Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0000373-66.2020.4.03.6319
Relator(a)
Juiz Federal MARCIO RACHED MILLANI
Órgão Julgador
8ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
17/08/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 27/08/2021
Ementa
E M E N T A
Dispensada a ementa por interpretação extensiva do artigo 46 da Lei nº 9.099/95, segunda parte.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
8ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000373-66.2020.4.03.6319
RELATOR:22º Juiz Federal da 8ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: MARILENA FRANCISCO DOS SANTOS
Advogado do(a) RECORRIDO: CARINA TEIXEIRA DE PAULA - SP318250-N
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo8ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000373-66.2020.4.03.6319
RELATOR:22º Juiz Federal da 8ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: MARILENA FRANCISCO DOS SANTOS
Advogado do(a) RECORRIDO: CARINA TEIXEIRA DE PAULA - SP318250-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recursos inominados interposto pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
e por MARILENA FRANCISCO DOS SANTOS contra a sentença, que julgou parcialmente
procedente o pedido formulado na petição inicial para condenar a autarquia previdenciária a
conceder aposentadoria por idade à parte autora, na forma do artigo 48, § 3º, da Lei nº
8.213/1991 (modalidade híbrida), com DIB (data de início do benefício) em 25.11.2019 (DER –
data de entrada do requerimento administrativo), computando-se para fins de carência período
remoto de labor rural de 24.03.1973 a 15.04.1975, de 01.12.1975 a 29.10.1976 e de 03.11.1976
a 31.01.1993, em regime de economia familiar, na condição de segurado especial, bem como
os períodos de 01.06.2000 a 14.02.2008 e de 18.09.2008 a 05.11.2009, na condição de
empregada doméstica.
Em suas razões de recurso, o INSS impugna o cômputo dos períodos supracitados para fins de
carência. Sustenta que o conjunto probatório não é indicativo de que a autora tenha de fato
desempenhado atividades laborativas, de modo que requer a ampla reforma da sentença e a
total improcedência do pedido.
A parte autora, por sua vez, insurge-se contra a fixação da DIB (data de início do benefício) em
25.11.2019 sob o argumento de que a DER (data de entrada do requerimento administrativo),
na realidade, é 27.08.2019. Requer o termo inicial do benefício a partir desta data.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo8ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000373-66.2020.4.03.6319
RELATOR:22º Juiz Federal da 8ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: MARILENA FRANCISCO DOS SANTOS
Advogado do(a) RECORRIDO: CARINA TEIXEIRA DE PAULA - SP318250-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
DO TEMPO DE SERVIÇO REGISTRADO EM CTPS:
Em relação aos períodos de 01.06.2000 a 14.02.2008 e de 18.09.2008 a 05.11.2009, observo
que os respectivos contratos de trabalho estão regularmente anotados em CTPS
contemporânea e em exata ordem cronológica com os demais vínculos empregatícios
registrados naquele documento, contendo ainda anotações de férias.
Tratando-se de segurada empregada, e partindo da premissa de que, nesses casos, a
responsabilidade pelo recolhimento das contribuições previdenciárias cabe ao empregador, não
pode a parte autora ser penalizada por eventual descumprimento de obrigação tributária por
parte de terceiros.
CARLOS ALBERTO PEREIRA DE CASTRO e JOÃO BATISTA LAZZARI, ensinam que (...) as
anotações na CTPS valem para todos os efeitos como prova de filiação à Previdência Social,
relação de emprego, tempo trabalhado e salário de contribuição. Não é do trabalhador o ônus
de provar a veracidade das anotações de sua CTPS, nem de fiscalizar o recolhimento das
contribuições previdenciárias, pois as anotações gozam de presunção juris tantum de
veracidade, consoante Enunciado n. 12 do TST (“Manual de Direito Previdenciário”, 4ª edição,
LTR, 2003, pág. 579).
Nesse mesmo sentido, reporto-me à Súmula n.º 75 das Turmas Nacionais de Uniformização de
Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais: “Súmula 75 – A Carteira de Trabalho e
Previdência Social (CTPS) em relação à qual não se aponta defeito formal que lhe comprometa
a fidedignidade goza de presunção relativa de veracidade, formando prova suficiente de tempo
de serviço para fins previdenciários, ainda que a anotação de vínculo de emprego não conste
no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS).”
Havendo presunção relativa de veracidade, que admite prova em contrário, competia ao INSS
infirmar a anotação em CTPS. No entanto, como nada foi comprovado em sentido contrário,
deverá ser afirmada a prova e, consequentemente, o período controverso deve permanecer
reconhecido e homologado para fins previdenciários.
DA POSSIBILIDADE DE COMPUTO DE PERÍODO RURAL REMOTO PARA A CONCESSÃO
DE APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA:
O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento dos Recursos Especiais nº 1.674.221/SP e nº
1.788.404/PR, realizado em 14.08.2019, sob a sistemática dos recursos repetitivos
representativos de controvérsia (Tema 1007), fixou a seguinte tese: “O tempo de serviço rural,
ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado
para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não
tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3º da Lei
8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o
tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisitos etário ou do requerimento
administrativo.”
Transcrevo abaixo a Ementa do julgamento do Recurso Especial nº 1.674.221/SP:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. RECURSO ESPECIAL SUBMETIDO AO RITO
DOS RECURSOS REPETITIVOS. OBSERVÂNCIA DO ARTIGO 1.036, § 5o. DO CÓDIGO FUX
E DOS ARTS. 256-E, II, E 256-I DO RISTJ. APOSENTADORIA HÍBRIDA. ART. 48, §§ 3o. E 4o.
DA LEI 8.213/1991. PREVALÊNCIA DO PRINCÍPIO DE ISONOMIA A TRABALHADORES
RURAIS E URBANOS. MESCLA DOS PERÍODOS DE TRABALHO URBANO E RURAL.
EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL, REMOTO E DESCONTÍNUO, ANTERIOR À LEI
8.213/1991 A DESPEITO DO NÃO RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÃO. CÔMPUTO DO
TEMPO DE SERVIÇO PARA FINS DE CARÊNCIA. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO
DO LABOR CAMPESINO POR OCASIÃO DO IMPLEMENTO DO REQUISITO ETÁRIO OU DO
REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. TESE FIXADA EM HARMONIA COM O PARECER
MINISTERIAL. RECURSO ESPECIAL DA SEGURADA PROVIDO.
1. A análise da lide judicial que envolve a proteção do Trabalhador Rural exige do julgador
sensibilidade, e é necessário lançar um olhar especial a esses trabalhadores para compreender
a especial condição a que estão submetidos nas lides campesinas.
2. Como leciona a Professora DANIELA MARQUES DE MORAES, é preciso analisar quem é o
outro e em que este outro é importante para os preceitos de direito e de justiça. Não obstante o
outro possivelmente ser aqueles que foi deixado em segundo plano, identificá-lo pressupõe um
cuidado maior. Não se pode limitar a apontar que seja o outro. É preciso tratar de tema
correlatos ao outro, com alteridade, responsabilidade e, então, além de distinguir o outro, incluí-
lo (mas não apenas de modo formal) ao rol dos sujeitos de direito e dos destinatários da justiça
(A Importância do Olhar do Outro para a Democratização do Acesso à Justiça, Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2015, p. 35).
3. A Lei 11.718/2008, ao incluir a previsão dos §§ 3o. e 4o. no art. 48 da lei 8.213/1991, abrigou,
como já referido, aqueles Trabalhadores Rurais que passaram a exercer temporária ou
permanentemente períodos em atividade urbana, já que antes da inovação legislativa o mesmo
Segurado se encontrava num paradoxo jurídico de desamparo previdenciário: ao atingir idade
avançada, não podia receber a aposentadoria rural porque exerceu trabalho urbano e não tinha
como desfrutar da aposentadoria urbana em razão de o curto período laboral não preencher o
período de carência (REsp. 1.407.613/RS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 28.11.2014).
4. A aposentadoria híbrida consagra o princípio constitucional de uniformidade e equivalência
dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, conferindo proteção àqueles
Trabalhadores que migraram, temporária ou definitivamente, muitas vezes acossados pela
penúria, para o meio urbano, em busca de uma vida mais digna, e não conseguiram
implementar os requisitos para a concessão de qualquer aposentadoria, encontrando-se em
situação de extrema vulnerabilidade social.
5. A inovação legislativa objetivou conferir o máximo aproveitamento e valorização ao labor
rural, ao admitir que o Trabalhador que não preenche os requisitos para concessão de
aposentadoria rural ou aposentadoria urbana por idade possa integrar os períodos de labor rural
com outros períodos contributivos em modalidade diversa de Segurado, para fins de
comprovação da carência de 180 meses para a concessão da aposentadoria híbrida, desde que
cumprido o requisito etário de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher.
6. Analisando o tema, esta Corte é uníssona ao reconhecer a possibilidade de soma de lapsos
de atividade rural, ainda que anteriores à edição da Lei 8.213/1991, sem necessidade de
recolhimento de contribuições ou comprovação de que houve exercício de atividade rural no
período contemporâneo ao requerimento administrativo ou implemento da idade, para fins de
concessão de aposentadoria híbrida, desde que a soma do tempo de serviço urbano ou rural
alcance a carência exigida para a concessão do benefício de aposentadoria por idade.
7. A teste defendida pela Autarquia Previdenciária, de que o Segurado deve comprovar o
exercício de período de atividade rural nos últimos quinze anos que antecedem o implemento
etário, criaria uma nova regra que não encontra qualquer previsão legal. Se revela, assim, não
só contrária à orientação jurisprudencial desta Corte Superior, como também contraria o
objetivo da legislação previdenciária.
8. Não admitir o cômputo do trabalho rural exercido em período remoto, ainda que o Segurado
não tenha retornado à atividade campesina, tornaria a norma do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991
praticamente sem efeito, vez que a realidade demonstra que a tendência desses Trabalhadores
é o exercício de atividade rural quando mais jovens, migrando para a atividade urbana com o
avançar da idade. Na verdade, o entendimento contrário, expressa, sobretudo, a velha posição
preconceituosa contra o Trabalhador Rural, máxime se do sexo feminino.
9. É a partir dessa realidade social experimentada pelos Trabalhadores Rurais que o texto legal
deve ser interpretado, não se podendo admitir que a justiça fique retida entre o rochedo que o
legalismo impõe e o vento que o pensamento renovador sopra. A justiça pode ser cega, mas os
juízes não são. O juiz guia a justiça de forma surpreendente, nos meandros do processo, e ela
sai desse labirinto com a venda retirada dos seus olhos.
10. Nestes termos, se propõe a fixação da seguinte tese: o tempo de serviço rural, ainda que
remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da
carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido
efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991, seja
qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho
exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo.
11. Recurso Especial da Segurada provido, determinando-se o retorno dos autos à origem, a
fim de que prossiga no julgamento do feito analisando a possibilidade de concessão de
aposentadoria híbrida.
(STJ – Superior Tribunal de Justiça; Recurso Especial nº 1.674.221-SP; Órgão julgador:
PRIMEIRA SEÇÃO; Relator Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO; Data do julgamento:
14/08/2019; Publicado no DJe de 04/09/2019) (grifo nosso)
DO ALEGADO LABOR RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR:
A jurisprudência de nossos tribunais consolidou-se no sentido de que, tratando-se de período
anterior ao advento da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, é possível o reconhecimento do
labor rural para fins previdenciários, independentemente do recolhimento das contribuições a
ele correspondentes, exceto para fins de carência, desde que prestado a partir dos 12 anos de
idade.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO - AGRAVO LEGAL - ART. 557 DO CPC - RECONHECIMENTO DE
ATIVIDADE RURAL A PARTIR DE 12 ANOS DE IDADE - PRESCRIÇÃO QUINQUENAL DE
PARCELAS – INOCORRÊNCIA - JUROS DE MORA - CORREÇÃO MONETÁRIA.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. O labor rural foi reconhecido a partir da data que o autor completou 12 anos, sendo este
entendimento majoritário desta Corte e do STJ.
2. Merece parcial reforma a decisão agravada quanto à determinação de observância da
prescrição quinquenal das parcelas, uma vez que o processo administrativo de concessão do
benefício foi protocolizado em 16.06.2001 e a ação ajuizada em 26.10.2004, não ultrapassando
o prazo legal.
3. Correção monetária e juros de mora serão aplicados nos termos do Manual de Cálculos da
Justiça Federal, aprovado pela Resolução n. 267/2013 do CJF, em vigor na data da decisão.
4. São indevidos os juros de mora entre a data da conta de liquidação e a expedição de
precatório, segundo o entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça.
5. Os honorários advocatícios devem ser mantidos em 10% sobre o valor das parcelas vencidas
até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do C. Superior Tribunal de Justiça.
6. Agravo legal parcialmente provido.
(TRF3 – Tribunal Regional Federal da 3ª Região; APELREEX – Apelação/Reexame Necessário
– 1636875; Processo n.º 0005803-78.2004.4.03.6183; SÉTIMA TURMA; Relator
Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS; Data do Julgamento: 27.07.2015; Publicação:
e-DJF3 Judicial 1 de 30.07.2015) (grifo nosso)
A matéria, inclusive, encontra-se sumulada pela TNU – Turma Nacional de Uniformização de
Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais, cuja Súmula nº 05 assim dispõe: “A prestação
de serviço rural por menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991,
devidamente comprovada, pode ser reconhecida para fins previdenciários”.
Posto isso, considerando que, no caso concreto, a autora nasceu em 11.01.1957, tendo
completado 12 anos de idade, portanto, em 11.01.1969, passo a analisar o pretenso
reconhecimento para fins previdenciários do alegado labor rural nos períodos de 24.03.1973 a
15.04.1975, de 01.12.1975 a 29.10.1976 e de 03.11.1976 a 31.01.1993, em regime de
economia familiar, na condição de segurado especial.
Reporto-me, inicialmente, ao disposto no artigo 55, §§ 2º e 3º, da Lei nº 8.213/91:
Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento,
compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de
segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de
segurado.
§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência
desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele
correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante
justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito
quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente
testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto
no Regulamento. (grifo nosso)
Decorre do dispositivo legal acima transcrito que a prova testemunhal, produzida de forma
exclusiva, é inapta à comprovação do tempo de serviço, seja em atividades rurais, seja em
atividades urbanas. É exigido pela lei um mínimo de documentação, que torne verossímeis as
alegações do segurado.
A jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça consolidou-se nesse sentido. Vejamos:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. PENSÃO POR MORTE. RECONHECIMENTO DA CONDIÇÃO DE
SEGURADO ESPECIAL DO DE CUJUS. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR.AUSÊNCIA DE
INÍCIO DE PROVA MATERIAL.FRAGILIDADE DA PROVA TESTEMUNHAL. ALTERAÇÃO DO
ACÓRDÃO PROFERIDO PELO TRIBUNAL A QUO. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL
NÃO PROVIDO. 1. O Tribunal a quo ao afirmar que não há início razoável de prova material
devidamente corroborada pela prova testemunhal, aplicou a jurisprudência do STJ consolidada
no sentido de que: 1) a prova testemunhal deve ser conjugada com início de prova material; 2)
não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo período de carência
estabelecido pelo artigo 143 da Lei 8.213/1991, desde que a prova testemunhal amplie sua
eficácia probatória. 2. A revisão do entendimento firmado pelo Tribunal a quo, que afirmou a
inexistência de um conjunto probatório harmônico acerca da condição de segurado especial do
de cujus, encontra óbice na Súmula 7/STJ. 3. Agravo regimental não provido.
(STJ – Superior Tribunal de Justiça; AGARESP – Agravo Regimental no Agravo em Recurso
Especial – 660048; AGARESP 201500248097; SEGUNDA TURMA; Relator Ministro MAURO
CAMPBELL MARQUES; Data do Julgamento: 28.04.2015; Publicação: DJE de 07.05.2015)
(grifo nosso)
Nesse passo, o artigo 106 da Lei n° 8.213/1991, com a redação dada pela Lei nº 13.846/2019,
apresenta um rol exemplificativo dos documentos aptos a configurar início de prova material
para fins de comprovação do exercício de trabalho rural:
Art. 106. A comprovação do exercício de atividade rural será feita, alternativamente, por meio
de:
I – contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdência Social;
II – contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural;
III – (revogado);
IV – Declaração de Aptidão ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar, de
que trata o inciso II do caput do art. 2° da Lei n° 12.188, de 11 de janeiro de 2010, ou por
documento que a substitua;
V – bloco de notas do produtor rural;
VI – notas fiscais de entrada de mercadorias, de que trata o § 7º do art. 30 da Lei nº 8.212, de
24 de julho de 1991, emitidas pela empresa adquirente da produção, com indicação do nome do
segurado como vendedor;
VII – documentos fiscais relativos a entrega de produção rural à cooperativa agrícola,
entreposto de pescado ou outros, com indicação do segurado como vendedor ou consignante;
VIII – comprovantes de recolhimento de contribuição à Previdência Social decorrentes da
comercialização da produção;
IX – cópia da declaração de imposto de renda, com indicação de renda proveniente da
comercialização de produção rural; ou
X – licença de ocupação ou permissão outorgada pelo Incra.
Saliento, no entanto, que o artigo 106 da Lei n° 8.213/1991, com a redação dada pela Lei nº
13.846/2019, apresenta um rol exemplificativo dos documentos aptos a configurar início de
prova material para fins de comprovação do exercício de trabalho rural. Saliento, no entanto,
que referido dispositivo legal deve ser interpretado em conformidade com o princípio
constitucional que garante ao cidadão acesso irrestrito à tutela jurisdicional (artigo 5º, XXXV, da
CF/88). Interpretá-lo de forma taxativa representaria, acima de tudo, a mitigação do livre
convencimento do magistrado, privando-o da liberdade de valorar as provas que lhe são
apresentadas.
Considera-se prova material toda prova não testemunhal. Há necessidade, no entanto, de
estabelecer a distinção da “prova material efetiva” e do chamado “início de prova material”.
A “prova material efetiva” é aquela capaz de comprovar fatos e direitos por si só, de maneira
taxativa. É a prova plena, que independe de outras para produzir efeitos no mundo jurídico.
Como “início de prova material”, por sua vez, são classificadas aquelas provas, notadamente
documentais, que evidenciam indício, probabilidade, sinais aparentes. Não são provas diretas,
dependem de outras que as complementem para produzirem efeitos no mundo jurídico.
Estabelecida estas definições, ressalto que, no entendimento adotado por este Relator (em
consonância com a Jurisprudência majoritária), a exemplo da prova testemunhal, o mero início
de prova material, isoladamente, não se presta à comprovação do trabalho rural para fins
previdenciários. Ambas se complementam, prova testemunhal e início de prova material, em
conjunto, podem definir o rumo da ação e firmar o convencimento do Julgador acerca da
veracidade dos fatos narrados na petição inicial. Separadas, no entanto, não se sustentam.
A corroborar:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. PENSÃO POR MORTE.
TRABALHADOR RURAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO.
DESNECESSIDADE. GENITORA FALECIDA. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL.
AUSÊNCIA DE PROVA TESTEMUNHAL. PEDIDO JULGADO PROCEDENTE.
CERCEAMENTO DE DEFESA DO INSS. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA.
SENTENÇA ANULADA. TUTELA ANTECIPADA.
1. Muito embora o art. 273, caput, do CPC, expressamente, disponha que os efeitos da tutela
pretendida na inicial poderão ser antecipados, a requerimento da parte, total ou parcialmente,
firmou-se nesta Primeira Turma a possibilidade de o órgão jurisdicional antecipá-la de ofício,
tendo em vista a natureza alimentar do benefício previdenciário e em razão da verossimilhança
do direito material alegado. Precedentes desta Corte.
2. A pensão por morte prevista no art. 74 da Lei 8.213/91, que é devida ao conjunto dos
dependentes de trabalhador rural, está subordinada à demonstração da condição de
dependente do segurado, nos termos do art. 16 da mencionada lei, e à comprovação da
atividade rural exercida pelo falecido, por meio de início de prova material corroborada por
prova testemunhal coerente e robusta.
3. A sentença julgou procedente o pedido inicial, sem a oitiva de testemunha, por considerar
suficiente a prova material juntada aos autos, dispensando a produção de prova testemunhal.
4. Não obstante tenha sido juntado aos autos início razoável de prova material do exercício de
atividade rural, verifica-se, contudo, que tais documentos não fazem prova direta sobre a
atividade profissional da genitora da parte autora, de forma a autorizar o deferimento da pensão
por morte de trabalhadora rural.
5. Na hipótese, o julgamento da lide, antes da oitiva das testemunhas, cerceia o direito do INSS,
uma vez que o pedido foi julgado procedente. É forçoso, assim, anular a sentença, para que
seja colhida a prova testemunhal e examinada a pretensão como de direito. Precedentes desta
Corte.
6. Embora seja necessária, para comprovação do direito ao recebimento do benefício
previdenciário pleiteado a demonstração simultânea de início razoável de prova material,
corroborada por prova testemunhal, verifica-se, pelas regras ordinárias de experiência, que a
existência nos autos de documentação registrando o labor rural, amplamente aceita pela
jurisprudência e contemporânea aos fatos a que se visa comprovar, confere verossimilhança ao
direito alegado na inicial, pelo que, impõe-se, nesses casos, a antecipação do provimento
jurisdicional, ainda que em caráter excepcional, determinando-se a implantação imediata do
benefício, até o julgamento final da presente ação, evitando-se, assim, maiores prejuízos à
parte autora, que não concorreu para a demora na solução do direito aqui vindicado.
7. Sentença anulada, em face da inaplicabilidade do provimento previsto no art. 515, § 3º, do
CPC.
8. Remessa oficial e apelação do INSS a que se dá parcial provimento.
9. Apelação da parte autora prejudicada.
10. Implantação imediata do benefício, no prazo máximo de 30 dias, com comunicação imediata
à autarquia previdenciária.
(TRF1, Primeira Turma, AC – Apelação Cível, Relator Desembargador Federal Néviton Guedes,
julgado em 11/12/2013, e-DJF1 de 14/03/2014 página 1285). (grifo nosso)
No caso concreto, com o intuito de comprovar o exercício de atividades rurais durante os
períodos controversos de 24.03.1973 a 15.04.1975, de 01.12.1975 a 29.10.1976 e de
03.11.1976 a 31.01.1993, a autora instruiu a petição inicial com os seguintes documentos: 1)
certidão de casamento, celebrado em 24.03.1973, na qual consta que seus pais eram
lavradores; 2) carteira profissional de trabalhador rural de seu esposo, Sr. Gonçalo dos Santos,
emitida em 07.11.1969, com registros de contrato de trabalho formal, na condição de
empregado, durante os períodos supracitados, inclusive com indicação de saque de FGTS,
anotações de férias e imposto sindical, alterações de salário e cadastro como participante do
PIS.
É certo que a Súmula nº 06, da TNU, é clara ao indicar que “A certidão de casamento ou outro
documento idôneo que evidencie a condição de trabalhador rural do cônjuge constitui início
razoável de prova material da atividade rurícola”. Também é evidente o teor da Súmula nº 14 ao
consignar que “Para a concessão de aposentadoria rural por idade, não se exige que o início de
prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício”.
A aplicação destas súmulas, todavia, não implica em considerar comprovada a atividade rural
de um cônjuge seja qual for o labor do outro. Com efeito, se comprovado o labor rural de um
dos cônjuges na condição de segurado especial, os documentos apresentados por um podem
aproveitar o outro, haja vista que nesta atividade prevalece o trabalho em regime de economia
familiar no qual o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao
desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua
dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes.
Ocorre que se há a comprovação de que um dos cônjuges não é segurado especial, os seus
documentos evidentemente não poderão comprovar que o outro cônjuge possui esta condição.
Se os documentos do marido comprovam a condição de empregado com registros em CTPS, e
não a condição de segurado especial, obviamente estes mesmos documentos não comprovam
que o trabalho em regime de economia familiar da esposa e, por conseguinte, a sua alegada
condição de segurada especial.
É exatamente o que se verifica no presente caso, onde a prova dos autos demonstra de
maneira irrefutável a condição de segurado empregado do marido da autora, de modo que,
ainda que trabalhador rural, não constituem início de prova material de que a autora também
laborava na lida campesina. O contrato formal de trabalho gera vínculo personalíssimo entre
empregador e empregado, e seus efeitos não se estendem aos familiares deste último.
Isso não quer dizer, em nenhum momento, que a parte autora não possa ter participado de
atividade rural em regime de economia familiar, nem que possa ter sido contratada como
diarista rural, por exemplo. Entretanto, impõe-se considerar que os documentos de seu marido,
isoladamente considerados, não são elementos aptos a servir como início de prova material,
sendo certo que a parte autora deveria ter apresentado algum outro elemento material neste
sentido, relacionado à sua própria atividade, já que seu cônjuge não se qualificava como
segurado especial.
Repito: se o marido não laborava em regime de economia familiar, mas sim na condição de
empregado, os seus documentos não constituem início de prova material de que a esposa
desempenhava atividades rurícolas na condição de segurada especial (em regime de
econômica familiar ou como diarista).
A verdade é que a autora não trouxe aos autos um único documento apto a demonstrar, ainda
que minimamente e de forma indiciária, que tenha efetivamente trabalhado no campo na
condição de segurada especial durante os períodos controversos (nos quais seu marido
mantinha a condição de segurado empregado, com registros formais de trabalho), e sendo a
apresentação de início de prova material imprescindível à comprovação de tempo de serviço,
nos termos da jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, torna-se
desnecessária uma incursão pormenorizada sobre a credibilidade ou não da prova testemunhal,
uma vez que esta, isoladamente, não se presta ao reconhecimento de labor em atividades
rurais.
A Constituição Federal e a legislação processual garantem ao Juiz a liberdade de firmar sua
convicção sem que esteja adstrito a parâmetros pré-determinados, podendo ele atribuir às
provas que lhe são apresentadas o valor que entender apropriado. No caso dos autos, entendo
ser o conjunto probatório demasiadamente frágil e deficiente para o pretenso reconhecimento
de labor rural da parte autora na condição de segurada especial, de modo que a sentença deve
ser reformada na parte em que reconheceu o labor rural nos períodos de 24.03.1973 a
15.04.1975, de 01.12.1975 a 29.10.1976 e de 03.11.1976 a 31.01.1993, haja vista que o
conjunto probatório não é indicativo de que a autora trabalhou em atividades rurícolas em
regime de economia familiar.
DO DIREITO À APOSENTADORIA POR IDADE:
Para a concessão de aposentadoria por idade, nos moldes da legislação previdenciária vigente
antes do advento da Emenda Constitucional nº 103/2019, é necessária, em apertada síntese, a
comprovação da idade mínima e do período de carência. A aferição do preenchimento destes
requisitos legais, no entanto, demanda interpretação conjugada dos artigos 25, inciso II, 48 e
142 da Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991, que em suas redações atuais assim dispõem:
“Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social
depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:
(...)
II – aposentadoria por idade, aposentadoria por tempo de serviço e aposentadoria especial: 180
contribuições mensais. (Redação dada pela Lei n.º 8.870, de 15 de abril de 1994)
(...)”
“Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida
nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) se
mulher. (Redação dada pela Lei n.º 9.032, de 28 de abril de 1995)
(...)”
“Art. 142. Para o segurado inscrito da Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem
como para o trabalhador e o empregado rural cobertos pela Previdência Social Rural, a
carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial obedecerá a seguinte
tabela, levando-se em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições
necessárias à obtenção do benefício:
Ano de implementação das condições
Meses de contribuições exigidos
1991
60 meses
1992
60 meses
1993
66 meses
1994
72 meses
1995
78 meses
1996
90 meses
1997
96 meses
1998
102 meses
1999
108 meses
2000
114 meses
2001
120 meses
2002
126 meses
2003
132 meses
2004
138 meses
2005
144 meses
2006
150 meses
2007
156 meses
2008
162 meses
2009
168 meses
2010
174 meses
2011
180 meses
(Artigo e tabela com redação dada pela Lei nº 9.032, de 28 de abril de 1995)”
No caso concreto, tratando-se de segurada do sexo feminino nascida em 11.01.1957, que,
portanto, completou o requisito etário (60 anos de idade) em 11.01.2017, para ter direito à
aposentadoria por idade deve comprovar 180 (cento e cinquenta e seis) meses de carência.
Período de carência, a teor do disposto no artigo 24 da Lei n.º 8.213/91, “é o número mínimo de
contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício,
consideradas a partir do transcurso do primeiro dia dos meses de suas competências”, e deve
ser aferido em função do ano em que o segurado completou a idade mínima necessária para
aposentar-se por idade.
Compulsando os autos, observo que o INSS, quando da análise do requerimento administrativo,
considerou para fins de carência apenas o período de 01.08.1995 a 28.02.1997, e tendo em
vista que também devem ser computados os períodos de 01.06.2000 a 14.02.2008 e de
18.09.2008 a 05.11.2009, nos quais comprova ter laborado como empregada doméstica,
constato que a autora conta com um total de 125 (cento e vinte e cinco) meses de carência, de
modo que não tem direito à aposentadoria por idade reclamada nesta ação, haja vista que não
preenche os requisitos legais.
Ante todo o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS para reformar em
parte a sentença e afastar o reconhecimento do alegado labor rural em regime de economia
familiar, na condição de segurada especial, nos períodos de 24.03.1973 a 15.04.1975, de
01.12.1975 a 29.10.1976 e de 03.11.1976 a 31.01.1993, que não devem ser computados para
fins previdenciários, bem como afastar a determinação de concessão de aposentadoria por
idade, haja vista que a autora não preenche os requisitos legais e, portanto, não tem direito ao
benefício.
Fica mantida a sentença apenas na parte em que reconheceu como tempo de serviço comum
os períodos de 01.06.2000 a 14.02.2008 e de 18.09.2008 a 05.11.2009, na condição de
empregada doméstica, de modo que a condenação imposta ao INSS nesta ação se limita a
proceder as respectivas averbações.
DOU POR PREJUDICADA A ANÁLISE DO RECURSO INOMINADO DA PARTE AUTORA.
REVOGO a tutela de urgência de natureza antecipatória concedida pelo Juízo de 1º Grau
quando da prolação da sentença. Oficie-se ao INSS para que proceda a imediata cessação do
benefício previdenciário concedido à parte autora por força da decisão antecipatória de tutela
ora revogada.
Sem condenação em custas e honorários, face o disposto no artigo 55, da Lei nº 9.099/1995.
É o voto.
E M E N T A
Dispensada a ementa por interpretação extensiva do artigo 46 da Lei nº 9.099/95, segunda
parte. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento ao recurso do réu e dar por prejudicada a análise
do recurso da parte autora., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante
do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
