Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0001316-39.2018.4.03.6324
Relator(a)
Juiz Federal CAIO MOYSES DE LIMA
Órgão Julgador
10ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
14/12/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 26/12/2021
Ementa
E M E N T A
Dispensada a ementa, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/95, combinado com o art. 1º da Lei
nº 10.259/2001.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
10ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001316-39.2018.4.03.6324
RELATOR:29º Juiz Federal da 10ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) RECORRENTE: EVERALDO ROBERTO SAVARO JUNIOR - SP206234-N,
TITO LIVIO QUINTELA CANILLE - SP227377-N
RECORRIDO: ANA LUCIA BUOSI
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Advogados do(a) RECORRIDO: DARIO ZANI DA SILVA - SP236769-N, JOSE DARIO DA
SILVA - SP142170-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001316-39.2018.4.03.6324
RELATOR:29º Juiz Federal da 10ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) RECORRENTE: EVERALDO ROBERTO SAVARO JUNIOR - SP206234-N,
TITO LIVIO QUINTELA CANILLE - SP227377-N
RECORRIDO: ANA LUCIA BUOSI
Advogados do(a) RECORRIDO: DARIO ZANI DA SILVA - SP236769-N, JOSE DARIO DA
SILVA - SP142170-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
JUIZ FEDERAL CAIO MOYSÉS DE LIMA: Trata-se de ação movida por ANA LÚCIA BUOSI em
face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS,com o objetivo de obter
aposentadoria por tempo de contribuição, a partir da data de entrada do requerimento
administrativo, em 14/06/2017 (DER), mediante o cômputo de atividade rural exercida no
período de 26/08/1975 a 19/09/1996.
A sentença julgouparcialmente procedente o pedido, condenando o réu a averbar, como tempo
de serviço rural, o período de 26/08/1975 a 31/10/1982, para todos os efeitos, exceto carência e
contagem recíproca.
Houve interposição de recurso por ambas as partes.
Nas razões recursais, a autora sustenta que (i) em todo o período de 26/08/1975 a 19/09/1996
foi trabalhadora rural em regime de economia familiar, no Sítio São Francisco, de propriedade
de seu pai, Bruno Buosi; (ii) o início de prova material foi corroborado pelas testemunhas; (iii)
não se exige um documento para cada ano a ser comprovado, bastando que os documentos
apresentados evidenciem o início e o término do período; (iv) o regime de economia familiar é
um regime de colaboração mútua dos membros da família e, portanto, os documentos
formalizados em nome de algum dos membros da família, seja ele o pai, o marido ou até
mesmo irmão, estende-se aos demais do grupo familiar, desde que comprovado o parentesco e
a real prestação das atividades rurais; e (v) o fato de genitor ter iniciado atividade laborativa não
constitui óbice, por si só, ao enquadramento da autora como segurada especial, uma vez que já
é pacificado nos tribunais o entendimento de que o exercício de atividade urbana por um dos
membros do grupo familiar não descaracteriza a condição de segurado especial dos demais.
O réu, por sua vez, sustenta, em síntese, que (i) a autora não apresentou um único documento
em nome próprio para comprovar o exercício de labor rural; (ii) na declaração de imposto de
renda do seu pai, a autora, no período de 1986 a 1990 figura como dependente, mas com a
profissão de "estudante" e, nas declarações de 1991 a 1993 sequer aparece como dependente;
(iii) os documentos em nome do pai da autora somente indicam a propriedade, não havendo
prova da alegada atividade rural em regime de economia familiar; (iv) o pai da autora ostenta a
qualidade de empresário junto ao INSS desde 01/11/1981, tendo recolhido contribuições na
qualidade de "empresário-empregador" no período de 11/1981 a 01/1985 e de 01/1995 a
06/1993; (v) em todas as DECAPS apresentadas, não consta assinalado o campo de que o pai
da autora explorava a atividade agroeconômica em regime de economia familiar, mas com
"concurso de empregados", denotando que a terra não era trabalhada apenas pela família; (vi)
da DECAP em nome do tio da autora (sócio de seu pai), também consta expressamente o
concurso de empregados; (vii) na declaração de imposto de renda do pai da autora, a partir de
1983, consta que o seu pai era proprietário de vários imóveis rurais (metade da Fazenda São
Francisco de 66,5 hectares, metade do Sítio Santa Tereza, de 28,3 hectares, metade do Sítio
Santa Luzia, de 36,3 hectares e metade da compra de 7,26 hectares anexo ao Sítio Santa
Luíza), o que descaracteriza o regime de economia familiar: (viii) em depoimento pessoal, a
autora confessou que seu pai foi proprietário de posto de gasolina, sem esclarecer o período
que seu pai manteve referida atividade empresarial; e (ix) o pai da autora era proprietário de
variados equipamentos agrícolas, como trator Agrale, pulverizador Holder, trator Massey
Ferguson, cultivador, plantadeira e adubadeira, que denotam a exploração em larga escala.
A autoraofereceu contrarrazões ao recurso do réu.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIO
JUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS
ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001316-39.2018.4.03.6324
RELATOR:29º Juiz Federal da 10ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogados do(a) RECORRENTE: EVERALDO ROBERTO SAVARO JUNIOR - SP206234-N,
TITO LIVIO QUINTELA CANILLE - SP227377-N
RECORRIDO: ANA LUCIA BUOSI
Advogados do(a) RECORRIDO: DARIO ZANI DA SILVA - SP236769-N, JOSE DARIO DA
SILVA - SP142170-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
JUIZ FEDERAL CAIO MOYSÉS DE LIMA (RELATOR):
Cômputo de atividade rural como tempo de serviço/contribuição.
Nos termos do art. 55, § 2º, da Lei nº. 8.213/91, o tempo de serviço rural anterior a 25/07/1991
pode ser computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele
correspondentes, exceto para efeito de carência.
Isso porque, sob o regime da antiga Lei Orgânica da Previdência Social – LOPS (Lei nº
3.807/60), os trabalhadores rurais (assim considerados os que cultivavam a terra) estavam
excluídos do regime previdenciário aplicável aos trabalhadores urbanos e não podiam gozar
dos benefícios próprios desse regime. Isso era o que resultava dos arts. 2º, inciso I, e 3º, inciso
II, da LOPS, na redação original:
“Art. 2º São beneficiários da previdência social:
I - na qualidade de ‘segurados’, todos os que exercem emprego ou atividade remunerada no
território nacional, salvo as exceções expressamente consignadas nesta Lei.
(...)”
“Art. 3º São excluídos do regime desta lei:
(...)
II - os trabalhadores rurais assim entendidos, os que cultivam a terra e os empregados
domésticos, salvo, quanto a estes, o disposto no art. 166.
(...)”
O art. 166 da LOPS determinava a realização de estudos para a futura inclusão dos
trabalhadores rurais no regime geral de previdência, mas a legislação superveniente acabou por
estabelecer para os trabalhadores rurais um regime próprio, distinto daquele aplicável aos
trabalhadores urbanos. Por essa razão, a Lei nº 5.890/73, ao excluir do art. 3º da LOPS a
definição de ‘trabalhador rural’, deixou a matéria para a ‘legislação própria’:
“Art. 3º São excluídos do regime desta lei:
II - os trabalhadores rurais, assim definidos na forma da legislação própria.
(...)”
O regime próprio de previdência dos trabalhadores rurais foi criado pelo Estatuto do
Trabalhador Rural (Lei nº 4.214/63) e era inicialmente administrado pelo Instituto de
Aposentadorias e Pensões dos Industriários - IAPI. Esse regime tinha fonte própria de custeio,
advinda do Fundo de Assistência do Trabalhador Rural - FUNRURAL (denominado inicialmente
“Fundo de Assistência e Previdência do Trabalhador Rural” até a alteração promovida pelo art.
8º do Decreto-lei nº 564/69).
O trabalhador rural, definido como “toda pessoa física que presta serviços a empregador rural,
em propriedade rural ou prédio rústico, mediante salário pago em dinheiro ou ‘in natura’, ou
parte ‘in natura’ e parte em dinheiro” (art. 2º), era segurado obrigatório do sistema, assim como
“os colonos ou parceiros, bem como os pequenos proprietários rurais, empreiteiros, tarefeiros e
as pessoas físicas que explorem as atividades previstas no art. 3º desta Lei [atividades
agrícolas, pastoris ou na indústria rural, assim considerado o estabelecimento não abrangido
pela Consolidação das Leis do Trabalho], estes com menos de cinco empregados a seu
serviço” (art. 160).
Podiam ingressar no sistema, na qualidade de segurados facultativos, “os proprietários em
geral, os arrendatários, demais empregados rurais não previstos no artigo anterior, bem como
os titulares de firma individual, diretores, sócios, gerentes, sócios solidários, sócios quotistas,
cuja idade seja, no ato da inscrição até cinquenta anos” (art. 161).
O sistema próprio dos trabalhadores rurais não oferecia o benefício de aposentadoria por tempo
de serviço. Estavam à disposição dos segurados e seus dependentes apenas os benefícios e
serviços listados no art. 164 do Estatuto: assistência à maternidade, auxílio-doença,
aposentadoria por invalidez ou velhice, pensão por morte, assistência médica e auxílio-funeral.
Com as alterações introduzidas pelo Decreto-lei nº 276/67, a administração do sistema passou
ao então Instituto Nacional de Previdência Social – INPS. O rol de segurados obrigatórios foi
modificado e passou a incluir, além dos trabalhadores rurais, “os pequenos produtores rurais,
na qualidade de cultivadores ou criadores, diretos e pessoais, definidos em regulamento”.
Paralelamente a esse regime previdenciário, o Decreto-lei nº 564/69 instituiu o Plano Básico de
Previdência Social destinado a “aos empregados não abrangidos pelo sistema geral da Lei nº
3.807” (art. 1º). Tornaram-se segurados obrigatórios do novo sistema os empregados e
trabalhadores avulsos do setor rural da agroindústria canavieira e de outras empresas
organizadas em nível que permitisse sua inclusão no sistema (art. 2º). O Plano Básico oferecia
aos segurados tão-somente os benefícios de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e
aposentadoria por velhice (art. 3º).
O rol de segurados do Plano Básico foi alterado pelo Decreto-lei nº 704/69 e passou a incluir
apenas os empregados do setor agrário da empresa agroindustrial (art. 2º), com previsão de
extensão do plano, no futuro, aos empregados das empresas produtoras e fornecedoras de
produto agrário in natura e dos empreiteiros ou organizações não constituídos sob a forma de
empresa que utilizassem mão-de-obra para a produção e o fornecimento de produto agrário in
natura.
Com o advento da Lei Complementar nº 11/71, alterada pela Lei Complementar nº 16/71, os
dois regimes previdenciários então existentes para o trabalhador rural (o regime do Estatuto do
Trabalhador Rural e o do Plano Básico de Previdência Social) foram substituídos pelo Programa
de Assistência ao Trabalhador Rural - PRORURAL.
Nos termos do art. 3º da Lei Complementar nº 11/71 e o art. 4º da Lei Complementar nº 16/71,
o PRORURAL abrangia o trabalhador rural com vínculo de emprego (inclusive aquele que
prestava serviços exclusivamente de natureza rural às empresas agroindustriais e
agrocomerciais) e o pequeno produtor, proprietário ou não, que trabalhasse sozinho ou em
regime de economia familiar:
“Art. 3º - São beneficiários do Programa de Assistência instituído nesta Lei Complementar o
trabalhador rural e seus dependentes.
§ 1º - Considera-se trabalhador rural, para os efeitos desta Lei Complementar:
a) a pessoa física que presta serviços de natureza rural a empregador, mediante remuneração
de qualquer espécie;
b) o produtor, proprietário ou não que, sem empregado, trabalhe na atividade rural,
individualmente ou em regime de economia familiar, assim entendido o trabalho dos membros
da família indispensável à própria subsistência e exercido em condições de mútua dependência
e colaboração.
§ 2º - Considera-se dependente o definido como tal na Lei Orgânica da Previdência Social e
Legislação posterior em relação aos segurados do Sistema Geral de Previdência Social.”
“Art. 4º - Os empregados que prestam exclusivamente serviços de natureza rural às empresas
agroindustriais e agrocomerciais são considerados beneficiários do PRORURAL, ressalvado o
disposto no parágrafo único deste artigo.
Parágrafo único - Aos empregados referidos neste artigo que, pelo menos, desde a data da Lei
Complementar nº 11, de 25 de maio de 1971, vêm sofrendo, em seus salários, o desconto da
contribuição devida ao INPS, é garantida a condição de segurados desse Instituto, não podendo
ser dispensados sendo por justa causa, devidamente comprovada em inquérito administrativo a
cargo do Ministério do Trabalho e Previdência Social.”
Somente podiam gozar do regime de previdência aplicável aos trabalhadores urbanos os
empregados das empresas agroindustriais ou agrocomerciais que já estivessem contribuindo
para esse regime pelo menos desde maio de 1971. Os demais trabalhadores permaneciam
vinculados ao regime próprio dos trabalhadores rurais.
O PRORURAL, tal como os sistemas previdenciários anteriores, não oferecia o benefício de
aposentadoria por tempo de serviço. O art. 2º da Lei Complementar nº 11/71 menciona apenas
os benefícios de aposentadoria por velhice, aposentadoria por invalidez, pensão e auxílio-
funeral.
A situação assim perdurou até o advento da Constituição Federal de 1988, que unificou os
regimes urbano e rural ao estabelecer, no inciso II do parágrafo único de seu art. 194, como
objetivo da seguridade social, a “uniformidade e equivalência de benefícios e serviços às
populações urbanas e rurais”.
Esse objetivo foi concretizado pela Lei nº 8.213/91, que incluiu expressamente os trabalhadores
rurais, com ou sem vínculo de emprego, na relação de segurados obrigatórios do RGPS,
conforme resulta de seu art. 11, transcrito abaixo na redação atualmente em vigor, com as
alterações promovidas pelas Leis nº 8.647/93, 9.876/99 e 11.718/2008:
“Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
I - como empregado:
a) aquele que presta serviço de natureza urbana ou rural à empresa, em caráter não eventual,
sob sua subordinação e mediante remuneração, inclusive como diretor empregado;
(...)
V - como contribuinte individual:
a) a pessoa física, proprietária ou não, que explora atividade agropecuária, a qualquer título, em
caráter permanente ou temporário, em área superior a 4 (quatro) módulos fiscais; ou, quando
em área igual ou inferior a 4 (quatro) módulos fiscais ou atividade pesqueira, com auxílio de
empregados ou por intermédio de prepostos; ou ainda nas hipóteses dos §§ 9º e 10 deste
artigo;
(...)
f) o titular de firma individual urbana ou rural, o diretor não empregado e o membro de conselho
de administração de sociedade anônima, o sócio solidário, o sócio de indústria, o sócio gerente
e o sócio cotista que recebam remuneração decorrente de seu trabalho em empresa urbana ou
rural, e o associado eleito para cargo de direção em cooperativa, associação ou entidade de
qualquer natureza ou finalidade, bem como o síndico ou administrador eleito para exercer
atividade de direção condominial, desde que recebam remuneração;
g) quem presta serviço de natureza urbana ou rural, em caráter eventual, a uma ou mais
empresas, sem relação de emprego;
(...)
VI - como trabalhador avulso: quem presta, a diversas empresas, sem vínculo empregatício,
serviço de natureza urbana ou rural definidos no Regulamento;
VII - como segurado especial: o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o
garimpeiro, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades,
individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de
terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14
(quatorze) anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo
familiar respectivo.
(...)”
Desse modo, somente com a unificação dos sistemas previdenciários o trabalhador rural
passou a fazer jus à aposentadoria por tempo de serviço. E foi por essa razão (isto é, porque o
trabalhador rural, antes da unificação mencionada, não possuía perfil contributivo adequado à
aposentadoria por tempo de serviço) que o art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/91 introduziu a regra de
transição pela qual o trabalho rural anterior ao regime unificado passaria a ser computado como
tempo de serviço, mas continuaria não podendo ser considerado para efeito de carência.
Note-se que, nos termos do art. 4º da Emenda Constitucional nº 20/98, o “tempo de serviço
considerado pela legislação vigente para efeito de aposentadoria” deve ser computado “como
tempo de contribuição” até que sobrevenha nova disciplina legal sobre a matéria.
A questão já está pacificada na jurisprudência, conforme se depreende do enunciado da
Súmula nº 24 da Turma Nacional de Uniformização:
“Súmula nº 24 – O tempo de serviço do segurado trabalhador rural anterior ao advento da Lei nº
8.213/91, sem o recolhimento de contribuições previdenciárias, pode ser considerado para a
concessão de benefício previdenciário do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), exceto
para efeito de carência, conforme a regra do art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/91.”
O recolhimento passou a ser obrigatório, no entanto, relativamente à atividade rural exercida a
partir da vigência da nova lei.
Observe-se, no entanto, que, em se tratando de empregado rural, mesmo a atividade rural
exercida antes de 1991 pode ser considerada para fins de carência, conforme entendimento do
Superior Tribunal de Justiça em precedente analisado sob a sistemática dos recursos
repetitivos. Confira-se:
“PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA.
APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. AVERBAÇÃO DE TRABALHO RURAL COM
REGISTRO EM CARTEIRA PROFISSIONAL PARA EFEITO DE CARÊNCIA. POSSIBILIDADE.
ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 55, § 2º, E 142 DA LEI 8.213/91. NÃO OCORRÊNCIA.
RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.
1. Caso em que o segurado ajuizou a presente ação em face do indeferimento administrativo de
aposentadoria por tempo de serviço, no qual a autarquia sustentou insuficiência de carência.
2. Mostra-se incontroverso nos autos que o autor foi contratado por empregador rural, com
registro em carteira profissional desde 1958, razão pela qual não há como responsabilizá-lo
pela comprovação do recolhimento das contribuições.
3. Não ofende o § 2º do art. 55 da Lei 8.213/91 o reconhecimento do tempo de serviço exercido
por trabalhador rural registrado em carteira profissional para efeito de carência, tendo em vista
que o empregador rural, juntamente com as demais fontes previstas na legislação de regência,
eram os responsáveis pelo custeio do fundo de assistência e previdência rural (FUNRURAL).
4. Recurso especial improvido. Acórdão sujeito ao regime do art.543-C do CPC e Resolução
STJ nº 8/2008.
(REsp 1352791/SP, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em
27/11/2013, DJe 05/12/2013)”
Por fim, cumpre ressaltar que a regra do art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/91, que autoriza o
cômputo, como tempo de serviço, do período de atividade rural anterior à data da vigência da
referida lei, independentemente do recolhimento das contribuições, aplica-se tão-somente ao
“trabalhador rural”, conceito que abrange apenas os segurados empregados, trabalhadores
eventuais e segurados especiais.
Não se incluem, portanto, no conceito de trabalhador rural os empresários rurais, mesmo os
pequenos empresários, pois para estes sempre vigorou a regra geral que exige o recolhimento
das contribuições para o cômputo do tempo de serviço.
Prova do tempo de serviço rural.
Com relação à prova do tempo de serviço rural, deve ser observada a regra do art. 55, § 3º, da
Lei nº 8.213/91, segundo o qual “a comprovação do tempo de serviço (...) só produzirá efeito
quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente
testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto
no Regulamento”.
A Turma Nacional de Uniformização já tratou de diversos aspectos da aplicação desse
dispositivo legal, destacando-se as seguintes diretrizes para a avaliação do conjunto probatório:
a) o início de prova material deve ser contemporâneo à prestação dos serviços (Súmula nº 34),
porém nada impede que o julgador estenda para o futuro ou para o passado, de acordo com o
seu prudente arbítrio, a eficácia probatória de um documento, sobretudo se ratificado pelos
demais elementos informativos trazidos aos autos (PEDILEF 0503164-94.2008.4.05.8200, DOU
de 3/5/13);
b) não é necessário, todavia, que o início de prova material corresponda a todo o período objeto
de prova, muito menos que haja correspondência ano a ano, como frequentemente exige o
INSS em sede administrativas (Súmula nº 14 – a súmula menciona a aposentadoria por idade,
mas seu teor se aplica a qualquer benefício, porque diz respeito à prova do tempo rural em
geral), bastando que o início de prova material abranja período extenso o suficiente para
conferir credibilidade ao depoimento das testemunhas e ao conjunto probatório como um
todo;c) admite-se o reconhecimento, para fins previdenciários, da prestação de serviço rural por
menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei nº 8.213/91 (Súmula nº 5); ed) em se tratando de
atividade rural exercida em regime de economia familiar, admite-se que o início de prova
material esteja em nome cônjuge (Súmula nº 6).
Caso concreto
Para comprovação da atividade rural em regime de economia familiar, no período de
26/08/1975 a 19/09/1996, a autora apresentou, conforme relacionados na sentença, os
seguintes documentos:
Visando comprovar suas alegações, a parte autora anexou aos autos cópia dos seguintes
documentos que merecem ser destacados: CTPS da autora com a primeira anotação em
20/09/96, no cargo de vendedora; declaração de exercício de atividade rural sob nº 01/2017;
recibo de entrega de declaração de IR em nome de Bruno Buosi, genitor da autora, qualificado
como agricultor, exercício 1975, na qual a autora figura como dependente, e tendo como
endereço Fazenda Invernada; notas fiscais nas quais o genitor da autora figura como
destinatário da mercadoria, emitidas em 1975, 1978/79, 1984, 89; notas fiscais emitidas em
1990/91, nas quais o senhor Bruno Buosi figura como fornecedor de laranja; declaração de
rendimentos do genitor da autora, exercício 1976, na qual consta que o mesmo possuía 50% de
um imóvel rural com 34 alqueires de extensão; declarações de produtor rural de 1977/81, em
nome do genitor da autora, Fazenda São Francisco, com anotação de que o senhor Bruno
explora atividade agroeconômica com ajuda de parceiros; declaração de imposto de renda de
1981, na qual consta que o senhor Bruno Buosi é proprietário de estabelecimento agrícola e
reside na Fazenda Invernada; declaração de produtor rural exercício 1982, em nome de Nestor
G Buosi e Bruno Buosi, Fazenda São Francisco, na qual consta que o declarante explora a
atividade com concurso de empregados; DECAP nº 211/86, 021/87, 82/89, 91/94, em nome de
Bruno Buosi e outro, Fazenda São Francisco; declarações de imposto de renda em nome de
Bruno Buosi, de 1983 e 1985/86, anexo 4, nas quais constam que o genitor da autora possuía
metade da Fazenda São Francisco com 66,7 has, metade do Sítio Santa Tereza, com 28,3 has,
metade do Sítio Santa Luzia com 36,3 has, equipamentos agrícolas; declaração de rendimentos
de 1991 em nome de Bruno Buosi, tendo como bens: sítio são Francisco, com 70 has,
equipamentos agrícolas; certificado de cadastro INCRA da Fazenda São Francisco, com 3,3
módulos fiscais de 1987; demonstrativo de gado de 1996, Fazenda São Francisco.
Os documentos relacionados podem ser considerados como início de prova material.
Resta verificar a natureza da atividade exercida e o período em que esta se deu.
O conteúdo dos documentos apresentados deixam dúvidas sobre a natureza da atividade
exercida. Explico.
O regime de economia familiar é definido em lei como “a atividade em que o trabalho dos
membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento
socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e
colaboração, sem a utilização de empregados permanentes” (art. 11, § 1º, da Lei nº 8.213/91).
Trata-se, em outras palavras, da agricultura de mera subsistência, em que não se visa
primariamente ao lucro, mas à manutenção da família. Daí a participação de todos no trabalho
em relação de mútua dependência e colaboração.
Note-se que essa definição, embora introduzida por lei de 2008, aplica-se ao autor por duas
razões: (i) a lei aplicável é aquela em vigor na data em que supostamente implementados todos
os requisitos para a obtenção do benefício pretendido; e (ii) trata-se de definição legal
meramente declarativa, introduzida pela nova lei com o intuito de aclarar conceito de natureza
constitucional (cf. arts. 195, § 8º, e 201, § 7º, inciso II, da Constituição Federal).
No presente caso, a autora apresentou declaração de imposto de renda de seu pai (pág. 15 do
ID 97920350), onde consta que a família possuía várias propriedades rurais, além de vários
equipamentos agrícolas.
Consta ainda, na "Declaração do Produtor Rural" (págs. 128-129 do ID 97920344) que a
atividade era exercida "com o concurso de empregados".
Dessa forma, o que sobressai do conjunto probatório é que a autora não demonstrou
suficientemente sua condição de seguradaespecial (regime de economia familiar), pois há fortes
indícios nos autos de que talvez sua família fosse detentora de uma empresa rural. Nesse caso,
como era seu o ônus da prova, a dúvida deve pesar em seu desfavor.
Diante do exposto, voto por dar provimento ao recurso da parte ré, para julgar improcedente a
ação. Prejudicado o recurso da parte autora.
Sem condenação em honorários, porque somente o recorrente vencido deve arcar com as
verbas sucumbenciais, nos termos do art. 55 da Lei nº 9.099/95, combinado com o art. 1º da Lei
nº 10.259/2001.
É o voto.
E M E N T A
Dispensada a ementa, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/95, combinado com o art. 1º da Lei
nº 10.259/2001. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Décima Turma
Recursal do Juizado Especial Federal da Terceira Região - Seção Judiciária de São Paulo, por
unanimidade, dar provimento ao recurso da parte ré, nos termos do voto do Juiz Federal
Relator, restando prejudicado o recurso da parte autora, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
