
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:PATRICIA JESUS OLIVEIRA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: FELIPE FIGUEIREDO CARDOSO - BA47214-A e CARINA MARQUES OLIVEIRA MAGALHAES - BA47431-A
RELATOR(A):URBANO LEAL BERQUO NETO

CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:PATRICIA JESUS OLIVEIRA
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: FELIPE FIGUEIREDO CARDOSO - BA47214-A e CARINA MARQUES OLIVEIRA MAGALHAES - BA47431-A
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta pelo INSS em face de sentença que julgou procedente a pretensão contida na ação para concessão de benefício de salário-maternidade de trabalhadora rural.
Em suas razões, requer a reforma da sentença para que seja julgado improcedente o pedido, ao argumento de que a autora não faz jus ao benefício pleiteado, posto que insuficiente a prova nos autos da sua condição de segurada especial e, pelo fato de que a autora era menor de dezesseis anos no período correspondente ao prazo de carência.
Oportunizado, o lado recorrido não apresentou contrarrazões.
Com vistas dos autos, o Ministério Público Federal informou desinteresse em manifestar-se quanto ao mérito, por ausência de interesse institucional que justifique a sua intervenção.
É o relatório.

CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
V O T O
Presentes os pressupostos recursais, conheço do recurso.
Mister a depuração, de pronto, do cerne da pretensão, ora vertida em base recursal, lembrando que se trata de conflito de interesses condizente ao benefício de salário-maternidade de trabalhadora rural, segurada especial, em que o recorrente sustenta o desacerto do julgado por considerar que inexiste condição de segurada especial da autora que era menor de dezesseis anos no período correspondente ao prazo de carência.
O benefício de salário-maternidade é devido à segurada especial que atender aos requisitos estabelecidos na Lei 8.213/91 (art. 25, III) e no § 2º do art. 93 do Regulamento aprovado pelo Decreto 3.048/99: exercício de atividade rural ou de pesca artesanal nos últimos dez meses imediatamente anteriores à data do parto ou do requerimento do benefício, quando requerido antes do parto, mesmo que de forma descontínua.
Quanto a irresignação do INSS ao fato de que a autora, ao tempo do parto, no período correspondente ao prazo de carência, era menor de dezesseis anos, a sentença de primeiro grau se encontra bem fundamentada quanto à análise de todo o conjunto probatório e não existem elementos nos autos que possa infirmar o quanto ali consignado.
Nos termos da jurisprudência deste TRF da 1ª Região e do STJ, é possível reconhecer o direito ao benefício previdenciário à mãe menor de 16 anos, uma vez que a vedação constitucional ao trabalho ao absolutamente incapaz, constante do art. 7º, XXXIII da CF/88, é norma de garantia do trabalhador, que visa à proteção da criança, não podendo ser interpretada em seu desfavor quando efetivamente comprovada a atividade rural.
Neste sentido, oportuno a transcrição do julgado do Colendo Superior Tribunal de Justiça:
PREVIDENCIÁRIO. (...). SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL MENOR DE 16 ANOS. ATIVIDADE CAMPESINA COMPROVADA. ART. 11, VII, c, § 6º. DA LEI 8.213/91. CARÁTER PROTETIVO DO DISPOSITIVO LEGAL. NORMA DE GARANTIA DO MENOR NÃO PODE SER INTERPRETADA EM SEU DETRIMENTO. IMPERIOSA PROTEÇÃO DA MATERNIDADE, DO NASCITURO E DA FAMÍLIA. DEVIDA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. RECURSO ESPECIAL DO INSS DESPROVIDO. 1. O sistema de Seguridade Social, em seu conjunto, tem por objetivo constitucional proteger o indivíduo, assegurando seus direitos à saúde, assistência social e previdência social; traduzindo-se como elemento indispensável para garantia da dignidade humana. 2. A intenção do legislador infraconstitucional ao impor o limite mínimo de 16 anos de idade para a inscrição no RGPS era a de evitar a exploração do trabalho da criança e do adolescente, ancorado no art. 7º., XXXIII da Constituição Federal. 3. Esta Corte já assentou a orientação de que a legislação, ao vedar o trabalho infantil, teve por escopo a sua proteção, tendo sido estabelecida a proibição em benefício do menor e não em seu prejuízo, aplicando-se o princípio da universalidade da cobertura da Seguridade Social. 4. Desta feita, não é admissível que o não preenchimento do requisito etário para filiação ao RGPS, por uma jovem impelida a trabalhar antes mesmo dos seus dezesseis anos, prejudique o acesso ao benefício previdenciário, sob pena de desamparar não só a adolescente, mas também o nascituro, que seria privado não apenas da proteção social, como do convívio familiar, já que sua mãe teria de voltar às lavouras após seu nascimento. 5. Nessas condições, conclui-se que, comprovado o exercício de trabalho rural pela menor de 16 anos durante o período de carência do salário-maternidade (10 meses), é devida a concessão do benefício. (...)” (1ª Turma do STJ, REsp nº 1.440.024/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe 28/08/2015.) Sem grifos no original
Não se admite, portanto, que o benefício seja indeferido pelo não preenchimento do requisito etário para filiação ao RGPS, prejudicando o acesso ao benefício previdenciário e desamparando não só a adolescente, ora autora, como também o nascituro, que seria privado, a um só tempo, da proteção social e do convívio familiar, posto que sua genitora seria compelida a voltar à faina pastoril após o nascimento, o que prejudicaria o fortalecimento de vínculos, os cuidados na primeira infância e colocaria o nascituro em situação de risco.
Seguindo nos autos, a concessão do benefício pleiteado pela parte autora, portanto, exige a demonstração do trabalho rural, em regime de subsistência, ou de pesca artesanal no prazo mínimo de 10 (dez) meses, ainda que descontínuos, mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena, inadmissível a prova exclusivamente testemunhal.
No que tange à caracterização da condição de segurada especial, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Jurisprudência, firmou o entendimento de que para o reconhecimento do tempo de serviço do trabalho rural, apesar de não haver exigência legal de que o documento apresentado como início de prova material abranja todo o período que se busca comprovar, é preciso que tal prova seja contemporânea ao menos por uma fração do lapso de trabalho rural pretendido (Pet 7.475/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 09/11/2016, DJe 29/11/2016).
É pacífica a jurisprudência do STJ e desta Corte no sentido de que o rol do art. 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo, (STJ AgRG no REsp 1073730/CE) sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos.
São idôneos, portanto, dentre outros, a ficha de alistamento militar, o certificado de dispensa de incorporação (CDI), o título eleitoral em que conste como lavrador a profissão do segurado (STJ, AgRG no REsp 939191/SC); a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF); certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR 1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR 3202/CE).
Igualmente aceitáveis documentos tais como certidões do INCRA, guias de recolhimento de ITR, documentos fiscais de venda de produtos rurais, recibos de pagamento a sindicato rural, certidão de registro de imóveis relativos à propriedade rural, contratos de parceria agrícola e todos outros que indiciem a ligação da parte autora com o trabalho e a vida no meio rural, bem como a CTPS com anotações de trabalho rural da parte autora, que é considerada prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência (REsp 310.264/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, 6ª Turma, DJ 18.02.2002, p. 530; AC 2004.38.03.000757-8/MG, Rel. Desembargadora Federal Neuza Maria Alves da Silva, Segunda Turma, e-DJF1 p.33 de 17/07/2008, AC 0004262-35.2004.4.01.3800/MG, Rel. Juiz Federal Miguel Ângelo de Alvarenga Lopes, 3ª Turma Suplementar, e-DJF1 p.191 de 02/03/2011).
No caso dos autos, a autora postula o benefício de salário-maternidade, na condição de segurada especial, em decorrência do nascimento de sua filha, ocorrido em 13/09/2018.
Com o propósito de comprovar a sua condição de segurada especial, de fato, juntou documentos que não se revestem de robustez, pois parte deles diz respeito a documentos não caracterizados pela segurança jurídica e das formalidades legais que possibilitem atestar a sua veracidade, como: o cartão de vacina, cartão da gestante, declarações, dentre outros, todos constando o endereço em comum o Sítio Covas dos Seixas.
Por outro lado, verifica-se a presença, da certidão de nascimento da filha da autora, em virtude da qual se postula o benefício; a CTPS do genitor com o indicativo do labor rural nos anos 2016 e 2018; contrato de comodato com início no ano de 2003 em nome de sua genitora (Gildete Silva de Jesus), e datado no ano de 2017, bem como ITR dos anos de 2017 e 2018, referente ao Sítio Covas dos Seixas, portanto, tais documentos, que possuem endereço em comum, devem ser considerados aptos a constituir o início de prova material.
Desse modo, não há que se falar em insuficiência de prova material, pois tais documentos devem ser considerados aptos a constituir o início de prova material. Ademais, a autora é pessoa jovem, contava com apenas 16 anos ao tempo do parto, de modo que, por não ser titular de propriedade rural, enfrenta maiores dificuldades para amealhar prova documental em nome próprio.
Com efeito, diante das dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores rurais para comprovar o exercício de atividade rurícola, em razão das peculiaridades inerentes ao meio campestre, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem adotado a solução pro mísero, em que se admite a prova testemunhal para demonstrar a qualidade de segurada, desde que acompanhada de início de prova material.
Conforme a prova testemunhal produzida nos autos, ficou comprovado que a autora, durante o período de carência indispensável à concessão do benefício, tirava o sustento do labor rural, em regime de subsistência. As testemunhas garantem que conhece a autora desde pequena e que sempre residiu e laborou em meio rural no Sítio Covas dos Seixas com seus pais e que convive com o genitor.
Registra-se, por oportuno, que em consonância com entendimento do STJ os dados constantes dos documentos apresentados são hábeis a comprovação da condição de rurícola para fins previdenciários, em especial quando inexiste qualquer indicativo de fraude que macule o seu conteúdo.
Por fim, a regra de limitação etária ao exercício de atividade laborativa, presente no artigo 7º, XXXIII, da Constituição da República, constitui norma protetiva da criança e do adolescente, razão pela qual não pode ser utilizada em seu prejuízo para fundamentar a negativa da proteção previdenciária.
Posto isto, NEGO PROVIMENTO ao recurso interposto pelo INSS, nos termos da fundamentação supra.
Em razão do não provimento recursal, fixo os honorários de sucumbência em 11% do valor da condenação, eis que majoro em um ponto percentual o parâmetro fixado na origem.
É o voto.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUO NETO
Relator

CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:PATRICIA JESUS OLIVEIRA
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: FELIPE FIGUEIREDO CARDOSO - BA47214-A e CARINA MARQUES OLIVEIRA MAGALHAES - BA47431-A
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. SEGURADA ESPECIAL. SEGURADA MENOR DE 16 ANOS DE IDADE. NORMA DE GARANTIA DO MENOR. VEDADA INTERPRETAÇÃO DESFAVORÁVEL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL VÁLIDA. RECURSO IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA.
1. O benefício de salário-maternidade é devido à segurada especial que atender aos requisitos estabelecidos na Lei 8.213/91 (art. 25, III) e no § 2º do art. 93 do Decreto 3.048/99. A demonstração do trabalho rural no prazo mínimo de 10 (dez) meses, ainda que descontínuos, deve ser comprovado mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena, inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF/1ª Região, Súmula 27).
2. Nos termos da jurisprudência deste TRF da 1ª Região e do STJ é possível reconhecer o direito ao benefício previdenciário à mãe menor de 16 anos, uma vez que a vedação constitucional ao trabalho ao menor de 16 anos, constante do art. 7º, XXXIII da CF/88 é norma de garantia do trabalhador, que visa à proteção da criança, não podendo ser interpretada em seu desfavor, quando efetivamente comprovada a atividade rural. Precedentes: AC 0004211-41.2011.4.01.4200, DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS AUGUSTO PIRES BRANDÃO, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 13/06/2018; 1ª Turma do STJ, REsp nº 1.440.024/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe 28/08/2015.
3. Não se admite, portanto, que o benefício seja indeferido pelo não preenchimento do requisito etário para filiação ao RGPS, prejudicando o acesso ao benefício previdenciário e desamparando não só a adolescente como também o nascituro, que seria privado, a um só tempo, da proteção social e do convívio familiar, posto que sua genitora seria compelida a voltar às lavouras após o nascimento, o que prejudicaria o fortalecimento de vínculos, os cuidados na primeira infância e colocaria a criança em situação de risco.
4. No caso dos autos, a autora postula o benefício de salário-maternidade rural em decorrência do nascimento de sua filha, cuja certidão se anexou, bem como coligiu a CTPS do genitor com o indicativo do labor rural nos anos 2016 e 2018, contrato de comodato com inicio no ano de 2003 em nome de sua genitora (Gildete Silva de Jesus), e datado no ano de 2017, bem como ITR dos anos de 2017 e 2018, referente ao Sitio Covas dos Seixas, portanto, tais documentos, que possuem endereço em comum, devem ser considerados aptos a constituir o início de prova material.
5. Dessa forma, não há que se falar em insuficiência de prova material, posto que há prova indiciária da sua condição de segurada especial. Ademais, a autora é pessoa jovem, contava com apenas 16 anos ao tempo do parto, de modo que, por não ser titular de propriedade rural, enfrenta maiores dificuldades para amealhar prova documental em nome próprio.
6. Com efeito, diante das dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores rurais para comprovar o exercício de atividade rurícola, em razão das peculiaridades inerentes ao meio campestre, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem adotado a solução "pro misero", em que se admite a prova testemunhal para demonstrar a qualidade de segurada, desde que acompanhada de início de prova material. Registra-se, por oportuno, que em consonância com entendimento do STJ os dados constantes nos documentos apresentados são hábeis a comprovação da condição de rurícola para fins previdenciários, em especial quando inexiste qualquer indicativo de fraude que macule o seu conteúdo.
7. Ademais, a prova testemunhal comprovou que a autora, durante o período de carência indispensável à concessão do benefício, tirava o sustento do labor rural, em regime de subsistência. As testemunhas garantem que conhece a autora desde pequena e que sempre residiu e laborou em meio rural no Sitio Covas dos Seixas com seus pais e que convive com o genitor.
8. Apelação que se nega provimento.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO a apelação interposta, nos termos do voto do relator.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUO NETO
Relator
