Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0003900-03.2019.4.03.6338
Relator(a)
Juiz Federal ISADORA SEGALLA AFANASIEFF
Órgão Julgador
13ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
18/10/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 25/10/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIARIO. Benefício por incapacidade. Sentença de improcedência. Recurso da parte
autora. Laudo pericial que não identifica incapacidade laboral. Ausência de documentos que
infirmem a conclusão pericial. Negado provimento ao recurso.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
13ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0003900-03.2019.4.03.6338
RELATOR:37º Juiz Federal da 13ª TR SP
RECORRENTE: SEVERINA SIMAO DA SILVA
Advogado do(a) RECORRENTE: LEACI DE OLIVEIRA SILVA - SP231450-A
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0003900-03.2019.4.03.6338
RELATOR:37º Juiz Federal da 13ª TR SP
RECORRENTE: SEVERINA SIMAO DA SILVA
Advogado do(a) RECORRENTE: LEACI DE OLIVEIRA SILVA - SP231450-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso interposto pela parte autora em face de sentença que julgou improcedente
o pedido formulado na inicial, negando a concessão de benefício por ausência de incapacidade.
Alega a parte recorrente que “é portadora de doença grave, crônica e incurável. Possui baixo
nível de escolaridade e sempre desenvolveu atividades que demandam a plenas condições
físicas e psíquicas, exatamente o que a Apelante é impedida de realizar face às moléstias que
lhe acometem. Nota-se que o Instituto-Apelado sequer deu a oportunidade a Apelante a
readaptar-se a nova atividade laborativa, para que a mesma possa prover o seu próprio
sustento e de sua família”. Requer a reforma da sentença.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0003900-03.2019.4.03.6338
RELATOR:37º Juiz Federal da 13ª TR SP
RECORRENTE: SEVERINA SIMAO DA SILVA
Advogado do(a) RECORRENTE: LEACI DE OLIVEIRA SILVA - SP231450-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
No caso em tela, o quadro clínico da parte autora foi analisado por perito judicial que negou a
incapacidade para o trabalho habitual.
A mera discordância com o laudo pericial não justifica sua rejeição ou a dilação da instrução
probatória. Todas as queixas da parte autora foram levadas ao conhecimento dos peritos, que
rechaçaram a incapacidade de qualquer natureza.
Observo que as queixas da parte autora foram analisadas a fundo pelo expert. Divergências
entre o laudo pericial e os atestados apresentados pela parte autora não elidem os resultados
das perícias, realizadas por peritos equidistantes e de confiança deste juízo. Por isso, não há
razão para que o resultado da prova pericial seja rechaçado.
A parte autora foi submetida à perícia médica, na especialidade de psiquiatria, cuja conclusão
pela ausência de incapacidade é clara (evento 30):
(...)
3. História:
Trata-se de pericianda de 53 anos de idade, que vem para perícia acompanhada do esposo,
que não acompanha a entrevista. Refere histórico de crise convulsiva iniciado ainda na infância,
afirmando atualmente estar sem apresentá-las devido ao uso de medicação.
Referiu também início de transtorno mental há 16 anos, após o nascimento da filha, quando
esta estava com 06 anos de idade.
Refere acompanhamento psiquiátrico atual no Centro de Tratamento Bezerra de Menezes, com
consultas a cada 02 meses. Descreve histórico de transtorno mental com episódio em que
pensou em suicídio e pegou uma faca para matá-la e matar a filha, além de “ouvir vozes”,
descritas como momentos em que acredita que a chamaram em outro local próximo/cômodo e,
ao chegar nele, não ter ninguém. Fala também de um episódio de esquecimento de fogo ligado
e episódios em que afirma estar bem e, sem motivo aparente para a mesma, tem momentos de
impulsividade e vontade de pegar uma faca pra agredir marido e filha.
Pericianda nega histórico de acidentes ou traumatismos cranioencefálico. Afirma não sair
desacompanhada de casa e fazer uso de medicação de acordo com tabela ilustrativa feita por
médica psiquiatra assistente, com auxílio do esposo. Afirma manter rotina esvaziada,
descrevendo-a como “só durmo”, afirmando que exercia anteriormente atividade como dona de
casa.
Ao exame psíquico, apresenta-se vigil, com autocuidado adequado, pouco colaborativa,
discurso direcionado à questões da doença, lamurioso, orientada auto e alopsiquicamente,
mantendo-se normovigilante, meória preservada, inteligência compatível com nível educacional,
humor não polarizado, apresentando breve momento de choro, afeto normomodulante,
congruente e hiporessoante, pensamento agregado, sem conteúdo delirante,
predominantemente vitimizado, sem ideação suicida estruturada no momento da entrevista,
sem sinais indiretos de alteração da sensopercepção, expressa-se por meio de mensagens
claras, sem alterações na psicomotricidade, volição e pragmatismo preservados, juízo de
realidade preservado e crítica de morbidez preservada.
4. Discussão:
Conforme definição, uma convulsão é uma perturbação fisiopatológica paroxística transitória da
função cerebral causada por uma descarga espontânea e excessiva de neurônios. Afirma-se
que um paciente tem epilepsia se ele apresentar uma condição crônica caracterizada por
convulsões recorrentes. A epilepsia é a doença neurológica crônica mais comum na população
geral. A crise, ou evento ictal, é a convulsão em si. Os períodos não ictais são denominados
“pré-ictal”, “pós-ictal”e “interictal”. As duas principais categorias de convulsões são as parcias e
generalizadas.
Para psiquiatras, as principais preocupações com relação à epilepsia são a consideração de um
diagnóstico dessa doença em pacientes psiquiátricos, as ramificações psicossociais desse
diagnóstico para o paciente e os efeitos psicológicos e cognitivos dos fármacos
anticonvulsivantes de uso mais comum. A epilepsia parcial complexa, a forma mais comum da
doença em adultos, afeta aproximadamente 3 a cada 1000 pessoas. Cerca de 30% dos
pacientes com convulsões parciais complexas apresentam uma doença mental maior, como
depressão. Com relação aos efeitos psicológicos, de 30 a 50% de todos os indivíduos com
epilepsia apresentam dificuldades psiquiátricas em algum momento durante o curso de sua
doença.
As anormalidades psiquiátricas de relato mais frequente em pacientes com epilepsia são
transtornos da personalidade, os quais são mais prováveis em pacientes com epilepsia
originária do lobo temporal. As características mais comuns são religiosidade, uma experiência
mais intensa de emoções e mudanças no comportamento sexual. A síndrome em sua forma
completa é bastante rara mesmo em indivíduos com convulsões parciais complexas com
origem no lobo temporal, sendo que muitos pacientes não são afetados por perturbações da
personalidade.
O surgimento de sintomas psicóticos, sintomas de transtorno do humor, alterações na
personalidade ou sintomas de ansiedade deve levar o clínico a avaliar o controle da epilepsia
do paciente e investigar a presença de um transtorno mental independente.
Nessas circunstâncias, o clínico deve verificar se o paciente segue adequadamente o regime
com fármacos anticonvulsivantes e considerar se os sintomas psiquiátricos podem ser efeitos
adversos dos próprios medicamentos. Quando surgem esses sintomas e um paciente com
diagnóstico de epilepsia, ou no qual epilepsia foi considerada como diagnóstico no passado, o
clínico deve obter os resultados de um ou mais exames de EEG.
No caso da pericianda em questão, chama a atenção o fato de não haver registro ou menção
de acompanhamento com médico especialista (neurologista), apesar do referido diagnóstico
desde a infância, bem como exames específicos, de neuroimagem e de atividade
eletroencefalográfica (exceto pela tomografia de crânio e vídeo EEG solicitado por perito
anterior). Além disso, consta acompanhamento com psiquiatra de modo irregular, por vezes
sem menção de prescrição de medicação anticonvulsivante e, ainda, com relatos curtos, sem
descrição de sintomas, porém com longo período de estabilidade. Chama a atenção último
relatório, emitido a menos de um mês da perícia, com descrição de quadro clínico bem mais
robusto do que o observado em registros de prontuário anteriormente, além de bem mais
exuberante ao observado na perícia.
Assim sendo, considera-se diagnóstico de transtorno mental independente de diagnóstico
neurológico, com quadro clínico compatível com transtorno de personalidade com instabilidade
emocional (transtorno de personalidade borderline). Conforme descrito no Compêndio de
Psiquiatria (Kaplan & Sadock, 2017), os transtornos da personalidade são comuns e crônicos e
ocorrem em 10 a 20% da população em geral, e sua duração é expressa em décadas. A 5a
edição do Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM-5) também define um
“transtorno da personalidade geral como um padrão persistente de experiência interna e
comportamento que se desvia acentuadamente das expectativas da cultura do indivíduo.
Quando os traços de personalidade são rígidos e mal-adaptativos e produzem prejuízo
funcional, ou sofrimento subjetivo, é possível diagnosticar um transtorno da personalidade”.
De acordo com o relato da pericianda, é possível observar tratamento iniciado há cerca de 02
décadas, já apresentando traços disfuncionais da sua personalidade, com ideação suicida e
homicida, pensamentos estes que são comuns ao quadro clínico apresentado nos transtornos
de personalidade borderline.
Indivíduos com transtorno da personalidade borderline, (também já chamado de “esquizofrenia
ambulatorial”) encontram-se no limiar entre neurose e psicose, mas diferencia-se de
esquizofrenia com base no fato de o paciente com personalidade borderline não apresentar
episódios psicóticos prolongados, transtorno do pensamento e outros sinais clássicos de
esquizofrenia. Já o transtorno borderline, tem por característica afeto, humor, comportamento,
relações objetais e autoimagem extraordinariamente instáveis.
O tratamento consiste basicamente com foco em psicoterapia. Para a obtenção de melhores
resultados, acrescenta-se, por vezes, farmacoterapia ao regime de tratamento.
No caso da pericianda, há relato de uso de múltiplas medicações, com resposta terapêutica
variável ao longo dos anos de tratamento, considerando que a farmacoterapia é útil para lidar
com características específicas da personalidade que interferem no funcionamento geral do
paciente. Os antipsicóticos, por exemplo, quando utilizados, podem servir para controlar raiva,
hostilidade e episódios psicóticos breves.
5. Conclusão:
Pelo visto e exposto acima, conclui-se que:
- A pericianda é portadora de transtorno de personalidade com instabilidade emocional (CID-10
F60.3).
A doença supracitada não a incapacita atividade laborativa.
- Caso a incapacidade decorra de doença, é possível determinar a data de início da doença?
R:Consta em prontuário em 09/03/2016 tratamento “há 13 anos”, então DID em 2003.
- Informe o senhor perito quais as características gerais (causas e consequências) da (s)
patologia(s) apresentadas pela parte autora.
R: Transtorno mental de origem multifatorial, caracterizada por quadro de instabilidade
emocional, impulsividade, por vezes agressividade e episódios psicóticos breves.
- Qual o grau de intensidade a(s) patologia(s), inclusive quanto à possibilidade de controle e
tratamento do quadro?
R: Trata-se de patologia suscetível a tratamento, focada em psicoterapia principalmente e com
uso de psicofármacos, atualmente estabilizada.
- A(s) patologia(s) verificadas fazem com que a parte Autora se enquadre em qual das
situações abaixo indicadas:
A) capacidade para o trabalho;
B) incapacidade para a atividade habitual;
C) incapacidade para toda e qualquer atividade;
D) redução da capacidade para o trabalho (apto a exercer suas atividades habituais, porém
exigindo maior esforço para as mesmas funções ou implicando menor produtividade).
- Constatada a incapacidade, é possível determinar se esta decorreu de agravamento ou
progressão de doença ou lesão?
R: Prejudicado, não há incapacidade.
- Caso a resposta seja afirmativa, é possível estimar a data e em que se baseou para fixar data
do agravamento ou progressão?
R: Prejudicado, não há incapacidade.
-É possível determinar a data de início da incapacidade?
Informar ao juízo os critérios utilizados para a fixação desta data, esclarecendo em quais
exames ou evidências baseou-se para concluir pela incapacidade e as razões pelas quais agiu
assim.
R: Prejudicado, não há incapacidade.
- Constatada incapacidade, esta impede totalmente ou parcialmente o periciando de praticar
sua atividade habitual?
R: Prejudicado, não há incapacidade.
- Em caso de incapacidade para sua atividade habitual, informar que tipo de atividade o
periciando está apto a exercer, indicando quais as limitações do periciando.
R: Prejudicado, não há incapacidade.
- Caso o periciando tenha redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia,
podendo exercê-lo, mas com maior grau de dificuldade, indique as limitações que enfrenta.
R: Prejudicado, não há incapacidade.
- A incapacidade impede totalmente o periciando de praticar outra atividade que lhe garanta
subsistência?
R: Prejudicado, não há incapacidade.
- A incapacidade é insusceptível de recuperação ou reabilitação para o exercício de outra
atividade que garanta subsistência ao periciando?
R: Prejudicado, não há incapacidade.
- Caso seja constatada incapacidade total (para toda e qualquer atividade), esta é temporária ou
permanente?
R: Prejudicado, não há incapacidade.
- É possível estimar qual é o tempo necessário para que o periciando se recupere e tenha
condições de voltar a exercer seu trabalho ou atividade habitual? Justifique. Em caso positivo,
qual é a data estimada?
R: Prejudicado, não há incapacidade.
- Não havendo possibilidade de recuperação, é possível estimar qual é a data do início da
incapacidade permanente? Justifique. Em caso positivo, qual é a data estimada?
R: Prejudicado, não há incapacidade.
- Em caso de incapacidade permanente e insusceptível de reabilitação para exercício de outra
atividade que lhe garanta a subsistência, o periciando necessita da assistência permanente de
outra pessoa? Em caso positivo, a partir de qual data?
R: Prejudicado, não há incapacidade.
- O periciando possui capacidade de exprimir sua vontade e de exercer pessoalmente a
administração de seus bens e valores recebidos?
R: Sim.
- O periciando pode se recuperar mediante intervenção cirúrgica? Uma vez afastada a hipótese
de intervenção cirúrgica, a incapacidade é permanente ou temporária?
R: Prejudicado, não se trata de patologia cirúrgica.
- Caso não seja constatada a incapacidade atual, informe se houver, em algum período,
incapacidade.
R: Diante de documentação apresentada, não foi possível observar incapacidade anterior. (...).
Em que pesem as alegações do recorrente de que está incapacitado, observo que o perito
judicial respondeu de forma satisfatória aos quesitos apresentados, com base nos documentos
médicos constantes nos autos e no exame clínico realizado, sendo categórico em afirmar a
ausência de incapacidade laborativa.
Embora existam nos autos documentos médicos apresentados pela parte recorrente, tais
documentos comprovam apenas a presença de patologias e a realização de tratamento médico
para controle dos problemas de saúde apresentados. Porém, é certo que a existência de
problemas de saúde não acarreta necessariamente incapacidade para as atividades habituais.
Diante da ausência do preenchimento do requisito legal da incapacidade não há que se falar em
direito à concessão do auxílio doença ou aposentadoria por invalidez, razão pela qual não
merece reforma a r. sentença recorrida.
Cumpre ressaltar, por fim, o teor da Súmula 77 da Turma Nacional de Uniformização: “O
julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando não reconhecer a
incapacidade do requerente para a sua atividade habitual”.
Ante o exposto, negoprovimento ao recurso.
Sem honorários, ante a ausência de contrarrazões.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIARIO. Benefício por incapacidade. Sentença de improcedência. Recurso da parte
autora. Laudo pericial que não identifica incapacidade laboral. Ausência de documentos que
infirmem a conclusão pericial. Negado provimento ao recurso. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Terceira Turma
Recursal do Juizado Especial Federal da 3ª Região - Seção Judiciária do Estado de São Paulo,
por unanimidade, negar provimento ao recurso da parte autora, nos termos do voto relatora da
Juíza Federal Isadora Segalla Afanasieff, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
