Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0000005-78.2020.4.03.6312
Relator(a)
Juiz Federal MARCIO RACHED MILLANI
Órgão Julgador
8ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
19/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 29/11/2021
Ementa
E M E N T A
Sem condenação em custas e honorários, face o disposto no artigo 55, da Lei nº 9.099/1995.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
8ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000005-78.2020.4.03.6312
RELATOR:22º Juiz Federal da 8ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: RENATO DOS SANTOS
Advogado do(a) RECORRIDO: BRINY ROCHA - ES29039-A
OUTROS PARTICIPANTES:
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000005-78.2020.4.03.6312
RELATOR:22º Juiz Federal da 8ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: RENATO DOS SANTOS
Advogado do(a) RECORRIDO: BRINY ROCHA - ES29039-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso inominado interposto pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
contra a sentença, que julgou procedente o pedido formulado na petição inicial para condená-lo
a restabelecer o auxílio-doença NB 31/629.307.918-7 a partir de 17.12.2019 (dia seguinte à
cessação administrativa), com DCB (data de cessação do benefício) previamente fixada em
03.03.2021, com a ressalva de que, caso o segurado entenda pela continuidade da
incapacidade, deverá formular requerimento administrativo de prorrogação junto ao INSS, em
até 15 (quinze) dias antes da data prevista como termo final do benefício. Consta da sentença,
ainda: “Caberá ao INSS, dentro de sua administração, promover eventual processode
reabilitação profissional, conforme sugerido pelo perito judicial. Ressalto que, o processode
reabilitação fica a cargo do INSS e é realizado de acordo com as possibilidadesadministrativas,
técnicas e financeiras, bem como as condições locais do órgão”.
Em suas razões de recurso, o INSS sustenta que o autor não comprova o desempenho de
atividade profissional incompatível com as restrições apontadas na perícia médica. Afirma
também que já desempenhou diversas atividades profissionais compatíveis com suas
limitações, de modo que não necessita de treinamento específico. Requer a ampla reforma da
sentença e a improcedência do pedido. Subsidiariamente, sustenta a incompatibilidade do
encaminhamento à reabilitação profissional com a prévia fixação da DCB (data de cessação do
benefício).
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000005-78.2020.4.03.6312
RELATOR:22º Juiz Federal da 8ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: RENATO DOS SANTOS
Advogado do(a) RECORRIDO: BRINY ROCHA - ES29039-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Os requisitos legais para a concessão do auxílio-por incapacidade temporária (auxílio-doença)
são os seguintes: a) a qualidade de segurado da parte requerente, mediante prova de sua
filiação ao Regime Geral de Previdência Social - RGPS; b) o cumprimento da carência, nos
termos dos artigos 24 a 26 da Lei n.º 8.213/91; c) a comprovação de ser ou estar a parte
requerente total e permanentemente incapacitada para o seu trabalho habitual, desde que o
evento incapacitante não seja preexistente à filiação ao RGPS e seu termo inicial (data de início
da incapacidade) seja fixado em período cuja qualidade de segurado esteja preservada e a
carência legal devidamente cumprida (salvo nos casos inseridos no disposto do artigo 26, inciso
II, da Lei n.º 8.213/91).
No caso concreto, a prova pericial médica, elaborada por profissional qualificado, de confiança
do Juízo e equidistante das partes, diagnosticou que o autor apresenta déficit de força motora e
cognitiva com vertigens (sequelas de traumatismo crânio encefálico), concluindo pela
caracterização de incapacidade total e permanente para a sua atividade profissional habitual,
com possibilidade de reabilitação para atividades que não exijam esforços físicos, condução de
veículo automotores, operação de máquinas e trabalho em altura. DII (data de início da
incapacidade) em 17.07.2019.
Não há razões para afastar as conclusões do médico perito, eis que fundadas no exame clínico
realizado na parte autora, bem como nos documentos médicos que lhe foram apresentados.
Considero desnecessária e inoportuna a reabertura da instrução processual, seja para a
realização de nova perícia médica, apresentação de relatório de esclarecimentos adicionais,
oitiva do médico perito, oitiva pessoal da parte autora ou de testemunhas, juntada de novos
documentos, etc., eis que não verifico contradições entre as informações constantes do laudo
aptas a ensejar dúvida, o que afasta qualquer alegação de nulidade e/ou cerceamento de
defesa.
O nível de especialização apresentado pelo médico perito é indubitavelmente suficiente para
promover a análise do quadro clínico apresentado nos autos. Não há necessidade de que seja
especialista em cada uma das patologias mencionadas pelo segurado. Conforme entendimento
consolidado na TNU – Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados
Especiais Federais, a realização de perícia por médico especialista só se faz necessária em
casos excepcionalíssimos e de elevada complexidade, como, por exemplo, aqueles que
envolvem doenças raras, o que não se verifica na hipótese em apreço.
A corroborar:
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL PREVIDENCIÁRIO.
PROVA PERICIAL. CONHECIMENTO TÉCNICO ESPECIALIZADO. POSSIBILIDADE DE
PERÍCIA SER REALIZADA POR MÉDICO GENERALISTA OU ESPECIALISTA EM MEDICINA
DO TRABALHO. REEXAME DE MATÉRIA DE FATO. INCIDENTE NÃO CONHECIDO. 1. A
Turma Nacional de Uniformização, ao interpretar o art. 145, §2º, do Código de Processo Civil de
1973 (art. 156, §1º, do Novo Código de Processo Civil), consolidou entendimento de que a
realização de perícia por médico especialista é apenas necessária em casos complexos, em
que o quadro clínico a ser analisado e os quesitos a serem respondidos exijam conhecimento
técnico específico, não suprido pela formação do médico generalista (cf.PEDILEF
200872510048413,Rel. Juiz Federal Derivaldo de Figueiredo Bezerra Filho, DJ
09/08/2010;PEDILEF200872510018627, Rel. Juíza Federal Jacqueline Michels Bilhalva, DJ
05/11/2010;PEDILEF200970530030463, Rel. Juiz Federal Alcides Saldanha Lima, DOU
27/04/2012;PEDILEF200972500044683, Rel. Juiz Federal Antonio Fernando Schenkel do
Amaral e Silva, DOU 04/05/2012;PEDILEF200972500071996, Rel. Juiz Federal Vladimir Santos
Vitovsky, DOU 01/06/2012;PEDILEF201151670044278, Rel Juiz Federal José Henrique
Guaracy Rebelo, DOU 09/10/2015). 2. Inexiste divergência em relação à jurisprudência da
Turma Nacional de Uniformização ou ao acórdão indicado como paradigma, uma vez que a
questão técnico-científica controversa não exige conhecimento especializado do médico perito
para ser esclarecida. 3. Hipótese de incidência da orientação do enunciado n. 42, da súmula da
jurisprudência da TNU, uma vez que o acórdão prolatado, em julgamento de recurso inominado,
aplicou o princípio do livre convencimento do magistrado diante das provas apresentadas e
concluiu pela inexistência de incapacidade laborativa da parte autora.
(TNU – Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais;
PEDILEF – Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei – 50042937920154047201;
Relator Juiz Federal Fábio César dos Santos Oliveira; Data do julgamento: 30.08.2017) (grifei)
Nesse sentido, vale mencionar trecho do parecer do Conselho Regional de Medicina do Estado
de São Paulo – CREMESP na resposta à consulta nº 51.337/06, em que se indagava se
qualquer médico está apto a realizar perícias médicas: “1) Qualquer médico está apto a praticar
qualquer ato médico e, por isso, qualquer profissional médico pode realizar qualquer perícia
médica de qualquer especialidade médica. Não há divisão de perícia em esta ou aquela
especialidade. Vale lembrar que a responsabilidade médica é intransferível, cabendo ao
profissional que realiza a perícia assumir esta responsabilidade.”
Pois bem.
A constatação de uma lesão, doença ou deformidade, por si só, não gera automaticamente o
direito ao auxílio por incapacidade temporária (auxílio-doença), na medida em que deve ser
avaliada em conjunto com outros fatores, como sua evolução fisiopatológica e as
consequências/repercussão que trará para a capacidade laboral do acometido, levando-se
sempre em conta sua profissão habitual.
A incapacidade laborativa está diretamente ligada às limitações funcionais de uma pessoa
frente às habilidades exigidas para o desempenho das atividades profissionais para as quais
está qualificada. Somente quando a doença, lesão ou deformidade impede o desempenho
dessas atividades é que se configura a incapacidade para o trabalho e, consequentemente,
caso preenchidos os demais requisitos legais (carência e qualidade de segurado da Previdência
Social), o direito ao benefício previdenciário. Doença não é sinônimo de incapacidade.
No caso, os registros em CTPS demonstram que, durante sua vida laboral, o autor
desempenhou preponderantemente atividades braçais, para as quais está incapacitado,
conforme apontamentos da perícia médica quanto às restrições para trabalhos que exijam
esforços físicos, condução de veículo automotores, operação de máquinas e atividades em
altura. Há dúvidas, de fato, se as limitações apontadas causam impedimentos para o
desempenho da última atividade profissional que o segurado vinha exercendo habitualmente,
no entanto, não há nos autos elementos que permitam concluir com segurança que, no
desempenho de suas funções, o autor não seja submetido aos fatores de risco enumerados
pelo médico perito.
Com efeito, ainda que dos registros em CTPS seja possível constatar que o autor realmente
possui expediência profissional algumas atividades que, em tese, respeitam as
limitações/restrições estabelecidas pela médica perita, entendo que a dúvida milita em favor do
segurado, de modo que a concessão do auxílio por incapacidade temporária é medida de
cautela que melhor se adequa ao caso concreto.
Dessa forma, a sentença deve ser mantida na parte em que determinou a concessão do
benefício, haja vista que também presentes a qualidade de segurado do Regime Geral de
Previdência Social e a carência. Entendo, todavia, que as particularidades do caso não
permitem a prévia fixação da DCB (data de cessação do benefício), na forma das alterações
legislativas promovidas pela Lei nº 13.457/2017 que incluiu os parágrafos 8º, 9º, 10 e 11 no
artigo 60 da Lei nº 8.213/91, haja vista a sua incompatibilidade com o programa de reabilitação
profissional, conforme acertadamente sustentado pelo INSS em seu recurso inominado.
Havendo constatação de incapacidade total e permanente para as atividades habituais, e não
sendo o caso de concessão de aposentadoria por invalidez (haja vista a possibilidade de
reabilitação para outras atividades profissionais), não há razão para a prévia fixação do termo
inicial do benefício (DCB) na medida que, em tese, o quadro clínico verificado é insusceptível de
recuperação.
A hipótese é de encaminhamento do segurado à análise de elegibilidade ao programa de
reabilitação profissional que, a teor do que decidiu a TNU – Turma Nacional de Uniformização
de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais, no julgamento do PEDILEF n.º 0506698-
72.2015.4.05.8500/SE, realizado em 21.02.2019, sob a sistemática dos recursos repetitivos
(Tema 177), que vincula as Turmas Recursais e os Juizados Especiais Federais, firmou a
seguinte tese: “1. Constatada a existência de incapacidade parcial e permanente, não sendo o
caso de aplicação da Súmula 47 da TNU, a decisão judicial poderá determinar o
encaminhamento do segurado para análise administrativa de elegibilidade à reabilitação
profissional, sendo inviável a condenação prévia à concessão de aposentadoria por invalidez
condicionada ao insucesso da reabilitação; 2. A análise administrativa da elegibilidade à
reabilitação profissional deverá adotar como premissa a conclusão da decisão judicial sobre a
existência de incapacidade parcial e permanente, ressalvada a possibilidade de constatação de
modificação das circunstâncias fáticas após a sentença.”
Extrai-se da decisão proferida pela TNU no julgamento do Tema 177 que a decisão judicial
poderá determinar apenas o encaminhamento do segurado para análise administrativa de
elegibilidade à reabilitação profissional, a ser realizada pelo INSS, adotando como premissa a
conclusão da perícia judicial sobre a existência de incapacidade parcial.
Advirto o INSS, no entanto, que embora a jurisprudência a ser seguida no âmbito dos Juizados
Especiais Federais tenha admitido que a efetiva inclusão do segurado em programa de
reabilitação profissional é ato discricionário da Administração, também estabeleceu não se
tratar de discricionariedade absoluta, eis que a análise de elegibilidade a ser efetuada no âmbito
administrativo deverá obrigatoriamente adotar como premissa a conclusão da decisão judicial
sobre a existência de incapacidade.
No caso concreto, o Poder Judiciário está declarando a incapacidade total e permanente para
trabalhos que exijam esforços físicos, condução de veículo automotores, operação de máquinas
e atividades em altura, de modo que o INSS não poderá esquivar-se dessas premissas e adotar
entendimento diverso quando efetuar a análise de exigibilidade ao programa de reabilitação
profissional.
Ante todo o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS para reformar a
sentença na parte em que fixou a DCB (data de cessação do benefício) em 03.03.2021, e
autorizar a autarquia previdenciária a proceder a análise administrativa de elegibilidade à
reabilitação profissional, adotando como premissa a decisão judicial acerca da incapacidade, ou
seja, incapacidade total e permanente para trabalhos que exijam esforços físicos, condução de
veículo automotores, operação de máquinas e atividades em altura.
O auxílio-doença deverá ser mantido enquanto o INSS não finalizar a análise de elegibilidade
ora determinada. No entanto, na hipótese do benefício já ter sido cessado na data estabelecida
na sentença ou em qualquer momento posterior, fica o INSS desobrigado de restabelecê-lo e
de proceder a análise de elegibilidade ao programa de reabilitação profissional. Nessa hipótese,
caso entenda que ainda não possui condições de reingressar no mercado de trabalho, deverá o
autor formalizar novo requerimento administrativo.
Sem condenação em custas e honorários, face o disposto no artigo 55, da Lei nº 9.099/1995.
É o voto.
E M E N T A
Sem condenação em custas e honorários, face o disposto no artigo 55, da Lei nº 9.099/1995.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento ao recurso do réu, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
