
| D.E. Publicado em 10/07/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO ao recurso de apelação da parte ré, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002497-65.2010.4.03.6127/SP
RELATÓRIO
O Senhor Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS:
Trata-se de apelação interposta pela parte ré (fls. 100/121) em face da r. sentença (fls. 92/97) que julgou procedente pedido formulado pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS para condená-la a devolver aos cofres públicos a importância que recebeu a título de aposentadoria por tempo de serviço (NB 42/108.217.995/4), devidamente acrescida de correção monetária e de juros, fixando verba honorária em 10% do valor atualizado da causa, além do reembolso de custas processuais.
Sustenta, preliminarmente, a incidência do fenômeno da coisa julgada (uma vez que a questão já teria sido dirimida no bojo do Mandado de Segurança nº 0001683-97.2003.403.6127) e, como prejudicial de mérito, a ocorrência de prescrição (seja de acordo com as regras do Código Tributário Nacional, seja de acordo com o Código Civil, seja, ainda, de acordo com as normas previdenciárias) - no mérito, aduz ser indevido o ressarcimento ante o recebimento dos importes de boa-fé e a ausência de prejuízo ao erário (pois continuaria vertendo contribuições ao sistema).
Subiram os autos sem contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
O Senhor Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS:
Trata-se de demanda ajuizada pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em face da parte ré visando a condenação desta ao ressarcimento ao erário da importância percebida a título de aposentadoria por tempo de serviço, que vigorou de 29/01/1998 a 01/03/2005. Argumenta o ente público que a parte ré requereu sua desaposentação e a expedição de certidão de tempo de serviço com o escopo de averbar seu período contributivo em Regime Próprio de Previdência Social (o que foi concedido nos autos do Mandado de Segurança nº 0001683-97.2003.403.6127), restando pendente, entretanto, questão afeta a devolução dos valores adimplidos (que, a teor dos r. provimentos exarados no indicado writ, deveria ser pugnada em via processual própria), motivo pelo qual ajuizou esta relação processual.
DA COISA JULGADA
Alega a parte ré que a questão objeto deste feito já teria sido resolvida no Mandado de Segurança nº 0001683-97.2003.403.6127, motivo pelo qual acobertada pelo manto da coisa julgada, o que imporia a extinção sem resolução de mérito desta relação processual.
Com efeito, analisando as peças colacionadas às fls. 71/89 dos autos, verifica-se que a parte autora impetrou mandamus visando obter ordem que assegurasse seu direito líquido e certo de se desaposentar (com a consequente expedição de certidão de tempo de serviço) para fins de averbação junto a Regime Próprio de Previdência Social. Especificamente a teor de fls. 71/73, consta decisão exarada pelo Ilustre Magistrado nos autos do writ em comento em decorrência de embargos de declaração lá opostos no qual o cerne controvertido guardava relação justamente com a necessidade de sanação de omissão no julgado atinente à (des)necessidade de devolução dos valores percebidos de aposentação.
Naquela oportunidade (fls. 71/73), restou consignado que não se encontrava albergado pelo pedido formulado no mandado de segurança aspecto relativo à devolução dos valores (até mesmo porque a impetração foi manejada pela própria parte ré desta atual relação processual), sendo que a ação constitucional não permitiria o manejo nem de reconvenção nem a postulação de pedido contraposto, razão pela qual a autarquia previdenciária (na pessoa da autoridade apontada como coatora) não poderia pugnar pelo ressarcimento ao erário naquela via processual (devendo postular tal pretensão pelas vias ordinárias).
Tal entendimento foi mantido por este E. Tribunal Regional quando da apreciação do reexame necessário e da apelação apresentada pelo ente público no Mandado de Segurança em comento (fls. 74/76), cabendo considerar que restou expressamente contido no v. acórdão que "não há que se falar, por fim, em ressarcimento dos valores recebidos pelo impetrante, uma vez que o objeto do presente writ é o reconhecimento da renúncia à aposentadoria e a expedição de certidão de tempo de serviço da aposentadoria renunciada" de modo que "nada há que ser modificado na sentença recorrida".
Portanto, nota-se cabalmente que a questão discutida neste feito não restou apreciada em sede do Mandado de Segurança anteriormente impetrado pela parte ré no qual postulou tão somente sua desaposentação (com a consequente expedição de certidão de tempo de serviço para fins de averbação em Regime Próprio de Previdência Social), donde se conclui que não há que se falar na ocorrência do fenômeno da coisa julgada, motivo pelo qual de rigor rechaçar a preliminar aventada.
DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO
De plano, importante ser dito que a ação manejada pelo ente previdenciário, a despeito de nominada "ressarcimento ao erário", não guarda contornos de imprescritibilidade. Isso porque a regra da imprescritibilidade prevista no art. 37, § 5º, da Constituição Federal, apenas tem seu campo de incidência delimitado às ações decorrentes de atos de improbidade, vale dizer, o ressarcimento ao erário motivado por ato ímprobo não encontra obstáculo ao seu exercício pelo decurso de prazo, razão pela qual se mostra imprescritível em razão do indicado comando constitucional. Por outro lado, demandas ressarcitórias levadas a efeito pelo Poder Público prescrevem, não tendo guarida na regra da imprescritibilidade anteriormente mencionada.
Tal entendimento foi sufragado pelo C. Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do RE 669.069 (submetido às regras da repercussão geral da questão constitucional), oportunidade em que restou firmada a tese segundo a qual "é prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil" (redação da tese aprovada nos termos do item 02, da Ata da 12ª Sessão Administrativa do E. Supremo Tribunal Federal, realizada em 09/12/2015). A propósito, segue a ementa do julgado:
Nesse diapasão, uma vez assentada a incidência do prazo extintivo de direito na hipótese em comento (nos termos anteriormente tecidos), cumpre perquirir qual lapso a Fazenda Pública possui para exercer a sua pretensão. E, nesse contexto, por questões de simetria e de isonomia, deve ser aplicado o disposto no Decreto nº 20.910/32. Tal diploma normativo aduz que prescreve em 05 (cinco) anos qualquer pretensão ressarcitória a ser exercida contra a Fazenda Pública, regramento este que deve ser aplicado analogicamente a situações em que o credor não é o particular, mas sim o ente político, ante a ausência de previsão legal atinente à matéria. A esse respeito, seguem os julgados abaixo:
Portanto, a pretensão deduzida nessa relação processual deve respeitar o lapso prescricional de 05 (cinco) anos, por aplicação isonômica do Decreto nº 20.910/32, não devendo ser cogitada, tal qual pugnado pela parte ré, a aplicação de regras insertas no Código Tributário Nacional, no Código Civil ou em normas previdenciárias. Ressalte-se, por oportuno, que a fluência de tal interregno começa a partir do instante em que surge a pretensão para o ente autárquico, o que, no caso dos autos, apura-se ter ocorrido quando do trânsito em julgado do Mandado de Segurança nº 0001683-97.2003.403.6127 (dia 14/01/2010 - fls. 88v/89), tendo em vista que foi neste momento em que restou definitivamente resolvida a necessidade de requerimento da prestação ressarcitória ao erário por meio da dedução da pretensão em via processual distinta da do writ impetrado.
Por tais fundamentos, afasto, também, a prejudicial de mérito arguida pela parte ré ante a não ocorrência de prescrição na justa medida em que não transcorreram mais de 05 (cinco) anos entre o surgimento da pretensão para a autarquia previdenciária (14/01/2010 - fls. 88v/89) e o momento de ajuizamento desta ação (10/06/2010 - fls. 02).
DO RESSARCIMENTO AO ERÁRIO
Debate-se neste feito, conforme anteriormente aduzido, a necessidade (ou não) da parte ré devolver o que percebeu enquanto vigeu sua aposentadoria por tempo de serviço mantida pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS (intervalo de 29/01/1998 a 01/03/2005) em razão do pleito por ela formulado de desaposentação levado a efeito e deferido nos autos do Mandado de Segurança nº 0001683-97.2003.403.6127. A r. sentença guerreada entendeu por bem acolher o postulado pelo ente público, de modo que assentou ser imperioso o ressarcimento da importância percebida ao longo do interregno anteriormente delimitado, com o que a parte ré não concorda.
Penso que o ponto controvertido acima descrito deve ser solucionado tendo como base os princípios que regem o Regime Geral de Previdência Social com assento constitucional (especialmente os postulados segundo os quais o sistema é contributivo e deve sempre manter o equilíbrio econômico-financeiro-atuarial) cotejado com o princípio geral de Direito que prega a vedação ao enriquecimento indevido.
Nesse diapasão, dispõe o caput do art. 201 da Constituição Federal que a Previdência Social deverá ser organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, sempre observados os critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, de modo que se extrai de tal preceito duas características basilares do regime jurídico previdenciário: a necessidade de que o sistema seja custeado mediante contribuições (das mais diversas fontes) e de que não poderá haver, até mesmo para que o sistema consiga se manter ao longo dos anos, mácula ao equilíbrio econômico-financeiro-atuarial - destaque-se que tais premissas são estabelecidas para que seja viável a Previdência Social com o passar de várias gerações (que usufruíram, usufruem e usufruirão do Seguro Social público).
E justamente o caso retratado nos autos, penso eu, ofende os dois princípios constitucionais mencionados anteriormente (caráter contributivo e equilíbrio econômico-financeiro-atuarial) na justa medida em que a parte ré postulou sua desaposentação para ingresso em Regime Próprio de Previdência Social (o que, nos termos da legislação de regência, impõe a compensação financeira entre os Regimes Previdenciários) a despeito de já ter gozado de aposentadoria mantida pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS pelo lapso de 29/01/1998 a 01/03/2005 (fls. 10), prática esta que somente pode ser viabilizada com o retorno integral ao status quo ante, ou seja, com a renúncia do ato de aposentação (o que foi obtido no Mandado de Segurança nº 0001683-97.2003.403.6127) e com a devolução dos valores percebidos enquanto vigente o benefício previdenciário renunciado (justamente para possibilitar a compensação entre os Regimes Geral e Próprio de Previdência Social de acordo com os critérios e com as normas estabelecidas na legislação que trata de tal aspecto).
Sem prejuízo do exposto, devemos considerar também, para a debelação da questão ora em apreciação, o princípio geral de Direito que coíbe e não tolera o enriquecimento indevido - ofende tal postulado o fato da parte ré, ao buscar o desfazimento do ato de aposentação exercido junto ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS (e tê-lo obtido), não pretender devolver o que já lhe foi pago (e, portanto, permitiu fruir dos benefícios que tais verbas mensais propiciaram no tempo em que adimplidas) e, posteriormente, pugnar por nova e melhor prestação previdenciária em Regime Próprio de Previdência Social levando em consideração exatamente o mesmo período que serviu de base para o deferimento da aposentadoria junto ao Regime Geral de Previdência Social, de modo que é natural a necessidade de devolução da importância acumulada que lhe foi paga no interregno de 29/01/1998 a 01/03/2005 a título de aposentadoria por tempo de serviço.
A conclusão exposta (de necessidade de ressarcimento ao erário) não cede em face da natureza alimentar dos valores previdenciários nem da alegada boa-fé da parte ré e muito menos em decorrência do suposto fato dela continuar vertendo exações previdenciárias ao sistema. Isso porque o ato de desaposentação foi pugnado e requerido pela parte ré em demanda intentada com tal desiderato, ou seja, houve manifestação volitiva voluntária no sentido de renunciar ao benefício em manutenção (com o escopo de, futuramente, constituir relação jurídica previdenciária melhor sob o aspecto financeiro), de modo que tal ato de vontade tem o condão de gerar outros efeitos e consequências, dentre as quais o dever de restituir o Poder Público acerca da quantia que lhe foi paga enquanto vigente sua aposentação. Imperioso, conforme dito alhures, o retorno ao status quo ante de maneira integral: desfazimento do ato de aposentadoria (mediante a renúncia do benefício) e ressarcimento ao erário dos valores recebidos enquanto esteve hígido o benefício.
Por todos os fundamentos anteriormente descritos, o r. provimento judicial impugnado deve ser mantido, de modo que a parte ré deve ser condenada a devolver ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a importância percebida a título de aposentadoria por tempo de serviço que gozou entre 29/01/1998 e 01/03/2005. Ressalte-se, entretanto, que tal ressarcimento deve ficar adstrito ao limite de até 30% (trinta por cento) do que a parte ré atualmente percebe de aposentadoria ou de proventos / subsídio / salário, em respeito ao patamar que a autarquia previdenciária possui, por força de lei, no que tange a descontos que pode levar a efeito.
CONSECTÁRIOS
Os juros de mora e a correção monetária deverão ser calculados na forma prevista no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, sem prejuízo da aplicação da legislação superveniente, observando-se, ainda, quanto à correção monetária, o disposto na Lei n.º 11.960/2009, consoante a Repercussão Geral reconhecida no RE n.º 870.947, em 16.04.2015, Rel. Min. Luiz Fux.
Verba honorária e reembolso de despesas processuais mantidos nos termos da r. sentença recorrida.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por NEGAR PROVIMENTO ao recurso de apelação da parte ré, nos termos anteriormente expendidos.
Fausto De Sanctis
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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| Data e Hora: | 27/06/2017 15:55:42 |
