
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
POLO PASSIVO:MARIA DAS GRACAS DE ALMEIDA SOUSA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: MARCO ANDRE VAZ DE ARAUJO - PI6447-A e VICTOR VINICIUS SOARES DO REGO - PI6078-A
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1018536-71.2023.4.01.0000
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS de sentença na qual foi julgado procedente o pedido inicial de concessão do benefício de salário-maternidade a trabalhadora rural (fls. 79/81).
Em suas razões (fls. 94/98), a autarquia apelante pugna pela reforma da sentença para que seja julgado improcedente o pedido, ao argumento de que não estão presentes os requisitos necessários à concessão do benefício. Subsidiariamente, requer “a aplicação da correção monetária com a incidência dos índices legalmente previstos (Súmula nº 148 do STJ) e de juros de mora não cumulativos incidentes tão-somente a partir da data da citação válida (Súmula nº 204 do STJ), bem como fixados em percentual não superior a 6% ao ano, tudo nos termos do art. 1º-F, da Lei 9.494/97” (fl. 98).
Sem contrarrazões.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Mérito
O salário-maternidade
A Constituição Federal de 1988 garante, no artigo 7º, inciso XVIII, a licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de 120 (cento e vinte) dias.
O benefício de salário-maternidade está previsto no art. 71 da Lei n. 8.213/91, que assim dispõe:
"Art. 71. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade."
Em relação à segurada especial, o art. 39, parágrafo único, do mesmo diploma legal, assim estabelece:
"Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do caput do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:
(...)
Parágrafo único. Para a segurada especial fica garantida a concessão do salário-maternidade no valor de 1 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao do início do benefício."
Dessa forma, para a concessão do benefício, sem que haja a necessidade do recolhimento de contribuições previdenciárias, é indispensável a comprovação do efetivo exercício de atividade atribuída legalmente ao segurado especial, assim definida na Lei n. 8.213/91:
"Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(...)
VII – como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade:
1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais;
(...)
§ 1º Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes."
A par disso, o aludido dispositivo legal exige a comprovação do efetivo desempenho da atividade em regime de economia familiar, nos moldes nele referidos, o que reivindica a existência de prova material passível de ser confirmada através de robusta prova testemunhal.
No caso do salário-maternidade, o exercício da atividade rural deve ser devidamente comprovado durante o período de carência legalmente indicado para a concessão do benefício.
Das provas
Registre-se que “A jurisprudência pátria, considerando a situação peculiar do trabalhador rural e a dificuldade encontrada por esses trabalhadores em comprovar a atividade rural, em qualquer de suas formas, permite que outros documentos (dotados de fé pública) não especificados em lei, sejam considerados para fins de concessão do benefício previdenciário” (AC 0031039-78.2012.4.01.9199, DESEMBARGADOR FEDERAL PEDRO BRAGA FILHO, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 20/03/2023 PAG.).
Ademais, é pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o rol do art. 106 da Lei n. 8.213/91 tem natureza meramente exemplificativa (AgRG no REsp 1073730/CE), sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além daqueles nele indicados.
O caso concreto
Conforme se observa dos autos, a parte autora ajuizou a presente ação após o indeferimento do requerimento administrativo do benefício, apresentando os seguintes documentos: cópia da certidão de nascimento de seu filho, Andrey de Almeida Sousa, ocorrido em 29/07/2007, sem indicar a qualificação profissional dos genitores; b) declaração de proprietário de imóvel rural, sem firma reconhecida; e c) certidão eleitoral emitida em 27/03/2013.
Examinando os autos, todavia, verifico que os documentos apresentados não são aptos à comprovação do exercício de atividade rural qualificável, nos termos do inciso VII do art. 11 da Lei n. 8.213/91, exercida sob o regime de economia familiar, por tempo suficiente à carência prevista no art. 39, parágrafo único, da Lei n. 8.213/91.
Com efeito, a certidão de nascimento em nada acrescenta à comprovação da qualidade de segurada especial, pois não consta a qualificação profissional dos genitores, e os demais documentos foram produzidos após o parto.
Além disso, não servem como início de prova material do labor rural, documentos que não se revestem das formalidades legais, tais como: carteiras, comprovantes e declarações de sindicatos sem a devida homologação do INSS e do Ministério Público; certidão eleitoral com anotação indicativa da profissão de lavrador; declarações escolares, de Igrejas, de ex-empregadores e afins; prontuários médicos em que constem as mesmas anotações; além de outros que a esses possam se assemelhar.
Na ausência, portanto, de início de prova material do exercício de atividade rural no período estabelecido na legislação de regência, não é possível a concessão do benefício de salário-maternidade.
Cabe anotar, ainda, que a jurisprudência pátria já se pacificou no sentido de que “A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário” (Sumula 149 do STJ).
Nesse mesmo sentido, vale ainda conferir o seguinte precedente desta Corte Regional:
“PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO MATERNIDADE. RURÍCOLA. INEXISTÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL DA ATIVIDADE CAMPESINA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. 1. O salário-maternidade é devido à segurada especial, no valor de 01 (um) salário mínimo mensal, durante 120 dias, a contar da data do parto ou dos 28 (vinte e oito) dias que o antecederam, desde que comprovado o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos dez meses imediatamente anteriores ao início do benefício (arts. 39, parágrafo único, e 71 c/c 25, da Lei nº 8.213/91). 2. Não se prestam como razoável início de prova material do labor rural documentos confeccionados em momento próximo ao ajuizamento da ação ou ao implemento do requisito etário, em especial quando não encontram sintonia com o conjunto probatório dos autos. 3. Na hipótese, a parte-autora não se desincumbiu de comprovar a sua qualidade de segurada especial, haja vista não ter colacionado aos autos documentos hábeis e robustos a confirmar a atividade campesina, mormente no período de carência exigido em lei. De igual modo, a mera juntada de documentos particulares, desprovidos de fé pública, não se mostra suficiente para o fim pretendido. Na ausência de início razoável de prova material, a jurisprudência é pacífica no sentido de que é inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª Região, Súmula 27). Saliente-se, por oportuno, que uma vez verificada a imprestabilidade da prova material, não se pode conceder o benefício com base apenas nas provas testemunhais, como já sedimentou este Tribunal em reiterados julgados. 4. Ante o caráter social que permeia o Direito Previdenciário, a coisa julgada opera secundum eventum litis ou secundum eventum probationais, permitindo a renovação do pedido, ante novas circunstâncias ou novas provas. Precedentes. 5. Os honorários advocatícios arbitrados em 15% sobre o valor atribuído à causa devem ser majorados em 2% (dois por cento), a teor do disposto no art. 85, §§ 2º, 3º e 11 do NCPC, totalizando o quantum de 17% (dezessete por cento) sobre a mesma base de cálculo, ficando suspensa a execução deste comando por força da assistência judiciária gratuita, nos termos do art. 98, §3º do Codex adrede mencionado. 6. Apelação desprovida.” (AC 0005279-20.2018.4.01.9199, DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, e-DJF1 08/06/2018).
Por fim, devo registrar que no julgamento do REsp 1352721/SP, em sede de recurso repetitivo, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que, nas ações previdenciárias, a ausência de prova a instruir a inicial implica o reconhecimento da ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem apreciação do mérito, podendo a parte autora ajuizar novamente a ação desde que reunidos novos elementos probatórios.
Nesse contexto, ausente um dos requisitos necessários ao reconhecimento da qualidade de segurada especial, qual seja, o início de prova material da atividade rural exercida, carece a autora de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo.
Com esses fundamentos, julgo extinto o processo, sem resolução do mérito, com base no art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil, e declaro prejudicada a apelação interposta pelo INSS.
É o voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS
Relatora
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
92
APELAÇÃO CÍVEL (198)1018536-71.2023.4.01.0000
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
MARIA DAS GRACAS DE ALMEIDA SOUSA
Advogados do(a) APELADO: MARCO ANDRE VAZ DE ARAUJO - PI6447-A, VICTOR VINICIUS SOARES DO REGO - PI6078-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. SENTENÇA JULGOU PROCEDENTE O PEDIDO. AUSÊNCIA DE UM INÍCIO DE PROVA MATERIAL DO EFETIVO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE CAMPESINA. INSUFICIÊNCIA DA PROVA TESTEMUNHAL. PROCESSO EXTINTO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. EXAME DA APELAÇÃO DO INSS PREJUDICADO.
1. A segurada especial referida no art. 39, parágrafo único, da Lei n. 8.213/91, faz jus ao benefício de salário-maternidade, mediante a comprovação do exercício de atividade rural nos últimos 10 (dez) meses imediatamente anteriores ao parto (art. 71 da Lei 8.213/91 e art. 93, § 2º, do Decreto n. 3.048/99).
2. Não tendo sido apresentado um início razoável de prova material suficiente para a comprovação do efetivo exercício da atividade rural, pelo período de carência legalmente exigido, o direito ao salário-maternidade não se configura, porque a mencionada atividade não pode ser reconhecida com base apenas em prova testemunhal, a teor do disposto no enunciado da Súmula n. 149 do Superior Tribunal de Justiça.
3. O Superior Tribunal de Justiça decidiu, em sede de recurso repetitivo, que nas ações previdenciárias a ausência de prova a instruir a inicial implica o reconhecimento da ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem resolução do mérito, possibilitando à parte autora propor novamente a ação, desde que apresente novos elementos probatórios (Tema 629).
4. Processo julgado extinto, sem apreciação do mérito. Exame da apelação do INSS prejudicado.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma, por unanimidade, extinguir o processo, sem resolução do mérito, dando por prejudicado o exame da apelação interposta pelo INSS, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS Relatora