
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:ALANE TELES SILVA CARNEIRO
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: MARCO ANTONIO PEREIRA DOS SANTOS - TO11549-A
RELATOR(A):URBANO LEAL BERQUO NETO

Gab. 25 - DESEMBARGADOR FEDERAL URBANO LEAL BERQUÓ NETO
PROCESSO: 1004932-19.2023.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 0000611-13.2021.8.27.2742
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:ALANE TELES SILVA CARNEIRO
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: MARCO ANTONIO PEREIRA DOS SANTOS - TO11549-A
RELATOR: URBANO LEAL BERQUO NETO
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta pelo INSS em face de sentença que julgou procedente a ação para concessão de benefício de salário-maternidade de trabalhadora rural.
Em suas razões, requer a reforma da sentença para que seja julgado improcedente o pedido, ao argumento de que o esposo da autora possui vínculos urbanos; que possui bens incompatíveis com a qualidade de segurado e endereço urbano. Sustenta, ainda, ausência de prova material válida.
A apelada apresentou contrarrazões.
É o relatório.

Gab. 25 - DESEMBARGADOR FEDERAL URBANO LEAL BERQUÓ NETO
PROCESSO: 1004932-19.2023.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 0000611-13.2021.8.27.2742
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:ALANE TELES SILVA CARNEIRO
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: MARCO ANTONIO PEREIRA DOS SANTOS - TO11549-A
V O T O
Presentes os pressupostos recursais, conheço do recurso.
Diante da inexistência de preliminares ou/e defesa indireta de mérito, mister a depuração, de pronto, do cerne da pretensão, ora vertida em base recursal, lembrando que se trata de conflito de interesses condizente ao salário maternidade.
O benefício de salário-maternidade é devido à segurada especial que atender aos requisitos estabelecidos na Lei 8.213/91 (art. 25, III) e no § 2º do art. 93 do Regulamento aprovado pelo Decreto 3.048/99: exercício de atividade rural nos últimos dez meses imediatamente anteriores à data do parto ou do requerimento do benefício, quando requerido antes do parto, mesmo que de forma descontínua.
A concessão do benefício pleiteado pela parte autora, portanto, exige a demonstração do trabalho rural no prazo mínimo de 10 (dez) meses, ainda que descontínuos, mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena, inadmissível a prova exclusivamente testemunhal.
No que tange à caracterização da condição de segurada especial, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Jurisprudência, firmou o entendimento de que para o reconhecimento do tempo de serviço do trabalho rural, apesar de não haver exigência legal de que o documento apresentado como início de prova material abranja todo o período que se busca comprovar, é preciso que tal prova seja contemporânea ao menos por uma fração do lapso de trabalho rural pretendido (Pet 7.475/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 09/11/2016, DJe 29/11/2016).
É pacífica a jurisprudência do STJ e desta Corte no sentido de que o rol do art. 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo, (STJ AgRG no REsp 1073730/CE) sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos.
São idôneos, portanto, dentre outros, a ficha de alistamento militar, o certificado de dispensa de incorporação (CDI), o título eleitoral em que conste como lavrador a profissão do segurado (STJ, AgRG no REsp 939191/SC); a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF); certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR 1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR 3202/CE).
Igualmente aceitáveis documentos tais como certidões do INCRA, guias de recolhimento de ITR, documentos fiscais de venda de produtos rurais, recibos de pagamento a sindicato rural, certidão de registro de imóveis relativos à propriedade rural, contratos de parceria agrícola e todos outros que indiciem a ligação da parte autora com o trabalho e a vida no meio rural, bem como a CTPS com anotações de trabalho rural da parte autora, que é considerada prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência (REsp 310.264/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, 6ª Turma, DJ 18.02.2002, p. 530; AC 2004.38.03.000757-8/MG, Rel. Desembargadora Federal Neuza Maria Alves da Silva, Segunda Turma, e-DJF1 p.33 de 17/07/2008, AC 0004262-35.2004.4.01.3800/MG, Rel. Juiz Federal Miguel Ângelo de Alvarenga Lopes, 3ª Turma Suplementar, e-DJF1 p.191 de 02/03/2011).
No caso dos autos, a autora postula o benefício de salário-maternidade rural em decorrência do nascimento de sua filha, ocorrido em 08/07/2016. Para comprovar sua qualidade de segurada especial juntou aos autos a certidão de nascimento da filha, em virtude da qual se postula o benefício; certidão de casamento, com qualificação rural do genitor (vaqueiro), lavrada em 02/06/2019; declaração e documentos de imóvel rural de terceiros referente a PA.Barra Bonita; cartão de gestante, com indicação de endereço rural PA. Barra Bonita; ficha de matrícula do filho José Alexandre Carneiro Almeida Junior, com qualificação rural dos genitores e indicação de endereço rural, referente os anos de 2014, 2015 e 2016 e anotações rurais em CNIS, no período de carência pretendido.
Embora a prova material, em sua maioria, não se revista de robustez, tendo em vista tratar-se de documentos meramente declaratórios e produzidos em momento posterior ao parto e próximo a DER ou ao ajuizamento da ação, os referidos documentos não apontam inconsistência com relação à prova testemunhal e demais elementos de prova dos autos, sendo aptos a constituir o início de prova material.
Conquanto a alegação do INSS de que o esposo da parte autora trabalha como empregado citadino auferindo remuneração superior ao salário mínimo vigente, verifica-se dos autos, na verdade, que se trata de segurado empregado rural como se pode conferir nas anotações constantes de seu CNIS (ID. 298729519 fl. 55 da rolagem única).
A remuneração auferida pelo cônjuge, ainda, não torna dispensável o trabalho rural da autora para a subsistência do grupo familiar, em especial pelo fato de que o grupo familiar ser composto pela autora, seu cônjuge e seus dois filhos, desvelando-se insuficiente a renda auferida por seu companheiro, na condição de trabalhador rural.
Ademais, A prova testemunhal comprovou que a autora, durante o período de carência indispensável à concessão do benefício, tirava o sustento do labor rural, em regime de subsistência. A testemunha Eurivane Vieira Reis afirma que conhece a autora há anos, que o marido da mesma é vaqueiro e trabalha de carteira assinada, mas ambos criam galinhas e porcos além de fazer queijo para se sustentarem, que fazem isso há oito anos, que ajuda nessas vendas em especial a de queijo, que autora trabalhou enquanto estava grávida.
Quanto à tese aventada de que o esposo da autora possui bens incompatíveis com a qualidade de segurado, tal asserção, não pode ser levada em consideração no julgamento do presente recurso, pois, referida informação não foi levada a conhecimento do Juízo "a quo", ou seja, não houve juntada da prova durante a instrução processual, mesmo não se tratando de fato novo. Nos termos do art. 1.014 do CPC, “as questões de fato não propostas no juízo inferior poderão ser suscitadas na apelação, se a parte provar que deixou de fazê-lo por motivo de força maior”.
A inovação em sede recursal caracteriza-se, portanto, como supressão de instância, motivo pelo qual a matéria, que não foi submetida ao crivo do juízo monocrático, não tendo sido decidida na sentença, não pode ser analisada pelo Tribunal, sob pena de ofensa aos princípios constitucionais do devido processo legal, do duplo grau de jurisdição, do contraditório e da ampla defesa
Por fim, apesar de o INSS afirmar que o esposo da parte autora possuir endereço urbano, anoto que esse fato não é suficiente para descaracterizar o labor rural, principalmente diante do disposto no inciso VII do art. 11, da Lei 8.213/91, in verbis:
Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
VII – como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:..
Dessa forma, considerando o conjunto probatório favorável a pretensão, o improvimento do apelo é medida que se impõe.
Posto isto, NEGO PROVIMENTO ao recurso interposto pelo INSS, nos termos da fundamentação supra.
Majoro os honorários sucumbenciais para 11% do valor da condenação, eis que aumento o patamar antes fixado na sentença em um ponto percentual.
É o voto.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator

Gab. 25 - DESEMBARGADOR FEDERAL URBANO LEAL BERQUÓ NETO
PROCESSO: 1004932-19.2023.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 0000611-13.2021.8.27.2742
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:ALANE TELES SILVA CARNEIRO
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: MARCO ANTONIO PEREIRA DOS SANTOS - TO11549-A
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. SEGURADA ESPECIAL. INOVAÇÃO PROCESSUAL EM FASE RECURSAL. VEDAÇÃO. NÃO CONHECIMENTO DE MATÉRIA NÃO LEVADA AO JUÍZO A QUO. PERÍODOS DE ATIVIDADE RURAL ANOTADO EM CNIS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL VÁLIDA. CORROBORADA COM PROVA TESTEMUNHAL. RECURSO NÃO PROVIDO. SENTENÇA MANTIDA.
1. O benefício de salário-maternidade é devido à segurada especial que atender aos requisitos estabelecidos na Lei 8.213/91 (art. 25, III) e no § 2º do art. 93 do Decreto 3.048/99. A demonstração do trabalho rural no prazo mínimo de 10 (dez) meses, ainda que descontínuos, deve ser comprovado mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena, inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF/1ª Região, Súmula 27).
2. A juntada à apelação de documentos não anexados na fase de conhecimento infringe diretamente o disposto no art. 1.014 do CPC, já que não levado a conhecimento do magistrado a quo, tampouco se tratando de fato superveniente à sentença. Recurso não conhecido no mérito da concessão do benefício em razão da indevida inovação processual.
3. O benefício de salário-maternidade é devido à segurada especial que atender aos requisitos estabelecidos na Lei 8.213/91 (art. 25, III) e no § 2º do art. 93 do Decreto 3.048/99. A demonstração do trabalho rural no prazo mínimo de 10 (dez) meses, ainda que descontínuos, deve ser comprovado mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena, inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF/1ª Região, Súmula 27).
4. No caso dos autos, a autora postula o benefício de salário-maternidade rural em decorrência do nascimento de sua filha, ocorrido em 08/07/2016. Para comprovar sua qualidade de segurada especial juntou aos autos a certidão de nascimento da filha, em virtude da qual se postula o benefício; certidão de casamento, com qualificação rural do genitor (vaqueiro), lavrado em 02/06/2019; declaração e documentos de imóvel rural de terceiros referente a PA.Barra Bonita; cartão de gestante, com indicação de endereço rural PA. Barra Bonita; Ficha de matrícula do filho José Alexandre Carneiro Almeida Junior, com qualificação rural dos genitores e indicação de endereço rural, referente os anos de 2014, 2015 e 2016 e anotações rurais em CNIS, no período de carência pretendido.
5. Da análise dos autos verifica-se que o companheiro da autora é a segurado empregado rural (art. 11, inciso I, a, da Lei de Benefícios), como se pode conferir nas anotações constantes da CNIS (ID. 298729519 fl. 55 da rolagem única). No que diz respeito à remuneração por ele auferida, verifico que tal fato, por si só, não torna dispensável o trabalho rural da autora para a subsistência do grupo familiar.
6. Embora a prova material, em sua maioria, não se revista de robustez, os referidos documentos não apontam inconsistência com relação à prova testemunhal e demais elementos de prova dos autos, sendo aptos a constituir o início de prova material.
7. A prova testemunhal comprovou que a autora, durante o período de carência indispensável à concessão do benefício, tirava o sustento do labor rural, em regime de subsistência. A testemunha Eurivane Vieira Reis afirma que conhece a autora há anos, que o marido da mesma é vaqueiro e trabalha de carteira assinada, mas ambos criam galinhas e porcos, além de produção de queijo, que fazem isso há oito anos, que ajuda nessas vendas em especial a de queijo, que autora trabalhou enquanto estava grávida.
8. Apelação a que se nega provimento.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO a apelação interposta, nos termos do voto do Relator.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator
