Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
5004566-11.2020.4.03.6102
Relator(a)
Juiz Federal CAIO MOYSES DE LIMA
Órgão Julgador
10ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
04/08/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 07/08/2022
Ementa
E M E N T A
Dispensada a ementa, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/95, combinado com o art. 1º da Lei
nº 10.259/2001.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
10ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº5004566-11.2020.4.03.6102
RELATOR:29º Juiz Federal da 10ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: RITA DE CASSIA DA SILVA OLIVEIRA
Advogados do(a) RECORRIDO: JOSE PAULO BARBOSA - SP185984-A, HENRIQUE
FERNANDES ALVES - SP259828-A
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº5004566-11.2020.4.03.6102
RELATOR:29º Juiz Federal da 10ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: RITA DE CASSIA DA SILVA OLIVEIRA
Advogados do(a) RECORRIDO: JOSE PAULO BARBOSA - SP185984-A, HENRIQUE
FERNANDES ALVES - SP259828-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
JUIZ FEDERAL CAIO MOYSÉS DE LIMA: Trata-se de ação movida por RITA DE CÁSSIA DA
SILVA OLIVEIRA em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em que se
pleiteia a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, nos termos do art. 29-C da
Lei nº 8.213/91, a partir de 05/08/2019, além de pagamento de indenização por danos morais.
Narra na inicial que a parte autora requereu o benefício em três ocasiões, em 26/01/2017, em
17/10/2018 e em 26/11/2019. O primeiro requerimento foi indeferido em 25/05/2017,
considerando-se um total de 29 anos, 4 meses e 16 dias de contribuição. O segundo foi negado
em 29/08/2019, considerando-se apenas 1 ano, 10 meses e 11 dias de contribuição. E o
terceiro foi deferido em 07/04/2020. Nota-se portanto, que na data do segundo requerimento
administrativo a parte autora já possuía o tempo necessário para a concessão do benefício,
sendo certo que em 05/08/2019, ainda no curso do procedimento administrativo, teria cumprido
os requisitos necessários para a concessão do benefício nos termos do art. 29-C da Lei nº
8.213/91, sem aplicação do fator previdenciário.
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido, condenando o réu a (i) implantar o
benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, desde a data de entrada do
requerimento administrativo, em 17/10/2018, computando um total de 31 anos, 1 mês e 7 dias
de contribuição; e (ii) pagar as prestações vencidas, descontando tudo o que foi pago em razão
de benefício não acumulável, nos termos da Resolução nº 658/2020 do Conselho da Justiça
Federal.
Diz a fundamentação:
Inicialmente, verifico que a autora afirma que em 17.10.2018 requereu a aposentadoria por
tempo de contribuição junto ao INSS e o benefício lhe foi indevidamente negado.
Em 26.11.2019 novamente ingressou com pedido de aposentadoria que foi deferido,
encontrando-se aposentada.
No entanto, afirma que a Prefeitura Municipal de São Joaquim da Barra, onde trabalha, está
demitindo os funcionários sob o argumento de que a EC 103/2019 não admite a manutenção do
contrato de trabalho e emprego público após a aposentadoria concedida a partir da
promulgação da aludida EC.
Em razão disso, requer em sede de tutela de urgência, seja o Ente Público Municipal oficiado
para se abster de desligá-la de seu quadro de funcionários.
Pois bem. A Prefeitura Municipal de São Joaquim da Barra não é parte na presente ação, de
forma que não cabe a este Juízo impor a quem não pertence à presente relação processual a
prática de ato processual, com evidente violação às normas processuais vigentes.
Sabidamente, somente pode ser compelido a determinada conduta aquele que figure como
parte processual, integrando a relação jurídica processual com o devido processo legal e,
portanto, direito de ampla defesa.
Por conseguinte, indefiro a antecipação requerida quanto ao ponto, pois, repito, a Prefeitura
Municipal referida não está no pólo passivo da ação.
MÉRITO
1. Aposentadoria por Tempo de Contribuição.
Destaco, de plano, que a autora obteve aposentadoria desde 26.11.2019.
No caso concreto, a autora pretende obter a aposentadoria por tempo de contribuição na data
do requerimento administrativo formulado em 17.10.2018 (fl. 57 do evento 02).
Aduz que, apesar de haver requerido o benefício em 17.10.2018, o INSS o indeferiu ao
argumento de que contava com tempo de contribuição de apenas 01 ano, 10 meses e 11 dias.
Da documentação constante dos autos (evento 02) é possível verificar que a autora havia
requerido a aposentadoria por tempo de contribuição em 26.01.2017 (fl. 41), ocasião em que o
INSS apurou tempo de contribuição de 29 anos, 04 meses e 16 dias (fl. 51).
Posteriormente, em 26.11.2019 (fl. 142 do evento 02), após a negativa do requerimento
formulado em 17.10.2018, a autora novamente pleiteou a aposentadoria junto ao INSS, que lhe
foi deferida, computados 32 anos, 02 meses e 03 dias de contribuição e calculada observado o
direito adquirido antes da EC 103/2019 (pesquisa Plenus – evento 12).
A grande pendência, ocorrida no requerimento administrativo de 2018, objeto desta lide, é que o
INSS não considerou como tempo de contribuição da autora, naquela oportunidade, o período
laborado para a Prefeitura Municipal de São Joaquim da Barra, por entender que a autora
deveria comprovar o regime previdenciário ao qual estava vinculada.
No entanto, nos outros dois requerimentos administrativos, a questão sequer foi aventada.
O CNIS da autora aponta as pendências AVEXT-VT e AVRC-DEF (vínculo extemporâneo
confirmado pelo INSS e acerto confirmado pelo INSS) para o vínculo e não há qualquer menção
a Regime Próprio de Previdência Social - RPPS (fl. 97 do evento 02).
Aliás, o vínculo está devidamente anotado na CTPS da autora (fl. 85 do evento 02), havendo,
inclusive, anotação de opção FGTS.
Logo, de fato, não havia motivos para desconsideração do vínculo em questão por ocasião do
requerimento administrativo formulado em 17.10.2018.
Aliás, observo que o INSS chegou a apurar o tempo de contribuição da autora em 2018,
computando o vínculo acima destacado e apurando um total de 31 anos, 01 mês e 07 dias de
contribuição na DER (17.10.2018). Posteriormente, acabou desconsiderando o vínculo e
apurando apenas 01 ano, 10 meses e 11 dias de contribuição.
Pois bem. Diante do acima exposto, está evidenciado que a autora fazia jus à aposentadoria
por tempo de contribuição na data da DER de 17.10.2018, com tempo apurado de 31 anos, 01
mês e 07 dias de contribuição, conforme consta do P.A (fls. 101/102 do evento 02).
Observo que na data da DER estava em vigor a Lei 13.183/15, que alterou o art. 29-C da Lei nº
8.213/91, nos seguintes termos:
“Art. 29-C. O segurado que preencher o requisito para a aposentadoria por tempo de
contribuição poderá optar pela não incidência do fator previdenciário no cálculo de sua
aposentadoria, quando o total resultante da soma de sua idade e de seu tempo de contribuição,
incluídas as frações, na data de requerimento da aposentadoria, for: I - igual ou superior a
noventa e cinco pontos, se homem, observando o tempo mínimo de contribuição de trinta e
cinco anos; ou II - igual ou superior a oitenta e cinco pontos, se mulher, observando o tempo
mínimo de contribuição de trinta anos.”
Considerando que a autora nasceu 11.06.1968, tem-se que contava, na data de 17.10.2018
(DIB), com 53 anos, 04 meses e 06 dias de idade, conforme apurado pela contadoria judicial.
Assim, somado o tempo de contribuição apurado com a idade da autora, chega-se ao total de
84 anos, 05 meses e 13 dias (fl. 102 do evento 02), de modo que não foi preenchido o requisito
legal.
Logo, a parte autora faz jus à percepção de aposentadoria por tempo de contribuição com
coeficiente de 100%, desde a data do requerimento administrativo (17.10.2018), com incidência
do fator previdenciário.
2. Danos Morais.
O simples indeferimento administrativo de um benefício não ocasiona dano moral, mas apenas
o descontentamento da parte com o que foi decidido.
Ademais, a autora poderia ter apresentado recurso, mas não o fez.
Ainda, no que se refere à possibilidade de dispensa da autora do emprego junto à Prefeitura
Municipal de São Joaquim da Barra, por conta da concessão de benefício nos termos da EC
103/2019, conforme fundamentação supra, sua aposentadoria por tempo de contribuição foi
concedida de acordo com a legislação anterior.
Por conseguinte, a autora não faz jus ao recebimento da indenização pretendida.
O réu recorre, sustentando, em síntese, que (i) no processo administrativo de 2018 houve a
notificação da autora, via sistema informatizado, para que apresentasse documentos da
Prefeitura que informassem para qual regime de previdência as contribuições foram feitas
(págs. 47 do PA) e a autora nada apresentou; (ii) sem o cômputo do tempo na Prefeitura, era
incabível, naquele quadro, a reafirmação da DER; e (iii) não ficou comprovada qualquer conduta
negligente ou desidiosa por parte da autarquia. Requer, por isso, a improcedência da ação.
Todavia, para o caso de manutenção do benefício, requer que seja aplicado o IPCA-E como
índice de correção monetária e juros na forma das Leis nº 11.960/2009 e nº 12.703/2012
(variação da caderneta de poupança).
A autora ofereceu contrarrazões, alegando a nulidade da sentença e erro material, uma vez
queem momento algum requereu a concessão do benefício desde a DER, mas sim a partir de
05/08/2019.
Em petição juntada em 04/03/2022, requereu a realização do julgamento por videoconferência
para apresentação de sustentação oral e expedição de certidão de objeto e pé.
As partes foram intimadas nos termos do art. 10 do Código de Processo Civil, em razão de
possível nulidade parcial da sentença.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº5004566-11.2020.4.03.6102
RELATOR:29º Juiz Federal da 10ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: RITA DE CASSIA DA SILVA OLIVEIRA
Advogados do(a) RECORRIDO: JOSE PAULO BARBOSA - SP185984-A, HENRIQUE
FERNANDES ALVES - SP259828-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
JUIZ FEDERAL CAIO MOYSÉS DE LIMA (RELATOR):
Nulidade parcial da sentença
A sentença concedeu o benefício desde a data de entrada do requerimento administrativo
(DER), mas a autora requereu a concessãoa partir de 05/08/2019, quando ainda estava em
curso o procedimento administrativo.
Dessa forma, reconheço a nulidade parcial da sentença, tendo em vista o disposto no art. 492
do Código de Processo Civil (É vedado ao juiz proferir decisão de natureza diversa da pedida,
bem como condenar a parte em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi
demandado) e, consequentemente, passo a analisar a possibilidade de reafirmação da DER
para 05/08/2019.
Matéria de fundo
A sentença assim se pronunciou sobre o período trabalhado na Prefeitura:
Da documentação constante dos autos (evento 02) é possível verificar que a autora havia
requerido a aposentadoria por tempo de contribuição em 26.01.2017 (fl. 41), ocasião em que o
INSS apurou tempo de contribuição de 29 anos, 04 meses e 16 dias (fl. 51).
Posteriormente, em 26.11.2019 (fl. 142 do evento 02), após a negativa do requerimento
formulado em 17.10.2018, a autora novamente pleiteou a aposentadoria junto ao INSS, que lhe
foi deferida, computados 32 anos, 02 meses e 03 dias de contribuição e calculada observado o
direito adquirido antes da EC 103/2019 (pesquisa Plenus – evento 12).
A grande pendência, ocorrida no requerimento administrativo de 2018, objeto desta lide, é que o
INSS não considerou como tempo de contribuição da autora, naquela oportunidade, o período
laborado para a Prefeitura Municipal de São Joaquim da Barra, por entender que a autora
deveria comprovar o regime previdenciário ao qual estava vinculada.
No entanto, nos outros dois requerimentos administrativos, a questão sequer foi aventada.
O CNIS da autora aponta as pendências AVEXT-VT e AVRC-DEF (vínculo extemporâneo
confirmado pelo INSS e acerto confirmado pelo INSS) para o vínculo e não há qualquer menção
a Regime Próprio de Previdência Social - RPPS (fl. 97 do evento 02).
Aliás, o vínculo está devidamente anotado na CTPS da autora (fl. 85 do evento 02), havendo,
inclusive, anotação de opção FGTS.
Logo, de fato, não havia motivos para desconsideração do vínculo em questão por ocasião do
requerimento administrativo formulado em 17.10.2018. (grifei)
Uma vez que tais fundamentos estão em sintonia com meu próprio entendimento, adoto-os
como razão de decidir.
Reafirmação da DER
É possível a reafirmação da DER, durante o procedimento administrativo, conforme dispõeo art.
690 da Instrução Normativa nº 77/2015 do INSS:
Art. 690. Se durante a análise do requerimento for verificado que na DER o segurado não
satisfazia os requisitos para o reconhecimento do direito, mas que os implementou em
momento posterior, deverá o servidor informar ao interessado sobre a possibilidade de
reafirmação da DER, exigindo-se para sua efetivação a expressa concordância por escrito.
Parágrafo único. O disposto no caput aplica-se a todas as situações que resultem em benefício
mais vantajoso ao interessado.
No presente caso, a data de entrada do requerimento administrativo se deu em 17/10/2018 e o
processo administrativo somente se encerrou em 29/08/2019. Portanto, em conformidade com
as normas editadas pela própria autarquia, é possível, em tese,a reafirmação da DER para
05/08/2019.
Ora, uma vez que o próprio INSS reconheceu que o vínculo coma Prefeitura Municipal de São
Joaquim da Serra perdurou até 31/01/2020, trata-se de período incontroverso, que podeser
computado.
Com base na contagem elaborada administrativamente pelo próprio INSS (pág. 264 do ID
213504703), a autora, em 05/08/2019, somava um total de 31 anos, 10 meses e 24 dias de
contribuição e 86 pontos, conforme contagem efetuada utilizando ferramenta de cálculo da
Justiça Federal:
Dessa forma, possível a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição nos termos do
art. 29-C, inciso II, § 2º, da Lei nº 8.213/91.
Consectários legais
A partir da entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 113, de 8 de dezembro de 2021, o
índice aplicável à correção dos débitos judiciais da Fazenda Pública, independentemente de
sua natureza, passou a ser aSELIC, quedeve ser utilizada tanto para fins de atualização
monetária quanto para remuneração do capital e compensação da mora, conforme se extrai do
art. 3º da referida emenda constitucional:
Art. 3º Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública,
independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do
capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez,
até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de
Custódia (Selic), acumulado mensalmente
Considerando que a emenda em questão entrou em vigor em 9 de dezembro de 2021, sem
efeitos retroativos, o novo cirtério de atualizaçãodeve valer somente a partir da competência de
janeiro de 2022.
Os períodos anteriores a essa competência permanecem regidospelo art. 1º-F daLei nº
9.494/97 e pelas decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) nas ADIs nº 4.425 e 4.357. Nas
duas ações mencionadas, a Corte Suprema declarou a inconstitucionalidade parcial do citado
dispositivo legal, de modo a afastar a adoção do critério empregado para as cadernetas de
poupança como índice de atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública,
e determinar, em seu lugar, a aplicação do IPCA-E.
Ainda que o objeto das referidas ADIs fosse restrito aos juros de mora e à correção monetária
no momento posterior à expedição dos precatórios, quando do julgamento do RE 870.947-SE,
no regime de repercussão geral (Tema 810), o STF voltou a mencionar o IPCA-E, desta vez
como índice aplicável às condenações em geral impostas à Fazenda Pública:
DIREITO CONSTITUCIONAL. REGIME DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA E JUROS
MORATÓRIOS INCIDENTE SOBRE CONDENAÇÕES JUDICIAIS DA FAZENDA PÚBLICA.
ART. 1º-F DA LEI Nº 9.494/97 COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 11.960/09.
IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DA UTILIZAÇÃO DO ÍNDICE DE REMUNERAÇÃO DA
CADERNETA DE POUPANÇA COMO CRITÉRIO DE CORREÇÃO MONETÁRIA. VIOLAÇÃO
AO DIREITO FUNDAMENTAL DE PROPRIEDADE (CRFB, ART. 5º, XXII). INADEQUAÇÃO
MANIFESTA ENTRE MEIOS E FINS. INCONSTITUCIONALIDADE DA UTILIZAÇÃO DO
RENDIMENTO DA CADERNETA DE POUPANÇA COMO ÍNDICE DEFINIDOR DOS JUROS
MORATÓRIOS DE CONDENAÇÕES IMPOSTAS À FAZENDA PÚBLICA, QUANDO
ORIUNDAS DE RELAÇÕES JURÍDICO-TRIBUTÁRIAS. DISCRIMINAÇÃO ARBITRÁRIA E
VIOLAÇÃO À ISONOMIA ENTRE DEVEDOR PÚBLICO E DEVEDOR PRIVADO (CRFB, ART.
5º, CAPUT). RECURSO EXTRAORDINÁRIO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O princípio
constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput), no seu núcleo essencial, revela que o art. 1º-F
da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os
juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir
sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, os quais devem observar os mesmos juros
de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito; nas hipóteses de relação jurídica
diversa da tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da
caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto legal
supramencionado. 2. O direito fundamental de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII) repugna o
disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, porquanto a
atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração
oficial da caderneta de poupança não se qualifica como medida adequada a capturar a variação
de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina. 3. A correção
monetária tem como escopo preservar o poder aquisitivo da moeda diante da sua
desvalorização nominal provocada pela inflação. É que a moeda fiduciária, enquanto
instrumento de troca, só tem valor na medida em que capaz de ser transformada em bens e
serviços. A inflação, por representar o aumento persistente e generalizado do nível de preços,
distorce, no tempo, a correspondência entre valores real e nominal (cf. MANKIW, N.G.
Macroeconomia. Rio de Janeiro, LTC 2010, p. 94; DORNBUSH, R.; FISCHER, S. e STARTZ, R.
Macroeconomia. São Paulo: McGraw-Hill do Brasil, 2009, p. 10; BLANCHARD, O.
Macroeconomia. São Paulo: Prentice Hall, 2006, p. 29). 4. A correção monetária e a inflação,
posto fenômenos econômicos conexos, exigem, por imperativo de adequação lógica, que os
instrumentos destinados a realizar a primeira sejam capazes de capturar a segunda, razão pela
qual os índices de correção monetária devem consubstanciar autênticos índices de preços. 5.
Recurso extraordinário parcialmente provido. (RE 870947, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal
Pleno, julgado em 20/09/2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO
DJe-262 DIVULG 17-11-2017 PUBLIC 20-11-2017) (grifei)
Confira-se, a propósito do tema, o seguinte trecho do voto do relator, Ministro Luiz Fux:
“[...]
SEGUNDA QUESTÃO:
Regime de atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública
Já quanto ao regime de atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública, a
questão reveste-se de sutilezas formais. É que, diferentemente dos juros moratórios, que só
incidem uma única vez até o efetivo pagamento, a atualização monetária da condenação
imposta à Fazenda Pública ocorre em dois momentos distintos:
O primeiro se dá ao final da fase de conhecimento com o trânsito em julgado da decisão
condenatória. Esta correção inicial compreende o período de tempo entre o dano efetivo (ou o
ajuizamento da demanda) e a imputação de responsabilidade à Administração Pública. A
atualização é estabelecida pelo próprio juízo prolator da decisão condenatória no exercício de
atividade jurisdicional.
O segundo momento ocorre já na fase executiva, quando o valor devido é efetivamente
entregue ao credor. Esta última correção monetária cobre o lapso temporal entre a inscrição do
crédito em precatório e o efetivo pagamento. Seu cálculo é realizado no exercício de função
administrativa pela Presidência do Tribunal a que vinculado o juízo prolator da decisão
condenatória.
O Supremo Tribunal Federal, ao julgar as ADIs nº 4.357 e 4.425, declarou a
inconstitucionalidade da correção monetária pela TR apenas quanto ao segundo período, isto é,
quanto ao intervalo de tempo compreendido entre a inscrição do crédito em precatório e o
efetivo pagamento. Isso porque a norma constitucional impugnada nas ADIs (art. 100, §12, da
CRFB, incluído pela EC nº 62/09) referia-se apenas à atualização do precatório e não à
atualização da condenação ao concluir-se a fase de conhecimento.
[...]
As expressões “uma única vez” e “até o efetivo pagamento” dão conta de que a intenção do
legislador ordinário foi reger a atualização monetária dos débitos fazendários tanto na fase de
conhecimento quanto na fase de execução. Daí por que o STF, ao julgar as ADIs nº 4.357 e
4.425, teve de declarar a inconstitucionalidade por arrastamento do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97.
Essa declaração, porém, teve alcance limitado e abarcou apenas a parte em que o texto legal
estava logicamente vinculado no art. 100, §12, da CRFB, incluído pela EC nº 62/09, o qual se
refere tão somente à “atualização de valores de requisitórios”.
Na parte em que rege a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública
até a expedição do requisitório (i.e., entre o dano efetivo/ajuizamento da demanda e a
condenação), o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 ainda não foi objeto de pronunciamento expresso do
Supremo Tribunal Federal quanto à sua constitucionalidade.
[...]
Entendo, assim, que a remuneração da caderneta de poupança prevista no art. 1º-F da Lei nº
9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/09, não consubstancia índice
constitucionalmente válido de correção monetária das condenações impostas à Fazenda
Pública, uma vez que desvinculada da variação de preços na economia, como revelam os
ângulos lógico-conceitual, técnico-metodológico, histórico-jurisprudencial e pragmático-
consequencialista apresentados supra.
DISPOSITIVO
Por todas as razões expostas, voto no sentido de, no caso concreto, DAR PROVIMENTO
PARCIAL ao recurso extraordinário interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS),
para, confirmando, em parte, o acórdão lavrado pela Quarta Turma do Tribunal Regional
Federal da 5ª Região, (i) assentar a natureza assistencial da relação jurídica em exame (caráter
não-tributário) e (ii) manter a concessão de benefício de prestação continuada (Lei nº 8.742/93,
art. 20) ao ora recorrido (iii) atualizado monetariamente segundo o IPCA-E desde a data fixada
na sentença e (iv) fixados os juros moratórios segundo a remuneração da caderneta de
poupança, na forma do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09.
Quanto à tese da repercussão geral, voto pela sua consolidação nos seguintes termos:
1. O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que
disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional
ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária , aos quais devem ser aplicados
os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em
respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações
oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de
remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta
extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09;
2. O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que
disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a
remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição
desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica
como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a
promover os fins a que se destina.
A fim de evitar qualquer lacuna sobre o tema e com o propósito de guardar coerência e
uniformidade com o que decidido pelo Supremo Tribunal Federal ao julgar a questão de ordem
nas ADIs nº 4.357 e 4.425, entendo que devam ser idênticos os critérios para a correção
monetária de precatórios e de condenações judiciais da Fazenda Pública. Naquela
oportunidade, a Corte assentou que, após 25.03.2015, todos os créditos inscritos em
precatórios deverão ser corrigidos pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-
E). Nesse exato sentido, voto pela aplicação do aludido índice a todas as condenações judiciais
impostas à Fazenda Pública, qualquer que seja o ente federativo de que se cuide.”
Desse modo, conforme se extrai da jurisprudência da Corte Suprema, o IPCA-E é o índice de
atualização monetária a ser aplicado a todas as condenações contra a Fazenda Pública atéa
competência de dezembro de 2021.
No presente caso, considerando que o IPCA-E já está previsto no Manual de Cálculos da
Justiça Federal e que a SELIC não foi objeto do recurso (até porque ainda não vigorava a EC
113/2022), falta interesse recursal ao INSS quanto ao pedido subsidiário.
Diante do exposto, voto por negar provimento ao recurso do INSS e, de ofício, retificar a
sentença quanto à DER, nos termos da fundamentação, a fim de determinar a implantação do
benefício de aposentadoria por tempo de contribuição a partir de 05/08/2019, computando um
total de 31 anos, 10 meses e 24 dias de contribuição e 86 pontos.
Condeno o réu ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) do
valor da condenação, nos termos do art. 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil e do art. 55
da Lei nº 9.099/95, considerando a baixa complexidade do tema.
É o voto.
E M E N T A
Dispensada a ementa, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/95, combinado com o art. 1º da Lei
nº 10.259/2001. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Décima Turma
Recursal do Juizado Especial Federal da Terceira Região - Seção Judiciária de São Paulo, por
unanimidade, negar provimento ao recurso da parte ré, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
