a 85), pediu a reformada sentença para a obtenção do benefício, em razão do nascimento de seu filho, em 27/09/2016, sob a alegação de apresentação de provas idôneas e suficientes para comprovação da atividade rural exercida anterior à data do parto.
Intimado, o recorrido não apresentou contrarrazões.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198): 1006521-80.2022.4.01.9999
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA (RELATOR):
O recurso pode ser conhecido, porque presentes os pressupostos recursais (competência do relator e da turma julgadora, tempestividade, adequação e observância das normas pertinentes a eventual preparo recursal).
A concessão do benefício previdenciário intitulado salário-maternidade à segurado especial, que tenha por base atividades rurais, exercidas em regime de economia familiar ou regime equivalente, depende da demonstração, por prova idônea e suficiente (documental e testemunhal), da qualidade de segurado especial e observância dos demais requisitos legais da legislação de regência (arts. 71 e conexos da Lei 8.213/1991 e § 2º do art. 93 do Regulamento aprovado pelo Decreto 3.048/1999).
O entendimento jurisprudencial dominante estabeleceu os seguintes critérios sobre a idoneidade e suficiência probatória do trabalho rural em regime de economia familiar ou equivalente, aplicáveis subsidiariamente à situação do salário-maternidade, observadas as devidas proporções (comparativamente à aposentadoria por idade e outros benefícios): 1) necessidade de produção de prova documental plena ou início de prova material confirmada e complementada pela prova testemunhal (Súmula 149 do STJ e Súmula 27 do TRF1); 2) mitigação da prova documental legal estabelecida no art. 106 da Lei 8.213/1991; 3) utilização de CTPS como prova plena, quando seus dados forem inseridos no CNIS ou demonstrado o recolhimento de contribuições no período, ou como prova relativa, na forma da Súmula 75 da TNU; 4) contemporaneidade temporal ampliada da prova documental, nos termos da Súmula 577 do STJ c/c Súmulas 14 e 34 da TNU e Tese 2, 11 e 17 da TNU; 5) mitigação da dimensão da propriedade em que se deu a atividade (Tese 1115 do STJ e Súmula 30 da TNU); 6) imediatidade da atividade ao tempo abrangido pelo requerimento, respeitado o direito adquirido quanto ao cumprimento pretérito de todas as condições (Tese 642 do STJ e Súmulas 54 e 11 da TNU c/c art. 5º, XXXVI, da CF/88); 7) extensão da prova material da condição de rurícola em nome de membros do grupo familiar convivente, principalmente cônjuge, companheiros e filhos, assim como pai e mãe antes do casamento ou união estável (Súmula 06 da TNU c/c §4º do art. 16 da Lei 8.213/1991), possibilitada a desconsideração da atividade urbana de membro do grupo familiar convivente quando o trabalho rural se apresentar indispensável para a sobrevivência desse grupo familiar (Teses 532 e 533 do STJ e Súmula 41 do TNU); 8) na situação de atividade intercalada, a relativização de concorrência de trabalho urbano breve e descontinuado do próprio beneficiário ou de membros do grupo familiar convivente (Tese 37 da TNU, Tema 301 da TNU e Súmula 46 da TNU); 9) resguardo da atividade especial própria da mulher casada com marido trabalhador urbano ou mantida por pensão alimentícia deste (Tese 23 da TNU). 10) qualificação da atividade conforme a atividade do empregado e não de acordo com o ramo de atividade do empregador (Tese 115 da TNU), o que possibilita a utilização de vínculos formais de trabalho, com exercício de atividades agrárias, como segurado especial; 11) possibilidade de consideração das atividades rurais exercidas por menor de idade em regime de economia familiar, nos termos da Súmula 5 da TNU e da Tese 219 da TNU (entre 12 e 14 anos até o advento da Lei 8.213/1991, e a partir de 14 anos após a referida data); 12) inclusão da situação do “boia-fria” como segurado especial (Tese 554 do STJ); 13) possibilidade de estabelecimento de residência do grupo familiar do segurado especial em aglomerado urbano, fora do local de exercício das atividades agrárias (inciso VII do art. 11 da Lei 8.213/1991, redação dada pela Lei 11.718/2008).
Os critérios jurisprudenciais que implicam interpretação extensiva à legislação de regência deverão ser aplicados com razoável parcimônia, pois, em dado caso concreto, uma única situação excepcional (quando relevante, intensa e abrangente) ou o conjunto de situações excepcionais (ainda que acessórias e menos abrangentes, quando individualmente consideradas) pode descaracterizar a situação de segurado especial em regime de economia familiar.
Possui especial relevância as Teses 11 e 17 da TNU, nos seguintes termos:
Tema 11 da TNU. A exigência de início de prova material contemporânea para concessão do salário-maternidade à segurada especial pode ser flexibilizada.
Tema 17 da TNU. A exigência de início de prova material para concessão do salário-maternidade à segurada especial pode ser flexibilizada.
Em razão do nascimento do filho Kairom Dias Moreira, ocorrido em 27/09/2016 (ID 195786516 - Pág. 15), a autora postula o benefício de salário-maternidade, na condição de segurada especial. Apresentou requerimento administrativo em 17/10/2018 (ID 195786516 - Pág. 32).
A autora juntou os seguintes documentos: certidão de nascimento do filho, em virtude do qual se postula o benefício previdenciário, registrado em 06/10/2016, de onde se extrai a profissão de lavradora da autora (ID 195786516 - Pág. 16); Título Definitivo de Domínio que o Instituto de Terras do Estado do Tocantins outorgou a Antônio de Sousa Lira (genitor da autora), um imóvel rural com área de 50 hectares localizado no Loteamento Fazenda Santa Catarina, no município de Campos Lindos/TO, em 11/06/2002 (ID 195786516 - Pág. 19 e 20); declaração do genitor da autora, datada de 11/01/2018, na qual informa que a autora trabalhou em regime de economia familiar em sua propriedade, no período de 30/09/2015 a 11/01/2018 (ID 195786516 - Pág. 22); cartão de vacinação do filho da autora, com endereço residencial em Fazenda Flor da Mata, em 28/09/2016 (ID 195786516 - Pág. 24 e 25); ficha de matrícula da autora em escola rural na Fazenda Vereda Bonita, município de Campos Lindos/TO, de onde se extrai seu endereço residencial em Fazenda Flor da Mata, em 19/01/2011 (ID 195786516 - Pág. 27); fichas de matrícula da autora em escola rural na Fazenda Vereda Bonita, município de Campos Lindos/TO, de onde se extrai a profissão de lavrador dos seus genitores e seu endereço residencial em Fazenda Flor da Mata, em 11/01/2008 e 27/01/2009 e 21/01/2010 (ID 195786516 - Pág. 28 a 30).
Os referidos documentos são idôneos, válidos e suficientes como início de prova material do exercício da atividade rural para a concessão do benefício postulado.
A própria certidão de nascimento do filho em virtude do qual se postula o salário-maternidade constitui início de prova material, segundo entendimento pacificado do STJ, no sentido de reconhecer como início probatório as certidões da vida civil, como bem se verifica.
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA DOCUMENTAL. SÚMULA Nº 07/STJ. NECESSIDADE DE ANTERIORIDADE DA PROVA. INOVAÇÃO RECURSAL. PRECLUSÃO. CERTIDÃO DE NASCIMENTO EM QUE CONSTA PROFISSÃO DO PAI COMO LAVRADOR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL.
1. O acolhimento das alegações do recorrente, no sentido de haver somente prova testemunhal acerca da condição de rurícola da parte autora, encontra óbice no enunciado sumular nº 7 desta Corte, tendo em vista a afirmação do aresto recorrido em sentido oposto.
2. A argumentação relativa à necessidade de anterioridade da prova caracteriza-se como inovação recursal, devendo ter sido suscitada em momento prévio. Dessarte, tal tese encontra-se atingida pela preclusão.
3. Ainda que assim não fosse, conforme reiterada jurisprudência desta Corte, a certidão de nascimento em que consta a profissão do pai como lavrador configura-se início de prova material a comprovar a atividade rurícola 4. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp n. 1.049.607/SP, relator Desembargador Honildo Amaral de Mello Castro -Desembargador Convocado do TJ/AP, Quinta Turma, julgado em 18/11/2010, DJe de 29/11/2010).
No mais, não impede o direito à percepção do benefício a circunstância de ter sido o labor prestado em período em que a parte era, de fato, menor de idade, uma vez que a vedação do trabalho do menor de 16 anos é regra protetiva do menor, não podendo vir a restringir-lhe os direitos, em especial na esfera previdenciária.
A prova testemunhal produzida durante a instrução processual (ID 195786516 - Pág. 64) foi idônea e suficiente para demonstrar o exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, e se encontra amparada por início de prova documental contemporânea à prestação laboral que se pretende reconhecida em juízo.
Comprovada a qualidade de trabalhadora rural anterior à data do parto (27/09/2016), mediante início de prova material devidamente complementada pela prova testemunhal e a ocorrência do parto em data não alcançada pela prescrição, deve ser reconhecido o direito da parte autora ao benefício de salário-maternidade, na condição de segurada especial, direito que lhe é pertinente e está em conformidade com a legislação previdenciária.
A sentença recorrida deve ser reformada, porque os dispositivos constitucionais e legais referidos na fase recursal devem ser interpretados conforme o entendimento jurisprudencial dominante.
Honorários recursais, quando devidos, na forma da legislação de regência (§11 do art. 85, do CPC/2015, c/c art. 5º, XXXVI, da CF/88 e Súmula 26-TRF da 1ª Região), observada eventual inexigibilidade (§3º do art. 98 do CPC/2015).
Ante o exposto, conheço do recurso para, no mérito, dar-lhe provimento e reformar a sentença proferida, para condenar o INSS a conceder salário-maternidade à autora, na condição de segurada especial, equivalente a quatro prestações do salário mínimo vigente à época do parto, e a pagar as parcelas vencidas acrescidas de correção monetária e juros de mora, nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, na versão vigente ao tempo da execução do julgado, observada a prescrição quinquenal.
Quanto à verba honorária, inverto-a em favor da parte autora, fixando-a em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data do acórdão deste julgado, a teor do disposto no art. 85, §§ 2º e 3º e art. 11, ambos do CPC/2015 c/c Súmula 111 do STJ.
É o voto.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 28 - DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA
Processo Judicial Eletrônico
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
PROCESSO: 1006521-80.2022.4.01.9999
PROCESSO DE REFERÊNCIA: 0002636-02.2020.8.27.2720
RECORRENTE: SANDRA DIAS DE SOUSA
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. RGPS. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADA POR PROVA TESTEMUNHAL. REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. SENTENÇA REFORMADA.
1. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte dias), com início no período entre vinte e oito dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade.
2. A concessão do respectivo benefício previdenciário, na qualidade de segurado especial, que tenha por base atividades rurais, exercidas em regime de economia familiar ou regime equivalente, depende da demonstração, por prova idônea e suficiente (documental e testemunhal), da condição de segurado especial, e observância dos demais requisitos legais da legislação de regência (art. 71 e conexos da Lei 8.213/1991 e § 2º do art. 93 do Regulamento aprovado pelo Decreto 3.048/1999).
3. Em razão do nascimento do filho Kairom Dias Moreira, ocorrido em 27/09/2016 (ID 195786516 - Pág. 15), a autora postula o benefício de salário-maternidade, na condição de segurada especial. A autora juntou os seguintes documentos: certidão de nascimento do filho, em virtude do qual se postula o benefício previdenciário, registrado em 06/10/2016, de onde se extrai a profissão de lavradora da autora (ID 195786516 - Pág. 16); Título Definitivo de Domínio que o Instituto de Terras do Estado do Tocantins outorgou a Antônio de Sousa Lira (genitor da autora), um imóvel rural com área de 50 hectares localizado no Loteamento Fazenda Santa Catarina, no município de Campos Lindos/TO, em 11/06/2002 (ID 195786516 - Pág. 19 e 20); declaração do genitor da autora, datada de 11/01/2018, na qual informa que a autora trabalhou em regime de economia familiar em sua propriedade, no período de 30/09/2015 a 11/01/2018 (ID 195786516 - Pág. 22); cartão de vacinação do filho da autora, com endereço residencial em Fazenda Flor da Mata, em 28/09/2016 (ID 195786516 - Pág. 24 e 25); ficha de matrícula da autora em escola rural na Fazenda Vereda Bonita, município de Campos Lindos/TO, de onde se extrai seu endereço residencial em Fazenda Flor da Mata, em 19/01/2011 (ID 195786516 - Pág. 27); fichas de matrícula da autora em escola rural na Fazenda Vereda Bonita, município de Campos Lindos/TO, de onde se extrai a profissão de lavrador dos seus genitores e seu endereço residencial em Fazenda Flor da Mata, em 11/01/2008 e 27/01/2009 e 21/01/2010 (ID 195786516 - Pág. 28 a 30).
4. A própria certidão de nascimento do filho em virtude do qual se postula o salário-maternidade constitui início de prova material, segundo entendimento pacificado do STJ, no sentido de reconhecer como início probatório as certidões da vida civil, como bem se verifica.
5. Não impede o direito à percepção do benefício a circunstância de ter sido o labor prestado em período em que a parte era, de fato, menor de idade, uma vez que a vedação do trabalho do menor de 16 anos é regra protetiva do menor, não podendo vir a restringir-lhe os direitos, em especial na esfera previdenciária.
6. Demonstradas a maternidade, a atividade rural e a qualidade de segurada especial, faz jus a parte autora ao benefício de salário-maternidade.
7. Apelação provida. Sentença reformada para concessão de salário-maternidade à segurada especial em razão da satisfação dos requisitos legais.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, dar provimento à apelação cível, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data e assinatura eletrônicas.
Desembargador Federal EULER DE ALMEIDA
