
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:APARECIDO JUSTINO DOS SANTOS
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: CARINE MARIA BARELLA RAMOS - RO6279
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES

Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social-INSS em face de sentença que julgou parcialmente procedente a pretensão autoral e condenou-o a restabelecer o auxílio-doença ao autor, desde a data da cessação do benefício anterior.
O apelante alega ter sido demonstrado nos autos que o autor permaneceu trabalhando durante o período de incapacidade. Requer, assim, a reforma da sentença, porquanto o exercício de atividade laborativa implica presunção de capacidade do autor e torna incompatível o recebimento do benefício por incapacidade.
É o relatório.

Processo Judicial Eletrônico
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
V O T O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
O efeito devolutivo da apelação consagra o princípio tantum devolutum quantum appellatum e transfere ao Tribunal apenas o exame da matéria impugnada no recurso, nos termos dos arts. 1.002 e 1.013 do CPC/2015.
Controvérsia limitada à possibilidade de recebimento de benefício por incapacidade concomitante ao período em que o segurado exerce atividade remunerada.
Auxílio-doença - requisitos trabalhador rural
Conforme disposto no art. 59 e 60, § 1º, da Lei 8.213/91, o auxílio-doença será devido ao segurado que ficar incapacitado temporariamente para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de quinze dias consecutivos.
A concessão de benefício previdenciário por incapacidade requer o preenchimento de dos requisitos: qualidade de segurado e incapacidade para o trabalho ou para a atividade habitual por mais de quinze dias.
Exercício da atividade remunerada após o requerimento administrativo
O e. Superior Tribunal de Justiça, em julgamento sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.013), analisou a questão controvertida acerca da possibilidade de recebimento de benefício por incapacidade, concedido judicialmente em período de abrangência concomitante àquele em que o segurado estava trabalhando e aguardava o deferimento do benefício, nestes termos:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ARTS. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015. TEMA REPETITIVO 1.013/STJ. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO-DOENÇA. DEMORA NA IMPLEMENTAÇÃO DO BENEFÍCIO. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE REMUNERADA PELO SEGURADO. NECESSIDADE DE SUBSISTÊNCIA DO SEGURADO. FUNÇÃO SUBSTITUTIVA DA RENDA NÃO CONSUBSTANCIADA. POSSIBILIDADE DE RECEBIMENTO CONJUNTO DA RENDA DO TRABALHO E DAS PARCELAS RETROATIVAS DO BENEFÍCIO ATÉ A EFETIVA IMPLANTAÇÃO. TESE REPETITIVA FIXADA. IDENTIFICAÇÃO E DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA
(...).
13. A presente controvérsia cuida de caso, portanto, em que falhou a função substitutiva da renda, base da cobertura previdenciária dos benefícios auxílio-doença e aposentadoria por invalidez.
14.O provimento do sustento do segurado não se materializou, no exato momento da incapacidade, por falha administrativa do INSS, que indeferiu incorretamente o benefício, sendo inexigível do segurado que aguarde a efetivação da tutela jurisdicional sem que busque, pelo trabalho, o suprimento da sua subsistência.
15. Por culpa do INSS, resultado do equivocado indeferimento do benefício, o segurado teve de trabalhar, incapacitado, para o provimento de suas necessidades básicas, o que doutrinária e jurisprudencialmente convencionou-se chamar de sobre-esforço. Assim, a remuneração por esse trabalho tem resultado inafastável da justa contraprestação pecuniária.
16. Na hipótese, o princípio da vedação do enriquecimento sem causa atua contra a autarquia previdenciária, pois, por culpa sua - indeferimento equivocado do benefício por incapacidade -, o segurado foi privado da efetivação da função substitutiva da renda laboral, objeto da cobertura previdenciária, inerente aos mencionados benefícios.
17. Como tempero do elemento volitivo do segurado, constata-se objetivamente que, ao trabalhar enquanto espera a concessão de benefício por incapacidade, está ele atuando de boa-fé, cláusula geral hodiernamente fortalecida na regência das relações de direito.
18. Assim, enquanto a função substitutiva da renda do trabalho não for materializada pelo efetivo pagamento do auxílio-doença ou da aposentadoria por invalidez, é legítimo que o segurado exerça atividade remunerada para sua subsistência, independentemente do exame da compatibilidade dessa atividade com a incapacidade laboral.
19. No mesmo sentido do entendimento aqui defendido: AgInt no AREsp 1.415.347/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, Je de 28.10.2019; REsp 1.745.633/PR, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 18.3.2019; AgInt no REsp 1.669.033/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe de 30.8.2018; REsp 1.573.146/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe de 13.11.2017; AgInt no AgInt no AREsp 1.170.040/SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe de 10.10.2018; AgInt no REsp 1.620.697/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe de 2.8.2018; AgInt no AREsp 1.393.909/SP, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 6.6.2019; e REsp 1.724.369/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 25.5.2018.
FIXAÇÃO DA TESE REPETITIVA
20. O Tema Repetitivo 1.013/STJ é assim resolvido: "No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente."
RESOLUÇÃO DO CASO CONCRETO
21. Ao Recurso Especial deve-se negar provimento, pois o Tribunal de origem julgou o presente caso no mesmo sentido do entendimento aqui proposto (fl. 142-143/e-STJ): "A permanência do segurado no exercício das atividades laborativas decorre da necessidade de prover sua subsistência enquanto a administração ou o Judiciário não reconheça sua incapacidade, não obstando a concessão do benefício vindicado durante a incapacidade."
22. Consubstanciado o que previsto no Enunciado Administrativo 7/STJ, o recorrente é condenado ao pagamento de honorários advocatícios de 10% (dez por cento) sobre o valor total da verba sucumbencial fixada nas instâncias ordinárias, com base no § 11 do art. 85 do CPC/2015.
CONCLUSÃO
23. Recurso Especial não provido, sob o rito dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015.
(REsp 1.786.590/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe de 1/7/2020).
Caso dos autos
O autor recebeu auxílio-doença de 03 a 10/2018 e, nesta ação, pretende o restabelecimento do referido benefício, em razão da persistência da inaptidão para o labor.
Para fins de comprovar sua condição de segurado especial, apresentou notas fiscais de comercialização de laticínio em seu nome, emitidas em 2017.
A prova de incapacidade foi produzida por perícia médica judicial, realizada em 28/09/2019, que atestou que o autor (53 anos, “rurícola”) é portador de “espondilodiscopatia degenerativa da coluna lombar com abaulamento discal nos níveis L5-S1” que o incapacita para sua atividade laboral desde 2017, de forma parcial e temporária, para as atividades que exijam esforço físico (fls. 107-110--rolagem única-PJe/TRF1).
Verifica-se equívoco do INSS em suas razões recursais, porque o caso é de pedido de restabelecimento de benefício concedido e cessado administrativamente em 2018, ou seja, posterior à data do início da incapacidade anotada no laudo (2017).
Ainda que assim não fosse, conforme o entendimento firmado pelo STJ no referido recurso julgado sob o rito dos recursos repetitivo, portanto vinculante, o segurado teria direito às parcelas pretéritas, tendo em vista a possibilidade de pagamento de parcelas vencidas durante o período em que exerceu atividade remunerada, em razão da necessidade de prover sua subsistência enquanto aguarda decisão administrativa ou judicial que reconheça seu direito ao benefício.
Portanto, deve ser mantida integralmente a sentença, pois procedente a pretensão autoral.
Honorários recursais
Nos termos do julgamento do REsp n. 1865663/PR, que tramitou sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.059 do STJ), a majoração dos honorários de sucumbência pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido, como no caso dos autos, desse modo, conforme disposição o art. 85, § 11, do CPC/2015.
Conclusão
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS.
É como voto.

PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1019920-50.2020.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 7002809-65.2018.8.22.0019
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: APARECIDO JUSTINO DOS SANTOS
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. TRABALHADOR RURAL. RESTABELECIMENTO DE AUXÍLIO-DOENÇA. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE CONCOMITANTE COM PERÍODO DAS PARCELAS RETROATIVAS. POSSIBILIDADE. TEMA 1013. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE.
1. A concessão de benefício previdenciário por incapacidade requer o preenchimento dos requisitos: qualidade de segurado e incapacidade para o trabalho.
2. Controvérsia limitada à possibilidade de recebimento de benefício de auxílio-doença concomitante ao período em que exerce atividade remunerada.
3. A prova de incapacidade foi produzida por perícia médica judicial, realizada em 28/09/2019, que atestou que o autor (53 anos, “rurícola”) é portador de “espondilodiscopatia degenerativa da coluna lombar, com abaulamento discal nos níveis L5-S1”, que o incapacita para sua atividade laboral desde 2017, de forma parcial e temporária, para as atividades que exijam esforço físico.
4. Na hipótese dos autos, verifica-se o equívoco nas razões recursais do INSS, porque o caso é de pedido de restabelecimento de benefício concedido e cessado administrativamente em 2018, ou seja, posterior à data do início da incapacidade anotada no laudo (2017).
5. Ademais, conforme o entendimento firmado pelo STJ em recurso julgado sob o rito dos recursos repetitivo, “no período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente”. (REsp 1.786.590/SP, Tema 1.013).
6. Desse modo, comprovado por perícia médica judicial que a incapacidade do autor persiste, deve ser mantida a sentença que determinou o restabelecimento do benefício, desde a data da cessação do benefício anterior.
7. Honorários de advogado majorados em dois pontos percentuais, nos termos do art. 85, §11, do CPC/2015 e da tese fixada no Tema 1.059/STJ.
8. Apelação do INSS não provida.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da sessão de julgamento.
Desembargador Federal RUI GONÇALVES
Relator
