
POLO ATIVO: FRANCISCO DE ASSIS BUENO
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: LEGMAR CUNHA SERAFIM SILVA - GO45836-A e MARIAH RODRIGUES METSAVAHT - GO39140-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES
Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Trata-se de recurso de apelação interposto pela parte autora, Sr. FRANCISCO DE ASSIS BUENO, em face de sentença que julgou improcedente seu pedido de auxílio-acidente, tendo em vista a ausência de prova de incapacidade laboral.
O apelante alega que o laudo pericial judicial restou confuso. Afirma ter requerido a nova produção pericial. Aduz ainda que os documentos particulares comprovam o preenchimento dos requisitos para obtenção do benefício almejado. Requer a reforma da sentença para que lhe seja concedido o pedido inicial.
Contrarrazões não apresentadas.
É o relatório.
Processo Judicial Eletrônico
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
V O T O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Presente os pressupostos de admissibilidade, recebo a apelação em seu duplo efeito, nos termos dos arts. 1.011 e 1.012, ambos do CPC.
O efeito devolutivo da apelação consagra o princípio tantum devolutum quantum appellatum e transfere ao Tribunal apenas o exame da matéria impugnada no recurso, nos termos dos arts. 1.002 e 1.013 do CPC/2015.
Requisitos
Da qualidade de segurado e do auxílio-acidente
Nos termos do art. 86 da Lei n. 8.213/91 (Plano de benefícios da Previdência Social), o auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.
Da leitura do dispositivo, extrai-se que a prestação é benefício previdenciário de cunho indenizatório, sendo devido ao segurado acidentado, quando, após a consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas que impliquem redução da capacidade para a atividade laborativa habitual.
Trata-se, assim, de benefício que não possui caráter substitutivo da renda proveniente do trabalho, pois é recebido pelo segurado cumulativamente com o salário. De tal sorte, a percepção do benefício discutido não exige afastamento do trabalho.
Com efeito, os requisitos para a concessão do benefício de auxílio-acidente são: a) qualidade de segurado, b) ter o segurado sofrido acidente de qualquer natureza, c) a redução parcial e definitiva da capacidade para o trabalho habitual, e; d) o nexo causal entre o acidente e a redução da capacidade.
De se ressaltar que, em decorrência de acidente sofrido, é necessário que haja a redução da capacidade laborativa para a função habitual do segurado, ou mesmo a impossibilidade total para o desempenho da mesma função, desde que possível a reabilitação para outra atividade.
Ao fim, a concessão de auxílio-acidente independe de carência, conforme o artigo 26, inciso I da Lei 8.213/91.
Quanto a qualidade de segurado, verifica-se que a jurisprudência se consolidou no sentido de que a concessão de benefício por incapacidade anterior comprova a qualidade de segurado do requerente, salvo se ilidida por prova contrária.
Na situação, a análise do presente recurso está restrita à análise do nexo causal entre o acidente e a redução da capacidade da parte autora, eis que única alvo de controvérsia.
Caso dos autos
Do nexo de causalidade
De acordo com o laudo pericial judicial - exame realizado em 18/5/2021 -, o autor, soldador, antes da incapacitação para sua atividade laboral (passou a exercer atividade de operador de logística na mesma empresa onde trabalhava antes da reabilitação), alega sentir dores em ombro e cotovelo direitos. O perito constatou que (rolagem única PJe/TRF-1, p. 155/159): “[...]IV — CONCLUSÃO: 0(a) periciando(a) é portador(a) de PATOLOGIA DE MANGUITO ROTADOR M751 EPICONDILITE DE COTOVELO M77 [...]”. O expert afirma expressamente que a sequela não decorre de acidente de trabalho e que não é possível constatar a data de início da doença, bem como que não há incapacidade laborativa. Relata ainda que não há possibilidade de reversão.
O juízo de origem assim fundamentou a sentença (rolagem única PJe/TRF-1, p. 201/204):
“[...]Brada que teve problemas de saúdes relacionados ao trabalho, que resultou em sequelas no ombro, bem como reduziu a capacidade laborativa do segurado, vindo a receber auxílio-doença durante os períodos de 07.04.2013 à 03.04.2014, BN: 301.307.732. Obtempera que, embora não possua o comunicado de acidente de trabalho, possui certificado de readaptação de função. [...]No tocante à qualidade de segurado, não há dúvidas, pois, logo após a ocorrência do acidente a parte autora gozou de outro benefício previdenciário, qual seja, o auxílio-doença. Entretanto, não há que se falar em acidente de trabalho, pois o fato de existir certificado de reabilitação profissional não indica, necessariamente, a ocorrência de evento acidentário. Do laudo médico de evento 33 se depreende que a causa da patologia é indefinida, que as patologias do membro superior acometem há anos o requerente possuem origem por múltiplos fatores, podendo estar associados a eventos traumáticos como também a esforços diários. Ainda, ficou constatado que as lesões não dizem respeito à acidente de trabalho e não são se referem à doença de trabalho. Por fim, informou que a doença/lesão/deficiência não atinge sua capacidade laborativa. Assim, não se demonstrou falta ou diminuição de capacidade laborativa e seu nexo de causalidade com qualquer acidente. [...]Isto posto, e pelo que mais dos autos constam, julgo IMPROCEDENTE o pedido formulado na inicial. [...]”.
O requerente, não conformado, interpôs o presente recurso, argumentando em suas razões que (rolagem única PJe/TRF-1, p. 209/215):
“[...]Elaborada a avaliação médica judicial, o Dr. perito referiu que periciando é portador das patologias de MANGUITO ROTADOR CID- M 751 e EPICONDILITE DE COTOVELO M-77. Adverte-se, que o laudo pericial ficou confuso, exemplo do quesito V[1]afirma que o periciando pode realizar atividade profissional exercida antes do ocorrido acidente, ele responde que sim. Ocorre que o Médico do Trabalho afirma veemente que ele não pode exercer a mesma atividade de antes, no mesmo sentido o próprio INSS, o reabilitou para outra atividade [...]Importante mencionar, o Processo de Reabilitação Profissional tem amparo no artigo 89 da Lei 8.213/91, é oferecido pelo INSS às pessoas incapacidades total ou parcial para se regressarem ao mercado de trabalho [...]Vale mencionar que por força do inciso I do artigo 20 da Lei 8.213/1991, a doença profissional ou ocupacional se equipara a acidente de trabalho [...] o Autor realiza atividades laborais como soldador em uma montadora de veículos. [...]Perceba-se que tais alegações estão amparadas pelos atestados do médicos do trabalho anexos aos autos, emitidos os quais constituem elementos técnicos de igual valor à prova pericial! Sendo assim, é imperativo o reconhecimento do direito do Recorrente ao auxílio-acidente de qualquer natureza desde a data da cessão do benefício de auxílio-doença. [...]".
O Pleito do autor merece ser acolhido eis que o nexo causal a ser comprovado para fins de concessão do benefício de auxílio-acidente deve se dar entre o acidente sofrido/lesão e a redução da capacidade para o labor desenvolvido à época do acidente. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. TRABALHADOR URBANO. LAUDO PERICIAL CONCLUSIVO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA REDUÇÃO DEFINITIVA DA CAPACIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE AUXÍLIO-ACIDENTE. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE DOS BENEFÍCIOS. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE LABORAL. QUALIDADE DE SEGURADO COMPROVADA. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. 1. Os requisitos para a concessão do benefício de auxílio-acidente são: a) qualidade de segurado, b) ter o segurado sofrido acidente de qualquer natureza, c) a redução parcial e definitiva da capacidade para o trabalho habitual, e; d) o nexo causal entre o acidente e a redução da capacidade. 2. A qualidade de segurado do autor e a carência restaram incontroversos, ante a concessão administrativa do benefício anterior nessa condição, último cessado em 30/11/2014 (pág. 55). 3. A perícia médica judicial atestou que a parte autora, nascida em 1964, primeiro grau completo, profissão declarada de serviços gerais, sofreu acidente de trânsito em 17/08/2014, tendo como patologia observada luxação do acrômio clavicular direito. Concluiu pela incapacidade parcial e permanente, fixando a data da incapacidade na data do laudo, qual seja 14/09/2020. Atesta que a incapacidade decorre de progressão e agravamento do quadro e estimou o prazo de 01 (um) ano para recuperação da capacidade laboral. 4. Tendo o laudo indicado que a parte autora necessita de 01 ano para tratamento e recuperação da capacidade laboral, entendo que as sequelas decorrentes do acidente sofrido ainda não estão consolidadas, portanto, o caso concreto não se enquadra nas hipóteses legais autorizadoras de concessão do auxílio-acidente, porém, diante da fungibilidade dos benefícios previdenciários e tendo em conta que o INSS tem o dever de conceder ao beneficiário a melhor opção que lhe cabe, não é defeso ao magistrado conceder, de ofício, ou por fundamento diverso, em ação previdenciária, a prestação pecuniária que é devida ao jurisdicionado, não configurando decisão extra petita. 5. Demonstrada a condição de segurado, bem como a incapacidade laborativa, é de se concluir que o estado de coisas reinante implica incapacidade com intensidade/temporalidade compatíveis com o deferimento de auxílio-doença, porquanto presentes os requisitos necessários à concessão , nos termos dos arts. 59 e ss. da Lei nº. 8.213/91. Assim, considerando que a parte autora teve cessado o benefício anterior do referido auxilio em 30/11/2014, deve a DIB ser fixada nessa data. 6. Apelação do INSS parcialmente provida (improcedente o pedido de auxílio-acidente). 7. Em homenagem ao princípio da fungibilidade, condeno o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS a implantar o benefício de auxílio-doença.
(AC 1015865-22.2021.4.01.9999, DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 27/06/2023 PAG.)
A qualidade de segurado restou comprovada, conforme se extrai do CNIS anexado aos autos (rolagem única PJe/TRF-1, p. 83/93).
O laudo pericial judicial, concluiu pela existência de redução da capacidade laboral do autor, conforme se constata da resposta ao quesito n. 3 (rolagem única PJe/TRF-1, p. 159). Outrossim, o perito constatou ainda a impossibilidade de reversão da sequela (portanto, a lesão restou consolidada), conforme resposta ao quesito n. 5 (rolagem única PJe/TRF-1, p. 159).
Logo, o autor faz jus ao benefício de auxílio-acidente ante a comprovação nos autos de sua incapacidade laboral para a atividade que exercia (visto que o autor foi reabilitado para o exercício de atividade diversa, conforme atestado de reabilitação profissional emitido pelo próprio INSS - rolagem única PJe/TRF-1, p. 43), do nexo causal entre a redução permanente sofrida e a atividade de soldador desenvolvida habitualmente à época do acidente. Dessa forma, a sentença deve ser reformada em sua integralidade.
Termo Inicial
O entendimento jurisprudencial é no sentido de que o termo inicial do benefício concedido por incapacidade é a data da cessação do pagamento anteriormente concedido ou a data do requerimento administrativo (AgInt no AREsp 1.961.174/SP, Rel. Min. Ministro Herman Benjamin, DJe de 29/6/2022 e REsp 1.475.373/SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe de 8/5/2018).
Assim, na hipótese, a DIB deve ser a data da cessação do auxílio-doença em 9/1/2017, conforme CNIS do autor (rolagem única PJe/TRF-1, p. 83/93). Entretanto, em matéria de natureza previdenciária, a prescrição alcança as parcelas vencidas anteriores ao quinquênio que precede ao ajuizamento da ação, nos termos do parágrafo único do art. 103 da Lei de Benefícios e da Súmula 85/STJ. Dessa forma, o benefício previdenciário é devido a partir da cessação do auxílio-doença, observada a prescrição quinquenal.
Consectários
O valor deve ser pago com acréscimo de correção monetária pelos índices indicados no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com incidência a partir do vencimento de cada parcela (Súmulas n. 148 do STJ).
Da modificação do quadro sucumbencial
Os honorários sucumbenciais fixados na origem devem ser reajustados ante a modificação do quadro sucumbencial.
Honorários recursais
Nos termos do julgamento do REsp n. 1865663/PR, que tramitou sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.059 do STJ), a majoração dos honorários de sucumbência pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal, desse modo, não se aplica o art. 85, § 11, do CPC ao caso dos autos.
Conclusão
Ante o exposto, dou provimento à apelação do autor, para reformar a sentença e determinar ao INSS a concessão de auxílio-acidente ao autor, nos termos da fundamentação supra.
É como voto.
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1002833-13.2022.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 5513970-85.2019.8.09.0048
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: FRANCISCO DE ASSIS BUENO
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. TRABALHADOR URBANO. INAPTIDÃO PARA O TRABALHO QUE EXERCIA. REABILITAÇÃO. AUXÍLIO-ACIDENTE. SEQUELA E NEXO CAUSAL COMPROVADOS. BENEFÍCIO DEVIDO. APELAÇÃO PROVIDA.
1. Nos termos do art. 86 da Lei n. 8.213/91 (Plano de benefícios da Previdência Social), o auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.
2. O autor recebeu auxílio-doença anteriormente, o que demonstra que a qualidade de segurado foi comprovada da via administrativa.
3. De acordo com o laudo pericial judicial - exame realizado em 18/5/2021 -, o autor, soldador, antes da incapacitação para sua atividade laboral (passou a exercer atividade de operador de logística na mesma empresa onde trabalhava antes da reabilitação), alega sentir dores em ombro e cotovelo direitos. O perito constatou que: “[...]IV — CONCLUSÃO: 0(a) periciando(a) é portador(a) de PATOLOGIA DE MANGUITO ROTADOR M751 EPICONDILITE DE COTOVELO M77 [...]”. O expert afirma expressamente que a sequela não decorre de acidente de trabalho e que não é possível constatar a data de início da doença, bem como que não há incapacidade laborativa. Relata ainda que não há possibilidade de reversão.
7. O auxílio-acidente é benefício previdenciário de cunho indenizatório, sendo devido ao segurado acidentado, quando, após a consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas que impliquem redução da capacidade para a atividade laborativa habitual.
8. Tema repetitivo 156 do STJ: Será devido o auxílio-acidente quando demonstrado o nexo de causalidade entre a redução de natureza permanente da capacidade laborativa e a atividade profissional desenvolvida, sendo irrelevante a possibilidade de reversibilidade da doença.
9. Os requisitos para a concessão do benefício de auxílio-acidente são: a) qualidade de segurado, b) ter o segurado sofrido acidente de qualquer natureza, c) a redução parcial e definitiva da capacidade para o trabalho habitual, e; d) o nexo causal entre o acidente e a redução da capacidade.
10. O autor faz jus ao benefício de auxílio-acidente ante a comprovação nos autos de sua incapacidade laboral e do nexo causal entre a redução permanente sofrida e a atividade anteriormente desenvolvida.
11. Em se tratando de restabelecimento de benefício, o termo inicial deverá ser a data da cessação do auxílio-doença.
12. Juros e correção monetária, conforme Manual de Cálculos da Justiça Federal.
13. Não se aplica o art. 85, § 11, do CPC ao caso dos autos, tendo em vista o que foi decidido no Tema 1.059/STJ.
14. Apelação provida, para determinar ao INSS a concessão de auxílio-acidente ao autor.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da assinatura eletrônica.
Desembargador Federal RUI GONÇALVES
Relator