Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0001250-12.2020.4.03.6317
Relator(a)
Juiz Federal CAIO MOYSES DE LIMA
Órgão Julgador
10ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
14/12/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 26/12/2021
Ementa
E M E N T A
Dispensada a ementa, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/95, combinado com o art. 1º da Lei
nº 10.259/2001.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
10ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001250-12.2020.4.03.6317
RELATOR:29º Juiz Federal da 10ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: VALDECI PEREIRA DOS SANTOS
Advogado do(a) RECORRIDO: GUSTAVO COTRIM DA CUNHA SILVA - SP253645-A
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001250-12.2020.4.03.6317
RELATOR:29º Juiz Federal da 10ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: VALDECI PEREIRA DOS SANTOS
Advogado do(a) RECORRIDO: GUSTAVO COTRIM DA CUNHA SILVA - SP253645-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
JUIZ FEDERAL CAIO MOYSÉS DE LIMA: Trata-se de ação movida por VALDECI PEREIRA
DOS SANTOSem face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, com o
objetivo de obter aposentadoria especial ou por tempo de contribuição, a partir da data de
entrada do requerimento administrativo, em 06/11/2019 (DER), mediante o cômputo de
atividade especial exercida nos períodos de 04/05/1988 a 20/03/1996, de 14/05/1996 a
10/07/1996, de 18/09/1996 a 26/01/2003, de 27/01/2003 a 18/03/2004, de 01/03/2004 a
24/10/2005 ede 04/11/2008 a 06/11/2019, além de computar a data correta de saída da em
relação à empresa "Officio Tecnologia em Vigilância Eletrônica Ltda.", em 24/10/2005.
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido, condenando o réu a (i) averbar, como
tempo de serviço comum, o período de 01/05/2004 a 24/10/2005; (ii) averbar, como tempo de
serviço especial, os períodos de 07/01/1991 a 20/03/1996, de 18/09/1996 a 26/01/2003 ede
01/03/2004 a 24/10/2005; (iii) implantar o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição
integral, a partir de 06/11/2019, com renda mensal inicial no valor de R$ 1.453,24; e (iv) pagar
as prestações vencidas, no valor de R$ 34.101,19, em julho de 2021, conforme cálculos da
Contadoria Judicial em consonância com a Resolução nº 658/2020 do Conselho da Justiça
Federal.
Houve a interposição de recurso por ambas as partes.
Nas razões recursais, o autor sustenta, em síntese, que (i) no período que trabalhou para o
"Município de Santo André", de 04/05/1988 a 20/03/1996, apresentou PPP comprovando a
exposição a "betume", não podendo ser prejudicado pela ausência de responsável pelos
registros ambientais em período anterior a 07/01/1991; (ii) até 05/03/1997 é possível o
enquadramento somente pela categoria profissional de "vigilante", portanto, o período de
14/05/1996 a 10/07/1996 pode ser enquadrado apenas com a apresentação da CTPS; (iii) no
período de 27/01/2003 a 18/03/2004, trabalhou como "vigilante", atuando em fórum e na Caixa
Econômica Federal, locais que, nitidamente, expõem o "vigilante" a roubos ou outras espécies
de violência física; (iv) não pode ser prejudicado pela ausência de responsável pelas condições
ambientais, uma vez que a responsabilidade pela elaboração do PPP é do empregador; e (v)
em relação ao período de 04/11/2008 a 06/11/2009, a sentença não reconheceu a atividade
como especial, porque o responsável pelas condições ambientais não possui registro junto ao
CRM ou CREA, porém o empregado não pode ser prejudicado pela ausência de tal registro.
O réu, por sua vez, requer,o sobrestamento do feito até o julgamento do Tema Repetitivo nº
1.031 pelo Superior Tribunal de Justiça.
No mérito, sustenta, em síntese, que (i) é indevida a antecipação dos efeitos da tutela na
sentença; (ii) em relação ao agente "betume", não há previsão nos Decretos nº 53.831/64 e nº
83.080/79, além da atividade exercida no período de 07/01/1991 a 20/03/1996 não se amoldar à
previsão do anexo 13 da NR-15; (iii) quanto aos períodos de 18/09/1996 a 26/01/2003 e de
01/03/2004 a 24/10/2005, o enquadramento pela categoria profissional somente é possível até
28/04/1995; (iv) a partir de 05/03/1997, não há mais previsão legal para o enquadramento em
razão da periculosidade; (v) o autor não comprovou possuir habilitação para o exercício da
atividade de "vigilante", nem registro no Departamento da Polícia Federal, através da CNV
(Carteira Nacional de Vigilante"; (vi) não há prova do porte de arma de fogo durante a jornada
de trabalho, tampouco da situação de perigo real e efetivo no exercício de suas funções; e (vii)
não há responsável pelos registros ambientais.
O autorofereceu contrarrazões ao recurso do réu.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001250-12.2020.4.03.6317
RELATOR:29º Juiz Federal da 10ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: VALDECI PEREIRA DOS SANTOS
Advogado do(a) RECORRIDO: GUSTAVO COTRIM DA CUNHA SILVA - SP253645-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
JUIZ FEDERAL CAIO MOYSÉS DE LIMA (RELATOR):
Pedido de sobrestamento do feito
Indefiro o pedido de sobrestamento do feito, tendo em vista que o Superior Tribunal de Justiça
já julgou o Tema 1.031 em dezembro de 2020.
Concessão de tutela na sentença
Nos Juizados Especiais Federais, o recurso da sentença tem efeito meramente devolutivo, nos
termos do art. 43 da Lei nº 9.099/95, combinado com o art. 1º da Lei nº 10.259/2001. O autor
tem, portanto, o direito subjetivo de executar provisoriamente a sentença condenatória, ao
menos no tocante à obrigação de fazer, independentemente do trânsito em julgado.
Disso se extrai que a decisão que “concede a tutela” na sentença não confere ao julgado
nenhum efeito que ele já não pudesse produzir por si próprio, mesmo quando o juízo invoca,
desnecessariamente, as disposições do Código de Processo Civil referentes à tutela provisória
para fundamentar a concessão da medida. Ademais, a lei processual admite expressamente
que o juízo determine de ofício a execução provisória da sentença condenatória, fixando, desde
logo, a sanção pecuniária para eventual descumprimento, conforme se depreende da leitura do
art. 536, caput e § 1º, do Código de Processo Civil, verbis:
Art. 536. No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou
não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para efetivação da tutela específica ou a
obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à
satisfação do exequente.
§1º. Para atender ao disposto no ‘caput’, o juiz poderá determinar, entre outras medidas, a
imposição de multa [...]
[...]
Ressalte-se, ainda, que o juízo não necessita analisar os requisitos para a concessão de
medidas de urgência quando o dever de cumprir a obrigação de fazer resulta do efeito normal
da sentença condenatória.
É certo que o réu pode, mesmo assim, pleitear o efeito suspensivo previsto na segunda parte
do art. 43 da Lei nº 9.099/95, demonstrando a existência de risco de dano irreparável resultante
da execução provisória do julgado. Todavia, tal pleito mostra-se agora prejudicado diante do
julgamento do recurso.
Legislação aplicável à atividade especial
A lei aplicável à concessão de benefícios previdenciários é aquela vigente à época do seu fato
gerador. Essa é também, ao menos em princípio, a lei a reger toda a vida contributiva do
segurado, inclusive no tocante ao seu tempo de serviço e à natureza comum ou especial de
suas atividades, na medida em que tais elementos também integram o fato gerador do benefício
previdenciário.
Todavia, esse princípio geral de Direito Intertemporal é limitado pelo direito adquirido, que
recebe especial proteção no art. 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal. Ora, o direito do
segurado a determinada forma de contagem do tempo de serviço é adquirido dia-a-dia, na
exata medida em que o serviço é efetivamente prestado, visto que se trata de um direito
derivado da própria relação jurídica de filiação, que se estabelece diária e continuamente entre
o trabalhador e a Previdência Social.
Quer dizer: aplica-se, como regra geral, a lei vigente na data da ocorrência do fato gerador do
benefício (i.e. data em que implementados os requisitos legais previstos para a sua concessão),
respeitados, no entanto, os direitos adquiridos do segurado quanto à forma de contagem de seu
tempo de serviço.
É evidente, no entanto, que se a lei da época da concessão do benefício for mais benéfica ao
segurado, não haverá violação do direito adquirido, pois a garantia constitucional em questão
tem por finalidade proteger o segurado e não prejudicá-lo. Assim, nada impede que os efeitos
da lei nova, mais benéfica, irradiem sobre todo o período contributivo do segurado.
Em razão disso e com vistas a facilitar a aplicação dos dois princípios de Direito Intertemporal
mencionados, é possível sintetizá-los num único enunciado: a lei aplicável à contagem do
tempo de serviço é aquela em vigor na data em que a atividade foi desempenhada pelo
segurado, salvo lei posterior mais benéfica.
Daí não haver contradição alguma nos posicionamentos jurisprudenciais que ora determinam a
aplicação da legislação em vigor na data da concessão do benefício e ora entendem aplicável a
lei da época da prestação dos serviços, conforme exemplificam os enunciados da Súmula nº 55
da Turma Nacional de Uniformização e da Súmula nº 13 das Turmas Recursais dos Juizados
Especiais Federais da 3ª Região:
Súmula nº 55 (TNU) - A conversão do tempo de atividade especial em comum deve ocorrer
com aplicação do fator multiplicativo em vigor na data da concessão da aposentadoria.
Súmula nº 13 (TR/3ªR) - Em matéria de comprovação de tempo de serviço especial, aplica-se a
legislação vigente à época da prestação do serviço.
A aplicação da lei posterior mais benéfica significa, na prática, que:
a) é possível o reconhecimento da natureza especial de atividades exercidas mesmo antes da
antiga Lei Orgânica da Previdência Social – LOPS (Lei nº 3.807/60), que criou o benefício de
aposentadoria especial, visto que referida lei irradiou seus efeitos sobre todo o histórico
contributivo dos segurados;
b) não há óbice algum à conversão do tempo de serviço especial anterior à vigência da Lei nº
6.887/80; e
c) os critérios mais benéficos de enquadramento e conversão das atividades especiais,
incluindo fatores de conversão, níveis de tolerância etc., podem ser aplicados retroativamente,
sem ofensa ao princípio “tempus regit actum”.
Enquadramento das atividades especiais
Os arts. 58 e 152 da Lei nº 8.213/91, em sua redação original, estabeleceram que a relação das
atividades consideradas especiais, isto é, das “atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à
integridade física”, seria objeto de lei específica e que, até o advento dessa lei, permaneceriam
aplicáveis as relações de atividades especiais que já vigoravam antes do advento da nova
legislação previdenciária.
Assim, por força dos referidos dispositivos legais, continuaram a vigorar as relações de
atividades especiais constantes dos quadros anexos aos Decretos nº 53.831/64 e 83.080/79,
conforme expressamente reconhecido pelos sucessivos regulamentos do Plano de Benefícios
(cf. art. 295 do Decreto nº 357/91, art. 292 do Decreto nº 611/92 e art. 70, parágrafo único, do
Decreto nº 3.048/99, em sua redação original).
O fundamento para considerar especial determinada atividade, nos termos dos Decretos nº
53.831/64 e 83.080/79, sempre foi o potencial de lesar a saúde ou a integridade física do
trabalhador em razão da periculosidade, penosidade ou insalubridade inerente à atividade em
questão. Havia nos decretos acima mencionados dois critérios autônomos para o
enquadramento das atividades especiais: (i) a categoria profissional do segurado (códigos
iniciados pelo número “2”; e (ii) a exposição a agente nocivo de natureza física, química ou
biológica (códigos iniciados pelo número “1”).
Tais formas de enquadramento encontravam respaldo não apenas no art. 58, como também no
art. 57 da Lei nº 8.213/91, segundo o qual o segurado do RGPS faria jus à aposentadoria
especial quando comprovasse período mínimo de trabalho prejudicial à saúde ou à atividade
física “conforme a atividade profissional”. A Lei nº 9.032/95 alterou a redação desse dispositivo
legal, dele excluindo a expressão “conforme a atividade profissional”, mas manteve em vigor os
arts. 58 e 152 da Lei nº 8.213/91.
Com o advento da Medida Provisória nº 1.523/96, sucessivamente reeditada até sua ulterior
conversão na Lei nº 9.528/97, foi alterada a redação do art. 58 e revogado o art. 152 da Lei nº
8.213/91, introduzindo-se duas importantes modificações quanto à qualificação das atividades
especiais: (i) no lugar da “relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à
integridade física” passaria a haver uma “relação dos agentes nocivos químicos, físicos e
biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física”, e (ii) essa
relação não precisaria mais ser objeto de lei específica, atribuindo-se ao Poder Executivo a
incumbência de elaborá-la.
Servindo-se de sua nova atribuição legal, o Poder Executivo baixou o Decreto nº 2.172/97, que
trouxe em seu Anexo IV a relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos a que
refere a nova redação do art. 58 da Lei nº 8.213/91 e revogou, como consequência, as relações
de atividades profissionais que constavam dos quadros anexos aos Decretos nº 53.831/64 e
83.080/79. Posteriormente, o Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 foi substituído pelo Anexo IV do
Decreto nº 3.048/99, que permanece ainda em vigor.
Observa-se, portanto, que houve, durante certo tempo, a sobreposição de regras
aparentemente conflitantes. Os Decretos nº 53.831/64 e 83.080/79 estabeleciam o
enquadramento das atividades não apenas pela exposição a agentes nocivos, mas também
pelo critério da categoria profissional, enquanto a nova redação dada ao art. 58 da Lei nº
8.213/91 somente mencionava a primeira forma de enquadramento e não a última.
Conforme se depreende da leitura do art. 273, inciso II, da Instrução Normativa nº 45/2010, o
INSS interpretou as alterações legislativas no sentido de que, a partir da entrada em vigor da
Lei 9.032/95, não seria mais possível o enquadramento das atividades por categoria
profissional.
Equivocada, no entanto, a referida interpretação, pois os Decretos nº 53.831/64 e 83.080/79,
mesmo no que se refere ao critério do enquadramento por categoria profissional, sempre
empregaram, como fundamento para a qualificação das atividades especiais, a penosidade,
insalubridade ou periculosidade ligadas intrinsecamente a tais atividades. Ora, uma vez que
essa forma de enquadramento traz implícita a ideia de que o trabalhador, por exercer certo tipo
de atividade, presumivelmente esteve exposto a condições prejudiciais à saúde ou à integridade
física, não há nela qualquer incompatibilidade com as alterações introduzidas pela Lei nº
9.032/95 ou pela MP nº 1.523/96.
Assim, continua válido o enquadramento por categoria profissional para as atividades exercidas
até o advento do Decreto nº 2.172/97, pois somente com esse decreto tal critério de
enquadramento foi efetivamente abolido.
Prova do exercício de atividade especial
A redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 não trazia regra acerca da prova do exercício da
atividade especial.
Seguiam-se, portanto, no âmbito administrativo, as regras estabelecidas pelas sucessivas
instruções normativas baixadas pelo INSS para disciplinar os procedimentos de seu setor de
benefícios, a última das quais é a Instrução Normativa INSS/PRES nº 45/2010, com suas
diversas alterações. Tais regras tradicionalmente exigiram, relativamente ao período em que
vigorava a redação original dos arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213/91, a comprovação do exercício da
atividade especial por meio de formulário próprio (SB-40/DSS-8030), o qual, somente no caso
de exposição ao agente nocivo ruído, deveria vir acompanhado de laudo pericial atestando os
níveis de exposição (cf. incisos I e II do art. 256 da IN 45/2010).
Na esfera jurisdicional, nunca houve qualquer razão, ao menos em relação às atividades
exercidas durante a vigência da redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91, para limitar ou
tarifar os meios de prova aptos a comprovar o exercício de atividade especial, especialmente
em virtude do princípio do livre convencimento do juiz (art. 131 do Código de Processo Civil).
Todavia, a apresentação dos formulários preenchidos pelo empregador sempre se mostrou um
importante elemento de convicção do juízo, visto que sem tal documento torna-se quase
impossível determinar quais foram as atividades efetivamente exercidas pelo segurado e os
seus respectivos períodos. Ademais, também no âmbito judicial tem sido exigida a
apresentação de laudo pericial quando não se possa, por outro meio, verificar a intensidade de
exposição ao agente nocivo, como é o caso, por exemplo, da exposição ao ruído.
A já citada MP nº 1.523/96 (atual Lei nº 9.528/97), mediante a introdução de quatro parágrafos
ao art. 58 da Lei nº 8.213/91, finalmente estabeleceu regras quanto à prova do exercício da
atividade especial. Passou então a ser exigida por lei a apresentação do formulário próprio (o
Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP) e, ainda, a elaboração, para todo e qualquer agente
nocivo (e não apenas para o caso de ruído), de laudo técnico de condições ambientais do
trabalho expedido por profissional habilitado (médico do trabalho ou engenheiro de segurança
do trabalho).
Deixou de ser obrigatória, no entanto, a apresentação do laudo juntamente com o formulário,
pois o PPP, desde que elaborado com base em laudo técnico, dispensa a apresentação do
próprio laudo, conforme disposto no art. 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91, e no art. 68, § 3º, do
Decreto nº 3.048/99.
Importante notar, ainda, que, no caso das atividades enquadradas por categoria profissional,
prescinde-se da elaboração de laudo técnico para a comprovação da efetiva exposição a
agentes nocivos, pois, pela lógica intrínseca a essa forma de enquadramento, o simples fato de
o trabalhador pertencer a uma determinada categoria profissional já pressupõe que as
atividades por ele exercidas são prejudiciais à saúde ou à integridade física.
No que se refere ao uso de tecnologias de proteção aptas a atenuar os efeitos do agente
nocivo, a MP nº 1.523/96 passou a exigir que constassem do laudo técnico informações
relativas ao uso de equipamentos de proteção coletiva (EPCs). Somente após o advento da Lei
nº 9.732/98 é que se passou a exigir também a inclusão de informações sobre o uso de
equipamentos de proteção individual (EPIs).
Deve-se ressaltar, no entanto, que a menção ao uso de EPCs e EPIs é mero requisito formal
dos laudos técnicos, não afastando, por si só, a natureza especial da atividade, quando não
comprovado que a nocividade foi totalmente eliminada pelo uso dos referidos equipamentos.
Atividade de vigilante
Para efeito de enquadramento por categoria profissional, o código 2.5.7 do quadro anexo ao
Decreto n.º 53.831/64 menciona apenas “bombeiros, investigadores e guardas”.
É de se indagar, portanto, se a expressão “guarda” utilizada no código acima mencionado pode
ser interpretada extensivamente para abranger os vigilantes.
A resposta deve ser afirmativa, tendo em vista o teor da Súmula 26 da Turma Nacional de
Uniformização - TNU, que prevê:
Súmula 26 - A atividade de vigilante enquadra-se como especial, equiparando-se à de guarda,
elencada no item 2.5.7 do Anexo III do Decreto n. 53.831/64.
Dessa forma, o enquadramento da atividade de vigilante, por categoria profissional, não exige
prova do porte de arma de fogo.
O Superior Tribunal de Justiça e a Turma Nacional de Uniformização, no julgamento do REsp
1306113/ SC (na sistemática de recursos repetitivos) e dos PEDILEFs 50495075620114047000
e 05308334520104058300, respectivamente, alteraram em parte esse entendimento ao
exigirem a comprovação do porte de arma de fogo a partir da entrada em vigor da Lei nº
9.032/95, mediante a apresentação de formulário emitido pelo empregador. Assentaram
também a tese de que a atividade de vigilante permaneceu especial, em razão da
periculosidade, mesmo após a edição do Decreto nº 2.172/97, devendo-se, a partir de então,
comprovar o porte de arma de fogo por meio de formulário do empregador fundado em perícia
técnica.
Esse entendimento foi alterado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento da Petição nº
10.679-RN (2014/0233212-2), onde se afirmou que “é possível reconhecer a possibilidade de
caracterização da atividade de vigilante como especial, com ou sem o uso de arma de fogo,
mesmo após 05/03/1997, desde que comprovada a exposição do trabalhador à atividade
nociva, de forma permanente, não ocasional, nem intermitente”.
Em recente decisão proferida pela mesma Corte Superior no Tema nº 1.031, foi assentada a
seguinte tese:
É admissível o reconhecimento da especialidade da atividade de Vigilante, com ou sem o uso
de arma de fogo, em data posterior à Lei 9.032/1995 e ao Decreto 2.172/1997, desde que haja
a comprovação da efetiva nocividade da atividade, por qualquer meio de prova até 5.3.1997,
momento em que se passa a exigir apresentação de laudo técnico ou elemento material
equivalente, para comprovar a permanente, não ocasional nem intermitente, exposição à
atividade nociva, que coloque em risco a integridade física do Segurado.
Conforme constou do voto do relator, Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, “deve-se
compreender que a profissão de Vigilante expõe, intuitivamente, o Trabalhador a riscos,
nocividades, perigos, danos físicos e emocionais de não pequena monta, que frequentemente
se manifestam na proximidade da velhice sob forma de fobias, síndrome de perseguição,
neuroses, etc. [...] Não há na realidade das coisas da vida como se separar a noção de
nocividade da noção de perigo, ou a noção de nocividade da noção de dano ou lesão, pois tudo
isso decorre, inevitavelmente, da exposição da pessoa a fatores inumeráveis, como a
ansiedade prolongada, o medo constantes, a inquietação espiritual diante de perseguições e
agressões iminentes, etc.”
Ainda, a Turma Regional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais da 3ª Região, no
julgamento proferido nos autos do PUIL nº 0001178-68.2018.4.03.9300, foi fixada a seguinte
tese:
Com relação ao labor exercido antes da vigência da Lei 9.032/1995, comprovada a efetiva
periculosidade, não se presumindo com base na anotação na CTPS, é possível reconhecer a
especialidade da função de ‘vigilante’ por categoria profissional, em equiparação à de guarda,
prevista no item 2.5.7 do quadro a que se refere o art. 2º do Decreto n. 53.831/1964, com ou
sem a comprovação do uso de arma de fogo, nos moldes previstos no Tema 1.031 do STJ.
Assim, considerando os precedentes acima, devem ser aplicados os seguintes critérios de
prova e enquadramento para a atividade de vigilante, independentemente do porte de arma de
fogo:
a) até 28/04/1995: enquadramento por categoria profissional, bastando, portanto, a
comprovação do exercício da atividade por meio de formulário;
b) de 29/04/1995 a 05/03/1997: enquadramento em razão da periculosidade, por meio de
formulário emitido pelo empregador; e
c) a partir de 05/03/1997: enquadramento em razão da periculosidade, por meio de formulário
embasado em perícia técnica.
Caso concreto
Para comprovação da atividade especial, o autor apresentou os seguintes documentos:
a) cópia da CTPS (págs. 43-44, 59-60 e 62 do ID 122999522) onde consta que, nos períodos
de 04/05/1988 a 20/03/1996, de 14/05/1996 a 10/07/1996, de 18/09/1996 a 26/01/2003, de
27/01/2003 a 18/03/2004, de 01/03/2004 a 24/10/2005 ede 04/11/2008 a 06/11/2019, trabalhou
para "Prefeitura Municipal de Santo André" (ajudante geral), "Líder Segurança S/C Ltda."
(vigilante), "GP Guarda Patrimonial de São Paulo S/C Ltda." (vigilante), "Vigilância Pedroza
Ltda." (vigilante), "Officio Serviços de Vigilância e Segurança Ltda." (vigilante) e ""Essencial
Sistema de Segurança Ltda" (vigilante), respectivamente;
b) PPP da "Prefeitura de Santo André" (págs. 78-79 do ID 122999522), dando conta de que, no
período de 04/05/1988 a 20/03/1996, trabalhou como "ajudante geral", com exposição a "breu
betume". O documento está devidamente assinado, carimbado e com indicação de responsável
pelos registros ambientais a partir de 07/01/1991;
c) PPP da "GP Guarda Patrimonial de São Paulo Ltda." (págs. 81-82 do ID 122999522), onde
consta que, no período de 18/09/1996 a 26/01/2003, trabalhou como "vigilante", consistente, em
síntese, em fazer ronda pelo local de trabalho, munido de arma de fogo calibre 38; O
documento está devidamente assinado, carimbado e com indicação do responsável pelos
registros ambientais em todo o período;
d) PPP elaborado pelo administrador judicial da massa falida da "Vigilância Pedrozo Ltda."
(págs. 86-87 do ID 122999522), dando conta de que, no período de 27/01/2003 a 18/03/2004 o
autor trabalhou como "vigilante" no "Fórum de Mauá" e na "N. Caixa". O documento está
devidamente assinado pelo administrador judicial, porém não há descrição da atividade
exercida, nem menção à exposição a algum fator de risco, além da inexistência de informações
sobre o responsável pelos registros ambientais;
e) PPP da "Officio Serviços de Vigilância e Segurança Ltda." (págs. 92-93 do ID 122999522),
onde consta que, no período de 01/03/2004 a 24/10/2005, trabalhou como "vigilante",
consistente, em síntese, em proteger as dependências da empresa, a vida dos funcionários e
sua própria vida, fazer ronda em todas as dependências da empresa, portando arma de fogo
calibre 38. O documento está devidamente assinado, carimbado e com informação sobre o
responsável pelos registros ambientais em todo o período; e
f) PPP da "Essencial Sistema de Segurança Eireli" (págs. 102-103 do ID 122999522), dando
conta de que, no período de 04/11/2008 a 06/10/2017 (data da emissão do documento),
trabalhou como "vigilante", consistente, em síntese, em efetuar rondas na divida da área,
procurando evitar invasões e/ou roubos, além de zelar pelo patrimônio da empresa. O
documento está devidamente assinado, carimbado e com indicação do responsável pelos
registros ambientais em todo o período.
Com base na documentação apresentada, possível o enquadramento de todo o período de
04/05/1988 a 20/03/1996 no código 1.2.11 do quadro anexo ao Decreto nº 53.831/64 e no
código 1.2.10 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79, tendo em vista que o "breu betume" é um
hidrocarboneto.
A exigibilidade de laudo técnico, em se tratando de agente químico, somente surgiu a partir de
05/03/1997, portanto, a falta de indicação de responsável pelos registros ambientais no período
anterior a 07/01/1991, não afasta a possibilidade do reconhecimento da atividade como
especial.
Ainda, somente a partir da edição do Decreto nº 3.048/99 é se que passou a exigir a indicação
de concentração do agente químico. Dessa forma, uma vez que se trata de período anterior,
basta a avaliação qualitativa.
Possível, também, o enquadramento dos períodosde 18/09/1996 a 26/01/2003,de 01/03/2004 a
24/10/2005ede 04/11/2008 a 06/10/2017, tendo em vista que,base na descrição das atividades,
entendo que ficou suficientemente comprovada a periculosidade, já que o autor tinha
atribuições relacionadas à segurança patrimonial, sendo certo que naquelas mencionadas nos
itens “c” e “e” chegou inclusive a portar arma de fogo.
Os requisitos adicionais mencionados no recurso do INSS, tais como “possuir habilitação para o
exercício da profissão” e “registro no Departamento da Polícia Federal” não estão previstos na
legislação, nem constam da jurisprudência firmada pelo STJ sobre o tema.
Os períodos de 14/05/1996 a 10/07/1996,de 27/01/2003 a 18/03/2004 e de 07/10/2017 a
06/11/2019somente podem ser computados como tempo de serviço comum.O primeiro e o
último, porque somente houve apresentação de CTPS, o que não é suficiente conforme o
entendimento firmado pelaTurma Regional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais
da 3ª Região, no julgamento proferido nos autos do PUIL nº 0001178-68.2018.4.03.9300. O
segundo, porque o documento apresentado não é hábil à comprovação da efetiva
periculosidade.
Note-se que, nos termos do art. 373, inciso I, do Código de Processo Civil, é do autor o ônus da
prova de fato constitutivo de seu direito, cabendo a ele a apresentação de todos os documentos
necessários à comprovação da atividade especial.
Passo à análise do direito à aposentadoria especial:
Com base na contagem elaborada pela Contadoria Judicial (ID 197411172), ajustando o tempo
de serviço especial na forma acima especificada, a parte autora, até a data de entrada do
requerimento administrativo, somava apenas 24anos, 9meses e 23dias de tempo
exclusivamente especial, conforme contagem efetuada utilizando ferramenta de cálculo da
Justiça Federal:
Portanto, não tendo cumprido os 25 anos de tempo especial necessários para a concessão da
aposentadoria especial, o autor somente faz jus à aposentadoria por tempo de contribuição.
Diante do exposto, voto por negar provimento ao recurso da parte ré e dar parcial provimento
ao recurso da parte autora, para reformar em parte a sentença, a fim de condenar o INSS
aaverbar, como tempo de serviço especial, convertendo em tempo de serviço comum, com o
acréscimo legal, os períodos de 04/05/1988 a 06/01/1991 e de 04/11/2008 a 06/010/2017, que
deverão ser somados aos tempo de contribuição já reconhecido na sentença.
Condeno a parte ré ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento)
do valor da condenação, nos termos do art. 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil e do art.
55 da Lei nº 9.099/95, considerando a baixa complexidade do tema.
É o voto.
E M E N T A
Dispensada a ementa, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/95, combinado com o art. 1º da Lei
nº 10.259/2001. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Décima Turma
Recursal do Juizado Especial Federal da Terceira Região - Seção Judiciária de São Paulo, por
unanimidade, negar provimento ao recurso da parte ré e dar parcial provimento ao recurso da
parte autora, nos termos do voto do Juiz Federal Relator, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
