Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0001405-17.2017.4.03.6318
Relator(a)
Juiz Federal CAIO MOYSES DE LIMA
Órgão Julgador
10ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
02/12/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 25/12/2021
Ementa
E M E N T A
Dispensada a ementa, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/95, combinado com o art. 1º da Lei
nº 10.259/2001.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
10ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001405-17.2017.4.03.6318
RELATOR:29º Juiz Federal da 10ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: JOAO BASQUES
Advogado do(a) RECORRIDO: ANTONIO MARIO DE TOLEDO - SP47319-N
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001405-17.2017.4.03.6318
RELATOR:29º Juiz Federal da 10ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: JOAO BASQUES
Advogado do(a) RECORRIDO: ANTONIO MARIO DE TOLEDO - SP47319-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
JUIZ FEDERAL CAIO MOYSÉS DE LIMA: Trata-se de ação movida por JOÃO BASQUES em
face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, com o objetivo de obter aaposentadoria
por idade híbrida, a partir da data de entrada do requerimento administrativo, em 26/10/2015
(DER).
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido, condenando o réu a (i) averbar, para fins
de carência, o tempo de atividade rural exercida no período de 19/06/1971 a 31/12/1989; (ii)
implantar o benefício de APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA, a partir da data da citação,
em 30/11/2017; e (iii) pagar as prestações vencidas, corrigidas monetariamente pelo IPCA-E e
juros de mora nos termos do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº
11.960/2009.
O réu recorre, sustentando, em síntese, que (i) não foram juntados os documentos elencados
pelo art. 106 da Lei nº 8.213/91, nem outros aceitos pela jurisprudência; (ii) a certidão de óbito,
de casamento e certificado de reservista, não podem ser utilizados como início de prova
material, pois são a mera instrumentalização de testemunhos prestados, com eficácia de prova
testemunhal; (iii) contratos de parceria rural, comodato, arrendamento rural ou qualquer outros
contratos equivalentes, por serem documentos elaborados sem qualquer formalidade e de fácil
confecção, não são aceitos como prova do labor rural em regime de economia familiar; (iv) título
de eleitor não pode ser utilizado como início de prova material, pois se trata de documentos
elaborado sem qualquer formalidade, sendo retificável a qualquer instante, constituindo mera
instrumentalização de declarações prestadas pelo emitente, com eficácia de prova testemunhal;
(v) documentos escolares são elaborados sem qualquer formalidade, bastando mera
declaração da parte interessada e podem ser alterados a qualquer tempo; (vi) todos os vínculos
constantes no CNIS e na CTPS são de natureza urbana; (vii) não resta caracterizado o regime
de economia familiar; (viii) inexistem informações ou dados dos demais integrantes da
família;(ix) a sentença não observou as balizas fixadas pelo STJ no Tema 995 a respeito da
reafirmação da DER, sendo indevida a concessão do benefício se o direito não se consumou a
partir do ajuizamento da ação; e (x) deveser afastadaacondenação em atrasados, juros de mora
e honorários advocatícios.
O autor ofereceu contrarrazões.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001405-17.2017.4.03.6318
RELATOR:29º Juiz Federal da 10ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: JOAO BASQUES
Advogado do(a) RECORRIDO: ANTONIO MARIO DE TOLEDO - SP47319-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
JUIZ FEDERAL CAIO MOYSÉS DE LIMA(RELATOR):
Prova do tempo de serviço rural.
Com relação à prova do tempo de serviço rural, deve ser observada a regra do art. 55, § 3º, da
Lei nº 8.213/91, segundo o qual “a comprovação do tempo de serviço (...) só produzirá efeito
quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente
testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto
no Regulamento”.
A Turma Nacional de Uniformização já tratou de diversos aspectos da aplicação desse
dispositivo legal, destacando-se as seguintes diretrizes para a avaliação do conjunto probatório:
a) o início de prova material deve ser contemporâneo à prestação dos serviços (Súmula nº 34),
porém nada impede que o julgador estenda para o futuro ou para o passado, de acordo com o
seu prudente arbítrio, a eficácia probatória de um documento, sobretudo se ratificado pelos
demais elementos informativos trazidos aos autos (PEDILEF 0503164-94.2008.4.05.8200, DOU
de 3/5/13);
b) não é necessário, todavia, que o início de prova material corresponda a todo o período objeto
de prova, muito menos que haja correspondência ano a ano, como frequentemente exige o
INSS em sede administrativas (Súmula nº 14 – a súmula menciona a aposentadoria por idade,
mas seu teor se aplica a qualquer benefício, porque diz respeito à prova do tempo rural em
geral), bastando que o início de prova material abranja período extenso o suficiente para
conferir credibilidade ao depoimento das testemunhas e ao conjunto probatório como um todo;
c) admite-se o reconhecimento, para fins previdenciários, da prestação de serviço rural por
menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei nº 8.213/91 (Súmula nº 5); e
d) em se tratando de atividade rural exercida em regime de economia familiar, admite-se que o
início de prova material esteja em nome cônjuge (Súmula nº 6).
Quanto aos tipos de documentos admissíveis como início de prova material, vale o preceito do
art. 669 do Código de Processo Civil:
Art. 369. As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente
legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que
se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz.
Por conseguinte, as vedações aplicáveis são apenas e tão somente aquelas do art. 5º, inciso
LVI, da Constituição Federal (provas obtidas por meios ilícitos) e as do dispositivo acima
transcrito da Lei Processual (provas obtidas por meios moralmente ilegítimos). Não incorrendo a
parte demandante em nenhuma dessas restrições, todos os elementos de prova por ela
apresentados devem ser considerados, merecendo cada qual o valor e o peso que lhe
couberem diante do conjunto probatório como um todo.
Caso concreto
A sentença assim se pronunciou sobre as provas apresentadas:
Para comprovar o fato alegado na inicial, apresentou como início de prova material os seguintes
documentos: i) certidão de casamento civil de João Basques, qualificado como lavrador, e
Terezinha Bianchini, qualificada como do lar, celebrado aos 19/06/1971; ii) termo de associação
à Cooperativa Agrícola Mista de Alvorada do Sul em 30/09/1982; iii) histórico escolar de 1º grau
em nome do aluno Vagner Basques, filho do autor, nascido aos 18/05/1972, que cursou os anos
letivos de 1979 a 1982 na Escola Rural Padre Manoel da Nóbrega, no município de Primeiro de
Maio/PR; iv) Requerimentos de matrícula do aluno Vagner Basques, filho de João Basques
(lavrador), domiciliado em Água da Barra Bonita, município de Primeiro de Maio/PR, datados
em 28/02/1983, 28/02/1986 e 15/02/1989; v) certidão de nascimento de Vandelson Basques,
nascido aos 06/10/1984, filho de João Basques, qualificado como lavrador, e Terezinha
Bianchini Basques; vi) histórico escolar de 1º grau em nome do aluno Valmir Basques, filho do
autor, nascido aos 20/02/1976, que cursou os anos letivos de 1983 a 1986 na Escola Rural
Padre Manoel da Nóbrega, no município de Primeiro de Maio/PR; vii) Requerimentos de
matrícula do aluno Valmir Basques, filho de João Basques (lavrador), domiciliado em Água da
Barra Bonita, município de Primeiro de Maio/PR, datados em 16/02/1987, 08/04/1988 e
15/02/1989; viii) declaração emitida pela Prefeitura Municipal de Primeiro de Maio, datada em
08/12/2013, na qual consta que Valdir Basques estudou na Escola Rural Municipal Padre
Manoel da Nóbrega, no município de Primeiro de Maio/PR, nos anos letivos de 1987 a 1989; ix)
certidão de matrícula nº 1.478 registrada no CRI da Comarca de Primeiro de Maio/PR, referente
ao imóvel rural constituído por um terreno de 5 alqueires adquirido por João Basques,
qualificado como agricultor, por meio de escritura pública de compra e venda pactuada em
15/07/1988; x) cartão de assinatura CAMAS, matrícula nº 1818, em nome do autor, qualificado
como agricultor, com data de admissão em 09/10/1982, domiciliado em Água da Barra Bonita,
município de Primeiro de Maio/PR; xi) notas fiscais emitidas pela Cooperativa Agrícola Mista de
Alvorada do Sul Ltda., nas datas de 23/03/1983, 03/03/1984, 14/03/1985, 18/04/1986,
25/03/1988 e 08/05/1989, figurando como remetente João Basques, domiciliado em Água da
Barra Bonita, município de Primeiro de Maio/PR, retratando a venda de soja a granel.
Colhe-se do extrato CNIS que o autor se filiou ao RGPS em 01/11/1990, na condição de
segurado obrigatório contribuinte individual (empresário/empregador) e verteu contribuições nas
competências de 11/1990 a 12/1990, 03/1991, 05/1991, 08/1991, 05/2004 a 04/2008 e 07/2008
a 11/2015.
[...]
O documento mais antigo juntado aos autos que faz prova do exercício de atividade rural é a
certidão de casamento civil, celebrado aos 19/06/1971, na qual consta a qualificação de rurícola
do autor.
A certidão de nascimento do filho Vandelson Basques, nascido aos 06/10/1984, também
menciona a qualificação de rurícola do genitor.
Os históricos de frequência escolar, os requerimentos de matrículas e a declaração emitida pela
Prefeitura Municipal de Primeiro de Maio/PR fazem prova de que os filhos do autor Vagner
Basques, Valmir Basques e Valdir Basques frequentaram a Escolar Rural Municipal Padre
Manoel da Nóbrega, no município de Primeiro de Maio/PR, nos anos letivos de 1979 a 1989.
Contam, ainda, nos referidos documentos a qualificação de rurícola do autor e o
estabelecimento do domicílio da unidade familiar em Água da Barra Bonita, município de
Primeiro de Maio/PR.
A certidão de matrícula nº 1.478, registrada no CRI da Comarca de Primeiro de Maio/PR,
comprova que o autor adquiriu em 15/07/1988 pequeno imóvel rural constituído por um terreno
de 5 alqueires.
Os documentos carreados aos autos demonstram que o autor era associado, desde
30/09/1982, à Cooperativa Agrícola Mista de Alvora do Sul e praticou com ela atos negociais,
tendo por objeto a comercialização de diminuta produção de soja a granel, entre 1983 e 1989.
Os depoimentos das testemunhas são firmes e seguros, no sentido de que o autor residia com
a esposa e os filhos em Água da Barra Bonita, município de Primeiro de Maio/PR, e se
dedicavam ao plantio e colheita de café, algodão, soja e feijão, sem o auxílio de terceiros.
Pontuaram que até final de 1989 ou início de 1990 o autor permaneceu no imóvel rural e, após,
passou a exercer atividade comercial, tendo sido proprietário da sorveteria ‘Luan Sorvetes’, na
cidade de Bela Vista.
Em relação ao período anterior ao casamento, o autor não exibiu nenhum início razoável de
prova material que retratasse o labor rural, tais como certidão de casamento dos pais ou
certidões de nascimento dele e dos irmãos, nas quais indicassem a qualificação de rurícola do
genitor; título de eleitor ou certificado de reservista contendo a qualificação de trabalhador rural.
Assim fixo o termo inicial do exercício da atividade rural em 19/06/1971. O termo final deve ser
fixado em 31/12/1989, último ano letivo de frequência de escola rural dos filhos do autor e de
comercialização da produção agrícola.
Pela leitura do trecho transcrito, verifica-se que vários dos documentos apresentados são
contemporâneos ao período reconhecido e contêm informação de que o autor era “trabalhador
rural”, o que os torna idôneos como início de prova material, nos termos da Súmula nº 34 da
Turma Nacional de Uniformização. O fato de que alguns dos documentos apenas
instrumentalizam declarações daparteinteressadanão lhes retira a natureza de prova material,
pois as declarações foram feitas contemporaneamente aos fatos. Tais declarações somente
passariam a ter valor de prova meramente testemunhal se prestadas extemporaneamente, com
pretensão de produzirem efeitoretroativo, o que não se dá no presente caso.
As testemunhas ouvidas em juízo confirmaram que o trabalho era exercido em regime de
economia familiar, sem o auxílio de terceiros.
Dessa forma, restou devidamente comprovado o exercício de atividade rural em regime de
economia familiar, no período de 19/06/1971 a 31/12/1989.
Quanto à reafirmação da DER, a sentença assim se pronunciou:
De início, como se pode ver, a instrução deficiente do processo administrativo (evento 14),
acarretada pelo próprio autor, foi sucedida de propositura de ação judicial em que busca a
condenação do INSS ao pagamento das verbas atrasadas do benefício, honorários
advocatícios e despesas processuais, sendo que dispõe de prova documental com
probabilidade de ser reconhecida já na esfera não judicial, sonegando ao INSS o direito de
exercer o seu mister legal de forma correta e eficaz.
A deficiência instrutória do processo administrativo previdenciário é notória, uma vez que o
único documento juntado pelo autor foi a carteira de identidade. Em juízo, instruiu o feito com
diversos documentos aos quais já se encontravam em sua esfera de disponibilidade.
Das duas, uma: ou o autor busca o controle de legalidade do ato administrativo expedido pelo
INSS no processo administrativo NB 41/175.401.624-0, cuja análise judicial ficará adstrita às
provas documentais apresentadas à autarquia no contexto do processo administrativo, ou
formula novo pedido perante o INSS, exibindo as provas documentais que possui.
O que não se revela possível é o comportamento de instruir deficientemente o processo
administrativo e, posteriormente, com provas desconhecidas pela autarquia, postular a
concessão do benefício previdenciário diretamente ao Poder Judiciário.
Nesse sentido, não custa lembrar que o STF (RE 631.240/MG) definiu que não se pode
ingressar diretamente no Poder Judiciário quando o segurado deixou de levar aoconhecimento
da autarquia questão de fato relevante ao objeto da demanda:
[...] ‘Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício
anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação
mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo – salvo
sedepender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração’.
(RE 631240, Relator: Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 03/09/2014,
REPERCUSSÃO GERAL, publicado em 10/11/2014).
Entretanto, em observância ao princípio da primazia da resolução do mérito e o avançado
estado em que se encontra o feito, mister o exame do mérito da ação, ressaltando, contudo,
que eventuais efeitos financeiros ficarão limitados à data da citação da autarquia ré.
Uma vez que tais fundamentos estão em sintonia com meu próprio entendimento, adoto-os
como razão de decidir.
Diante do exposto, voto por negar provimento ao recurso da parte ré.
Condeno o réu ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) do
valor da condenação, nos termos do art. 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil e do art. 55
da Lei nº 9.099/95, considerando a baixa complexidade do tema.
É o voto.
E M E N T A
Dispensada a ementa, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/95, combinado com o art. 1º da Lei
nº 10.259/2001. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Décima Turma
Recursal do Juizado Especial Federal da Terceira Região - Seção Judiciária de São Paulo, por
unanimidade, negar provimento ao recurso da parte ré, nos termos do voto do Juiz Federal
Relator, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
