Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0000975-74.2021.4.03.6302
Relator(a)
Juiz Federal MARCIO RACHED MILLANI
Órgão Julgador
8ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
24/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 08/03/2022
Ementa
E M E N T A
Dispensada a ementa por interpretação extensiva do artigo 46 da lei n.º 9.099/95, segunda parte.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
8ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000975-74.2021.4.03.6302
RELATOR:22º Juiz Federal da 8ª TR SP
RECORRENTE: IVONE APARECIDA BERNARDES
Advogado do(a) RECORRENTE: EDILEUZA LOPES SILVA - SP290566-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000975-74.2021.4.03.6302
RELATOR:22º Juiz Federal da 8ª TR SP
RECORRENTE: IVONE APARECIDA BERNARDES
Advogado do(a) RECORRENTE: EDILEUZA LOPES SILVA - SP290566-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A parte autora ajuizou ação em face do INSS requerendo a concessão de aposentadoria por
idade híbrida, mediante o cômputo de tempo de serviço rural, laborado em regime de economia
familiar, entre os anos de 1967 e 1973 e de 1999 a 2007.
A sentença julgou improcedente o pedido.
A parte autora recorreu requerendo a procedência da demanda.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000975-74.2021.4.03.6302
RELATOR:22º Juiz Federal da 8ª TR SP
RECORRENTE: IVONE APARECIDA BERNARDES
Advogado do(a) RECORRENTE: EDILEUZA LOPES SILVA - SP290566-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O pedido foi assim julgado:
“(...)
Dúvida não há de que a parte autora completou 60 anos em 2015 conforme documento de
identidade anexado ao processo.
Quanto à carência, seu implemento dependerá da demonstração de número de contribuições
superiores a 180 meses, conforme art. 25, II, da lei 8.213/91.
No que toca ao tempo de serviço rural pleiteado, esclareço que, em sede de comprovação ou
de reconhecimento de tempo de serviço há que se observar, em princípio, o teor do disposto no
art. 55, § 3º da Lei 8.213/91, que exige a conjunção do binômio início de prova material com a
prova testemunhal.
Ocorre que não há nos autos início de prova material apto a comprovar o efetivo desempenho
de atividade rural pela autora, sem registro em CTPS, no período requerido - até completar 36
anos de idade.
Observo que a autora atingiu 12 anos de idade em 1967 e atingiu 36 anos em 1991. De fato,
não há nos autos qualquer documento contemporâneo ao período em questão, apto a
demonstrar o desempenho de atividade rural pela autora.
Logo, ante a ausência de documento apto a servir como início de prova material da prestação
do trabalho rural no período requerido, a improcedência do pedido é medida que se impõe.
Ante o exposto, julgo improcedente o pedido extinguindo o processo com julgamento de mérito,
com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil.
(...)”
O recurso não merece provimento.
Com efeito, embora o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento dos Recursos Especiais nº
1.674.221/SP e nº 1.788.404/PR, realizado em 14.08.2019, sob a sistemática dos recursos
repetitivos representativos de controvérsia (Tema 1007), tenha admitido a utilização do período
rural remoto para fins de concessão do benefício, o fato é que a prova dos autos não indica o
exercício do referido serviço rural por parte da autora.
Nesse passo, a respeito do reconhecimento do tempo pretendido, destaco, inicialmente, o
disposto no artigo 55, §§ 2º e 3º, da Lei n.º 8.213/91:
Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento,
compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de
segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de
segurado.
§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência
desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele
correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante
justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito
quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente
testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto
no Regulamento.
Decorre do dispositivo legal acima transcrito que a prova testemunhal, produzida de forma
exclusiva, é inapta à comprovação do tempo de serviço, seja em atividades rurais, seja em
atividades urbanas. É exigido pela lei um mínimo de documentação, que torne verossímeis as
alegações do segurado.
Nesse passo, o artigo 106 do referido diploma legal, com a redação dada pela Lei n.º
11.718/2008, apresenta um rol exemplificativo dos documentos aptos a configurar início de
prova material para fins de comprovação do exercício de trabalho rural:
Art. 106. A comprovação do exercício de atividade rural será feita, alternativamente, por meio
de:
I – contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdência Social;
II – contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural;
III – declaração fundamentada de sindicato que represente o trabalhador rural ou, quando for o
caso, de sindicato ou colônia de pescadores, desde que homologada pelo Instituto Nacional do
Seguro Social – INSS;
IV – comprovante de cadastro do Instituto nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA,
no caso de produtores em regime de economia familiar;
V – bloco de notas do produtor rural;
VI – notas fiscais de entrada de mercadorias, de que trata o § 7º do art. 30 da lei n.º 8.212, de
24 de julho de 1991, emitidas pela empresa adquirente da produção, com indicação do nome do
segurado como vendedor;
VII – documentos fiscais relativos a entrega de produção rural à cooperativa agrícola,
entreposto de pescado ou outros, com indicação do segurado como vendedor ou consignante;
VIII – comprovantes de recolhimento de contribuição à Previdência Social decorrentes da
comercialização da produção;
IX – cópia da declaração de imposto de renda, com indicação de renda proveniente da
comercialização de produção rural; ou
X – licença de ocupação ou permissão outorgada pelo Incra.
Saliento, por oportuno, que o artigo 106 da Lei n.º 8.213/91 deve ser interpretado em
conformidade com o princípio constitucional que garante ao cidadão acesso irrestrito à tutela
jurisdicional (artigo 5º, XXXV, da CF/88). Interpretá-lo de forma taxativa representaria, acima de
tudo, a mitigação do livre convencimento do magistrado, privando-o da liberdade de valorar as
provas que lhe são apresentadas.
Considera-se prova material toda prova não testemunhal. Há necessidade, no entanto, de
estabelecer a distinção da “prova material efetiva” e do chamado “início de prova material”.
A “prova material efetiva” é aquela capaz de comprovar fatos e direitos por si só, de maneira
taxativa. É a prova plena, que independe de outras para produzir efeitos no mundo jurídico.
Como “início de prova material”, por sua vez, são classificadas aquelas provas, notadamente
documentais, que evidenciam indício, probabilidade, sinais aparentes. Não são provas diretas,
dependem de outras que as complementem para produzirem efeitos no mundo jurídico.
Estabelecida estas definições, ressalto que, no entendimento adotado por este Relator (em
consonância com a Jurisprudência majoritária), a exemplo da prova testemunhal, o mero início
de prova material, isoladamente, não se presta à comprovação do trabalho rural para fins
previdenciários. Ambas se complementam, prova testemunhal e início de prova material, em
conjunto, podem definir o rumo da ação e firmar o convencimento do Julgador acerca da
veracidade dos fatos narrados na petição inicial. Separadas, no entanto, não se sustentam.
A corroborar:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. PENSÃO POR MORTE.
TRABALHADOR RURAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO.
DESNECESSIDADE. GENITORA FALECIDA. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL.
AUSÊNCIA DE PROVA TESTEMUNHAL. PEDIDO JULGADO PROCEDENTE.
CERCEAMENTO DE DEFESA DO INSS. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA.
SENTENÇA ANULADA. TUTELA ANTECIPADA.
1. Muito embora o art. 273, caput, do CPC, expressamente, disponha que os efeitos da tutela
pretendida na inicial poderão ser antecipados, a requerimento da parte, total ou parcialmente,
firmou-se nesta Primeira Turma a possibilidade de o órgão jurisdicional antecipá-la de ofício,
tendo em vista a natureza alimentar do benefício previdenciário e em razão da verossimilhança
do direito material alegado. Precedentes desta Corte.
2. A pensão por morte prevista no art. 74 da Lei 8.213/91, que é devida ao conjunto dos
dependentes de trabalhador rural, está subordinada à demonstração da condição de
dependente do segurado, nos termos do art. 16 da mencionada lei, e à comprovação da
atividade rural exercida pelo falecido, por meio de início de prova material corroborada por
prova testemunhal coerente e robusta.
3. A sentença julgou procedente o pedido inicial, sem a oitiva de testemunha, por considerar
suficiente a prova material juntada aos autos, dispensando a produção de prova testemunhal.
4. Não obstante tenha sido juntado aos autos início razoável de prova material do exercício de
atividade rural, verifica-se, contudo, que tais documentos não fazem prova direta sobre a
atividade profissional da genitora da parte autora, de forma a autorizar o deferimento da pensão
por morte de trabalhadora rural.
5. Na hipótese, o julgamento da lide, antes da oitiva das testemunhas, cerceia o direito do INSS,
uma vez que o pedido foi julgado procedente. É forçoso, assim, anular a sentença, para que
seja colhida a prova testemunhal e examinada a pretensão como de direito. Precedentes desta
Corte.
6. Embora seja necessária, para comprovação do direito ao recebimento do benefício
previdenciário pleiteado a demonstração simultânea de início razoável de prova material,
corroborada por prova testemunhal, verifica-se, pelas regras ordinárias de experiência, que a
existência nos autos de documentação registrando o labor rural, amplamente aceita pela
jurisprudência e contemporânea aos fatos a que se visa comprovar, confere verossimilhança ao
direito alegado na inicial, pelo que, impõe-se, nesses casos, a antecipação do provimento
jurisdicional, ainda que em caráter excepcional, determinando-se a implantação imediata do
benefício, até o julgamento final da presente ação, evitando-se, assim, maiores prejuízos à
parte autora, que não concorreu para a demora na solução do direito aqui vindicado.
7. Sentença anulada, em face da inaplicabilidade do provimento previsto no art. 515, § 3º, do
CPC.
8. Remessa oficial e apelação do INSS a que se dá parcial provimento.
9. Apelação da parte autora prejudicada.
10. Implantação imediata do benefício, no prazo máximo de 30 dias, com comunicação imediata
à autarquia previdenciária.
(TRF1, Primeira Turma, AC – Apelação Cível, Relator Desembargador Federal Néviton Guedes,
julgado em 11/12/2013, e-DJF1 de 14/03/2014 página 1285). (grifo nosso)
Ademais, para comprovação do tempo de labor rural, é indispensável que o início de prova
material seja contemporâneo à época dos fatos que se quer demonstrar, sob pena de não
possuir valor probatório. Nesse sentido, reporto-me à Súmula n.º 34 da Turma Nacional de
Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais: “Súmula 34 – Para fins de
comprovação do tempo de labor rural, o início de prova material deve ser contemporâneo à
época dos fatos a provar.”
Estabelecidas estas premissas, verifico que, com intuito de comprovar a atividade rural entre os
anos de 1967 e 1973 e de 1999 a 2007, a parte autora não apresentou qualquer documento
que possa ser considerado como início de prova material válido.
De fato, conforme apresentado no próprio recurso, só consta dos autos a seguinte
documentação (fls. 15/23 do Id. 213185211): (i) a certidão de seu nascimento, ocorrido em
1955; (ii) certidão imobiliária de aquisição de imóvel pelo seu pai do ano de 1953; (iii) certidão
do óbito do seu genitor, ocorrido em 1987; (iv) declaração da Prefeitura do ano de 2019
informando seu estudo em escola situada em zona rural entre 1962 e 1966; (v) certidão de
batismo emitida em 2019; e (vi) autodeclaração junto ao INSS
Como se vê, nenhum documento é contemporâneo ao alegado período de atividade rural,
cabendo destacar, inclusive, que na certidão de nascimento da autora, posterior à aquisição do
imóvel por seu pai, o próprio genitor é qualificado como “comerciário”, bem como que residência
em zona rural não é suficiente para indicar que efetivamente exercia atividade rural.
Dessa forma, diante da ausência de início de prova material a respeito do alegado labor rural da
parte autora, realmente se torna desnecessária a realização de prova testemunhal nos autos, já
que esta, isoladamente, não se presta à declaração de existência de tempo de serviço rural.
A Constituição Federal e a legislação processual, por meio do “princípio do livre convencimento
motivado”, garantem ao Juiz a liberdade de firmar sua convicção sem que esteja adstrito a
parâmetros pré-determinados, podendo ele atribuir às provas que lhe são apresentadas o valor
que entender apropriado. No caso dos autos, entendo ser o conjunto probatório
demasiadamente frágil e deficiente para o pretenso reconhecimento do labor rural.
Ante todo o exposto, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO DA AUTORA e mantenho
integralmente a sentença.
Condeno o recorrente vencido ao pagamento de honorários advocatícios no percentual de 10%
do valor da condenação ou, não havendo condenação, do valor atualizado da causa, nos
termos do artigo 55, “caput”, segunda parte, da Lei n.º 9.099/1995, combinado com o artigo 1º
da Lei 10.259/2001.
No entanto, considerando que é beneficiário(a) da justiça gratuita, as obrigações decorrentes de
sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser
executadas se, nos 5 (cinco) anos subsequentes ao trânsito em julgado, o credor demonstrar
que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de
gratuidade, a teor do disposto no artigo 98, § 3º do Código de Processo Civil de 2015.
É o voto.
E M E N T A
Dispensada a ementa por interpretação extensiva do artigo 46 da lei n.º 9.099/95, segunda
parte. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
