Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / MS
0000035-09.2021.4.03.6206
Relator(a)
Juiz Federal RICARDO DAMASCENO DE ALMEIDA
Órgão Julgador
2ª Turma Recursal da Seção Judiciária de Mato Grosso do Sul
Data do Julgamento
06/07/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 21/07/2022
Ementa
E M E N T A
Dispensada.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
Mato Grosso do Sul
2ª Turma Recursal da Seção Judiciária de Mato Grosso do Sul
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000035-09.2021.4.03.6206
RELATOR:4º Juiz Federal da 2ª TR MS
RECORRENTE: JOSE RAUL DE ARRUDA RAMIRES
Advogado do(a) RECORRENTE: DENIS ROGERIO SOARES FERREIRA - MS20290-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Dispensado o relatório (artigo 81, § 3º, da Lei 9.099/95 c.c. artigo 1º da Lei 10.259/2001).
V O T O
A sentença foi proferida nos seguintes termos:
Trata-se de ação ajuizada por JOSE RAUL DE ARRUDA RAMIRES em face do INSTITUTO
NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, em que pretende a concessão do benefício de
amparo assistencial – LOAS.
Dispensado o relatório, na forma do artigo 38, da Lei 9.099/95 c/c art. 1º, da Lei n.º 10.259/01.
I – FUNDAMENTAÇÃO
1. Questões prévias
As preliminares suscitadas pela Autarquia não merecem acolhida. Não restou provado, no caso
concreto, que o valor da causa tenha superado o limite de alçada deste.
No que tange à incidência da prescrição aplica -se ao caso em análise o enunciado da Súmula
85 do STJ, uma vez que se tratam de prestações sucessivas, ou seja, encontram-se prescritas
apenas as parcelas anteriores ao quinquênio que antecedeu a propositura da ação.
Do mesmo modo, as demais preliminares arguidas em contestação padrão não apresentam
pertinência alguma com a lide e não foram verificadas no presente feito
2. No mérito
Superadas as questões preliminares, passo ao exame do mérito da causa.
O benefício assistencial em tela foi instituído pela Constituição Federal em seu art. 203, inciso
V, que tem a seguinte redação:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: [...]
V – a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e
ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
Como se depreende do comando constitucional, o benefício assistencial tem por finalidade
assegurar condições materiais mínimas, mediante o pagamento de um salário mínimo, para que
a pessoa idosa ou portadora de deficiência possa prover a própria subsistência, na hipótese de
seus familiares não possuírem condições financeiras para fazê-lo.
Assim, são requisitos constitucionais – cumulativos – para a obtenção do benefício, portanto: (i)
a deficiência ou idade avançada; e (ii) a necessidade (hipossuficiência econômica).
No caso em tela, tem-se que pelo menos um desses requisitos não restou satisfeito.
Com relação ao requisito da necessidade, a Lei 8.742/93 considera “incapaz de prover a
manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita
seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo” (art. 20, §3º).
Todavia, como decidido pelo C. Supremo Tribunal Federal - em julgamento em que se analisou
precisamente a constitucionalidade do art. 20, §3º da Lei 8.742/93:
(...) Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias
mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações
legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros
benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro) (STF, Rcl 4374, Tribunal Pleno, Rel. Min.
GILMAR MENDES, DJe 03/09/2013).
Por essa razão, a C. Suprema Corte optou pela “Declaração de inconstitucionalidade parcial,
sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993”, situação jurídica que autoriza
os magistrados de 1ª instância a aferir a necessidade do postulante do amparo assistencial por
outros meios de prova além da mera verificação da renda familiar per capita.
Por sua vez, a TNU, em incidente de uniformização representativo de controvérsia, julgado em
14 de abril de 2016, “a renda familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo não exclui a
utilização de outros elementos de prova para aferição da condição socioeconômica, em face da
inexistência de presunção absoluta de miserabilidade para fins de concessão de benefício
assistencial” (processo 50000493-92.2014.4.04.7002).
No mesmo sentido, forte na Lei 13.146/2015, a lei 8.742/93 passou a prever expressamente
que para concessão desse benefício poderão ser utilizados outros elementos probatórios da
condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade (§ 11. do art. 20
da lei 8.742/93), positivando a jurisprudência do STJ sobre o tema (AgRg noAREsp 379927 de
15/10/ 2013).
Cumpre destacar que filhos casados não compõem o núcleo familiar da demandante por
expressa opção legislativa (artigo 20 da Lei 8.742 de 1993), conforme ressaltado pela
jurisprudência:
ASSISTÊNCIA SOCIAL. APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO
CONTINUADA. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS.
- A Constituição garante à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprove não
possuir meios de prover sua própria manutenção o pagamento de um salário mínimo mensal.
Trata-se de benefício de caráter assistencial, que deve ser provido aos que cumprirem tais
requisitos, independentemente de contribuição à seguridade social.
- É possível extrair do conjunto probatório a existência de impedimentos de longo prazo que
obstruem a participação do apelado na sociedade, em igualdade de condições com as demais
pessoas. O quadro apresentado se ajusta, portanto, ao conceito de pessoa com deficiência, nos
termos do artigo 20, § 2º, da Lei 8.742/93, com a redação dada pela Lei 12.435/2011.
-A LOAS prevê que miserabilidade existe quando a renda familiar mensal per capita é inferior a
¼ de um salário mínimo (art. 20, §3º), sendo que se considera como "família" para aferição
dessa renda "o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o
padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que
vivam sob o mesmo teto" (art. 20, §1º).
- Com o fundamento de que a situação de miserabilidade não pode ser aferida através de mero
cálculo aritmético, o STF declarou, em 18.04.2013, ao julgar a Reclamação 4.374, a
inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, e do art. 20, §3º da LOAS.
- A renda per capita familiar mensal é, portanto, de R$ 400,00, superior a ¼ de um salário
mínimo (equivalente a R$220,00).
- As circunstâncias descritas no estudo social não denotam a situação de miserabilidade
alegada. A família da autora tem acesso aos mínimos sociais e suas necessidades básicas
estão sendo supridas.
- O benefício de prestação continuada não serve de complementação de renda e sim para
casos de extrema necessidade.
- Apelação a que se nega provimento. (TRF-3-AC: 00178079120174039999 SP, Relator:
DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ STEFANINI, Data de Julgamento: 11/12/2017, OITAVA
TURMA, Data de Publicação: e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/03/2017) (grifou-se)
Dessa forma, os filhos devem ser desconsiderados no cálculo da renda familiar, uma vez que
constituem núcleo familiar diverso, a despeito dos deveres de ajuda para com seu genitor.
Evidentemente não se trata de entendimento absoluto, sendo inafastável a análise de cada
caso, notadamente porque a Constituição Federal, em seu art. 229, prevê, expressamente, o
dever dos pais de assistir, criar e educar os filhos, bem como o dever dos filhos maiores de
ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.
Ainda, o Código Civil, nos arts. 1.694 a 1.697, também obriga a prestação de alimentos dos pais
em favor dos filhos, dos filhos maiores em favor dos pais, dos irmãos entre si, e de avós com
netos e vice-versa.
Assim, a responsabilidade do Estado pelo sustento é subsidiária em relação à da família.
Registre-se, assim, que a assistência social tem atuação supletiva, neste sentido leciona
Simone Barbasian Fontes: “A atuação da Assistência Social, enquanto setor responsável pela
inserção social das pessoas situadas em condições de miserabilidade, tem atuação sempre
supletiva à atuação da própria família. Em linhas sintéticas, somente deverá pôr em aplicação
suas políticas na medida da absoluta impossibilidade do beneficiário de manter-se de forma
autônoma, por seu próprio trabalho ou por conta de auxílio familiar.” (O conceito aberto de
família e seguridade social. P.251- in Direito da Previdência e Assistência Social – elementos
para uma compreensão interdisciplinar. Porto Alegre: Conceito Editorial, 2009.)
Descabe tornar o Estado como ‘garantidor universal’, em detrimento do dever primário da
família, conforme bem enumera a legislação em vigor. Afinal, não cabe ao Estado substituir as
pessoas em suas respectivas obrigações legais, mesmo porque os direitos sociais devem ser
interpretados do ponto de vista da sociedade, não do indivíduo.
Desta feita, a se levar ao extremo tal consideração de dissociação da renda dos familiares,
favorecer-se-ia situações nas quais as pessoas são abandonados em estado de penúria por
seus parentes, os quais gozam de excelentes condições econômicas, atribuindo um ônus
indevido a ser suportado por toda a sociedade.
Convém salientar, pela pertinência, que o objetivo do benefício assistencial é conceder renda a
quem não tem o suficiente para a própria sobrevivência digna, e não complementar os
proventos auferidos por uma família que vive com certas dificuldades. Neste sentido, inclusive,
já decidiu o E. TRF 3.ª Região: “O benefício de prestação continuada não tem por fim a
complementação da renda familiar ou proporcionar maior conforto ao beneficiário, mas sim,
destina-se ao idoso ou deficiente em estado de penúria” (AC 876500. 9.ª Turma. Rel. Des. Fed.
Marisa Santos. DJU, 04.09.2003).
Passo à análise da questão sob esse prisma.
Na questão da miserabilidade, o estudo socioeconômico descreve que o autor reside com sua
genitora, sendo que a renda familiar advém da remuneração e pensão por morte recebida por
esta, o que totaliza R$ 2.200,00 (evento 18).
Logo, como destacado pelo MPF (evento 32) a renda familiar per capita é bastante superior a ¼
do salário mínimo de que trata a Lei n. 8.742/93.
Ressalta-se que a renda familiar é mais do que suficiente para arcar com as despesas básicas,
declaradas pela família (R$ 1.871,34).
Por fim, destaca-se do laudo social a informação de que a casa que a parte autora habita com a
genitora é própria, avaliada em R$ 70.000,00. Além disso, denota-se das fotografias que,
apesar de simples, a casa possui a estrutura básica necessária para as necessidades básicas
da família.
Cumpre destacar que o benefício assistencial LOAS tem a finalidade de amparar situações
excepcionais de miserabilidade, não possuindo a função de complementação de renda:
CONSTITUCIONAL. ASSISTÊNCIAL - BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA - ART.
203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. HIPOSSUFICIÊNCIA NÃO COMPROVADA.
I - O Supremo Tribunal Federal, no RE n. 567.985, reconheceu a inconstitucionalidade parcial,
sem pronúncia de nulidade, do art.20, §3º, da Lei nº 8.742/93, e do art. 34, par. único, da Lei nº
10.741/2003.
II - A autora contava com 77 (setenta e sete) anos, quando ajuizou a presente ação, tendo por
isso a condição de idosa.
III - Os elementos de prova existentes nos autos apontam em sentido contrário à alegada
miserabilidade da autora.
IV - O estudo social feito em 21.10.2014, às fls. 109/114, informa que a autora reside com o
marido, Sr. Satunino Nascimento dos Santos, de 85 anos, a filha, separada, Sra. Idalina Fortuna
dos Santos Silva, os netos, filhos desta, Paulo Henrique Santos da Silva, de 19, na ocasião
estava detido, Zaqueu dos Santos Silva, de 16, e Giovane Fortuna dos Santos, de 12, a filha,
solteira, Elza Fortuna dos Santos, de 40, o filho, casado, Gilberto Fortuna dos Santos, de 45, a
nora Adriana Aparecida Rossi dos Santos, de 39, e o neto, filho destes, Gustavo Rossi dos
Santos, de 06, em casa própria, contendo oito cômodos, sendo quatro quartos, sala, cozinha e
dois banheiros. Os móveis e eletrodomésticos que guarnecem a casa são antigos e
parcialmente desgastados. As despesas são: alimentação R$ 2.000,00; água R$ 250,00;
energia elétrica R$ 110,00; gás R$ 45,00; remédios R$ 200,00. A renda da família advém da
aposentadoria do marido da autora, no valor de um salário mínimo mensal, do trabalho da filha
Elza, como balconista, no valor de R$ 846,40 (oitocentos e quarenta e seis reais e quarenta
centavos) mensais, do trabalho formal de Gilberto, trabalhador rural, no valor de R$ 1.270,00
(mil e duzentos e setenta reais) mensais, e do trabalho formal de Adriana, como vendedora, no
valor de R$ 785,00 ( setecentos e oitenta e cinco reais) mensais.
IV - A autora não vive em situação de risco social ou vulnerabilidade social, não podendo o
benefício assistencial ser utilizado para fins de complementação de renda.
V - As despesas giravam em torno de R$ 2.605,00, consistindo em alimentação, água, energia
elétrica, gás e remédios; ou seja, as despesas são inferiores às receitas, R$ 3.855, 00.
VI - Prevê o art. 229 da Constituição da República o dever de reciprocidade na prestação de
assistência entre pais e filhos ao estatuir que "os pais têm o dever de assistir, criar e educar os
filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice,
carência ou enfermidade".
VII - A assistência social prestada pelo Estado deve ter cunho subsidiário, não podendo ser
substituída pela assistência de familiares que tem reconhecidamente condições de prestá-la.
VIII - Apelação improvida. (TRF 3ª Região, NONA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2223596 -
0006655- 46.2017.4.03.9999, Rel. JUIZ CONVOCADO OTAVIO PORT, julgado em 18/04/2018,
e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/05/2018 – grifou-se).
Assim, não se verifica o requisito referente à hipossuficiência econômica.
Como os requisitos são cumulativos, a hipótese é de improcedência da demanda.
3. Da necessidade de nomeação de curador provisório
O laudo pericial constatou que a parte autora é portadora de “F41, Outros transtornos ansiosos;
F71.1, Retardo mental moderado; F32.1, Episódio depressivo moderado” (evento 23). Na
ocasião, destacou a perita que o autor não possui capacidade de exprimir sua vontade e de
exercer pessoalmente a administração de seus bens e valores recebidos.
Por sua vez, o laudo socioeconômico indicou a condição de deficiente do autor, destacando que
“(...) Segundo informações o autor José Raul de Arruda Ramires, sofre de Retardo mental
Moderado, Episódios Depressivos, Ansiedade Generalizada e falta de equilíbrio. (...) O autor
auxilia nos afazeres domésticos com supervisão, uma vez que tem limitações físicas e
intelectuais. (...) A parte autora possui noção mínima de tempo, espaço e hora (...)”.
Nesse sentido, depreende -se tanto do laudo médico como do laudo socioeconômico que tal
patologia implica ainda incapacidade para os demais atos da vida civil.
Sobre a necessidade de nomeação de curador, cumpre ressalvar que a questão da curatela
definitiva esbarra na competência material e, portanto, absoluta, eis que foge à seara reservada
à atuação da Justiça Federal, tal como preceituado no artigo 109 da Constituição Federal.
Destaco, neste ponto, que o Estatuto da Pessoa com Deficiência não mais relaciona a
deficiência mental com a incapacidade absoluta e, também, não exige o processo de interdição
para o exercício de direitos.
Na mesma linha, sabe -se que a Lei nº 13.146, de 2015, incluiu o art. 110-A à Lei nº 8.213, de
1991, com a seguinte dicção: "no ato de requerimento de benefícios operacionalizados pelo
INSS, não será exigida apresentação de termo de curatela de titular ou de beneficiário com
deficiência, observados os procedimentos a serem estabelecidos em regulamento."
Por sua vez, o Decreto nº 5.699, de 2006, já havia revogado o § 1º do art. 162 do Decreto nº
3.048, de 1999, que tornava obrigatória a apresentação do termo de curatela, ainda que
provisória, para a concessão de aposentadoria por invalidez decorrente de doença mental.
Portanto, por disposição legal, o termo de curatela não deverá ser exigido no requerimento do
benefício.
Contudo, comprovada a incapacidade para realizar os atos da vida civil da parte autora, cabe
ao magistrado a nomeação de curador especial, nos termos do artigo 72, inciso I, do Código de
Processo Civil, o que de fato não foi observado.
Como bem pontuado pelo MPF (evento 32), corroborado pelas perícias realizadas pelo juízo, a
parte autora encontra -se incapaz para os atos da vida civil, razão pela qual nomeio Maria de
Fatima de Arruda (genitora), como curadora especial de José Raul de Arruda Ramires, somente
para atos do presente processo.
Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido. Dou por resolvido o mérito, nos termos
do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil.
Sem custas e honorários advocatícios nesta instância.
Intime-se o patrono da causa, para que apresente procuração outorgada pelo curador especial,
no prazo de 10 (dez) dias.
Interposto recurso inominado contra a sentença, vista à parte contrária para contrarrazões.
Decorrido o prazo, com ou sem manifestação, remetam-se os autos à Turma Recursal,
independentemente de juízo de admissibilidade (art. 1010, §3º, do CPC).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Consigno que o art. 46 combinado com o § 5º do art. 82, ambos da Lei n. 9.099/95, facultam à
Turma Recursal dos Juizados Especiais a remissão aos fundamentos adotados na sentença.
O mencionado § 5º do art. 82 da Lei n. 9.099/95 dispõe que se a sentença for confirmada pelos
próprios fundamentos, a súmula do julgamento servirá de acórdão.
O Colendo Supremo Tribunal Federal já reconheceu a constitucionalidade da utilização da
denominada técnica da fundamentação per relationem. Afirmou que a sua utilização não viola o
dever constitucional de motivação das decisões judiciais (art. 93, inc. IX, da CF/88). É o que se
extrai do seguinte precedente:
(...) O Supremo Tribunal Federal tem salientado, em seu magistério jurisprudencial, a propósito
da motivação “per relationem”, que inocorre ausência de fundamentação quando o ato decisório
– o acórdão, inclusive – reporta-se, expressamente, a manifestações ou a peças processuais
outras, mesmo as produzidas pelo Ministério Público, desde que, nestas, se achem expostos os
motivos, de fato ou de direito, justificadores da decisão judicial proferida. Precedentes. Doutrina.
O acórdão, ao fazer remissão aos fundamentos fático-jurídicos expostos no parecer do
Ministério Público – e ao invocá-los como expressa razão de decidir –, ajusta-se, com plena
fidelidade, à exigência jurídico-constitucional de motivação a que estão sujeitos os atos
decisórios emanados do Poder Judiciário (CF, art. 93, IX).
(ADI 416 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 16/10/2014,
ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-215 DIVULG 31-10-2014 PUBLIC 03-11-2014) grifei.
Feitas as considerações acima, saliento que a sentença recorrida não merece reparos, pois se
fundamentou em norma jurídica e entendimento jurisprudencial aplicáveis à espécie.
Cinge-se a controvérsia sobre o cumprimento do requisito hipossuficiência, necessário à
concessão do benefício pleiteado.
Esclareço, quanto à renda per capita que, apesar de válido, o critério objetivo de miserabilidade
trazido pela Lei Orgânica de Assistência Social não é absoluto. É dizer: o fato de a renda per
capita familiar ultrapassar ¼ salário mínimo não afasta, de pronto, a possibilidade de concessão
do benefício assistencial em apreço, pois o E. STF reconheceu a viabilidade de concessão do
benefício assistencial, mesmo se superado o limite de ¼ do salário-mínimo por cabeça (previsto
na Lei n. 8.742/93), desde que, no caso concreto e de forma fundamentada, o juízo se baseie
em provas, admitidas em direito, que demonstrem a miserabilidade do requerente.
No Recurso Especial Repetitivo n. 1.112.557/MG, o Superior Tribunal de Justiça firmou o
mesmo entendimento: a limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser
considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover
a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
Ainda sobre o tema, Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari, em seu Manual de
Direito Previdenciário, afirmam que:
“Em juízo, o não cumprimento do critério econômico de 1/4 do salário mínimo ou mesmo a
aplicação extensiva do art. 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso não enseja mais o acesso
ao STF. A existência de miserabilidade deverá ser analisada no caso concreto com base em
critérios subjetivos, podendo até ser invocados os que foram declarados inconstitucionais pela
ausência de norma substituidora, ou com aplicação de outros parâmetros, tal qual o de metade
do salário mínimo previsto para os demais benefícios sociais do Governo Federal. Nesse
sentido: TRF4, AC 0012820-58.2012.404.9999, 6ª Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto
Silveira, DE de 16.7.2013.
Para a TNU, não havendo mais critério legal para aferir a incapacidade econômica do assistido,
a miserabilidade deverá ser analisada em cada caso concreto, sendo possível aferir a condição
de hipossuficiência econômica do idoso ou do portador de deficiência por outros meios que não
apenas a comprovação da renda familiar mensal (PEDILEF 0502360-21.2011.4.05.8201, Rel.
Juiz Federal Gláucio Maciel, DOU de 21.6.2013). E, segundo essa Corte uniformizadora, “O
critério objetivo consubstanciado na exigência de renda familiar per capita inferior a 1/4 do
salário-mínimo gera uma presunção relativa de miserabilidade, que pode, portanto, ser afastada
por outros elementos de prova.” (Representativo de Controvérsia n. 122, PEDILEF 5000493-
92.2014.4.04.7002/ PR, Rel. Juiz Federal Daniel Machado da Rocha, DOU de 15.4.2016).” (p.
575-576)
A Turma Regional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais da 3ª Região sumulou o
entendimento de que:
Na concessão do benefício assistencial, deverá ser observado como critério objetivo a renda
per capita de ½ salário mínimo gerando presunção relativa de miserabilidade, a qual poderá ser
infirmada por critérios subjetivos em caso de renda superior ou inferior a ½ salário mínimo
(enunciado n. 21).
Convém ainda assinalar que a Lei 10.741/03, no art. 34, parágrafo único, prevê a exclusão do
valor do benefício percebido pelo cônjuge, já que se trata de renda mínima. Veja-se:
Art. 34. Parágrafo único. O benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do
caput não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a
Loas.
A interpretação jurisprudencial do referido dispositivo foi no sentido de que o valor de um salário
mínimo proveniente de benefício de amparo social ao idoso percebido por quem não pode
prover sua própria subsistência, por ser deficiente ou idoso maior de 65 anos, deve ser excluído
da soma da renda familiar do requerente do benefício previsto no artigo 20 da Lei n. 8.742/93. O
mesmo raciocínio é aplicado para a renda dos segurados que recebem benefícios
previdenciários que alcancem tal montante.
Atento a isso, verifico que a família é composta pelo recorrente e sua genitora.
Do laudo socioeconômico extrai-se que: (i) a família reside em imóvel próprio; (ii) o recorrente
está desempregado; (iii) a renda familiar atual é proveniente do valor recebido pela mãe como
gari e da pensão por morte deixada pelo pai falecido do autor, o que totaliza R$ 2.200,00.
As despesas ordinárias da família são: energia - R$ 298,64; água - R$ 132,70; gás - R$ 90,00;
alimentação e higiene - R$ 1.100,00; internet - R$ 100,00; vestuário - R$ 150,00.
Resta, portanto, evidente a não caracterização de miserabilidade da recorrente, uma vez que a
renda per capita é superior ao valor da metade de um salário mínimo. Além disso, vale frisar
que as fotografias anexadas ao laudo socioeconômico demonstram moradia simples, entretanto
guarnecida de móveis e utensílios suficientes para manutenção de vida digna.
Não entendo, com tais considerações, preenchido o requisito da miserabilidade.
A sentença deve ser mantida.
Consigno, no mais, ser suficiente que sejam expostas as razões de decidir do julgador, para
que se dê por completa e acabada a prestação jurisdicional, não havendo a necessidade de
expressa menção a todo e qualquer dispositivo legal mencionado, a título de
prequestionamento. Assim, não vislumbro dos argumentos deduzidos no processo qualquer
outro fundamento relevante capaz de, em tese, infirmar a conclusão ora adotada.
Posto isso, voto por negar provimento ao recurso, nos termos da fundamentação supra.
Condeno a parte recorrente vencida ao pagamento de honorários advocatícios no importe de
10% sobre o valor corrigido da causa, conforme previsão do art. 55, segunda parte, da Lei n.
9.099/95. A exigibilidade ficará suspensa pelo período de cinco anos subsequentes ao trânsito
em julgado deste acórdão, nos termos do disposto no art. 98, §2º e §3º, do CPC/15.
Custas na forma da lei.
É o voto.
E M E N T A
Dispensada.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma
Recursal da Seção Judiciária de Mato Grosso do Sul decidiu, por unanimidade, negar
provimento ao recurso da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
