
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:GEIELY FRANCISCO SILVA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: DIEGO RAMON NEIVA LUZ - GO35376-A
RELATOR(A):URBANO LEAL BERQUO NETO

Gab. 25 - DESEMBARGADOR FEDERAL URBANO LEAL BERQUÓ NETO
PROCESSO: 1003172-35.2023.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 0000444-95.2022.8.27.2730
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:GEIELY FRANCISCO SILVA
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: DIEGO RAMON NEIVA LUZ - GO35376-A
RELATOR: URBANO LEAL BERQUO NETO
R E L A T Ó R I O
O EXMO DESEMBARGADOR FEDERAL URBANO LEAL BERQUÓ NETO (Relator):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS em face de sentença que julgou procedente a ação de concessão de salário-maternidade de trabalhadora rural, segurada especial, em decorrência do nascimento da criança J.H.F.L., ocorrido em 08/03/2021.
Em suas razões, o INSS sustenta a ausência de documento válido a servir como início de prova material do período de carência pretendido, bem como a existência de vínculos de natureza urbana, registrado no CNIS do companheiro/cônjuge da autora, descaracterizadores do alegado labor rural em regime de economia familiar.
O lado apelado, devidamente intimado, apresentou contrarrazões.
Com vistas dos autos, o Ministério Público Federal informou não vislumbrar a presença de interesse institucional a justificar a sua intervenção quanto ao mérito.
É o relatório.

Gab. 25 - DESEMBARGADOR FEDERAL URBANO LEAL BERQUÓ NETO
PROCESSO: 1003172-35.2023.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 0000444-95.2022.8.27.2730
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:GEIELY FRANCISCO SILVA
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: DIEGO RAMON NEIVA LUZ - GO35376-A
RELATOR: URBANO LEAL BERQUO NETO
V O T O
O EXMO DESEMBARGADOR FEDERAL URBANO LEAL BERQUÓ NETO (Relator):
Presentes os pressupostos recursais, conheço do recurso.
Mister a depuração, de pronto, do cerne da pretensão ora vertida em base recursal, lembrando que se trata de conflito de interesses condizente à percepção de benefício de salário-maternidade de trabalhadora rural, segurada especial, em que o recorrente sustenta o desacerto do julgado por considerar que inexiste documento idôneo a servir como início de prova material da alegada condição de segurada especial da autora. Sustenta o recorrente, ainda, a existência de vínculos urbanos no CNIS do companheiro/cônjuge da autora, o que seria suficiente a descaracterizar o alegado labor rural em regime de subsistência.
O benefício de salário-maternidade, regulamentado basicamente pelos artigos 71 a 73 da Lei 8.213/91 e artigos 93 a 103 do Decreto 3.048/99, será devido quando regularmente demonstrado o adimplemento dos seguintes requisitos (art. 25 da Lei 8.213/91): (1) qualidade de segurada; (2) demonstração do estado de gravidez, de adoção ou de obtenção de guarda judicial para fins de adoção de criança; e, (3) para a segurada especial, facultativa e contribuinte individual, cumprimento da carência de 10 contribuições mensais.
A concessão do benefício pleiteado pela parte autora, portanto, exige a demonstração do trabalho rural, em regime de subsistência, no prazo mínimo de 10 (dez) meses, ainda que descontínuos, mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena, inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF/1ª Região, Súmula 27).
No que tange à caracterização da condição de segurada especial, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Jurisprudência, firmou o entendimento de que para o reconhecimento do tempo de serviço do trabalho rural, apesar de não haver exigência legal de que o documento apresentado como início de prova material abranja todo o período que se busca comprovar, é preciso que tal prova seja contemporânea ao menos por uma fração do lapso de trabalho rural pretendido (Pet 7.475/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 09/11/2016, DJe 29/11/2016).
É pacífica a jurisprudência do STJ e desta Corte no sentido de que o rol do art. 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo, (STJ AgRG no REsp 1073730/CE) sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos.
São idôneos, portanto, dentre outros, a ficha de alistamento militar, o certificado de dispensa de incorporação (CDI), o título eleitoral em que conste como lavrador a profissão do segurado (STJ, AgRG no REsp 939191/SC); a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF); certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR 1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR 3202/CE).
Igualmente aceitáveis documentos tais como certidões do INCRA, guias de recolhimento de ITR, documentos fiscais de venda de produtos rurais, recibos de pagamento a sindicato rural, certidão de registro de imóveis relativos à propriedade rural, contratos de parceria agrícola e todos outros que indiciem a ligação da parte autora com o trabalho e a vida no meio rural, bem como a CTPS com anotações de trabalho rural da parte autora, que é considerada prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência (REsp 310.264/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, 6ª Turma, DJ 18.02.2002, p. 530; AC 2004.38.03.000757-8/MG, Rel. Desembargadora Federal Neuza Maria Alves da Silva, Segunda Turma, e-DJF1 p.33 de 17/07/2008, AC 0004262-35.2004.4.01.3800/MG, Rel. Juiz Federal Miguel Ângelo de Alvarenga Lopes, 3ª Turma Suplementar, e-DJF1 p.191 de 02/03/2011).
No caso dos autos, a autora postula o benefício de salário-maternidade rural, segurada especial, em decorrência do nascimento de seu filho J.H.F.L., ocorrido em 08/03/2021, devendo fazer prova do labor rural em regime de subsistência pelo período de 05/2020 a 03/2021.
Com o propósito de comprovar a sua condição de segurada especial juntou aos autos, dentre outros de menor relevo, os seguintes documentos:
- Certidão de nascimento da criança em virtude da qual se postula o beneficio, de onde se extrai o endereço dos genitores situado em meio rural, a profissão da autora como trabalhadora agropecuária em geral e o genitor como de seringueiro;
- CTPS do companheiro da autora contendo diversos vínculos de natureza rural, situando-se dentro do período de carência pretendido o vínculo em meio rural na condição de seringueiro.
Dessa forma, não há que se falar em ausência de prova material do labor rural em regime de subsistência, pois os documentos retromencionados são idôneos a configurar o início de prova material, em especial pelo fato de que inexiste nos autos qualquer elemento de contraprova da alegada condição de segurada especial da autora no período de carência pretendido ou qualquer outro elemento indicativo de fraude que macule o conteúdo dos documentos em referência e as afirmações exordiais.
Registra-se, ao demais, que há nos autos vasto acervo probatório indicando a condição de trabalhadora rural da autora, embora os demais documentos se situem fora do período de prova pretendido.
Com efeito, diante das dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores rurais para comprovar o exercício de atividade rural, em razão das peculiaridades inerentes ao meio campestre, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem adotado a solução pro mísero, em que se admite a prova testemunhal para demonstrar a qualidade de segurada, desde que acompanhada de início de prova material, situação externada, neste particular.
Desse modo, nada há nos autos que possa infirmar as conclusões do julgador monocrático, devendo a sentença ser mantida, posto que comprovado o preenchimento dos requisitos indispensáveis a concessão do benefício pela autora.
Conquanto o INSS sustente a existência de vínculos no CNIS do companheiro da autora na condição de empregado, consoante se infere da análise da CTPS os referidos vínculos firmados durante o período de carência se deram na condição de trabalhador rural, o que reforça os argumentos vertidos na inicial. Ademais, consoante o entendimento consolidado pelo STJ, o “trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar (...)” (REsp 1.304.479/SP – Tema 532).
E neste ponto, constata-se que não restou demonstrado, pelo recorrente, que a renda auferida pelo companheiro da autora teria tornado dispensável o trabalho rural desempenhado pela recorrida.
Por oportuno, vale registrar que a existência de endereço urbano, por si só, não afasta a qualidade de segurada especial da autora, tratando-se de prática comum a apresentação, junto aos órgãos públicos, de endereço de terceiros para o fim de recebimento de correspondências.
Em tempo, verifica-se que no que tange aos consectários da condenação o julgador monocrático fixou o IPCA-E como índices de correção monetária, o que não encontra respaldo legal e jurisprudencial.
Isso porque o STJ firmou o entendimento no Tema 905, segundo o qual “As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009)”, razão pela qual tais índices devem ser adotados até a publicação da EC 113/2021.
Após a publicação da Emenda Constitucional 113/2021 deverão incidir, tão somente, a taxa SELIC, eis que a mencionada taxa foi adotada tanto para a correção monetária quanto para os juros moratórios, ao teor do art. 3º disposto na EC em comento, que passou a disciplinar a atualização dos débitos das condenações que envolvem a Fazenda Pública.
Assim, determina-se que a atualização dos juros e correção monetária seja efetivada conforme as diretrizes do Manual de Cálculos da Justiça Federal, em sua versão mais atualizada, em consonância com o Tema 905 do STJ, bem como com a EC 113/2021, a partir de 19/12/2021, com adoção da taxa Selic para atualização monetária, tanto para remuneração do capital como para a compensação pela mora.
Posto isto, NEGO PROVIMENTO ao recurso interposto pelo INSS, nos termos da fundamentação supra.
Em razão da sucumbência recursal, fixo os honorários advocatícios em 11% sobre o valor da condenação, eis que majoro em um ponto percentual os parâmetros fixados na origem.
Mediante atuação de ofício, determino que a atualização dos juros e correção monetária seja efetivada conforme as diretrizes do Manual de Cálculos da Justiça Federal, em sua versão mais atualizada, posto que em consonância com o termo do TEMA 905 do STJ e da EC 113/2021.
É como voto.

Gab. 25 - DESEMBARGADOR FEDERAL URBANO LEAL BERQUÓ NETO
PROCESSO: 1003172-35.2023.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 0000444-95.2022.8.27.2730
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:GEIELY FRANCISCO SILVA
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: DIEGO RAMON NEIVA LUZ - GO35376-A
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. SEGURADA ESPECIAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL VÁLIDA. TEMA 532 STJ. REQUISITOS PREENCHIDOS. CONSECTÁRIOS DA CONDENAÇÃO. TEMA 905 STJ. ADOÇÃO DE TAXA SELIC POSTERIOR A VIGÊNCIA DA EC 113/2021. RECURSO IMPROVIDO.
1. O benefício salário-maternidade, regulamentado basicamente pelos artigos 71 a 73 da Lei 8.213/91 e artigos 93 a 103 do Decreto 3.048/99, será devido quando regularmente demonstrado o adimplemento dos seguintes requisitos (art. 25 da Lei 8.213/91): (1) qualidade de segurada; (2) demonstração do estado de gravidez, de adoção ou de obtenção de guarda judicial para fins de adoção de criança; e, (3) para a segurada especial, facultativa e contribuinte individual, cumprimento da carência de 10 contribuições mensais.
2. No caso dos autos, a autora postula o benefício de salário-maternidade rural, segurada especial, em decorrência do nascimento de seu filho J.H.F.L., ocorrido em 08/03/2021. Com o propósito de comprovar a sua condição de segurada especial juntou aos autos, dentre outros de menor relevo, os seguintes documentos: certidão de nascimento da criança em virtude da qual se postula o beneficio, de onde se extrai o endereço dos genitores situado em meio rural, a profissão da autora como trabalhadora agropecuária em geral e o genitor como de seringueiro; CTPS do companheiro da autora contendo diversos vínculos de natureza rural, situando-se dentro do período de carência pretendido o vínculo em meio rural na condição de seringueiro. Dessa forma, não há que se falar em ausência de prova material do labor rural em regime de subsistência.
3. Assim, conquanto o INSS sustente a existência de vínculos no CNIS do companheiro da autora na condição de empregado, consoante se infere da análise da CTPS os referidos vínculos firmados durante o período de carência se deram na condição de trabalhador rural, o que reforça os argumentos vertidos na inicial. Ademais, consoante o entendimento consolidado pelo STJ, o “trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar (...)” (REsp 1.304.479/SP – Tema 532).
4. Verifica-se que não restou demonstrado, pelo recorrente, que a renda auferida teria tornado dispensável o trabalho rural desempenhado pela recorrida. Registra-se, ao demais, que a existência de endereço urbano, por si só, não afasta a qualidade de segurada especial da autora, tratando-se de prática comum a apresentação, junto aos órgãos públicos, de endereço de terceiros para o fim de recebimento de correspondências.
5. Determina-se que a atualização dos juros e correção monetária seja efetivada conforme as diretrizes do Manual de Cálculos da Justiça Federal, em sua versão atualizada, em consonância com o Tema 905 do STJ, bem como com a EC 113/2021 que, a partir de 19/12/2021, adotou a taxa Selic para atualização monetária, tanto para remuneração do capital como para a compensação pela mora.
6. Apelação a que se nega provimento.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO à apelação interposta, nos termos do voto do Relator.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator
