
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:LEIDIMARA DE SOUSA COSTA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: MARCUS VINICIUS SCATENA COSTA - SP286253-S e BRUNO HENRIQUE MASTIGUIN ROMANINI - TO4718-A
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1008054-06.2024.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS de sentença na qual foi acolhido o pedido inicial de concessão do benefício de salário-maternidade a trabalhadora rural (fls. 109/115).
Em suas razões, a autarquia apelante pugna pela reforma da sentença para que seja julgado improcedente o pedido, ao argumento de que não estão presentes os requisitos necessários à concessão do benefício. Na hipótese de manutenção da sentença, formula pedidos subsidiários relacionados à prescrição quinquenal e a honorários advocatícios, entre outros (fls. 121/123).
Foram apresentadas contrarrazões.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
O salário-maternidade
A Constituição Federal de 1988 garante, no artigo 7º, inciso XVIII, a licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de 120 (cento e vinte) dias.
O benefício previdenciário de salário-maternidade está previsto no art. 71 da Lei n. 8.213/91, que assim dispõe:
"Art. 71. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade."
Em relação à segurada especial, o art. 39, parágrafo único, do mesmo diploma legal, assim estabelece:
"Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do caput do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:
(...)
Parágrafo único. Para a segurada especial fica garantida a concessão do salário-maternidade no valor de 1 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao do início do benefício."
Dessa forma, para a concessão do benefício, sem que haja a necessidade do recolhimento de contribuições previdenciárias, é indispensável a comprovação de efetivo exercício de atividade atribuída legalmente ao segurado especial, assim definida na Lei n. 8.213/91:
"Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(...)
VII – como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade:
1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais;
(...)
§ 1º Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes."
A par disso, o aludido dispositivo legal exige a comprovação do efetivo desempenho da atividade em regime de economia familiar, nos moldes nele referidos, o que reivindica a existência de prova material passível de ser confirmada através de robusta prova testemunhal.
No caso do salário-maternidade, o exercício de atividade rural deve ser devidamente comprovado durante o período de carência legalmente indicado para a concessão do benefício.
Das provas
Registre-se que “A jurisprudência pátria, considerando a situação peculiar do trabalhador rural e a dificuldade encontrada por esses trabalhadores em comprovar a atividade rural, em qualquer de suas formas, permite que outros documentos (dotados de fé pública) não especificados em lei, sejam considerados para fins de concessão do benefício previdenciário” (AC 0031039-78.2012.4.01.9199, DESEMBARGADOR FEDERAL PEDRO BRAGA FILHO, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 20/03/2023 PAG.).
Ademais, é pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o rol do art. 106 da Lei n. 8.213/91 tem natureza meramente exemplificativa (AgRG no REsp 1073730/CE), sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício da atividade rural, além daqueles nele indicados.
O caso concreto
Conforme se observa dos autos, a parte autora ajuizou a presente ação em 31/11/2022, após o indeferimento do requerimento administrativo do benefício, apresentando os seguintes documentos: cópia da certidão de nascimento do filho, Heitor da Silva Costa, ocorrido em 31/01/2021, sem indicar a profissão dos genitores; cópia da certidão de nascimento de uma filha, nascida em 11/05/2015, em que consta a qualificação profissional dos genitores como lavradores; e ficha de matrícula, constando a autora como lavradora.
Ora, a certidão de nascimento da filha, nascida em 11/05/2015, na qual os genitores foram qualificados como lavradores, é extemporânea, uma vez que emitida em época remota, bastante anterior ao período de carência que a parte almeja comprovar.
Com efeito, deve-se reconhecer que não foi produzido início de prova material suficiente para a demonstração do efetivo exercício da atividade rural.
Vale anotar, ainda, que a jurisprudência pátria já se pacificou no sentido de que o benefício previdenciário não pode ser concedido com base apenas em prova testemunhal, nos termos da Súmula n. 149 do Superior Tribunal de Justiça, que estabelece:
“A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário”.
Sobre o tema, merece registro o seguinte precedente deste TRF – 1ª Região:
“PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO MATERNIDADE. RURÍCOLA. INEXISTÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL DA ATIVIDADE CAMPESINA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. 1. O salário-maternidade é devido à segurada especial, no valor de 01 (um) salário mínimo mensal, durante 120 dias, a contar da data do parto ou dos 28 (vinte e oito) dias que o antecederam, desde que comprovado o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos dez meses imediatamente anteriores ao início do benefício (arts. 39, parágrafo único, e 71 c/c 25, da Lei nº 8.213/91). 2. Não se prestam como razoável início de prova material do labor rural documentos confeccionados em momento próximo ao ajuizamento da ação ou ao implemento do requisito etário, em especial quando não encontram sintonia com o conjunto probatório dos autos. 3. Na hipótese, a parte-autora não se desincumbiu de comprovar a sua qualidade de segurada especial, haja vista não ter colacionado aos autos documentos hábeis e robustos a confirmar a atividade campesina, mormente no período de carência exigido em lei. De igual modo, a mera juntada de documentos particulares, desprovidos de fé pública, não se mostra suficiente para o fim pretendido. Na ausência de início razoável de prova material, a jurisprudência é pacífica no sentido de que é inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª Região, Súmula 27). Saliente-se, por oportuno, que uma vez verificada a imprestabilidade da prova material, não se pode conceder o benefício com base apenas nas provas testemunhais, como já sedimentou este Tribunal em reiterados julgados. 4. Ante o caráter social que permeia o Direito Previdenciário, a coisa julgada opera secundum eventum litis ou secundum eventum probationais, permitindo a renovação do pedido, ante novas circunstâncias ou novas provas. Precedentes. 5. Os honorários advocatícios arbitrados em 15% sobre o valor atribuído à causa devem ser majorados em 2% (dois por cento), a teor do disposto no art. 85, §§ 2º, 3º e 11 do NCPC, totalizando o quantum de 17% (dezessete por cento) sobre a mesma base de cálculo, ficando suspensa a execução deste comando por força da assistência judiciária gratuita, nos termos do art. 98, §3º do Codex adrede mencionado. 6. Apelação desprovida.” (AC 0005279-20.2018.4.01.9199, DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, e-DJF1 08/06/2018).
Finalmente, devo registrar que no julgamento do REsp 1352721/SP, em sede de recurso repetitivo, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que “A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa” (REsp n. 1.352.721/SP, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Corte Especial, julgado em 16/12/2015, DJe de 28/4/2016.).
Nesse contexto, ausente um dos requisitos necessários ao reconhecimento da qualidade de segurada especial, qual seja, o início de prova material da atividade rural exercida, carece a autora de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo.
Com esses fundamentos, julgo extinto o processo, sem resolução do mérito, com base no art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil, e declaro prejudicada a apelação interposta pelo INSS.
É o voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS
Relatora
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
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APELAÇÃO CÍVEL (198)1008054-06.2024.4.01.9999
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
LEIDIMARA DE SOUSA COSTA
Advogados do(a) APELADO: BRUNO HENRIQUE MASTIGUIN ROMANINI - TO4718-A, MARCUS VINICIUS SCATENA COSTA - SP286253-S
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. SENTENÇA JULGOU PROCEDENTE O PEDIDO. AUSÊNCIA DE UM INÍCIO DE PROVA MATERIAL DO EFETIVO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE CAMPESINA. INSUFICIÊNCIA DA PROVA TESTEMUNHAL. PROCESSO EXTINTO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. EXAME DA APELAÇÃO PREJUDICADO.
1. A segurada especial referida no art. 39, parágrafo único, da Lei n. 8.213/91, faz jus ao benefício de salário-maternidade, mediante a comprovação do exercício da atividade rural nos últimos 10 (dez) meses imediatamente anteriores ao parto (art. 71 da Lei 8.213/91 e art. 93, § 2º, do Decreto n. 3.048/99).
2. Não tendo sido apresentado ao menos um início razoável de prova material suficiente para a comprovação do efetivo exercício da atividade rural, pelo período de carência legalmente exigido, o direito ao salário-maternidade não se configura, porque o exercício do labor campesino não pode ser reconhecido apenas e tão-somente com base em prova testemunhal (Súmula 149 do STJ).
3. No julgamento do REsp 1352721/SP, em sede de recurso repetitivo, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que “A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa” (REsp n. 1.352.721/SP, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Corte Especial, julgado em 16/12/2015, DJe de 28/4/2016.).
4. Processo julgado extinto, de ofício, sem apreciação do mérito. Exame da apelação do INSS prejudicado.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma, por unanimidade, extinguir o processo, sem resolução do mérito, dando por prejudicado o exame do recurso de apelação interposto pelo INSS, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS Relatora