Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0000995-48.2020.4.03.6319
Relator(a)
Juiz Federal MARCIO RACHED MILLANI
Órgão Julgador
8ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
17/08/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 27/08/2021
Ementa
E M E N T A
Dispensada a ementa por interpretação extensiva do artigo 46 da Lei nº 9.099/95, segunda parte.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
8ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000995-48.2020.4.03.6319
RELATOR:22º Juiz Federal da 8ª TR SP
RECORRENTE: CLAUDIA MARIA MENDES DE SOUZA
Advogado do(a) RECORRENTE: CARINA TEIXEIRA DE PAULA - SP318250-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo8ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000995-48.2020.4.03.6319
RELATOR:22º Juiz Federal da 8ª TR SP
RECORRENTE: CLAUDIA MARIA MENDES DE SOUZA
Advogado do(a) RECORRENTE: CARINA TEIXEIRA DE PAULA - SP318250-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recursos inominados interpostos pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL e por CLÁUDIA MARIA MENDES DE SOUZA contra a sentença, que julgou
parcialmente procedente o pedido formulado na petição inicial para condenar a autarquia
previdenciária a conceder auxílio por incapacidade temporária (auxílio-doença) à parte autora,
no período de 08.06.2020 (DIB – data de início do benefício) a 08.08.2020 (DCB – data de
cessação do benefício).
Em suas razões de recurso, o INSS impugna a fixação da DIB (data de início do benefício) em
08.06.2020 sob o argumento de que a segurada somente formalizou requerimento
administrativo em 14.07.2020 (DER – data de entrada do requerimento administrativo), de modo
que requer seja esse o termo inicial do benefício, a teor do que dispõe o artigo 60, § 1º, da Lei
nº 8.213/1991.
A parte autora, por sua vez, sustenta ter direito à concessão de aposentadoria por incapacidade
permanente (aposentadoria por invalidez) ou, alternativamente, à manutenção do auxílio por
incapacidade temporária (auxílio-doença) com encaminhamento para programa de reabilitação
profissional. Subsidiariamente, requer a intimação do perito médico judicial para responder
quesitos complementares.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo8ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000995-48.2020.4.03.6319
RELATOR:22º Juiz Federal da 8ª TR SP
RECORRENTE: CLAUDIA MARIA MENDES DE SOUZA
Advogado do(a) RECORRENTE: CARINA TEIXEIRA DE PAULA - SP318250-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Constituição Federal de 1988, no campo dos direitos sociais, definiu o conceito de seguridade
social em seu artigo 194: “A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de
iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à
saúde, à previdência e à assistência social”.
A expressão ‘Seguridade Social’, como está posta na Carta Magna, é o termo genérico utilizado
pelo legislador constituinte para designar o sistema de proteção que abrange os três programas
sociais de maior relevância: Saúde, Assistência Social e Previdência Social (espécies do
gênero ‘Seguridade Social’ e absolutamente distintos entre si).
Enquanto as Ações e Serviços de Saúde têm por objetivo principal levar assistência médica à
população, incluindo medidas de medicina preventiva, a Assistência Social tem por objetivo
essencial amparar os mais necessitados por meio de prestação de serviços, bem como pela
concessão de benefícios pecuniários àqueles (especialmente idosos e deficientes) que
comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção, e que não estejam cobertos
pela Previdência Social. Ambas têm em comum a inexigibilidade de um vínculo contributivo.
A Previdência Social, por sua vez, deve ser interpretada como uma forma de “seguro coletivo”,
de caráter contributivo e filiação obrigatória, que visa assegurar uma renda aos seus
participantes ou dependentes, pela concessão de benefícios previdenciários, quando, por
alguma razão previamente prevista em lei (velhice, doenças, morte, etc.), não mais tiverem
condições de prover seu sustento e o de sua família por meio do trabalho.
Assim, mesmo que custeados nos termos do artigo 195 da Constituição Federal, que consagrou
o princípio da Solidariedade, e apesar de seu inegável cunho social, os benefícios da
Previdência Social (que não se confunde com a Assistência Social, eis que se trata de espécie
diversa do gênero Seguridade Social) possuem caráter eminentemente securitário, não
devendo ser interpretados como benefícios assistencialistas.
Quanto aos benefícios previdenciários por incapacidade, os requisitos legais para sua
concessão são os seguintes: a) a qualidade de segurado da parte requerente, mediante prova
de sua filiação ao Regime Geral de Previdência Social - RGPS; b) o cumprimento da carência,
nos termos dos artigos 24 a 26 da Lei n.º 8.213/91; c) a comprovação de ser ou estar a parte
requerente incapacitada para o trabalho, desde que o evento incapacitante não seja
preexistente à filiação ao RGPS e seu termo inicial (data de início da incapacidade) seja fixado
em período cuja qualidade de segurado estivesse preservada e a carência legal devidamente
cumprida (salvo nos casos inseridos no disposto do artigo 26, inciso II, da Lei n.º 8.213/91).
Tratando-se de pedido de benefício previdenciário por incapacidade, deve o Julgador ater-se
exclusivamente ao preenchimento dos requisitos legais objetivos acima relatados, não
comportando à análise da matéria, salvo em casos excepcionalíssimos em que a prova dos
autos indicar a existência de incapacidade parcial, digressões relacionadas ao Princípio da
Dignidade da Pessoa Humana e às condições socioeconômicas da parte requerente.
Cabe destacar, ainda, que a constatação de uma lesão, doença ou deformidade, por si só, não
gera automaticamente o direito ao benefício previdenciário por incapacidade, na medida em que
devem ser avaliadas em conjunto com outros fatores, como sua evolução fisiopatológica e as
consequências que trarão para a capacidade laboral do acometido, levando-se sempre em
conta sua profissão habitual.
A incapacidade laborativa está diretamente ligada às limitações funcionais de uma pessoa
frente às habilidades exigidas para o desempenho das atividades profissionais para as quais
está qualificada. Somente quando a doença, lesão ou deformidade impede o desempenho
dessas atividades é que se configura a incapacidade para o trabalho e, consequentemente,
caso preenchidos os demais requisitos legais (carência e qualidade de segurado da Previdência
Social), o direito ao benefício previdenciário por incapacidade. Doença não é sinônimo de
incapacidade.
No caso concreto, a prova pericial médica, elaborada em 09.11.2020 por profissional
qualificado, de confiança do Juízo e equidistante das partes, diagnosticou que a autora
apresenta quadro de bursite trocantérica direita e tendinite fibular direita (em tratamento com
infiltrações), submetida a tratamento cirúrgico de meniscectomia e toalete artroscópico do joelho
direito, cujo tempo estimado de recuperação é de aproximadamente 60 (sessenta) dias,
concluindo de maneira calara e fundamentada pela caracterização de incapacidade parcial e
temporária para o trabalho em decorrência de dores, redução da força do membro afetado e
limitação para mobilidade ativa. DII (data do início da incapacidade) em 08.06.2020, data da
artroscopia em joelho direito.
Asseverou o médico perito o carácter meramente parcial e temporário do quadro incapacitante,
com aptidão imediata para desempenhar atividades profissionais leves, que permitem
alternância de posição entre ficar em pé e sentar-se, e possibilidades de plena recuperação
futura mediante tratamento fisioterápico e medicamentoso. Em reposta ao quesito de número
12 do Juízo, afirmou não ser possível estimar o tempo necessário para a recuperação e retorno
para as atividades habituais, sob a justificativa de que isso depende da regularidade do
tratamento fisioterápico, entre outros fatores.
Não há razões para afastar as conclusões da perícia médica judicial, eis que fundadas no
exame clínico realizado na parte autora, bem como nos documentos médicos apresentados.
Considero desnecessária e inoportuna a reabertura da instrução processual, seja para a
realização de nova perícia médica, apresentação de relatório de esclarecimentos adicionais,
oitiva do médico perito, oitiva pessoal da parte autora ou de testemunhas, juntada de novos
documentos, etc., eis que não verifico contradições entre as informações constantes do laudo
aptas a ensejar dúvida, o que afasta qualquer alegação de nulidade e/ou cerceamento de
defesa.
Considerando a condição do magistrado de destinatário da prova (artigo 370, CPC/2015), é
importante frisar que “só ao juiz cabe avaliar a necessidade de nova perícia”(JTJ 142/220,
197/90, 238/222). De tal forma, compete apenas ao juiz apreciar a conveniência de realização
de nova avaliação, bem como o acolhimento de quesitos complementares (artigo 470, I e II c/c
artigo 480, CPC/2015), sendo certo que “o julgamento antecipado da lide tem total amparo
legal, decorrente da aplicação do CPC 330, I, não se configurando afronta aos CPC 425 e 331”.
(STJ, 6ª Turma, AI 45.539/MG, Relator Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, julgado em
16/12/1993, decisão monocrática, DJ de 08/02/1994, grifos nossos).
O nível de especialização apresentado pelo perito médico judicial é indubitavelmente suficiente
para promover a análise do quadro clínico apresentado nos autos. Não há necessidade de que
seja especialista em cada uma das patologias mencionadas na petição inicial. Conforme
entendimento consolidado na TNU – Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos
Juizados Especiais Federais, a realização de perícia por médico especialista só se faz
necessária em casos excepcionalíssimos e de elevada complexidade, como, por exemplo,
aqueles que envolvem doenças raras, o que não se verifica na hipótese em apreço.
A corroborar:
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL PREVIDENCIÁRIO.
PROVA PERICIAL. CONHECIMENTO TÉCNICO ESPECIALIZADO. POSSIBILIDADE DE
PERÍCIA SER REALIZADA POR MÉDICO GENERALISTA OU ESPECIALISTA EM MEDICINA
DO TRABALHO. REEXAME DE MATÉRIA DE FATO. INCIDENTE NÃO CONHECIDO. 1. A
Turma Nacional de Uniformização, ao interpretar o art. 145, §2º, do Código de Processo Civil de
1973 (art. 156, §1º, do Novo Código de Processo Civil), consolidou entendimento de que a
realização de perícia por médico especialista é apenas necessária em casos complexos, em
que o quadro clínico a ser analisado e os quesitos a serem respondidos exijam conhecimento
técnico específico, não suprido pela formação do médico generalista (cf.PEDILEF
200872510048413,Rel. Juiz Federal Derivaldo de Figueiredo Bezerra Filho, DJ
09/08/2010;PEDILEF200872510018627, Rel. Juíza Federal Jacqueline Michels Bilhalva, DJ
05/11/2010;PEDILEF200970530030463, Rel. Juiz Federal Alcides Saldanha Lima, DOU
27/04/2012;PEDILEF200972500044683, Rel. Juiz Federal Antonio Fernando Schenkel do
Amaral e Silva, DOU 04/05/2012;PEDILEF200972500071996, Rel. Juiz Federal Vladimir Santos
Vitovsky, DOU 01/06/2012;PEDILEF201151670044278, Rel Juiz Federal José Henrique
Guaracy Rebelo, DOU 09/10/2015). 2. Inexiste divergência em relação à jurisprudência da
Turma Nacional de Uniformização ou ao acórdão indicado como paradigma, uma vez que a
questão técnico-científica controversa não exige conhecimento especializado do médico perito
para ser esclarecida. 3. Hipótese de incidência da orientação do enunciado n. 42, da súmula da
jurisprudência da TNU, uma vez que o acórdão prolatado, em julgamento de recurso inominado,
aplicou o princípio do livre convencimento do magistrado diante das provas apresentadas e
concluiu pela inexistência de incapacidade laborativa da parte autora.
(TNU – Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais;
PEDILEF – Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei – 50042937920154047201;
Relator Juiz Federal Fábio César dos Santos Oliveira; Data do julgamento: 30.08.2017) (grifei)
Nesse sentido, vale mencionar trecho do parecer do Conselho Regional de Medicina do Estado
de São Paulo – CREMESP na resposta à consulta n.º 51.337/06, em que se indagava se
qualquer médico está apto a realizar perícias médicas: “1) Qualquer médico está apto a praticar
qualquer ato médico e, por isso, qualquer profissional médico pode realizar qualquer perícia
médica de qualquer especialidade médica. Não há divisão de perícia em esta ou aquela
especialidade. Vale lembrar que a responsabilidade médica é intransferível, cabendo ao
profissional que realiza a perícia assumir esta responsabilidade”.
http://www.cremesp.org.br/?siteAcao=Pareceres&dif=s&ficha=1&id=8600&tipo=PARECER&org
ao=ConselhoRegionaldeMedicinadoEstadodeSaoPaulo&numero=51337&situacao=&data=01-
04-2009
A parte autora insurge-se contra as conclusões da perícia médica, porém não apresentou
elementos concretos que pudessem confrontá-las. Os documentos médicos juntados aos autos
foram devidamente avaliados pelo perito do Juízo para a elaboração de seu parecer, de modo
que não infirmam suas conclusões, ao contrário, fornecem subsídios para um diagnóstico ainda
mais preciso, seguro e conclusivo de sua parte.
Considero absolutamente inoportuna e desarrozoada a realização de nova perícia médica ou
mesmo a intimação do perito médico judicial para responder quesitos complementares. A prova
pericial médica produzida nestes autos é firme e minuciosa, observou o contraditório,
possibilitou às partes o amplo exercício do direito de defesa, enfim, atendeu todos os preceitos
processuais e constitucionais. Não há qualquer ilegalidade maculando o trabalho do perito
medico judicial, profissional sério, experiente e sem qualquer interesse no processo.
Pois bem.
Diante da análise do conjunto probatório, considero que a sentença determinou a concessão do
benefício previdenciário por incapacidade que melhor se amolda ao caso em análise, o auxílio-
doença. Não se justifica o inconformismo da parte autora. A aposentadoria por invalidez é o
benefício previdenciário concedido àquelas pessoas cuja gravidade do quadro clínico,
conjugada com as condições socioculturais, resulta na incapacidade total e irreversível para o
trabalho. Por irreversível entende-se aquela incapacidade definitiva, quando inexiste
possibilidade de recuperação. Definitivamente, não é o quadro que se verifica nos autos.
A aposentadoria por invalidez é benefício previdenciário que deve ser implantado com muita
cautela, somente quando esgotadas todas as possibilidades de recuperação ou reabilitação do
segurado, de modo que considero sua concessão absolutamente prematura nesse momento.
A autora é pessoa de meia idade, possui experiência profissional, é portadora de patologia
tratável e com prognóstico de total recuperação para o desempenho das mesmas atividades
que habitualmente desempenhou em sua vida profissional, sendo plenamente possível, e até
desejável, o seu retorno ao mercado de trabalho sem necessidade de procedimento de
reabilitação profissional que, nos termos do artigo 62 da Lei nº 8.213/1991, somente é
destinado àqueles segurados insuscetíveis de recuperação para a sua atividade habitual, o que
não é o caso da autora.
De outra sorte, se de um lado a sentença não merece reparos quanto à modalidade de
benefício concedido à parte autora (auxílio-doença), de outro entendo que não agiu com acerto
quando fixou a DCB (data de cessação do benefício) em 08.08.2020.
É verdade que o perito médico judicial fixou a DII (data do início da incapacidade) em
08.06.2020, data da artroscopia em joelho direito, e esclareceu que costumeiramente a
recuperação ocorre em aproximadamente 60 (sessenta) dias. No entanto, ressalto que o exame
pericial foi realizado em 09.11.2020, sendo constatado quadro incapacitante naquela ocasião,
tendo afirmado o auxiliar do Juízo, em reposta ao quesito de número 12, não ser possível
estimar o tempo necessário para a recuperação.
A prova dos autos é indicativa, portanto, de que a autora não estava apta para o desempenho
de suas atividades profissionais habituais em 08.08.2020, de modo que o benefício deve ser
estendido além da DCB (data de cessação do benefício) fixada na sentença. Isso não significa,
no entanto, que o provimento judicial deva estabelecer a manutenção do auxílio-doença por
tempo indeterminado.
Diante do caráter eminentemente transitório do auxílio-doença, é absolutamente lícito que o
julgador, amparado no laudo médico judicial, estabeleça previamente a DCB (data de cessação
do benefício), sem que isso signifique que o benefício deverá necessariamente ser cessado na
data preestabelecida, que poderá ser estendida até a efetiva reavaliação médico-pericial a
cargo do INSS caso o segurado requeira formalmente a sua prorrogação. Este procedimento
(prévia fixação da DCB) está em conformidade com as alterações legislativas promovidas pela
Lei nº 13.457/2017 que incluiu os parágrafos 8º, 9º, 10 e 11 no artigo 60 da Lei nº 8.213/91.
O § 8º do artigo 60 da Lei nº 8.213/1991, incluído pela Lei nº 13.457/2017, estabelece que
“sempre que possível, o ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença, judicial ou
administrativo, deverá fixar o prazo estimado para a duração do benefício”. Não verifico
inconstitucionalidade nessas inovações, haja vista que o artigo 201 da Constituição Federal
apenas estabelece que a Previdência Social atenderá a cobertura dos eventos de doença e
invalidez, delegando à lei ordinária, no entanto, os critérios de concessão, manutenção,
reavaliação e cessação dos benefícios.
Nesse sentido já decidiu a TNU – Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos
Juizados Especiais Federais, no julgamento do PEDILEF n.º 0500774-49.2016.4.05.8305,
realizado em 19.04.2018 (acórdão publicado em 23/04/2018, sob a sistemática dos recursos
repetitivos (Tema 164), assim estabelecendo: “Por não vislumbrar ilegalidade na fixação de data
estimada para a cessação do auxílio-doença, ou mesmo na convocação do segurado para nova
avaliação da persistência das condições que levaram à concessão do benefício na via judicial, a
Turma Nacional de Uniformização, por unanimidade, firmou as seguintes teses: a) os benefícios
de auxílio-doença concedidos judicial ou administrativamente, sem Data de Cessação de
Benefício (DCB), ainda que anteriormente à edição da MP nº 739/2016, podem ser objeto de
revisão administrativa, na forma e prazos previstos em lei e demais normas que regulamentam
a matéria, por meio de prévia convocação dos segurados pelo INSS, para avaliar se persistem
os motivos da concessão do benefício; b) os benefícios concedidos, reativados ou prorrogados
posteriormente à publicação da MP nº 767/2017, convertida na Lei nº 13.457/17, devem, nos
termos da lei, ter sua DCB fixada, sendo desnecessária, nesses casos, a realização de nova
perícia para a cessação do benefício; c) em qualquer caso, o segurado poderá pedir a
prorrogação do benefício, com garantia de pagamento até a realização da perícia médica.”
(grifei)
Cumpre-me destacar, por oportuno, que as inovações legislativas trazidas pela Lei n.º
13.457/2017, embora disponham acerca da necessidade de prévia fixação do termo final do
auxílio-doença e autorizem a cessação do auxílio-doença sem a necessidade de realização de
nova perícia médica, não impõem necessariamente a cessação do benefício na data
preestabelecida, ressalvando a possibilidade do segurado requerer administrativamente sua
prorrogação antes da DCB (data de cessação do benefício) caso entenda que ainda está
incapacitado para o trabalho, hipótese em que, ai sim, deverá ser mantido até que o INSS
proceda a reavaliação médico-pericial.
No caso em análise, onde o perito médico judicial afirmou não ser possível estimar o tempo
necessário para a recuperação e retorno para as atividades habituais, incide a norma do § 9º do
supracitado artigo 60, segundo a qual “na ausência de fixação do prazo de que trata o § 8º
deste artigo, o benefício cessará após o prazo de cento e vinte dias, contado da data de
concessão ou de reativação do auxílio-doença, exceto se o segurado requerer a sua
prorrogação perante o INSS, na forma do regulamento, observado o disposto no art. 62 desta
Lei”. (grifei)
Conforme se extrai do dispositivo legal acima transcrito, tendo o perito médico judicial afirmado
não ser possível estimar o tempo necessário para a recuperação, o auxílio-doença deveria ser
concedido à autora pelo prazo de 120 (cento e vinte) dias. Todavia, tendo em vista que a norma
do supracitado § 9º prevê a possibilidade de manutenção do benefício por mais tempo caso o
segurado requeira a sua prorrogação, e considerando que o prazo de 120 (cento e vinte) dias já
foi ultrapassado no curso da ação, para não causar prejuízos à segurada determino o
restabelecimento do auxílio-doença desde 08.08.2020 e sua manutenção até 30 (trinta) dias
contados da data em que a parte autora for intimada do teor desta decisão, devendo ser
automaticamente cessado após o decurso desse prazo, exceto na hipótese de pedido formal de
prorrogação diretamente ao INSS em até 15 (quinze) dias antes da DCB ora estabelecida,
hipótese em que deverá ser mantido até a reavaliação médica-pericial administrativa.
Por fim, entendo que assiste razão ao INSS quando sustenta que a DIB (data de início do
benefício) deve ser fixada na em 14.07.2020 (DER – data de entrada do requerimento
administrativo), e não em 08.06.2020 (DII – data de início da incapacidade) como constou na
sentença.
Isso porque, a teor do disposto no § 1º do artigo 60 da Lei nº 8.213/1991, o auxílio-doença é
devido desde a data do requerimento administrativo quando requerido por segurado afastado
da atividade por mais de 30 (trinta) dias. Considerando que na DER a autora já estava
incapacitada por período superior a 30 (trinta) dias, não há amparo legal para que o benefício
lhe seja concedido desde a DII.
E a jurisprudência da TNU – Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados
Especiais Federais é pacífica no sentido de que o termo inicial de benefício previdenciário por
incapacidade deverá ser fixado na DER (data de entrada do requerimento administrativo)
quando da prova dos autos for possível constatar a existência de incapacidade em momento
anterior, como no presente caso.
Vejamos:
PEDILEF 200540007086316 - PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI
FEDERAL - 04/06/2014
1. Esta TNU já firmou entendimento no sentido de que “o termo inicial dos benefícios, seja por
incapacidade, seja no de prestação continuada deve ser assim fixado: a) na data de elaboração
do laudo pericial, se o médico não precisar o início da incapacidade e o juiz não possuir outros
elementos nos autos para sua fixação (Precedente: PEDILEF n.º 200936007023962); b) na
data dorequerimento administrativo,se a perícia constatar a existência da incapacidade em
momento anterior a este pedido (Precedente: PEDILEF n.º 00558337620074013400); e c) na
data do ajuizamento do feito, se não houver requerimento administrativoe a perícia constatar o
início da incapacidade em momento anterior à propositura da ação (Precedente: PEDILEF n.º
00132832120064013200). Em todos os casos, se privilegia o princípio do livre convencimento
motivado que permite ao magistrado a fixação da data de início do benefício mediante a análise
do conjunto probatório (Precedente: PEDILEF n.º 05017231720094058500)” (Cf. PEDILEF n.º
0501152-47.2007.4.05.8102, Rel. Juiz Federal Paulo Ricardo Arena Filho, j. 25 mai. 2012)
(grifei)
Ante todo o exposto, DOU PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS para fixar a DIB (data de
início do benefício) do auxílio-doença concedido nesta ação em 14.07.2020 (DER – data de
entrada do requerimento administrativo), e DOU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DA
PARTE AUTORA para determinar o restabelecimento do auxílio-doença desde 08.08.2020 e
sua manutenção até 30 (trinta) dias contados da data em que a parte autora for intimada do teor
desta decisão, devendo ser automaticamente cessado após o decurso desse prazo, exceto na
hipótese de pedido formal de prorrogação diretamente ao INSS em até 15 (quinze) dias antes
da DCB ora estabelecida, hipótese em que deverá ser mantido até a reavaliação médica-
pericial administrativa.
Na hipótese do benefício já ter sido cessado administrativamente em decorrência de
reavaliação médico-pericial posterior à data da perícia médica judicial que tenha constato a
recuperação da capacidade para o trabalho, o INSS está desobrigado de reativá-lo.
Sem condenação em honorários, face o disposto no artigo 55 da Lei nº 9.099/1995.
É o voto.
E M E N T A
Dispensada a ementa por interpretação extensiva do artigo 46 da Lei nº 9.099/95, segunda
parte. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento ao recurso do réu e dar parcial provimento ao recurso da
parte autora., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
