Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0001156-07.2020.4.03.6336
Relator(a)
Juiz Federal MARCIO RACHED MILLANI
Órgão Julgador
8ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
17/09/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 28/09/2021
Ementa
E M E N T A
Dispensada a ementa por interpretação extensiva do artigo 46 da Lei nº 9.099/95, segunda parte.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
8ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001156-07.2020.4.03.6336
RELATOR:22º Juiz Federal da 8ª TR SP
RECORRENTE: EDNEIA DO CARMO DA SILVA MOMESSO
Advogado do(a) RECORRENTE: PAULO CESAR PAGAMISSI DE SOUZA - SP144663-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001156-07.2020.4.03.6336
RELATOR:22º Juiz Federal da 8ª TR SP
RECORRENTE: EDNEIA DO CARMO DA SILVA MOMESSO
Advogado do(a) RECORRENTE: PAULO CESAR PAGAMISSI DE SOUZA - SP144663-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso inominado interposto por EDNEIA DO CARMO DA SILVA MOMESSO
contra a sentença, que julgou improcedente o pedido de concessão de benefício por
incapacidade sob o fundamento de que não detinha a qualidade de segurado do Regime Geral
de Previdência Social na DII (data de início da incapacidade).
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001156-07.2020.4.03.6336
RELATOR:22º Juiz Federal da 8ª TR SP
RECORRENTE: EDNEIA DO CARMO DA SILVA MOMESSO
Advogado do(a) RECORRENTE: PAULO CESAR PAGAMISSI DE SOUZA - SP144663-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A ação foi julgada, em primeiro grau de jurisdição, nos seguintes termos:
“(...)
No caso dos autos, Edneia do Carmo da Silva Momesso busca a concessão de auxílio por
incapacidade temporária ou aposentadoria por incapacidade permanente. Fez requerimento
administrativo em 20/02/2020 (fl. 10 – evento 2).
Realizada a perícia médica, o laudo constatou a existência de incapacidade permanente para
atividades pesadas, com DII em 2015.
No entanto, à luz do extrato do CNIS, a última contribuição da requerente foi feita em outubro
de 2008. Só retomou os pagamentos como contribuinte individual em outubro de 2019, quando
já estava incapaz para o labor.
Destaque-se a autora não impugnou o laudo pericial.
Evidenciada a incapacidade preexistente, o pedido não pode ser acolhido.
3. DISPOSITIVO.
Ante o exposto, julgo improcedentes os pedidos e extingo o feito com resolução de mérito, nos
termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil.
(...)”.
A sentença não merece reparos.
Os requisitos legais para a concessão de benefício previdenciário por incapacidade são: a) a
qualidade de segurado da parte requerente, mediante prova de sua filiação ao Regime Geral de
Previdência Social - RGPS; b) o cumprimento da carência, nos termos dos artigos 24 a 26 da
Lei n.º 8.213/91; c) a comprovação de ser ou estar a parte requerente incapacitada para o
trabalho, desde que o evento incapacitante não seja preexistente à filiação ao RGPS e seu
termo inicial (data de início da incapacidade) seja fixado em período cuja qualidade de segurado
estivesse preservada e a carência legal devidamente cumprida (salvo nos casos inseridos no
disposto do artigo 26, inciso II, da Lei n.º 8.213/91).
A qualidade de segurado tem como fato gerador a filiação ao Regime Geral de Previdência
Social – RGPS mediante o exercício de atividade formal remunerada na condição de
empregado ou, ainda, com o recolhimento mensal das contribuições previdenciárias, nos casos
dos contribuintes individuais, facultativos e empresários.
Em princípio, esta condição se mantém com a vigência de contrato formal de trabalho e/ou o
recolhimento mensal de contribuições previdenciárias, porém, o artigo 15 da Lei nº 8.213/91
estabelece um interstício, denominado “período de graça”, em que a qualidade de segurado da
Previdência Social daqueles que deixaram de contribuir monetariamente para o sistema é
provisoriamente preservada.
Vejamos:
Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I – sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II – até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem
remuneração;
III – até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de
segregação compulsória;
IV – até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V – até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às forças Armadas para
prestar serviço militar;
VI – até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já
tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a
perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para ao segurado
desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do
Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a
Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao término do prazo fixado no
Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês
imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.
(grifo nosso)
No caso concreto, a prova pericial médica, elaborada por profissional qualificado, de confiança
do Juízo e equidistante das partes, diagnosticou que a parte autora é portadora de insuficiência
renal crônica e hipertensão arterial, concluindo de maneira clara e amplamente fundamentada
pela existência de incapacidade total e temporária para o trabalho, com DII (data de início da
incapacidade) em dezembro/2015.
Não há razões para afastar as conclusões do médico perito, eis que fundadas no exame clínico
realizado na parte autora, bem como nos documentos médicos que lhe foram apresentados.
Considero desnecessária e inoportuna a reabertura da instrução processual, seja para a
realização de nova perícia médica, apresentação de relatório de esclarecimentos adicionais,
oitiva do médico perito, oitiva pessoal da parte autora ou de testemunhas, juntada de novos
documentos, etc., eis que não verifico contradições entre as informações constantes do laudo
aptas a ensejar dúvida, o que afasta qualquer alegação de nulidade e/ou cerceamento de
defesa.
Considerando a condição do magistrado de destinatário da prova (artigo 370, CPC/2015), é
importante frisar que “só ao juiz cabe avaliar a necessidade de nova perícia”(JTJ 142/220,
197/90, 238/222). De tal forma, compete apenas ao juiz apreciar a conveniência de realização
de nova avaliação, bem como o acolhimento de quesitos complementares (artigo 470, I e II c/c
artigo 480, CPC/2015), sendo certo que “o julgamento antecipado da lide tem total amparo
legal, decorrente da aplicação do CPC 330, I, não se configurando afronta aos CPC 425 e 331”.
(STJ, 6ª Turma, AI 45.539/MG, Relator Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, julgado em
16/12/1993, decisão monocrática, DJ de 08/02/1994, grifos nossos).
O nível de especialização apresentado pelo médico perito é indubitavelmente suficiente para
promover a análise do quadro clínico apresentado nos autos. Não há necessidade de que seja
especialista em cada uma das patologias mencionadas pela parte autora. Conforme
entendimento consolidado na TNU – Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos
Juizados Especiais Federais, a realização de perícia por médico especialista só se faz
necessária em casos excepcionalíssimos e de elevada complexidade, como, por exemplo,
aqueles que envolvem doenças raras, o que não se verifica na hipótese em apreço.
A corroborar:
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL PREVIDENCIÁRIO.
PROVA PERICIAL. CONHECIMENTO TÉCNICO ESPECIALIZADO. POSSIBILIDADE DE
PERÍCIA SER REALIZADA POR MÉDICO GENERALISTA OU ESPECIALISTA EM MEDICINA
DO TRABALHO. REEXAME DE MATÉRIA DE FATO. INCIDENTE NÃO CONHECIDO. 1. A
Turma Nacional de Uniformização, ao interpretar o art. 145, §2º, do Código de Processo Civil de
1973 (art. 156, §1º, do Novo Código de Processo Civil), consolidou entendimento de que a
realização de perícia por médico especialista é apenas necessária em casos complexos, em
que o quadro clínico a ser analisado e os quesitos a serem respondidos exijam conhecimento
técnico específico, não suprido pela formação do médico generalista (cf.PEDILEF
200872510048413,Rel. Juiz Federal Derivaldo de Figueiredo Bezerra Filho, DJ
09/08/2010;PEDILEF200872510018627, Rel. Juíza Federal Jacqueline Michels Bilhalva, DJ
05/11/2010;PEDILEF200970530030463, Rel. Juiz Federal Alcides Saldanha Lima, DOU
27/04/2012;PEDILEF200972500044683, Rel. Juiz Federal Antonio Fernando Schenkel do
Amaral e Silva, DOU 04/05/2012;PEDILEF200972500071996, Rel. Juiz Federal Vladimir Santos
Vitovsky, DOU 01/06/2012;PEDILEF201151670044278, Rel Juiz Federal José Henrique
Guaracy Rebelo, DOU 09/10/2015). 2. Inexiste divergência em relação à jurisprudência da
Turma Nacional de Uniformização ou ao acórdão indicado como paradigma, uma vez que a
questão técnico-científica controversa não exige conhecimento especializado do médico perito
para ser esclarecida. 3. Hipótese de incidência da orientação do enunciado n. 42, da súmula da
jurisprudência da TNU, uma vez que o acórdão prolatado, em julgamento de recurso inominado,
aplicou o princípio do livre convencimento do magistrado diante das provas apresentadas e
concluiu pela inexistência de incapacidade laborativa da parte autora.
(TNU – Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais;
PEDILEF – Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei – 50042937920154047201;
Relator Juiz Federal Fábio César dos Santos Oliveira; Data do julgamento: 30.08.2017) (grifei)
Nesse sentido, vale mencionar trecho do parecer do Conselho Regional de Medicina do Estado
de São Paulo – CREMESP na resposta à consulta nº 51.337/06, em que se indagava se
qualquer médico está apto a realizar perícias médicas: “1) Qualquer médico está apto a praticar
qualquer ato médico e, por isso, qualquer profissional médico pode realizar qualquer perícia
médica de qualquer especialidade médica. Não há divisão de perícia em esta ou aquela
especialidade. Vale lembrar que a responsabilidade médica é intransferível, cabendo ao
profissional que realiza a perícia assumir esta responsabilidade.”
http://www.cremesp.org.br/?siteAcao=Pareceres&dif=s&ficha=1&id=8600&tipo=PARECER&org
ao=ConselhoRegionaldeMedicinadoEstadodeSaoPaulo&numero=51337&situacao=&data=01-
04-2009
Pois bem.
A constatação de quadro incapacitante não é suficiente para a concessão do benefício
previdenciário requerido nesta ação, é necessário também que na DII (data de início da
incapacidade) – no caso, em dezembro/2015 – a parte autora mantivesse a qualidade de
segurado do Regime Geral de Previdência Social.
O conjunto probatório, com especial destaque ao extrato do CNIS – Cadastro Nacional de
Informações Sociais (arquivo nº. 12), demostra que a autora verteu contribuições ao Regime
Geral de Previdência Social até 31.10.2008, permanecendo, após essa data, dez anos sem
verter uma única contribuição ao sistema público de previdência.
Retornou ao regime apenas em 01.10.2019, na condição de segurada facultativa/contribuinte
individual, e já requereu prestação por incapacidade em 20.02.2020. Trata-se, irrefutavelmente,
de incapacidade preexistente à filiação no Regime Geral de Previdência Social, cabendo
ressaltar que a própria autora relatou na perícia que não exerce atividade laborativa desde
dezembro/2015.
Extrai-se da Lei nº 8.213/91, conforme disposto em seus artigos 42, § 2º e 59, parágrafo único,
que não será devido aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença ao segurado que se filiar ao
Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa
para o benefício, ressalvada a hipótese em que a incapacidade sobrevier por motivo de
progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.
A progressão ou agravamento de uma doença, no entanto, são fatos que requerem
demonstração material da sua ocorrência, não dispensam a produção probatória e não
permitem o seu acolhimento a partir de meras presunções. No caso, a perícia médica afastou
de maneira contundente a hipótese de agravamento após o reingresso ao Regime Geral de
Previdência Social.
“Não há relação de seguro social sem filiação prévia. Se no campo da relação de custeio a
obrigação de pagar contribuição social não se vinculava ao fato de ser, ou não, segurado do
regime de previdência, no âmbito da relação de prestação a regra se inverte. O direito do
indivíduo à proteção previdenciária só se perfaz quando este se encontra, compulsória ou
facultativamente, filiado a um regime de Previdência Social.” (Pereira de Castro, Carlos Alberto
e Lazzari, João Batista; Manual de Direito Previdenciário; Editora Forense; 16ª Edição; 2014;
página 143) (grifo nosso)
O sistema previdenciário pressupõe mutualidade, com o recolhimento de contribuições pelo
tempo mínimo da carência exigida para cada benefício, previamente aos riscos sociais dos
quais o seguro social protege seus segurados. Se, entretanto, fosse admitido o pagamento de
contribuições posteriores à contingência social contra qual visa a lei assegurar o trabalhador,
como uma doença incapacitante, não haveria mais Previdência, porque o trabalhador passaria
a verter contribuições apenas se, e quando, necessitasse do benefício, “fraudando” a
concepção securitária do sistema.
É exatamente o que se verifica no caso concreto, no qual é evidente que a autora reingressou
ao RGPS sabedora de que já estava acometida de patologias incapacitantes, em verdadeira
tentativa de burlar o caráter mutualista do sistema previdenciário, com o claro propósito de obter
indevidamente benefício previdenciário contra o qual não estava segurada.
Não é possível conceder benefício previdenciário a quem só contribui quando lhe é
conveniente, deixando de exercer o dever de solidariedade social no custeio do RGPS. Atitudes
dessa natureza, que infelizmente se repetem com frequência, estão entre as principais causas
do tão propagado déficit da Previdência Social. O Poder Judiciário não pode compactuar com
isso.
A Constituição Federal e a legislação processual garantem ao Juiz a liberdade de firmar sua
convicção sem que esteja adstrito a parâmetros pré-determinados, podendo ele atribuir às
provas que lhe são apresentadas o valor que entender apropriado. No caso, tenho que a
incapacidade da parte autora é preexistente à sua filiação ao Regime Geral de Previdência
Social, razão pela qual não tem direito à concessão de benefício previdenciário por
incapacidade (auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez).
Ante todo o exposto, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO DA PARTE AUTORA e mantenho
integralmente a sentença recorrida.
Condeno a parte autora, na condição de recorrente vencido, ao pagamento de honorários
advocatícios no percentual de 10% do valor atualizado da causa, nos termos do artigo 55,
“caput”, segunda parte, da Lei nº 9.099/1995, combinado com o artigo 1º da Lei 10.259/2001.
No entanto, na hipótese de ser beneficiário(a) da justiça gratuita, as obrigações decorrentes de
sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser
executadas se, nos 5 (cinco) anos subsequentes ao trânsito em julgado, o credor demonstrar
que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de
gratuidade, a teor do disposto no artigo 98, § 3º do Código de Processo Civil de 2015.
É o voto.
E M E N T A
Dispensada a ementa por interpretação extensiva do artigo 46 da Lei nº 9.099/95, segunda
parte. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso da parte autora, nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
