Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0003554-77.2016.4.03.6105
Relator(a)
Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
05/03/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 13/03/2020
Ementa
E M E N T A
AÇÃO DE RESSARCIMENTO.PREVIDENCIÁRIO. RESTITUIÇÃO DE BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL PAGO INDEVIDAMENTE AO BENEFICIÁRIO. DESNECESSIDADE. MÁ-FÉ
NÃO COMPROVADA. NATUREZA ALIMENTAR DO BENEFÍCIO. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. IMPOSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO
DO INSS.
1. A parte ré teve o benefício assistencial nº 88/529.499.457-3 concedido a partir de 19/03/2008.
2. Identificada irregularidade na concessão do referido benefício, consistente na renda familiar
superior a 1/4 do salário-mínimo vigente, foi considerado indevido o pagamento do LOAS à parte
ré, pretendendo a autarquia o ressarcimento deste montante.
3. Não se mostra possível, porém, a cobrança dos valores pagos equivocadamente à parte ré,
pois, conforme pacificado pelo E. Supremo Tribunal Federal, os valores indevidamente recebidos
somente devem ser restituídos quando demonstrada a má-fé do beneficiário, tendo em vista
tratar-se de verbas de caráter alimentar, o que não ocorreu no caso concreto.
4. Com relação à fixação de honorários advocatícios para a Defensoria Pública da União, tendo
em vista que a ação foi ajuizada pelo INSS, ambos estão inseridos no conceito de Fazenda
Pública, de modo que verificada a confusão de credor e devedor, inviável o reconhecimento da
obrigação pretendida, como, aliás, encontra-se pacificado na jurisprudência, por meio da Súmula
421, do STJ.
5. Apelação do INSS parcialmente provida.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0003554-77.2016.4.03.6105
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE ROBERTO
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0003554-77.2016.4.03.6105
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE ROBERTO
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator):Trata-se de ação proposta
peloINSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSSem face deJOSE
ROBERTO,objetivando o ressarcimento de valores indevidamente pagos a título de benefício
assistencial.
Juntados documentos.
A parte ré apresentou contestação.
Réplica do INSS.
O MM. Juízo de origem julgou improcedente o pedido.
Inconformada, a autarquia interpôs recurso de apelação alegando, em síntese, ser devida a
restituição, pela parte ré, dos valores indevidamente recebidos, sob pena de configuração de
enriquecimento ilícito. Subsidiariamente, argui a impossibilidade de pagamento de honorários
advocatícios em favor da Defensoria Pública da União.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
O Ministério Público Federal se manifestou pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0003554-77.2016.4.03.6105
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE ROBERTO
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator):Inicialmente, verifica-se que a parte ré
teve o benefício assistencial nº 88/529.499.457-3 concedido a partir de 19/03/2008 (página 24 -
ID 40967173).
No entanto, em 13/06/2014, foi-lhe enviado um ofício comunicando que havia sido identificado
indício de irregularidade na concessão do referido benefício, consistente na renda familiar
superior a 1/4 do salário-mínimo vigente, vez que reside coma sua companheira e esta é titular de
aposentadoria por tempo de contribuição, sendo-lhe oportunizado o prazo de 10 dias para
apresentação de defesa (página 43 - ID 40967173).
Não apresentada defesa pela parte ré, a autarquia entendeu tratar-se de concessão irregular de
benefício, facultando o prazo de 30 dias para a apresentação de recurso desta decisão (página
53 - ID 40967173).
Não interposto recurso, o INSS procedeu à cobrança administrativa dos valores pagos a este
título (página 63 - ID 40967173)., não tendo a parte ré, contudo, efetuado o pagamento.
Pretende o INSS, por meio da presente ação judicial, o ressarcimento do montante indevidamente
pago a título de benefício assistencial.
Conforme pacificado pelo E. Supremo Tribunal Federal, os valores indevidamente recebidos
somente devem ser restituídos quando demonstrada a má-fé do beneficiário, tendo em vista
tratar-se de verbas de caráter alimentar:
"AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO
PREVIDENCIÁRIO. PAGAMENTO A MAIOR. DEVOLUÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS
INDEVIDAMENTE PELO SEGURADO AO INSS. ART. 115 DA LEI 8.213/91. IMPOSSILIDADE.
BOA-FÉ. NATUREZA ALIMENTAR. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA RESERVA
DE PLENÁRIO. INOCORRÊNCIA. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL.
1. A violação constitucional dependente da análise do malferimento de dispositivo
infraconstitucional encerra violação reflexa e oblíqua, tornando inadmissível o recurso
extraordinário.
2. O princípio da reserva de plenário não resta violado, nas hipóteses em que a norma em
comento (art. 115 da Lei 8.213/91) não foi declarada inconstitucional nem teve sua aplicação
negada pelo Tribunal a quo, vale dizer: a controvérsia foi resolvida com a fundamento na
interpretação conferida pelo Tribunal de origem a norma infraconstitucional que disciplina a
espécie. Precedentes: AI 808.263-AgR, Primeira Turma Rel. Min. LUIZ FUX, DJe de 16.09.2011;
Rcl. 6944, Pleno, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, Dje de 13.08.2010; RE 597.467-AgR, Primeira
Turma, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI Dje de 15.06.2011 AI 818.260-AgR, Segunda
Turma, Rel. Min. ELLEN GRACIE, Dje de 16.05.2011, entre outros.
3. In casu, o acórdão recorrido assentou: "PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO
DE CONTRIBUIÇÃO. COBRANÇA DOS VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE. CARÁTER
ALIMENTAR DAS PRESTAÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. 1. Esta Corte vem se manifestando no
sentido da impossibilidade de repetição dos valoresrecebidos de boa-fé pelo segurado, dado o
caráter alimentar das prestações previdenciárias, sendo relativizadas as normas dos arts. 115, II,
da Lei nº 8.213/91, e 154, § 3º, do Decreto nº 3.048/99. 2. Hipótese em que, diante do princípio
da irrepetibilidade ou da não-devolução dos alimentos, deve ser afastada a cobrança dos valores
recebidos indevidamente pelo segurado, a título de aposentadoria por tempo de contribuição."
4. Agravo regimental desprovido." (STF, AgRg no AI 849.529, Relator Ministro LUIZ FUX, j.
14/02/2012, DJe 15/03/2012)
No mesmo sentido, a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça:
"AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. DEVOLUÇÃO DOS VALORES
PAGOS EM RAZÃO DE ERRO DA ADMINISTRAÇÃO NA CONCESSÃO DE BENEFÍCIO.
DESNECESSIDADE. BOA-FÉ DO SEGURADO. HIPOSSUFICIÊNCIA. NATUREZA ALIMENTAR
DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
É incabível a devolução pelos segurados do Regime Geral da Previdência Social de valores
recebidos em decorrência de erro da Administração Pública. Entendimento sustentado na boa-fé
do segurado, na sua condição de hipossuficiente e na natureza alimentar dos benefícios
previdenciários.
Agravo regimental desprovido." (AgRg no Ag 1170485/RS, 5ª Turma, Relator Ministro FELIX
FISCHER, j. 11/07/2009, DJe 14/12/2009);
"AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA RURAL CASSADA.
RESTITUIÇÃO DE PARCELAS PREVIDENCIÁRIAS PAGAS ADMINISTRATIVAMENTE. VERBA
ALIMENTAR RECEBIDA DE BOA FÉ PELA SEGURADA.
1- Não há a violação ao art. 130, § único da Lei nº 8.213/91, pois esse dispositivo exonera o
beneficiário da previdência social de restituir os valores recebidos por força da liquidação
condicionada, não guardando, pois, exata congruência com a questão tratada nos autos.
2- O art. 115 da Lei nº 8.213/91, que regulamenta a hipótese de desconto administrativo, sem
necessária autorização judicial, nos casos em que a concessão a maior se deu por ato
administrativo do Instituto agravante, não se aplica às situações em que o segurado é receptor de
boa-fé, o que, conforme documentos acostados aos presentes autos, se amolda ao vertente caso.
Precedentes.
3- Agravo regimental a que se nega provimento." (AgRg no REsp 413.977/RS, Relator Ministra
MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, 6ª Turma, j.19/02/2009, DJe 16/03/2009)
No caso, embora tenha sido comprovado que a parte ré já residia com a sua companheira à
época do requerimento administrativo do benefício assistencial, e que ela é beneficiária de
aposentadoria por tempo de contribuição desde 1985, o que torna a renda do núcleo familiar
superior a 1/4 do salário-mínimo e o LOAS indevido, não há elementos que demonstrem a
existência de má-fé.
Conforme se observa da cópia do processo administrativo, ao fazer o requerimento na via
administrativa a parte ré juntou como comprovante de endereço uma conta de telefone em nome
de sua companheira (página 07 - ID 40967173), não tendo o INSS questionado em momento
algum quem seria a titular dessa fatura.
Ainda, tem-se que embora o benefício tenha sido deferido em 19/03/2008, a autarquia somente
procedeu à sua revisão em 2014, e, nos termos do artigo 21 da Lei nº 8.742/93, "O benefício de
prestação continuada deve ser revisto a cada 2 (dois) anos para avaliação da continuidade das
condições que lhe deram origem."
Desse modo, conquanto o benefício tenha sido pago equivocadamente no período, é indevida a
restituição desses valores, tendo em vista a natureza alimentar de tais verbas, bem como a
ausência de comprovação da má-fé da parte ré no caso concreto, devendo-se destacar, ademais,
que a má-fé não pode ser presumida.
De rigor, portanto, a manutenção da sentença recorrida neste ponto.
Com relação aos honorários advocatícios, porém, assiste razão à autarquia.
Observo que a parte ré foi representada judicialmente pela Defensoria Pública da União, nos
autos de ação ajuizada pelo INSS, o qual está inserido no conceito de Fazenda Pública.
Dessa forma, verificada a confusão de credor e devedor, inviável o reconhecimento da obrigação
pretendida, como, aliás, encontra-se pacificado na jurisprudência, por meio da Súmula 421, do
STJ:
"Os honorários advocatícios não são devidos à Defensoria Pública quando ela atua contra a
pessoa jurídica de direito público à qual pertença."
Transcrevo, por oportuno, os seguintes julgados proferidos em sede de recurso especial
representativo de controvérsia:
"ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE
CONTROVÉRSIA REPETITIVA. RIOPREVIDÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
PAGAMENTO EM FAVOR DA DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.
NÃO CABIMENTO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
1. "Os honorários advocatícios não são devidos à Defensoria Pública quando ela atua contra a
pessoa jurídica de direito público à qual pertença" (Súmula 421/STJ).
2. Também não são devidos honorários advocatícios à Defensoria Pública quando ela atua contra
pessoa jurídica de direito público que integra a mesma Fazenda Pública.
3. Recurso especial conhecido e provido, para excluir da condenação imposta ao recorrente o
pagamento de honorários advocatícios." (STJ, Corte Especial, REsp 1199715 / RJ, Rel. Min.
Arnaldo Esteves Lima, j. em 16/02/2011, DJe em 12/04/2011).
"PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL SUBMETIDO À SISTEMÁTICA PREVISTA NO
ART. 543-C DO CPC. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DEFENSORIA PÚBLICA. CÓDIGO
CIVIL, ART. 381 (CONFUSÃO). PRESSUPOSTOS.
1. Segundo noção clássica do direito das obrigações, ocorre confusão quando uma mesma
pessoa reúne as qualidades de credor e devedor.
2. Em tal hipótese, por incompatibilidade lógica e expressa previsão legal extingue-se a
obrigação.
3. Com base nessa premissa, a jurisprudência desta Corte tem assentado o entendimento de que
não são devidos honorários advocatícios à Defensoria Pública quando atua contra a pessoa
jurídica de direito público da qual é parte integrante.
4. A contrario sensu, reconhece-se o direito ao recebimento dos honorários advocatícios se a
atuação se dá em face de ente federativo diverso, como, por exemplo, quando a Defensoria
Pública Estadual atua contra Município.
5. Recurso especial provido. Acórdão sujeito à sistemática prevista no art. 543-C do CPC e à
Resolução nº 8/2008-STJ." (STJ, Corte Especial, REsp 1108013 / RJ, Rel. Min. Eliana Calmon, j.
em 03/06/2009, DJe em 22/06/2009).
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS, tão somente para excluir a
condenação da autarquia em honorários advocatícios, mantendo, no mais, a r. sentença.
É como voto.
E M E N T A
AÇÃO DE RESSARCIMENTO.PREVIDENCIÁRIO. RESTITUIÇÃO DE BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL PAGO INDEVIDAMENTE AO BENEFICIÁRIO. DESNECESSIDADE. MÁ-FÉ
NÃO COMPROVADA. NATUREZA ALIMENTAR DO BENEFÍCIO. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. IMPOSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO
DO INSS.
1. A parte ré teve o benefício assistencial nº 88/529.499.457-3 concedido a partir de 19/03/2008.
2. Identificada irregularidade na concessão do referido benefício, consistente na renda familiar
superior a 1/4 do salário-mínimo vigente, foi considerado indevido o pagamento do LOAS à parte
ré, pretendendo a autarquia o ressarcimento deste montante.
3. Não se mostra possível, porém, a cobrança dos valores pagos equivocadamente à parte ré,
pois, conforme pacificado pelo E. Supremo Tribunal Federal, os valores indevidamente recebidos
somente devem ser restituídos quando demonstrada a má-fé do beneficiário, tendo em vista
tratar-se de verbas de caráter alimentar, o que não ocorreu no caso concreto.
4. Com relação à fixação de honorários advocatícios para a Defensoria Pública da União, tendo
em vista que a ação foi ajuizada pelo INSS, ambos estão inseridos no conceito de Fazenda
Pública, de modo que verificada a confusão de credor e devedor, inviável o reconhecimento da
obrigação pretendida, como, aliás, encontra-se pacificado na jurisprudência, por meio da Súmula
421, do STJ.
5. Apelação do INSS parcialmente provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Decima Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento a apelacao do INSS, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
