Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0001815-16.2019.4.03.6315
Relator(a)
Juiz Federal MARCIO RACHED MILLANI
Órgão Julgador
8ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
09/12/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 27/12/2021
Ementa
E M E N T A
Dispensada a ementa por interpretação extensiva do artigo 46 da Lei nº 9.099/95, segunda parte.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
8ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001815-16.2019.4.03.6315
RELATOR:22º Juiz Federal da 8ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: A. C. J. D. C.
REPRESENTANTE: KAREN CRISTINA DE JESUS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001815-16.2019.4.03.6315
RELATOR:22º Juiz Federal da 8ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: A. C. J. D. C.
REPRESENTANTE: KAREN CRISTINA DE JESUS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso inominado interposto pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
contra a sentença, que julgou procedente o pedido formulado na petição inicial para condená-lo
a conceder Benefício Assistencial de Prestação Continuada de Amparo ao Deficiente a
AMYLEE CRISTINA JESUS DE CAMPOS, com DIB (data de início do benefício) em
12.06.2018.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001815-16.2019.4.03.6315
RELATOR:22º Juiz Federal da 8ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: A. C. J. D. C.
REPRESENTANTE: KAREN CRISTINA DE JESUS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 203, caput, estabelece que “a assistência social
será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social”,
assegurando, nos termos do inciso V, “a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à
pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à
própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei”.
Referido comando constitucional foi regulamentado pela Lei nº 8.742, de 07 de dezembro de
1993, que, ao dispor sobre a organização da Assistência Social, instituiu o Benefício de
Prestação Continuada, nos seguintes termos:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à
pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem
não possuir meios de prover a própria manutenção nem tê-la provida por sua família. (Redação
dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 1º Para os efeitos do disposto no ‘caput’, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou
companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos
solteiros e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
(Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 2º Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual
ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação
plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação
dada pela Lei nº 13.146, de 2015)
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a
família cuja renda mensal ‘per capita ́ seja: (Redação dada pela Lei nº 13.982, de 2020)
I – Inferior a um quarto do salário mínimo. (Redação dada pela Medida Provisória nº 1.023, de
2020)
§ 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com
qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os de assistência
médica e da pensão especial de natureza indenizatória. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de
2011)
§ 5º A condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o direito do
idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada. (Redação dada pela
Lei nº 12.435, de 2011)
§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de
impedimento de que trata o § 2º, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas
por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS.
(Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 7º Na hipótese de não existirem serviços no município de residência do beneficiário, fica
assegurado, na forma prevista em regulamento, o seu encaminhamento ao município mais
próximo que contar com tal estrutura. (Incluído pela Lei nº 9.720, de 30.11.1998)
§ 8º A renda familiar mensal a que se refere o § 3º deverá ser declarada pelo requerente ou seu
representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o
deferimento de pedido. (Incluído pela Lei nº 9.720, de 30.11.1998)
§ 9º Os rendimentos decorrentes de estágio supervisionado e de aprendizagem não serão
computados para fins de cálculo da renda familiar ‘per capita’ a que se refere o § 3º deste
artigo. (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015)
§ 10 Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2º deste artigo, aquele que
produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 11 Para a concessão do benefício de que trata o ‘caput’ deste artigo, poderão ser utilizados
outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de
vulnerabilidade, conforme regulamento. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015)
§ 12 São requisitos para a concessão, a manutenção e a revisão do benefício as inscrições no
Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) e no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo
Federal - Cadastro Único, conforme previsto em regulamento. (Incluído pela Lei nº 13.846, de
2019)
§ 13 (...)
§ 14 O benefício de prestação continuada ou o benefício previdenciário no valor de até 1 (um)
salário-mínimo concedido a idoso acima de 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou pessoa com
deficiência não será computado, para fins de concessão do benefício de prestação continuada a
outro idoso ou pessoa com deficiência da mesma família, no cálculo da renda a que se refere o
§ 3º deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
§ 15 O benefício de prestação continuada será devido a mais de um membro da mesma família
enquanto atendidos os requisitos exigidos nesta Lei. (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
Art. 20-A. Em razão do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6,
de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional
decorrente do coronavírus (Covid-19), o critério de aferição da renda familiar mensal per capita
previsto no inciso I do § 3º do art. 20 poderá ser ampliado para até ½ (meio) salário-mínimo.
(Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
§ 1º A ampliação de que trata o caput ocorrerá na forma de escalas graduais, definidas em
regulamento, de acordo com os seguintes fatores, combinados entre si ou isoladamente:
(Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
I – grau de dependência; (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
II – a dependência de terceiros para o desempenho de atividades básicas da vida diária;
(Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
III – as circunstâncias pessoais e ambientais e os fatores socioeconômicos e familiares que
podem reduzir a funcionalidade e a plena participação social da pessoa com deficiência
candidata ou do idoso; (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
IV – o comprometimento do orçamento do núcleo familiar de que trata o § 3º do art. 20
exclusivamente com gastos com tratamentos de saúde, médicos, fraldas, alimentos especiais e
medicamentos do idoso ou da pessoa com deficiência não disponibilizados gratuitamente pelo
Sistema Único de Saúde (SUS), ou com serviços não prestados pelos Serviço Único de
Assistência Social (Suas), desde que comprovadamente necessários à preservação da saúde e
da vida. (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
§ 2º O grau de deficiência e o nível de perda de autonomia, representado pela dependência de
terceiros para o desempenho de atividades básicas da vida diária, de que tratam,
respectivamente, os incisos I e II do § 1º deste artigo, serão aferidos, para a pessoa com
deficiência, por meio de índices e instrumentos de avaliação funcional a serem desenvolvidos e
adaptados peara a realidade brasileira, observados os termos dos §§ 1º e 2º do art. 2º da Lei nº
13.146, de 6 de julho de 2015. (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
§ 3º As circunstâncias pessoais e ambientais e os fatores socioeconômicos de que trata o inciso
III do § 1º deste artigo levarão em consideração, observado o disposto nos §§ 1º e 2º do art. 2º
da Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015, entre outros aspectos: (Incluído pela Lei nº 13.982, de
2020)
I – inferior a um quarto do salário-mínimo;
II – a acessibilidade e a adequação do local de residência à limitação funcional, as condições de
moradia e habitabilidade, o saneamento básico e o entorno familiar e domiciliar; (Incluído pela
Lei nº 13.982, de 2020)
III – a existência e a disponibilidade de transporte público e de serviços públicos de saúde e de
assistência social no local de residência do candidato ao benefício; (Incluído pela Lei nº 13.982,
de 2020)
IV – a dependência do candidato ao benefício em relação ao usos de tecnologias assistivas; e
(Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
V – o número de pessoas que convivem com o candidato ao benefício e a coabitação com outro
idoso ou pessoa com deficiência dependente de terceiros para o desempenho de atividades
básicas da vida diária. (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
§ 4º O valor referente ao comprometimento do orçamento do núcleo familiar com gastos com
tratamento de saúde, médicos, fraldas, alimentos especiais e medicamentos do idoso ou da
pessoa com deficiência, de que trata o inciso IV do § 1º deste artigo, será definido pelo Instituto
Nacional do Seguro Social, a partir de valores médios dos gastos realizados pelas famílias
exclusivamente com essas finalidades, conforme critérios definidos em regulamento, facultada
ao interessado a possibilidade de comprovação, nos termos do referido regulamento, de que os
gastos efetivos ultrapassam os valores médios. (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)
Art. 21. O benefício de prestação continuada deve ser revisto a cada 2 (dois) anos para
avaliação da continuidade das condições que lhe derem origem.
§ 1º O pagamento do benefício cessa no momento em que forem superadas as condições
referida no ‘caput’, ou em caso de morte do beneficiário.
§ 2º O benefício será cancelado quando se constatar irregularidade na sua concessão ou
utilização.
§ 3º O desenvolvimento das capacidades cognitivas, motoras ou educacionais e a realização de
atividades não remuneradas de habilitação e reabilitação, entre outras, não constituem motivo
de suspensão ou cessação do benefício da pessoa com deficiência. (incluído pela lei nº 12.435,
de 2011)
§ 4º A cessação do benefício de prestação continuada concedido à pessoa com deficiência não
impede nova concessão do benefício, desde que atendidos os requisitos definidos em
regulamento. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
Art. 21-A. O benefício de prestação continuada será suspenso pelo órgão concedente quando a
pessoa com deficiência exercer atividade remunerada, inclusive na condição de
microempreendedor individual. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 1º Extinta a relação trabalhista ou a atividade empreendedora de que trata o ‘caput’ deste
artigo e, quando for o caso, encerrado o prazo de pagamento do seguro-desemprego e não
tendo o beneficiário adquirido direito a qualquer benefício previdenciário, poderá ser requerida a
continuidade do pagamento do benefício suspenso, sem necessidade de realização de perícia
médica ou reavaliação da deficiência e do grau de incapacidade para esse fim, respeitado o
período de previsão previsto no ‘caput’ do art. 21. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 2º A contratação de pessoa com deficiência como aprendiz não acarreta a suspensão do
benefício de prestação continuada, limitado a 2 (dois) anos o recebimento concomitante da
remuneração e do benefício. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
Observa-se que a LOAS – Lei de Organização da Assistência Social (Lei nº 8.742/93), em seu
artigo 20, § 3º, inciso I, considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência
ou idosa a família cuja renda mensal “per capita” seja inferior a ¼ (um quarto) do salário-
mínimo.
O E. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 567.985, ao qual
atribuiu repercussão geral, declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronuncia de nulidade,
do dispositivo legal destacado no parágrafo anterior, observando a proliferação “de leis que
estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios assistenciais”.
A flexibilização, por parte da Suprema Corte, do requisito objetivo estampado na LOAS relativo
ao limite da renda per capita familiar para a concessão do Benefício de Amparo Social, surgiu
da necessidade de melhor adequá-lo à realidade social do país e garantir a efetividade do
comando estampado no artigo 203, inciso V, da Constituição da República, e está
fundamentada na edição de leis que instituíram novos benefícios assistenciais, como a Lei n.º
9.533/97, que instituiu o programa federal de garantia de renda mínima, ou a Lei n.º
10.2019/2001, regulada pelo Decreto n.º 4.313/2002, que criou o programa “Bolsa Escola”, que
adotaram o critério de renda mensal per capita inferior a ½ (meio) salário-mínimo para definir
seu público alvo.
Nesse sentido:
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA AO IDOSO E AO DEFICIENTE
– ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
1. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V, da
Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário
mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
2. Art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo
Supremo Tribunal Federal na ADI 1.232. Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que “considera-
se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja
renda mensal per capita seja inferior a ¼ (um quatro) do salário mínimo”. O requisito financeiro
estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria
que situações de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do
benefício assistencial previsto constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de
Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do
art. 20, § 3º, da LOAS.
3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de
inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo
Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do
critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS. Como a lei permaneceu inalterada,
elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e de
se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes.
Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão
de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a
Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01,
que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio
financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a
ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a
rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade dos critérios objetivos. Verificou-
se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas
(políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos
patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios
assistenciais por parte do Estado brasileiro).
4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da
Lei 8.742/1993.
5. Recurso extraordinário a que se nega provimento.
(STF, Tribunal Pleno, RE 567.985/MT, Relator Ministro Marco Aurélio, Relator para Acórdão
Ministro Gilmar Mendes, julgado em 18/04/2013, DJe de 03/10/2013).
Reporto-me, nesse ponto, à Súmula nº 21 da Turma Regional de Uniformização de
Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais da 3ª Região: “Súmula 21 – Na concessão do
benefício assistencial, deverá ser observado como critério objetivo a renda per capita de ½
salário mínimo, gerando presunção relativa de miserabilidade, a qual poderá ser infirmada por
critérios subjetivos em caso de renda superior ou inferior a ½ salário mínimo”.
Cabe ressaltar, no entanto, que como bem destacado na supracitada Súmula nº 21 da TRU3, a
presunção de miserabilidade conferida pelo preenchimento do critério objetivo (renda per capita
inferior a ½ salário-mínimo) é apenas relativa, podendo ser infirmada quando haja elementos
comprobatórios de que a parte autora possui meios de prover de maneira digna, ainda que
minimamente, suas necessidades básicas.
É exatamente o que estabelece o § 11 do artigo 20 da Lei nº 8.742/1993 ao dispor que
“poderão ser utilizados outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo
familiar e da situação de vulnerabilidade”.
Em outras palavras: mesmo quando comprovado que a renda per capita do núcleo familiar não
ultrapasse a metade do salário-mínimo, o Benefício Assistencial de Prestação Continuada de
Amparo ao Idoso e ao Deficiente não será devido quando a aferição das reais condições
socioeconômicas indicar de maneira segura que o postulante ao benefício não se encontra em
situação de extrema vulnerabilidade social.
Exemplificando: independentemente do preenchimento do critério objetivo, o benefício não será
devido quando as condições de moradia e habitabilidade do postulante, bem como os bens
materiais que guarnecem sua residência, não condizem com a alegada situação de
miserabilidade. Não pode ser classificado como miserável, também como exemplo, o
proprietário de veículo automotor.
Também não é devido o benefício àquele que possua familiares que, mesmo não residindo sob
o mesmo teto, tenham capacidade econômica para auxiliá-lo. Isto porque, a teor do disposto no
artigo 203, inciso V da Constituição Federal a obrigação constitucional do Estado de prestar
assistência financeira a idosos e deficientes está condicionada à inexistência de familiares
capazes de assegurar a manutenção desses indivíduos.
Vale destacar, nesse ponto, os artigos 1.694 e 1.696 do Código Civil, que dispõem acerca da
obrigatoriedade de prestação de alimentos recíproca entre pais e filhos.
Reporto-me, nesse ponto, à Súmula nº 23 da Turma Regional de Uniformização de
Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais da 3ª Região: “Súmula 23 – O benefício de
prestação continuada (LOAS) é subsidiário e para sua concessão não se prescinde da análise
do dever legal de prestar alimentos previsto no Código Civil”.
Há precedentes do Supremo Tribunal Federal nesse sentido. Vejamos:
EMENTA Agravos regimentais em reclamação. Perfil constitucional da reclamação. Ausência
dos requisitos. Recursos não providos. 1. Por atribuição constitucional, presta-se a reclamação
para preservar a competência do STF e garantir a autoridade de suas decisões (art. 102, inciso
I, alínea l, CF/88), bem como para resguardar a correta aplicação de súmula vinculante (art.
103-A, § 3º, CF/88). 2. A jurisprudência desta Corte desenvolveu parâmetros para a utilização
dessa figura jurídica, dentre os quais se destaca a aderência estrita do objeto do ato reclamado
ao conteúdo das decisões paradigmáticas do STF. 3. A definição dos critérios a serem
observados para a concessão do benefício assistencial depende de apurado estudo e deve ser
verificada de acordo com as reais condições sociais e econômicas de cada candidato à
beneficiário, não sendo o critério objetivo de renda per capta o único legítimo para se aferir a
condição demiserabilidade.Precedente (Rcl nº 4.374/PE) 4. Agravos regimentais não providos.
(STF – Supremo Tribunal Federal; Rcl-AgR 4154; Relator Ministro DIAS TOFFOLI; Plenário,
19.09.2013) (grifo nosso)
No tocante à definição de deficiente para fins de concessão do Benefício Assistencial de
Prestação Continuada, a teor do disposto no artigo 20, § 2º da Lei n.º 8.742/93, com a redação
dada pela Lei n.º 13.146/2015, “considera-se pessoa com deficiência aquela que tem
impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em
interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas”.
Nesse ponto, deve ser destacado o § 10 do supracitado artigo 20 da Lei nº 8.742/93, incluído
pela Lei nº 12.470/2011, e em plena vigência, que assim dispõe: “Considera-se impedimento de
longo prazo, para os fins do § 2º deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de
2 (dois) anos”.
Da análise das normas acima transcritas, verifica-se ser clara e categórica a intenção do
legislador, ao regulamentar o Benefício Assistencial de Prestação Continuada de Amparo ao
Deficiente, no valor de 01 (um) salário-mínimo mensal, de destiná-lo exclusivamente aos
portadores de deficiências que acarretem impedimentos por, no mínimo, 02 (dois) anos.
Referido dispositivo legal, por definir expressa e taxativamente o conceito de impedimentos de
longo prazo, trata-se de norma fechada, que não comporta interpretações extensivas por parte
do Poder Judiciário, a quem compete zelar pelo cumprimento da lei, nos exatos termos
insculpidos pelo legislador.
Por fim, tenho por oportuno salientar que a idade do postulante jamais pode ser invocada como
justificativa para a concessão de Benefício Assistencial de Prestação Continuada de Amparo ao
Deficiente, eis que se trata de contingência social já amparada pela LOAS, desde que seja igual
ou superior a 65 (sessenta e cinco) anos.
Estabelecidas estas premissas e passando à análise do caso concreto, Observo que a prova
pericial médica, elaborada por profissional qualificado, de confiança do Juízo e equidistante das
partes, cujo nível de especialização é indubitavelmente suficiente para promover a análise do
quadro clínico apresentado nos autos, indica de forma clara e amplamente fundamentada que a
parte autora apresenta impedimentos de longo prazo (por período superior a dois anos) que, em
interação com diversas barreiras, obstruem a sua participação plena e efetiva na sociedade em
igualdade de condições com as demais pessoas, de modo que se enquadra no amplo conceito
de deficiente estabelecido no artigo 20, §§ 2º e 10 da Lei n.º 8.742/93, com as alterações
introduzidas pela Lei n.º 12.470/2011.
Cumpre-me destacar, nesse ponto, com o conceito de deficiência não se confunde
necessariamente com situação de incapacidade para o trabalho, conforme já estabelecido pela
TNU – Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais,
no julgamento do PEDILEF n.º 0073261-97.2014.4.03.6301, em 21.11.2018, sob a sistemática
dos recursos repetitivos representativos de controvérsia (Tema 173), que alterou a sua Súmula
de número 48, que passou a conter a seguinte redação: “Para fins de concessão do benefício
assistencial de prestação continuada, o conceito de pessoa com deficiência, que não se
confunde necessariamente com situação de incapacidade laborativa, é imprescindível a
configuração de impedimento de longo prazo de duração mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido
no caso concreto, desde a data do início de sua caracterização.”
No mais, observo que o conjunto probatório, com especial destaque para o laudo
socioeconômico, demonstra de forma efetiva, segura e satisfatória que a parte autora encontra-
se em estado de miserabilidade e em situação de vulnerabilidade social que justificam a
concessão do benefício de prestação continuada instituído da Lei n.º 8.742/93 (Lei de
Organização da Assistência Social), na medida em que não dispõe de meios de prover de
maneira digna, sequer minimamente, as suas necessidades básicas, tampouco possuiu
familiares capazes de provê-las.
Pela leitura e análise da sentença recorrida, verifico que a questão discutida nos autos foi
decidida em conformidade com as provas produzidas e, ainda, segundo critérios previstos em
Lei, na Constituição Federal e na jurisprudência pacificada no âmbito de nossos Tribunais.
Assim sendo, por estar em perfeita consonância com o entendimento deste relator em
julgamentos análogos, ratifico e adoto os mesmos fundamentos do aresto recorrido, nos termos
do que dispõe o artigo 46, da Lei nº 9.099/1995, c/c o artigo 1º, da Lei n.º 10.259/2001.
Esclareço, a propósito, que o Supremo Tribunal Federal concluiu que a adoção pelo órgão
revisor das razões de decidir do ato impugnado não implica violação ao artigo 93, inciso IX, da
Constituição Federal, em razão da existência de expressa previsão legal permissiva. Nesse
sentido, trago à colação o seguinte julgado da Corte Suprema:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. MATÉRIA
INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA INDIRETA. JUIZADO ESPECIAL. REMISSÃO AOS
FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. INOCORRÊNCIA.
1. Controvérsia decidida à luz de legislações infraconstitucionais. Ofensa indireta à Constituição
do Brasil.
2. O artigo 46 da Lei n. 9.099/95 faculta ao Colégio Recursal do Juizado Especial a remissão
aos fundamentos adotados na sentença, sem que isso implique afronta ao artigo 93, IX, da
Constituição do Brasil. Agravo regimental a que se nega provimento.
(STF, 2ª Turma, AgRg em AI 726.283/RJ, Relator Ministro Eros Grau, julgado em 11/11/2008,
votação unânime, DJe de 27/11/2008).
Ante todo o exposto, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS e mantenho integralmente
a sentença recorrida.
Desde que a parte autora esteja representada por advogado regularmente constituído, condeno
o recorrente vencido ao pagamento de honorários advocatícios no percentual 10% do valor da
condenação ou, não havendo condenação pecuniária, de 10% do valor atualizado da causa,
nos termos do artigo 55, “caput”, segunda parte, da Lei nº 9.099/1995, combinado com o artigo
1º da Lei 10.259/2001. Na hipótese da parte autora não estar representada por advogado, ou se
representada pela Defensoria Pública da União, fica o recorrente vencido desobrigado do
pagamento da verba honorária.
É o voto.
E M E N T A
Dispensada a ementa por interpretação extensiva do artigo 46 da Lei nº 9.099/95, segunda
parte. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso do réu, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
