Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0003719-52.2020.4.03.6310
Relator(a)
Juiz Federal MARCIO RACHED MILLANI
Órgão Julgador
8ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
19/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 29/11/2021
Ementa
E M E N T A
Dispensada a ementa por interpretação extensiva do artigo 46 da Lei nº 9.099/95, segunda parte.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
8ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0003719-52.2020.4.03.6310
RELATOR:22º Juiz Federal da 8ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: RONALDO FELIX DE SOUZA
Advogado do(a) RECORRIDO: ANA PAULA FOLSTER MARTINS - SP249004-N
OUTROS PARTICIPANTES:
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0003719-52.2020.4.03.6310
RELATOR:22º Juiz Federal da 8ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: RONALDO FELIX DE SOUZA
Advogado do(a) RECORRIDO: ANA PAULA FOLSTER MARTINS - SP249004-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso inominado interposto pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
contra a sentença, que julgou parcialmente procedente o pedido formulado na petição inicial
para condená-lo a conceder auxílio por incapacidade temporária (auxílio-doença) a RONALDO
FELIZ DE SOUZA, com DIB (data de início do benefício) em 05.05.2020 (DER – Data de
entrada do requerimento administrativo), determinando a sua manutenção até o decurso de 6
(seis) meses contados do trânsito em julgado.
Em suas razões de recurso, afirma que a parte autora retornou voluntariamente ao trabalho,
com vínculo formal de trabalho com PORTAL DOS IPÊS SPE LTDA. a partir de 15.09.2020, de
modo que não tem direito ao benefício previdenciário por incapacidade. Requer a ampla
reforma da sentença e a improcedência do pedido. Subsidiariamente, requer que a DCB (data
de cessação do benefício) seja fixada em 6 (seis) meses contados da data da perícia médica e
não do trânsito em julgado, como constou na sentença. Insurgiu-se, ainda, contra a cominação
de multa em caso de não observação do prazo fixado para o cumprimento da decisão que
antecipou os efeitos da tutela jurisdicional.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0003719-52.2020.4.03.6310
RELATOR:22º Juiz Federal da 8ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: RONALDO FELIX DE SOUZA
Advogado do(a) RECORRIDO: ANA PAULA FOLSTER MARTINS - SP249004-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A cominação de multa no caso de inadimplemento de obrigação de fazer (a saber, a
implantação do benefício) encontra amparo legal nos artigos 497, 536, § 1º e 537 do Código de
Processo Civil de 2015, que assim dispõem:
Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se
procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem
a obtenção da tutela pelo resultado prático equivalente.
Art. 536. No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou
de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica
ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias
à satisfação do exequente.
§ 1º. Para atender ao disposto no ‘caput’, o juiz poderá determinar, entre outras medidas, a
imposição de multa, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de
obras e o impedimento de atividade nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de
força policial.
Art. 537. A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de
conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja
suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento
do preceito.
Tal sistemática permite ao Juízo que imponha a multa independentemente de pedido da parte,
ou mesmo que a agrave ou reduza e, ainda, a cumulação de multa com as perdas e danos. O
que se pretende é que a multa cumpra seu papel, de modo a impor ao devedor o cumprimento
de sua obrigação, sendo que, caso não surta efeito, pode ser agravada. Situações há em que
se admite até mesmo a possibilidade de se reduzir ou retirar a multa, caso se perceba a
impossibilidade de cumprir sua finalidade, por exemplo, no caso de insolvência do devedor.
A corroborar:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. CABIMENTO DE IMPOSIÇÃO
DE MULTA DIÁRIA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA POR DESCUMPRIMENTO DE
OBRIGAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE REVISÃO DO VALOR ARBITRADO. AGRAVO
REGIMENTAL DO ESTADO DE PERNAMBUCO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. O entendimento adotado pela Corte de origem não destoa da jurisprudência do STJ, segundo
a qual é cabível a cominação de multa contra a Fazenda Pública por descumprimento de
obrigação de fazer. No caso em tela, a apreciação dos critérios previstos no art. 461 do CPC
para a fixação de seu valor demandaria o reexame de matéria fático-probatória, o que encontra
óbice na Súmula 7 desta Corte. Excepcionam-se apenas as hipóteses de valor irrisório ou
exorbitante.
2. Na hipótese, o valor de R$ 1.000,00 não se mostra excessivo, a ensejar a sua revisão por
esta Corte Superior, especialmente por se tratar de hipótese de fornecimento de medicamentos
e tratamento de saúde.
3. Agravo Regimental do ESTADO DE PERNAMBUCO a que se nega provimento.
(STJ – Superior Tribunal de Justiça; AgRg no AREsp 575203/PE; Órgão Julgador: PRIMEIRA
TURMA; Relato Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO; Data do julgamento: 18.02.2016;
Publicado no DJe de 02.03.2016) (grifo nosso)
No caso concreto, o prazo concedido para cumprimento da obrigação de fazer foi bastante
razoável e suficiente para que o INSS cumprisse adequadamente a determinação. Seja como
for, a questão não aparenta ser substancialmente relevante, eis que, conforme se verifica nos
autos, a autarquia previdenciária foi célere no cumprimento da decisão e na implantação do
benefício, de modo que a possibilidade cominação de multa está afastada.
Superada a matéria preliminar, passo à análise do mérito.
A prova pericial médica, elaborada em 09.12.2020 por profissional qualificado, de confiança do
Juízo e equidistante das partes, cujo nível de especialização é indubitavelmente suficiente para
promover a análise do quadro clínico apresentado nos autos, diagnosticou que o autor é
portador de quadro “pós operatório de drenagem de hematoma coxa esquerda” (sic), “com
perda funcional devido dor e perda de arco de joelho esquerdo” (sic), concluindo pela existência
de incapacidade total e temporária para o trabalho, com DII (data de início da incapacidade) em
03.04.2020, asseverando, no entanto, a possibilidade de reversibilidade do quadro
incapacitante e recuperação plena da aptidão para o labor no prazo estimado de 6 (seis) meses
contados da data da realização do exame pericial.
Não há razões para afastar as conclusões da perícia médica judicial, eis que fundadas no
exame clínico realizado na parte autora, bem como nos documentos médicos que lhe foram
apresentados. Considero desnecessária e inoportuna a reabertura da instrução processual, seja
para a realização de nova perícia médica, apresentação de relatório de esclarecimentos
adicionais, oitiva do médico perito, oitiva pessoal da parte autora ou de testemunhas, juntada de
novos documentos, etc., eis que não verifico contradições entre as informações constantes do
laudo aptas a ensejar dúvida, o que afasta qualquer alegação de nulidade.
A prova pericial médica produzida nestes autos é firme e minuciosa, observou o contraditório,
possibilitou às partes o amplo exercício do direito de defesa, enfim, atendeu todos os preceitos
processuais e constitucionais. Não há qualquer ilegalidade maculando o trabalho do médico
perito nomeado nesta ação, profissional experiente e sem qualquer interesse no processo.
Pois bem.
A prova dos autos é indicativa de que o autor retornou ao trabalho a partir de 15.09.2020,
mantendo desde então vínculo empregatício formal com PORTAL DOS IPÊS SPE LTDA,
concomitante ao período em que, conforme conclusões da perícia médica judicial, esteve
incapacitado para o trabalho.
Com efeito, o fato de ter vertido contribuições ao Regime Geral de Previdência Social no
período supracitado, e de ter desempenhado atividade profissional remunerada, não infirma as
conclusões da perícia médica quanto à existência de incapacidade para o trabalho. Diante da
falha do INSS, que indeferiu incorretamente o benefício no âmbito administrativo, não restou ao
segurado outra alternativa senão buscar o próprio sustento por meio do trabalho, ainda que não
estivesse apto ao labor.
Negar o benefício sob o fundamento defendido pela autarquia previdenciária em seu recurso
inominado seria conferir vantagem indevida a quem negou equivocadamente a concessão do
benefício, que deveria ter sido implantado administrativamente, sem a necessidade de
intervenção do Poder Judiciário.
O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento dos Recursos Especiais nº 1.786.590/SP e n°
1.788.700/SP, realizado em 24.06.2020 (acórdãos publicados em 01.07.2020), sob a
sistemática dos recursos repetitivos representativos de controvérsia (Tema 1.013), fixou a
seguinte tese: “No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de
auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do
RGPS tem direito ao recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que
incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago
retroativamente.”
Transcrevo abaixo a Ementa do julgamento do Recurso Especial nº 1.786.590/SP:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ARTS.
1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015. TEMA REPETITIVO 1.013/STJ. BENEFÍCIO POR
INCAPACIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO-DOENÇA. DEMORA NA
IMPLEMENTAÇÃO DO BENEFÍCIO. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE REMUNERADA PELO
SEGURADO. NECESSIDADE DE SUBSISTÊNCIA DO SEGURADO. FUNÇÃO SUBSTITUTIVA
DA RENDA NÃO CONSUBSTANCIADA. POSSIBILIDADE DE RECEBIMENTO CONJUNTO
DA RENDA DO TRABALHO E DAS PARCELAS RETROATIVAS DO BENEFÍCIO ATÉ A
EFETIVA IMPLANTAÇÃO. TESE REPETITIVA FIXADA.
IDENTIFICAÇÃO E DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA
1. O tema repetitivo ora controvertido consiste em definir a "possibilidade de recebimento de
benefício, por incapacidade, do Regime Geral de Previdência Social, de caráter substitutivo da
renda (auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez), concedido judicialmente em período de
abrangência concomitante àquele em que o segurado estava trabalhando e aguardava o
deferimento do
benefício."
2. Os fatos constatados no presente Recurso Especial consistem cronologicamente em: a) o
segurado teve indeferido benefício por incapacidade (auxílio-doença ou aposentadoria por
invalidez) na via administrativa; b) para prover seu sustento, trabalhou após o indeferimento e
entrou com ação judicial para a concessão de benefício por incapacidade; c) a ação foi julgada
procedente para conceder o benefício desde o requerimento administrativo, o que acabou por
abranger o período de tempo em que o segurado trabalhou; e d) o debate, travado ainda na
fase ordinária, consiste no entendimento do INSS de que o benefício por incapacidade
concedido judicialmente não pode ser pago no período em que o segurado estava trabalhando,
ante seu caráter substitutivo da renda e à luz dos arts. 42, 46 e 59 da Lei 8.213/1991.
3. A presente controvérsia e, consequentemente, a tese repetitiva que for fixada não abrangem
as seguintes hipóteses:
3.1. O segurado está recebendo regularmente benefício por incapacidade e passa a exercer
atividade remunerada incompatível com sua incapacidade, em que não há o caráter da
necessidade de sobrevivência como elemento que justifique a cumulação, e a função
substitutiva da renda do segurado é implementada de forma eficaz. Outro aspecto que pode ser
analisado sob perspectiva diferente é o relativo à boa-fé do segurado. Há jurisprudência das
duas Turmas da Primeira Seção que analisa essa hipótese, tendo prevalecido a compreensão
de que há incompatibilidade no recebimento conjunto das verbas. A exemplo: AgInt no REsp
1.597.369/SC, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe 13.4.2018; REsp
1.454.163/RJ, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 18.12.2015; e
REsp 1.554.318/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 2.9.2016.
3.2. O INSS alega o fato impeditivo do direito (o exercício de trabalho pelo segurado) somente
na fase de cumprimento da sentença, pois há elementos de natureza processual prejudiciais à
presente tese a serem considerados, notadamente a aplicabilidade da tese repetitiva fixada no
REsp 1.253.513/AL (Rel. Ministro Castro Meira, Primeira Seção, DJe de 20.8.2012).
RESOLUÇÃO DA TESE CONTROVERTIDA
4. Alguns benefícios previdenciários possuem a função substitutiva da renda auferida pelo
segurado em decorrência do seu trabalho, como mencionado nos arts. 2º, VI, e 33 da Lei
8.213/1991. Em algumas hipóteses, a substitutividade é abrandada, como no caso de ser
possível a volta ao trabalho após a aposentadoria por tempo de contribuição (art. 18, § 2º, da
Lei 8.213/1991). Em outras, a substitutividade resulta na incompatibilidade entre as duas
situações (benefício e atividade remunerada), como ocorre com os benefícios auxílio-doença
por incapacidade e aposentadoria por invalidez.
5. Desses casos de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, é pressuposto que a
incapacidade total para o trabalho seja temporária ou definitiva, respectivamente.
6. Como consequência, o Regime Geral de Previdência Social arca com os citados benefícios
por incapacidade para consubstanciar a função substitutiva da renda, de forma que o segurado
que não pode trabalhar proveja seu sustento.
7. A cobertura previdenciária, suportada pelo regime contributivo solidário, é o provimento do
sustento do segurado enquanto estiver incapaz para o trabalho.
8. É decorrência lógica da natureza dos benefícios por incapacidade, substitutivos da renda,
que a volta ao trabalho seja, em regra, causa automática de cessação desses benefícios, como
se infere do requisito da incapacidade total previsto nos arts. 42 e 59 da Lei 8.213/1991, com
ressalva ao auxílio-doença.
9. No caso de aposentadoria por invalidez, o art. 42 da Lei de Benefícios da Previdência Social
(LBPS) estabelece como requisito a incapacidade "para o exercício de atividade que lhe
garanta a subsistência", e, assim, a volta a qualquer atividade resulta no automático
cancelamento do benefício (art. 46).
10. Já o auxílio-doença estabelece como requisito (art. 59) que o segurado esteja "incapacitado
para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual". Desse modo, a função substitutiva do
auxílio-doença é restrita às duas hipóteses, fora das quais o segurado poderá trabalhar em
atividade não limitada por sua incapacidade.
11. Alinhada a essa compreensão, já implícita desde a redação original da Lei 8.213/1991, a Lei
13.135/2015 incluiu os §§ 6º e 7º no art. 60 daquela, com a seguinte redação (grifos
acrescentados): "§ 6º O segurado que durante o gozo do auxílio-doença vier a exercer atividade
que lhe garanta subsistência poderá ter o benefício cancelado a partir do retorno à atividade. §
7º Na hipótese do § 6º, caso o segurado, durante o gozo do auxílio-doença, venha a exercer
atividadediversa daquela que gerou o benefício, deverá ser verificada aincapacidade para cada
uma das atividades exercidas."
12. Apresentado esse panorama legal sobre o tema, importa estabelecer o ponto diferencial
entre a hipótese fática dos autos e aquela tratada na lei: aqui o segurado requereu o benefício,
que lhe foi indeferido, e acabou trabalhando enquanto não obteve seu direito na via judicial; já a
lei trata da situação em que o benefício é concedido, e o segurado volta a trabalhar.
13. A presente controvérsia cuida de caso, portanto, em que falhou a função substitutiva da
renda, base da cobertura previdenciária dos benefícios auxílio-doença e aposentadoria por
invalidez.
14. O provimento do sustento do segurado não se materializou, no exato momento da
incapacidade, por falha administrativa do INSS, que indeferiu incorretamente o benefício, sendo
inexigível do segurado que aguarde a efetivação da tutela jurisdicional sem que busque, pelo
trabalho, o suprimento da sua subsistência.
15. Por culpa do INSS, resultado do equivocado indeferimento do benefício, o segurado teve de
trabalhar, incapacitado, para o provimento de suas necessidades básicas, o que doutrinária e
jurisprudencialmente convencionou-se chamar de sobre-esforço. Assim, a remuneração por
esse trabalho tem resultado inafastável
da justa contraprestação pecuniária.
16. Na hipótese, o princípio da vedação do enriquecimento sem causa atua contra a autarquia
previdenciária, pois, por culpa sua – indeferimento equivocado do benefício por incapacidade –,
o segurado foi privado da efetivação da função substitutiva da renda laboral, objeto da cobertura
previdenciária, inerente aos mencionados benefícios.
17. Como tempero do elemento volitivo do segurado, constata-se objetivamente que, ao
trabalhar enquanto espera a concessão de benefício por incapacidade, está ele atuando de
boa-fé, cláusula geral hodiernamente fortalecida na regência das relações de direito.
18. Assim, enquanto a função substitutiva da renda do trabalho não for materializada pelo
efetivo pagamento do auxílio-doença ou da aposentadoria por invalidez, é legítimo que o
segurado exerça atividade remunerada para sua subsistência, independentemente do exame
da compatibilidade dessa atividade com a incapacidade laboral.
19. No mesmo sentido do entendimento aqui defendido: AgInt no AREsp 1.415.347/SP, Rel.
Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, Je de 28.10.2019; REsp 1.745.633/PR, Rel.
Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 18.3.2019; AgInt no REsp 1.669.033/SP,
Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe de 30.8.2018; REsp
1.573.146/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe de 13.11.2017;
AgInt no AgInt no AREsp 1.170.040/SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe de
10.10.2018; AgInt no REsp 1.620.697/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma,
DJe de 2.8.2018; AgInt no AREsp 1.393.909/SP, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma,
DJe de 6.6.2019; e REsp 1.724.369/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe
de 25.5.2018.
FIXAÇÃO DA TESE REPETITIVA
20. O Tema Repetitivo 1.013/STJ é assim resolvido: "No período entre o indeferimento
administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez,
mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas
do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo
benefício previdenciário pago retroativamente."
RESOLUÇÃO DO CASO CONCRETO
21. Ao Recurso Especial deve-se negar provimento, pois o Tribunal de origem julgou o presente
caso no mesmo sentido do entendimento aqui proposto (fl. 142-143/e-STJ): "A permanência do
segurado no exercício das atividades laborativas decorre da necessidade de prover sua
subsistência enquanto a administração ou o Judiciário não reconheça sua incapacidade, não
obstando a concessão do benefício vindicado durante a incapacidade."
22. Consubstanciado o que previsto no Enunciado Administrativo 7/STJ, o recorrente é
condenado ao pagamento de honorários advocatícios de 10% (dez por cento) sobre o valor total
da verba sucumbencial fixada nas instâncias ordinárias, com base no § 11 do art. 85 do
CPC/2015.
CONCLUSÃO
23. Recurso Especial não provido, sob o rito dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015.
(STJ – Superior Tribunal de Justiça; Recurso Especial n° 1.786.590/SP; Órgão julgador:
PRIMEIRA SEÇÃO; Relato Ministro HERMAN BENJAMIN; Data do julgamento: 24.06.2020;
Publicado no DJE de 01.07.2020) (grifei)
Quanto à fixação da DCB (data de cessação do benefício), ressalto que, ao estimar a
possibilidade de recuperação da capacidade laborativa a partir de 09.06.2021, quando
decorridos 6 (seis) meses contados da data do exame pericial, o médico perito o fez amparado
em seu conhecimento técnico e experiência profissional, que lhe permitem estipular um
prognóstico realista e confiável.
Com efeito, diante do caráter eminentemente transitório do auxílio-doença, é absolutamente
lícito que o julgador, amparado no laudo médico judicial, estabeleça previamente a DCB (data
de cessação do benefício), sem que isso signifique que o benefício deverá necessariamente ser
cessado na data preestabelecida, que poderá ser estendida até a efetiva reavaliação médico-
pericial a cargo do INSS caso o segurado requeira formalmente a sua prorrogação.
Este procedimento (prévia fixação da DCB) está em conformidade com as alterações
legislativas promovidas pela Lei nº 13.457/2017 que incluiu os parágrafos 8º, 9º, 10 e 11 no
artigo 60 da Lei n.º 8.213/91. Não verifico inconstitucionalidade nessas inovações, haja vista
que o artigo 201 da Constituição Federal apenas estabelece que a Previdência Social atenderá
a cobertura dos eventos de doença e invalidez, delegando à lei ordinária, no entanto, os
critérios de concessão, manutenção, reavaliação e cessação dos benefícios.
Cumpre-me destacar, por oportuno, que as inovações legislativas trazidas pela Lei n.º
13.457/2017, embora disponham acerca da necessidade de prévia fixação do termo final do
auxílio-doença, não impõem necessariamente a cessação do benefício na data preestabelecida,
ressalvando a possibilidade do segurado requerer administrativamente sua prorrogação antes
da DCB (data de cessação do benefício) caso entenda que ainda está incapacitado para o
trabalho, hipótese em que deverá ser mantido até que o INSS proceda a reavaliação médico-
pericial.
Nesse sentido já decidiu recentemente a TNU – Turma Nacional de Uniformização de
Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais, no julgamento do PEDILEF n.º 0500774-
49.2016.4.05.8305, realizado em 19.04.2018 (acórdão publicado em 23/04/2018, sob a
sistemática dos recursos repetitivos (Tema 164), assim estabelecendo: “Por não vislumbrar
ilegalidade na fixação de data estimada para a cessação do auxílio-doença, ou mesmo na
convocação do segurado para nova avaliação da persistência das condições que levaram à
concessão do benefício na via judicial, a Turma Nacional de Uniformização, por unanimidade,
firmou as seguintes teses: a) os benefícios de auxílio-doença concedidos judicial ou
administrativamente, sem Data de Cessação de Benefício (DCB), ainda que anteriormente à
edição da MP nº 739/2016, podem ser objeto de revisão administrativa, na forma e prazos
previstos em lei e demais normas que regulamentam a matéria, por meio de prévia convocação
dos segurados pelo INSS, para avaliar se persistem os motivos da concessão do benefício; b)
os benefícios concedidos, reativados ou prorrogados posteriormente à publicação da MP nº
767/2017, convertida na Lei nº 13.457/17, devem, nos termos da lei, ter sua DCB fixada, sendo
desnecessária, nesses casos, a realização de nova perícia para a cessação do benefício; c) em
qualquer caso, o segurado poderá pedir a prorrogação do benefício, com garantia de
pagamento até a realização da perícia médica.” (grifei)
Dessa forma, considerando a prova dos autos, a legislação de regência e a tese firmada pela
TNU do julgamento no Tema 164, não há fundamentos para a manutenção do benefício sem
reavaliação médica-pericial por todo o período estabelecido na sentença, que extrapola muito o
prazo estimado na perícia médica para uma possível recuperação da capacidade laborativa.
Ante todo o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS para estabelecer
em 09.06.2021 a DCB (data de cessação do benefício) do auxílio-doença concedido da
sentença. Considerando que o prazo de recuperação estabelecido pelo médico perito já foi
ultrapassado e que o autor retornou ao mercado de trabalho, REVOGO a tutela de urgência de
natureza antecipatória concedida na sentença e determino a expedição de ofício ao INSS para
que proceda a imediata cessação do benefício.
Os valores pagos ao autor relativo a períodos posteriores a 09.06.2021 poderão ser
descontados quando da apuração dos valores atrasados.
Sem condenação em honorários, face o disposto no artigo 55 da Lei nº 9.099/1995.
É o voto.
E M E N T A
Dispensada a ementa por interpretação extensiva do artigo 46 da Lei nº 9.099/95, segunda
parte. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento ao recurso do réu, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
