Processo
AR - AÇÃO RESCISÓRIA / SP
5019678-27.2019.4.03.0000
Relator(a)
Desembargador Federal DAVID DINIZ DANTAS
Órgão Julgador
3ª Seção
Data do Julgamento
04/09/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 09/09/2020
Ementa
E M E N T A
AÇÃO RESCISÓRIA AFORADA POR MARIA ELISA FERREIRA PINTO. APOSENTADORIA
POR IDADE A RURÍCOLA. DOCUMENTAÇÃO NOVA (ART. 966, INC. VII, DO CÓDIGO DE
PROCESSO CIVIL DE 2015): DESCARACTERIZAÇÃO NA ESPÉCIE. MATÉRIA PRELIMINAR
REJEITADA. PEDIDO FORMULADO NA ACTIO RESCISORIA JULGADO IMPROCEDENTE.
- A preliminar de decadência foi afastada por despacho não recorrido. De qualquer modo,
proposta a demanda em 02/08/2019 e ocorrido o trânsito em julgado em 20/05/2019
(ID76218437), não se há falar tenha sido ultrapassado o prazo de dois anos.
- A Súmula 343 do Supremo Tribunal Federal não se aplica à hipótese simplesmente porque o
pleito da parte autora baseia-se, segundo afirma, na existência de documentação nova e não em
eventual violação de lei.
- Sobre a actio rescisoria apresentar caráter recursal, é tema que se confunde com o mérito e
como tal é apreciado e resolvido.
- A parte autora afirma ter trazido aos autos prova nova consistente na Carteira Profissional do
esposo, Jair Joaquim Pinto.
- A princípio, ao menos em tese, haveria possibilidade de aproveitamento da referida CTPS, haja
vista tratar-se de suposta obreira campesina, para qual o Superior Tribunal de Justiça tem
mitigado o rigorismo na apresentação de documentação, mesmo que injustificada sua não oferta
anteriormente, i. e., por ocasião da instrução do feito primígeno.
- Ocorre que a prestação de serviços para terceiros por parte do esposo da requerente não é
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
circunstância nova, já que expressamente examinada no pronunciamento judicial rescindendo.
- Na verdade, a Carteira Profissional em questão corrobora o fundamento de que não restou
caracterizado exercício de atividade rural em regime de economia familiar, tampouco invalida a
informação de que "a autora possui cadastro como contribuinte individual, descaracterizando o
regime de economia familiar e no período imediatamente anterior ao requisito etário, de
01.03.2013 a 31.01.2018."
- Não bastasse, o referido documento também não possui força suficiente para, de per se, alterar
o raciocínio expresso no julgado sob censura, porque a extensão da profissão do empregado
rural à esposa, como no caso em apreço, não convence como ocorre quando a prestação do
serviço na agricultura dá-se em regime de economia familiar.
- Nesta última modalidade de mourejo, a ideia de participação da cônjuge no amanho da terra é
imanente à definição do art. 11, inc. VII, § 1º, da LBPS, isso porque, segundo o dispositivo legal
em testilha “Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos
membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico
do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a
utilização de empregados permanentes”, o mesmo não ocorrendo, necessariamente, quando o
varão trabalha como empregado com registro na CTPS. Precedentes desta Corte.
- Condenada a parte autora em honorários advocatícios de R$ 1.100,00 (mil e cem reais),
devendo ser observado, porém, o art. 98, §§ 2º e 3º, do CPC/2015, inclusive no que concerne às
custas e despesas processuais.
- Matéria preliminar rejeitada. Pedido formulado na ação rescisória julgado improcedente.
Acórdao
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5019678-27.2019.4.03.0000
RELATOR:Gab. 28 - DES. FED. DAVID DANTAS
AUTOR: MARIA ELISA FERREIRA PINTO
Advogado do(a) AUTOR: REGIANE DE FATIMA GODINHO DE LIMA - SP254393-N
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5019678-27.2019.4.03.0000
RELATOR:Gab. 28 - DES. FED. DAVID DANTAS
AUTOR: MARIA ELISA FERREIRA PINTO
Advogado do(a) AUTOR: REGIANE DE FATIMA GODINHO DE LIMA - SP254393-N
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de ação rescisória ajuizada aos 02/08/2019 por Maria Elisa Ferreira Pinto (art. 966, inc.
VII, CPC/2015) contra acórdão da 8ª Turma desta Corte, de provimento da apelação do INSS,
reformada sentença concessiva de aposentadoria por idade a rurícola e cassada tutela
anteriormente concedida.
Em resumo, afirma ter logrado encontrar documentação nova apta a modificar o julgado
rescindendo, qual seja, a Carteira de Trabalho do seu marido, na qual constam registros como
trabalhador rural:
"(...)
Ocorre que, em junho do presente ano, a autora teve acesso a carteira de trabalho de seu
marido, que comprova que o mesmo apenas teve vínculos rurais em carteira, nunca tendo
trabalhado nas vias rurais. (sic)
Diante da nova prova, que sana a deficiência probatória da apelação proposta pelo réu, conforme
fundamentação da decisão deste egrégio tribunal, não restou alternativas, senão a propositura da
presente ação para rescisão do acórdão nos termos da fundamentação a seguir exposta.
(...)."
Deferida Justiça gratuita à parte autora (ID 107612170).
Contestação (ID 126063081, p. 1-7). Preliminarmente: há decadência do direito de propor a
vertente demanda; a actio rescisoria apresenta caráter recursal e aplicável ao caso a Súmula 343
do Supremo Tribunal Federal.
Réplica (ID 131292528, p. 1-4).
Saneador, sem recurso, em que afastada a afirmação de decadência (ID 132070231, p. 1-2).
Razões finais da parte autora (ID 133040605, p. 1-3) e do ente público (ID 135368608).
Parquet Federal (ID 136340476, p. 1-3): "manifesta-se o Ministério Público Federal pelo regular
prosseguimento do feito".
Trânsito em julgado (ID 76218437): 20/05/2019.
É o relatório.
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5019678-27.2019.4.03.0000
RELATOR:Gab. 28 - DES. FED. DAVID DANTAS
AUTOR: MARIA ELISA FERREIRA PINTO
Advogado do(a) AUTOR: REGIANE DE FATIMA GODINHO DE LIMA - SP254393-N
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Cuida-se de ação rescisória ajuizada por Maria Elisa Ferreira Pinto (art. 966, inc. VII, CPC/2015)
contra acórdão da 8ª Turma desta Corte, de provimento da apelação do INSS, reformada
sentença concessiva de aposentadoria por idade a rurícola e cassada tutela anteriormente
concedida.
1. QUESTÕES PRELIMINARES
A preliminar de decadência foi afastada por despacho não recorrido.
De qualquer modo, proposta a demanda em 02/08/2019 e ocorrido o trânsito em julgado em
20/05/2019 (ID 76218437), não se há falar tenha sido ultrapassado o prazo bienal na espécie.
A Súmula 343 do Supremo Tribunal Federal não se aplica à hipótese simplesmente porque o
pleito da parte autora baseia-se, segundo afirma, na existência de documentação nova e não em
eventual violação de lei.
Sobre a actio rescisoria apresentar caráter recursal, é tema que se confunde com o mérito e
como tal é apreciado e resolvido.
2. ART. 966, INC. VII, CPC/2015
Segundo o inc. VII do art. 485 do Codice Processual Civil de 1973 (atualmente, art. 966, inc. VII,
CPC/2015), tinha-se por novo o documento produzido anteriormente ao trânsito em julgado do
decisório do qual se pretendia a rescisão, cuja existência era ignorada pela parte, a quem
competia, entretanto, o ônus de demonstrar a inviabilidade de sua utilização na instrução do pleito
inicial.
É de se aduzir que devia de ter força probante a garantir, de per se, pronunciamento favorável
àquele que o estava a apresentar.
Para além, que o infirmava o fato de não ter sido ofertado na ação originária por negligência.
A propósito, cito doutrina de Rodrigo Barioni:
“(...)
A expressão 'documento novo' não guarda relação com o momento de sua formação. O
documento já existia à época da decisão rescindenda. A novidade está relacionada ao fato de o
documento não ter sido utilizado no processo que gerou a decisão rescindenda.
Deve tratar-se de documento já existente ao tempo da decisão rescindenda e inédito para o
processo originário, que represente inovação em relação ao material probatório da causa matriz,
suficiente a modificar o posicionamento adotado pela decisão rescindenda. Se o documento é
confeccionado após a decisão rescindenda ou não for inédito, isto é, se fora juntado aos autos da
ação originária, sem receber a devida apreciação na decisão rescindenda, não se insere no
conceito de documento novo.
(...)
Aspecto fundamental para o cabimento da ação rescisória, com suporte no inc. VII do art. 485 do
CPC, é que a não utilização do documento, no processo original, decorra de motivo alheio à
vontade do autor. Assim ocorrerá, por exemplo, se o documento foi furtado, se estava em lugar
inacessível, se não se pôde encontrar o depositário do documento, se a parte estava internada
em estado grave, se o documento foi descoberto após o trânsito em julgado etc. Ou seja, não
pode o autor, voluntariamente, haver recusado a produção da prova na causa anterior, de
maneira a gerar a impossibilidade da utilização, ou não haver procedido às diligências
necessárias para a obtenção do documento, uma vez que a ação rescisória não se presta a
corrigir a inércia ou a negligência ocorridas no processo originário. Por isso, cabe ao autor da
rescisória expor os motivos que o impediram de fazer uso do documento na causa matriz, para
que o órgão julgador possa avaliar a legitimidade da invocação.
Em princípio, documentos provenientes de serviços públicos ou de processos que não tramitaram
sob segredo de justiça não atendem à exigência de impossibilidade de utilização. A solução
preconizada ampara-se na presunção de conhecimento gerada pelo registro público ou pela
publicidade do processo (...)
É preciso, por fim, que o documento novo seja capaz, por si só, de assegurar pronunciamento
favorável ao autor da rescisória, isto é, seja apto a modificar o resultado do processo, total ou
parcialmente. Isso significa que o documento há de ser ‘decisivo' - como textualmente consta no
art. 395, n. 3, do CPC italiano -, representando prova segura sobre os fatos que nele constam, de
tal sorte que, se o juiz tivesse oportunidade de considerá-lo, o pronunciamento poderia ter sido
diverso. Cabe ao autor da rescisória o ônus de demonstrar, na inicial, que o documento novo é
capaz, isoladamente, de alterar o quadro probatório que se havia formado no processo em que foi
emanada a decisão rescindenda. Inviável, por isso, a reabertura da dilação probatória, para oitiva
de testemunhas e produção de provas, que visem a complementar o teor do documento novo. Se
este conflitar com outras provas dos autos, especialmente outros documentos, sem infirmá-las,
deve-se preservar a coisa julgada e julgar improcedente a ação rescisória.
(...).” (BARIONI, Rodrigo. Ação rescisória e Recursos para os Tribunais Superiores, São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 121-127) (g. n.)
A redação do inciso VII do art. 485 em consideração restou alterada no Código de Processo Civil
de 2015.
Agora, o art. 966 disciplina a matéria afirmando que:
“Art. 966: A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
(...)
VII - obtiver o autor, posteriormente ao trânsito em julgado, prova nova cuja existência ignorava
ou de quê não pode fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável;
(...).”
Socorremo-nos, mais uma vez, de escólio doutrinário para esmiuçá-lo:
“4.10. Prova Nova. Uma das hipóteses que permitem o ajuizamento da ação rescisória diz
respeito à existência de elemento probatório decisivo, não utilizado no processo de origem, apto a
alterar a configuração fática que motivou a decisão judicial. No CPC de 1973, a previsão dizia
respeito ao 'documento novo', enquanto no CPC/2015 o dispositivo refere-se a 'prova nova'. A
modificação foi proposta a partir da necessidade de se enquadrarem no fundamento rescisório
provas que não consistam tecnicamente em documento, sobretudo o caso do exame
hematológico para investigação de paternidade (DNA), aceito sem problemas pela jurisprudência
como apto a fundar a ação rescisória. A nosso ver, o texto do CPC/2015 amplia demasiadamente
o campo para o ajuizamento da ação rescisória, de maneira a permitir a desconstituição da coisa
julgada com base em provas testemunhais ou laudos periciais, o que poderia propiciar nova
oportunidade para o autor da ação rescisória produzir provas contrárias ao material do processo
matriz. Teria sido melhor se o texto do dispositivo se limitasse à prova documental, mas com a
previsão expressa de que a prova científica (exame de DNA e outros meios decorrentes de
avanços tecnológicos) pudesse se equiparar à prova documental para fins de rescindibilidade. É
necessário que a prova seja nova, no sentido de não ter sido utilizada no processo anterior. O
termo ‘nova' não se refere ao momento de sua formação. É imprescindível, ainda, que o autor
não tenha conseguido produzir essa prova no processo matriz por causa externa à sua vontade:
seja porque desconhecia a prova, seja porque, embora sabendo de sua existência, não pôde
utilizá-la.
A prova deve ser ‘capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável'. É preciso,
portanto, que seja decisiva. Por isso, a prova deve ser forte o suficiente para, sozinha, modificar o
quadro fático adotado pela sentença. Nessa ordem de ideias, não é difícil prever que, embora
tenha havido a ampliação a qualquer meio de prova, o documento novo continuará a exercer
papel de destaque nesse fundamento rescisório, pela maior confiabilidade que apresenta no
registro de acontecimentos pretéritos.” (BARIONI, Rodrigo. Breves Comentários ao Novo Código
de Processo Civil/Teresa Arruda Alvim Wambier... [et al.], coordenadores, São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2015, p. 2154-2155) (g. n.)
“VII: 48. Prova nova. O atual CPC é mais abrangente do que o CPC/1973, pois admite não só a
apresentação de documento novo, mas também de tudo que possa formar prova nova em relação
ao que constou da instrução do processo original. Mas, da mesma forma que ocorria em relação
ao documento novo, por prova nova deve entender-se aquela que já existia quando da prolação
da sentença, mas cuja existência era ignorada pelo autor da rescisória, ou que dele não pôde
fazer uso – portanto, não cabe, no caso, dar início a nova perícia judicial, por exemplo. São
enquadráveis, portanto, neste dispositivo, apenas os documentos, os depoimentos e os
testemunhos. (...).” (Nelson Nery Junior; Rosa Maria de Andrade Nery, Código de Processo Civil
Comentado, 16ª ed., revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2016, p. 2060)
“XXII. Prova nova. Alcance. (...) O CPC/2015 ampliou a abrangência da prova, não apenas para
admitir documento ou prova que, em princípio, poderia fornecer igual ou maior grau de segurança
quanto à demonstração do acerto da afirmação da parte (algo que se poderia obter com a prova
pericial, frente a documental), mas admitiu a rescisória com base em prova nova, sem exceção. É
possível, portanto, o ajuizamento de ação rescisória com base em prova testemunhal nova, desde
que presentes as condições previstas no art. 966, VII, do CPC/2015, isso é, desde que o autor a
ignorasse ou dela não tivesse podido fazer uso, e tal prova, por si só, seja capaz de garantir a ele
resultado favorável (sob o prisma do CPC/1973, quanto a documento novo, cf. STJ, AgRg na AR
3.819/RJ, rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, 2.ª S., j. 09.09.2015). Assim deve ser considerado o
documento que existia à época da prolação da decisão rescindenda, mas que, por motivo alheio à
vontade do autor da ação rescisória, não pôde ser juntado aos autos da ação originária (cf. STJ,
4.ª T., AgRg no Ag 960.654/SP, rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, j. 03.04.2008; STJ, AgRg no
REsp 983.372/PR, j. 11.05.2010, rel. Min. Luiz Fux, 1.ª T.). Não se considera prova nova, assim,
o documento produzido após a prolação da decisão rescindenda (cf. STJ, 1.ª T., REsp
815.950/MT, rel. Min. Luiz Fux, j. 18.03.2008). Assim, ‘nova’ é a prova já existente, e não aquela
que surgiu posteriormente: ‘Considera-se ‘documento novo’ o que seja preexistente ao julgado
rescindendo, mas que não fora apresentado em juízo em razão de alguma das hipóteses
previstas no supracitado dispositivo legal. A Res. 302/2002 do Conama não pode ser admitida
como documento novo, visto que foi editada após o julgamento do recurso que originou o acórdão
objeto da presente demanda’ (STJ, AR 2.481/PR, j. 13.06.2007, 1.ª S., rel. Min. Denise Arruda).
Além de ser ‘a) existente à época da decisão rescindenda’, é necessário, também, que seja ‘b)
ignorado pela parte ou que dela não poderia fazer uso; c) por si só apto a assegurar
pronunciamento favorável; d) guarde relação com fato alegado no curso da demanda em que se
originou a coisa julgada que se quer desconstituir’ (STJ, REsp 1.293.837/DF, rel. Min. Paulo de
Tarso Sanseverino, 3.ª T., j. 02.04.2013). A respeito, cf. também comentário ao art. 493 do
CPC/2015.) (José Miguel Garcia Medina, Novo Código de Processo Civil comentado: com
remissões e notas comparativas ao CPC/1973, 4ª ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2016, p. 1388-1389) (g. n.)
Pois bem.
Foram fundamentos do ato decisório hostilizado (ID 86078384, p. 75-83):
"(...)
Cuida-se de pedido de concessão de aposentadoria por idade de trabalhador rural.
A r. sentença julgou PROCEDENTE o pedido do(a) autor(a) e CONDENO (sic) o réu à concessão
de aposentadoria por idade, em favor do(a) autor(a), no valor de um salário mínimo, com todos os
seus acréscimos e gratificações ao benefício aderidas, a partir do pedido administrativo
(27/06/2017- fls. 23). Pagará as parcelas atrasadas de uma só vez, corrigidas através da
utilização do Manual de Cálculos da Justiça Federal- JF e as Tabelas de Correção Monetária, ali
disponibilizadas, para a realização de cálculos judiciais (orientação da Corregedoria Geral de
Justiça- Comunicado CG n. 203/2016- Protocolo n. 2015/165751, publicado no DOE de 19, 23 e
25/02/2016). Arcará o réu com as despesas processuais, não abrangidas pela isenção de que
goza, bem como com os honorários advocatícios, estimados estes em dez por cento sobre o valor
da condenação, até a data desta sentença, afastada a incidência sobre as vincendas, em razão
do disposto na Súmula 111, do Egrégio Superior Tribunal de Justiça. Concedeu tutela antecipada.
Inconformada apela a Autarquia Federal sustenta, em síntese, ausência de prova material, não
houve o recolhimento das contribuições previdenciárias, nem o cumprimento do período de
carência legalmente exigido inadmissibilidade da prova exclusivamente testemunhal. Requer
alteração da correção monetária e juros de mora.
Regularmente processados, subiram os autos a este E. Tribunal.
É o relatório.
(...)
O pedido para reconhecimento da atividade exercida na lavoura, referente ao período indicado na
inicial, para fins de aposentadoria por idade funda-se nos documentos carreados aos autos, dos
quais destaco:
- Cédula de identidade (nascimento em 26.06.1962).
- Certidões de casamento em 25.02.1983 e de nascimento de filhos em 21.08.1984, 19.11.1987,
qualificando o marido como lavrador.
- Conta de luz apontando de 12.01.2017 com classificação onofásico rural.
- Declaração emitida pela Justiça Eleitoral do Estado de Piedade-São Paulo, datada de
18.01.2017, informando que a parte autora, por ocasião de sua inscrição eleitoral em 18.09.1986,
declarou sua ocupação como trabalhadora rural '(MERAMENTE DECLARADOS PELO
REQUERENTE, SEM VALOR PROBATÓRIO)'.
- Comunicado do indeferimento do pedido de aposentadoria por idade, segurado especial,
formulado na via administrativa em 27.06.2017.
A Autarquia juntou consulta efetuada ao sistema Dataprev, constando que a requerente possui
cadastro como contribuinte individual, de 01.03.2013 a 31.01.2018 e que o marido tem vínculos
empregatícios, de forma descontínua, de 08.01.2007 a 12.2015 para Sadao kanno e de
02.01.2016 a 01.2018 para Rafael Muller, em atividade rural e possui recolhimentos como
empregado doméstico, de 01.08.2010 a 31.08.2010.
Cadastro nacional da pessoa jurídica juntado a fls. 49 informando que 'Sadao Kanno' e 'Rafael
Muller' são propriedades rurais.
Os depoimentos das testemunhas são vagos e imprecisos quanto à atividade rural em regime de
economia familiar exercida pela autora.
As testemunhas informam que a requerente quando era solteira trabalhava na propriedade dos
genitores e como diarista. Depois que se casou continuou laborando em sua propriedade até os
dias de hoje, juntamente com o marido e com o filho em regime de economia familiar. Um dos
depoentes informa que o marido também labora para o empregador, Rafael Muller, com verduras
e, Às (sic) reperguntas, a outra testemunha relata que o marido trabalha para os empregadores
Rafael e Sadao no campo.
Segundo o preceito do art. 143 da Lei nº 8.213/91, o trabalhador rural, na forma da alínea 'a' do
inciso I, IV, ou VII do art. 11, pode requerer a aposentadoria por idade, no valor de um salário
mínimo, durante quinze anos, contados da vigência dessa legislação, desde que prove ter
exercido atividade rurícola, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior
ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício,
conforme tabela inserta no art. 142.
Além disso, deve atender os requisitos etários do art. 48, § 1º.
Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do art. 11, fica garantida a concessão da
aposentadoria por idade, nos termos do artigo 39, inciso I da Lei nº 8.213/91, dispensado do
cumprimento da carência, de acordo com o art. 26, inciso III.
Além do que, a eficácia do artigo 143, com termo final em julho de 2006, foi prorrogada pela
Medida Provisória nº 312, de 19/07/2006, convertida na Lei nº 11.368, de 9 de novembro de
2006, estendendo para mais dois anos o prazo do referido artigo, para o empregado rural.
Acrescente-se que a Lei nº 11.718, de 20.06.2008, tornou a estender o prazo até 31.12.2010.
Bem, neste caso, embora a autora tenha completado 55 anos em 2017, a prova produzida não é
hábil a demonstrar o exercício da atividade no campo, pelo período de carência legalmente
exigido, segundo o artigo 142 da Lei 8.213/91, de 180 meses.
Compulsando os autos, verifica-se que a prova material é antiga, não comprovando a atividade
rural pelo período de carência legalmente exigido.
Além do que, as testemunhas informam que a autora trabalhou juntamente com o marido em roça
própria, entretanto, esclarecem que o esposo também laborou para os empregadores Rafael e
Sadao, inclusive, do Sistema Dataprev, juntado pela Autarquia, extrai-se que o cônjuge tem
vínculos em atividade rural para os empregadores Rafael e Sadao, de 2007 a 2018, e como
empregado doméstico de 01.08.2010 a 31.08.2010, não sendo crível que neste período tenha
exercido atividade em regime de economia familiar.
Acrescente-se que, não foram juntados aos autos documentos que usualmente caracterizam o
trabalho rural em regime de economia familiar, tais como, registro de imóvel rural, matrícula,
contratos de parceria, declaração cadastral de produtor, impostos sobre a terra rural, ou notas
fiscais de comercialização da produção rural, o que torna inviável o reconhecimento da alegada
atividade rural nos moldes previstos no art. 11 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que o regime de economia familiar pressupõe que os membros da família
trabalhem no imóvel rural, sem o auxílio de empregados, para sua própria subsistência, o que não
ficou demonstrado no presente feito.
Por fim, a autora possui cadastro como contribuinte individual, descaracterizando o regime de
economia familiar e no período imediatamente anterior ao requisito etário, de 01.03.2013 a
31.01.2018.
Verifico que o STJ já julgou em Recurso Especial Representativo de Controvérsia n° 1.354.908-
SP:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE
RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE
TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER
PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º
combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que
estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural,
momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo
48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter
atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo
descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito.
Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os
requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.
2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência.
Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil. (Recurso especial n° 1.354.908-
SP–Relator Ministro Mauro Campbell Marques).
Dessa forma, as provas são insuficientes para concessão do benefício pleiteado.
Neste sentido, orienta-se a jurisprudência, consoante decisão do E. S.T.J., cujo aresto transcrevo:
RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE
SERVIÇO.VALORAÇÃO DE PROVA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADA POR
PROVA TESTEMUNHAL. INOCORRÊNCIA.
1. O conhecimento do recurso especial fundado na alínea "c" da Constituição da República
requisita, em qualquer caso, a transcrição dos trechos dos acórdãos que configurem o dissídio,
mencionando-se as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados, não
se oferecendo, como bastante, a simples transcrição de ementas, votos ou notícias de
julgamento.
2. 'A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação
administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada
em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na
ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento.' (artigo
55, parágrafo 3º, da Lei 8.213/91).
3. O início de prova material, de acordo com a interpretação sistemática da lei, é aquele feito
mediante documentos que comprovem o exercício da atividade nos períodos a serem contados,
devendo ser contemporâneos dos fatos a comprovar, indicando, ainda, o período e a função
exercida pelo trabalhador.
4. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que para fins de concessão do benefício de
aposentadoria por idade, o início de prova material deverá ser corroborado por idônea e robusta
prova testemunhal.
5. Em havendo o acórdão recorrido afirmado que, a par de não bastante à demonstração do
tempo de serviço a prova documental, a testemunhal era insuficiente à comprovação da atividade
rural desempenhada pelo segurado, a preservação da improcedência do pedido de aposentadoria
por idade é medida que se impõe.
6. Ademais, a 3ª Seção desta Corte tem firme entendimento no sentido de que a simples
declaração prestada em favor do segurado, sem guardar contemporaneidade com o fato
declarado, carece da condição de prova material, exteriorizando, apenas, simples testemunho
escrito que, legalmente, não se mostra apto a comprovar a atividade laborativa para fins
previdenciários (EREsp 205.885/SP, Relator Ministro Vicente Leal, in DJ 30/10/2000).
7. Recurso não conhecido. (STJ, 6ª Turma, RESP 434015, relator Min. Hamilton Carvalhido, j.
20.02.2003).
Do conjunto probatório dos autos, portanto, verifica-se que não houve cumprimento dos requisitos
exigidos pelos artigos 142 e 143 da Lei 8.213/91, segundo os quais, ainda que descontínuo, esse
trabalho deve corresponder ao período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em
número de meses idêntico à carência.
Em face da inversão do resultado da lide, restam prejudicados os demais pontos do recurso do
INSS.
Pelas razões expostas, dou provimento ao apelo da Autarquia Federal, para reformar a sentença
e julgar improcedente o pedido. Condeno a parte autora no pagamento das custas e dos
honorários advocatícios que fixo em R$1.000,00 (hum mil reais), observando-se o disposto no
artigo 98, § 3º do CPC/2015, por ser beneficiária da gratuidade da justiça. Casso a tutela
antecipada.
É o voto." (g.n.)
2.1 - CONSIDERAÇÕES
A parte autora afirma ter trazido aos autos prova nova consistente na Carteira Profissional do
esposo, Jair Joaquim Pinto (nº 4985, série 00340-SP: ID 86078384, p. 86-96), com registros
como trabalhador rural para Sadao Kanno (de 08/01/2007 a 13/03/2013 e de 01/10/2013 a
30/12/2015) e para Rafael Muller (de 02/02/2016 sem data de saída).
A princípio, esclarecemos que, ao menos em tese, haveria possibilidade de aproveitamento da
referida CTPS, haja vista tratar-se de obreira campesina, para qual o Superior Tribunal de Justiça
tem mitigado o rigorismo na apresentação de documentação, mesmo que injustificada sua não
oferta anteriormente, i. e., por ocasião da instrução do feito primígeno.
Ocorre que a prestação de serviços para terceiros por parte do esposo da requerente não é
circunstância nova, já que expressamente examinada no pronunciamento judicial rescindendo: "A
Autarquia juntou consulta efetuada ao sistema Dataprev, constando que a requerente possui
cadastro como contribuinte individual, de 01.03.2013 a 31.01.2018 e que o marido tem vínculos
empregatícios, de forma descontínua, de 08.01.2007 a 12.2015 para Sadao kanno e de
02.01.2016 a 01.2018 para Rafael Muller, em atividade rural e possui recolhimentos como
empregado doméstico, de 01.08.2010 a 31.08.2010."
Na verdade, a Carteira Profissional em questão corrobora o fundamento de que não restou
caracterizado o exercício de atividade rural em regime de economia familiar, in litteris:
"(...)
Bem, neste caso, embora a autora tenha completado 55 anos em 2017, a prova produzida não é
hábil a demonstrar o exercício da atividade no campo, pelo período de carência legalmente
exigido, segundo o artigo 142 da Lei 8.213/91, de 180 meses.
Compulsando os autos, verifica-se que a prova material é antiga, não comprovando a atividade
rural pelo período de carência legalmente exigido.
Além do que, as testemunhas informam que a autora trabalhou juntamente com o marido em roça
própria, entretanto, esclarecem que o esposo também laborou para os empregadores Rafael e
Sadao, inclusive, do Sistema Dataprev, juntado pela Autarquia, extrai-se que o cônjuge tem
vínculos em atividade rural para os empregadores Rafael e Sadao, de 2007 a 2018, e como
empregado doméstico de 01.08.2010 a 31.08.2010, não sendo crível que neste período tenha
exercido atividade em regime de economia familiar.
Acrescente-se que, não foram juntados aos autos documentos que usualmente caracterizam o
trabalho rural em regime de economia familiar, tais como, registro de imóvel rural, matrícula,
contratos de parceria, declaração cadastral de produtor, impostos sobre a terra rural, ou notas
fiscais de comercialização da produção rural, o que torna inviável o reconhecimento da alegada
atividade rural nos moldes previstos no art. 11 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que o regime de economia familiar pressupõe que os membros da família
trabalhem no imóvel rural, sem o auxílio de empregados, para sua própria subsistência, o que não
ficou demonstrado no presente feito.
Por fim, a autora possui cadastro como contribuinte individual, descaracterizando o regime de
economia familiar e no período imediatamente anterior ao requisito etário, de 01.03.2013 a
31.01.2018.
(...)."
Para além, não invalida a informação de que "a autora possui cadastro como contribuinte
individual, descaracterizando o regime de economia familiar e no período imediatamente anterior
ao requisito etário, de 01.03.2013 a 31.01.2018."
Não bastasse, temos que o referido documento também não possui força suficiente para, de per
se, alterar o raciocínio expresso no julgado sob censura, porque a extensão da profissão do
empregado rural à esposa, como no caso em apreço, não convence como ocorre quando a
prestação do serviço na agricultura dá-se sob o referido regime de economia familiar.
Nesta última modalidade de mourejo, a ideia de participação da cônjuge no amanho da terra é
imanente à definição do art. 11, inc. VII, § 1º, da LBPS.
Isso porque, segundo o dispositivo legal em testilha “Entende-se como regime de economia
familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria
subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições
de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes” (g. n.), o
mesmo não ocorrendo, necessariamente, quando o varão trabalha como empregado com registro
na CTPS.
Nesse sentido, julgados da 3ª Seção desta Corte, com os quais comungamos:
“PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO LITERAL À DISPOSITIVO
DE LEI. ERRO DE FATO. PRONUNCIAMENTO JUDICIAL SOBRE O FATO. VALORAÇÃO DE
PROVA. LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. RAZOABILIDADE. SOLUÇÃO JURÍDICA
ADMISSÍVEL. PARÂMETROS LEGAIS E JURISPRUDENCIAIS DE ÉPOCA. INCABÍVEL
REANÁLISE DE PROVAS. DOCUMENTO NOVO. INSUFICIÊNCIA, POR SI SÓ, À
MODIFICAÇÃO DO JULGADO. INCABÍVEL REABERTURA DE DILAÇÃO PROBATÓRIA PARA
SUPRIR DEFICIÊNCIA DO CONJUNTO PROBATÓRIO DECORRENTE DE DESÍDIA OU
NEGLIGÊNCIA. EXCEPCIONALIDADE RELATIVA À OBSERVÂNCIA DE CIRCUNSTÂNCIAS
VULNERABILIZANTES VIVENCIADAS POR TRABALHADORES RURAIS. APOSENTADORIA
POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE CAMPESINA NO PERÍODO
IMEDIATAMENTE ANTERIOR À IMPLEMENTAÇÃO DO REQUISITO ETÁRIO. INEXISTÊNCIA
DE REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. EXTENSÃO DE PROVA MATERIAL EM NOME DE
TERCEIRO. NECESSIDADE DE CORRELAÇÃO LÓGICA COM A SITUAÇÃO COMUM. PROVA
TESTEMUNHAL FRÁGIL. IUDICIUM RESCINDENS. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. VERBA
HONORÁRIA. CONDENAÇÃO.
1. A viabilidade da ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei pressupõe violação frontal
e direta da literalidade da norma jurídica, não se admitindo a mera ofensa reflexa ou indireta.
Ressalta-se que, em 13.12.1963, o e. Supremo Tribunal Federal fixou entendimento, objeto do
enunciado de Súmula n.º 343, no sentido de que ‘não cabe ação rescisória por ofensa a literal
disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação
controvertida nos tribunais’.
2. Para que seja possível a rescisão do julgado por violação literal de lei decorrente de valoração
da prova, esta deve ter sido de tal modo desconexa que resulte em pungente ofensa à norma
vigente ou em absoluto descompasso com os princípios do contraditório ou da ampla defesa. A
excepcional via rescisória não é cabível para mera reanálise das provas.
3. A viabilidade da ação rescisória por erro de fato pressupõe que, sem que tenha havido
controvérsia ou pronunciamento judicial sobre o fato, o julgado tenha admitido um fato inexistente
ou considerado inexistente um fato efetivamente ocorrido, que tenha influído de forma definitiva
para a conclusão do decidido.
4. O erro de fato, necessariamente decorrente de atos ou documentos da causa, deve ser aferível
pelo exame do quanto constante dos autos da ação subjacente, sendo inadmissível a produção
de provas na demanda rescisória a fim de demonstrá-lo.
5. É patente a inexistência de erro de fato no julgado, seja em decorrência da controvérsia entre
as partes quanto ao efetivo exercício da alegada atividade rural, seja porque houve
pronunciamento judicial expresso sobre o fato. Verifica-se que os documentos apresentados nos
autos foram apreciados e valorados pelo Juízo originário, que entendeu pela sua insuficiência
para demonstrar a dedicação da autora à lida campesina.
6. O único documento que lhe fazia referência a qualificava como ‘do lar’. O documento em nome
de seu genitor não tratava do período de carência; ademais, consta que seu pai já era falecido,
além da autora fazer parte de outro núcleo familiar. Quanto à CTPS de seu companheiro,
indicando a existência de vínculos empregatícios rurais, ressalta-se que, embora considerados os
parâmetros da solução pro misero, com a possibilidade de abrandamento da prova exigível para
configuração do tempo de serviço rural dos trabalhadores rurais volantes, a possibilidade de
extensão da prova material em nome de terceiro, na hipótese de mourejo rural não exercido em
regime de economia familiar, é matéria controversa até os dias atuais, atraindo-se a Súmula n.º
343 do e. Supremo Tribunal Federal.
7. Relevante destacar que a jurisprudência atualmente consolidada no âmbito do c. Superior
Tribunal Justiça, inclusive com o julgamento do Recurso Especial n.º 1.304.479/SP, sob o rito do
artigo 543-C do CPC/1973, é voltada para as hipóteses de aproveitamento da prova material em
nome de terceiro, com a extensão da qualidade de trabalhador rural para outro membro do
mesmo grupo familiar, nos casos em que o grupo familiar exerce o labor rural em regime de
economia familiar.
8. O aproveitamento por extensão de documentos em nome de terceiro deve guardar correlação
lógica com a situação que se pressupõe comum. Razoável a presunção de que, ante a
comprovação de que algum dos membros do núcleo familiar trabalhava, em regime de economia
familiar, de que os demais também o fizessem, eis que é pressuposto necessário e comum dessa
atividade o apoio mútuo e o esforço comum, sem os quais o grupo não conseguiria se manter. A
mesma presunção, entretanto, não vale para o diarista, eis que o fato de um dos membros
exercer funções laborativas nesta qualidade, não faz presumir que os demais também o façam,
ante a inexistência de pressuposto comum ou de caraterística integrativa da parte ao todo.
9. O Juízo originário apreciou as provas segundo seu livre convencimento, de forma motivada e
razoável, tendo adotado uma solução jurídica, dentre outras, admissível, não se afastando dos
parâmetros legais e jurisprudenciais que existiam à época.
10. Fundada a ação rescisória na existência de documento novo, a prova nova deve ser, por si
só, suficiente para modificar o julgado rescindendo, ainda que de forma parcial. Não se objetiva
reabrir a dilação probatória para, simplesmente, suprir deficiência do conjunto probatório
produzido na ação originária, decorrente da não observância pela parte, por desídia ou
negligência, de seu ônus processual probatório, mas, sim, viabilizar a apresentação de prova
nova, cuja existência a parte ignorava ou de que não podia fazer uso, bem como, em casos
excepcionais, documento cujo valor probatório era desconhecido pela parte em razão de
circunstâncias vulnerabilizantes, como aquelas vivenciadas por trabalhadores rurais.
11. O documento novo, que viabiliza a rescisão do julgado, deve se reportar à situação fática
pretérita, isto é, aquela já existente à época da decisão rescindenda.
12. Ainda que observados os parâmetros de razoabilidade que norteiam a solução pro misero e
aceita a tese da sua novidade, os documentos carreados não seriam suficientes à inversão do
resultado do julgamento. As fichas de identificação civil no IIRGD, em que constou qualificada
como trabalhadora rural, serviriam como prova material indiciária do labor campesino, ao menos
em período mais próximo ao implemento do requisito etário. Não obstante, a prova testemunhal é
extremamente frágil e sequer alcança todo o período de carência, corroborando os documentos
que indicavam dedicação campesina da autora somente em período próximo ao implemento do
requisito etário.
13. Ressalta-se a tese firmada pela 1ª Seção do c. Superior Tribunal de Justiça no julgamento
dos Recursos Especiais autuado sob n.º 1.348.633/SP, sob a sistemática dos recursos repetitivos
representativos de controvérsia, no sentido de que é possível o reconhecimento de tempo de
serviço rural exercido em momento anterior ou posterior àquele retratado no documento mais
antigo juntado aos autos como início de prova material, mas desde que tal período venha
delineado em prova testemunhal idônea e robusta, inclusive, objeto de edição do enunciado de
Súmula n.º 577.
14. Verba honorária fixada em R$ 1.000,00 (mil reais), devidamente atualizado e acrescido de
juros de mora, conforme estabelecido do Manual de Cálculos e Procedimentos para as dívidas
civis, até sua efetiva requisição (juros) e pagamento (correção), conforme prescrevem os §§ 2º,
4º, III, e 8º, do artigo 85 do CPC. A exigibilidade das verbas honorárias devidas ficará suspensa
por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou
a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no artigo 98, § 3º,
do CPC.
15. Em juízo rescindendo, julgada improcedente a ação rescisória, nos termos do artigo 487, I, do
CPC/2015.” (AR 5011179-25.2017.4.03.0000, rel. Des. Fed. Carlos Delgado, v. u., e-DJF3
29/08/2019) (g. n.)
“PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RESCISÓRIA. DOCUMENTO NOVO.
INSUFICIÊNCIA, POR SI SÓ, À MODIFICAÇÃO DO JULGADO. INCABÍVEL REABERTURA DE
DILAÇÃO PROBATÓRIA PARA SUPRIR DEFICIÊNCIA DO CONJUNTO PROBATÓRIO
DECORRENTE DE DESÍDIA OU NEGLIGÊNCIA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ RURAL.
COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE CAMPESINA NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR À
INCAPACIDADE. OCUPAÇÃO URBANA DA REQUERENTE. EXTENSÃO DE PROVA
MATERIAL EM NOME DE TERCEIRO. NECESSIDADE DE CORRELAÇÃO LÓGICA COM A
SITUAÇÃO COMUM. IUDICIUM RESCINDENS. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. VERBA
HONORÁRIA. CONDENAÇÃO.
1. Fundada a ação rescisória na existência de documento novo, a prova nova deve ser, por si só,
suficiente para modificar o julgado rescindendo, ainda que de forma parcial. Não se objetiva
reabrir a dilação probatória para, simplesmente, suprir deficiência do conjunto probatório
produzido na ação originária, decorrente da não observância pela parte, por desídia ou
negligência, de seu ônus processual probatório, mas, sim, viabilizar a apresentação de prova
nova, cuja existência a parte ignorava ou de que não podia fazer uso, bem como, em casos
excepcionais, documento cujo valor probatório era desconhecido pela parte em razão de
circunstâncias vulnerabilizantes, como aquelas vivenciadas por trabalhadores rurais.
2. Ainda que observados os parâmetros de razoabilidade que norteiam a solução pro misero e
aceita a tese da sua novidade, o documento carreado não seria suficiente à inversão do resultado
do julgamento. Tem-se, dentre outros, como fundamento determinante no julgado rescindendo,
que levou à improcedência do pedido na ação subjacente, o exercício de atividade urbana como
doméstica, situação esta que não sofreria alteração alguma com a juntada da carteira de trabalho
de seu esposo.
3. Ademais, seu marido, de quem pretende a extensão da qualidade de trabalhador rural, é
empregado de empresas do ramo de bioenergia, na qualidade de administrador de turma e fiscal
de lavoura, atividade que não se confunde com aquela do trabalhador que efetivamente lida com
a penosa atividade rurícola.
4. Ainda que se pudesse entender que tais atividades são típicas do trabalhador rural, cuja
diferenciada proteção encontra amparo na legislação previdenciária, tampouco caberia à
extensão da eficácia probatória dos documentos de seu marido, haja vista que se tratam de
vínculos empregatícios. O aproveitamento por extensão de documentos em nome de terceiro
deve guardar correlação lógica com a situação que se pressupõe comum. Explico. Razoável a
presunção de que, ante a comprovação de que algum dos membros do núcleo familiar trabalhava
em regime de economia familiar, os demais também o fizessem, eis que é pressuposto
necessário e comum dessa atividade o apoio mútuo e o esforço comum, sem os quais o grupo
não conseguiria se manter. A mesma presunção, entretanto, não vale para o empregado rural ou
diarista, eis que o fato de um dos membros exercer funções laborativas nesta qualidade, não faz
presumir que os demais também o façam, ante a inexistência de pressuposto comum ou de
caraterística integrativa da parte ao todo.
5. Fazia-se imprescindível que a autora tivesse apresentado início de prova material relativo ao
período de carência, a fim de, em conjunto com outros meios probatórios (como a prova oral),
demonstrar que se dedicava ao mourejo rural no período imediatamente anterior ao início da
incapacidade laborativa.
6. Verba honorária fixada em R$ 1.000,00 (mil reais), devidamente atualizado e acrescido de
juros de mora, conforme estabelecido do Manual de Cálculos e Procedimentos para as dívidas
civis, até sua efetiva requisição (juros) e pagamento (correção), conforme prescrevem os §§ 2º,
4º, III, e 8º, do artigo 85 do CPC. A exigibilidade das verbas honorárias devidas ficará suspensa
por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou
a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no artigo 98, § 3º,
do CPC.
7. Em juízo rescindendo, julgada improcedente a ação rescisória, nos termos do artigo 487, I, do
CPC/2015.” (3ª Seção, AR 5014928-50.2017.4.03.0000, rel. Des. Fed. Carlos Delgado, v. u.,
Intimação via sistema DATA: 12/07/2019) (g. n.)
Dessa maneira, entendemos que a apresentação da aludida Carteira de Trabalho em nada
alteraria o raciocínio exprimido no decisum vergastado.
3 - DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto no sentido de rejeitar a matéria preliminar arguida e julgar improcedente o
pedido formulado na ação rescisória. Condenada a parte autora em honorários advocatícios de
R$ 1.100,00 (mil e cem reais), devendo ser observado, porém, o art. 98, §§ 2º e 3º, do CPC/2015,
inclusive no que concerne às custas e despesas processuais.
É o voto.
E M E N T A
AÇÃO RESCISÓRIA AFORADA POR MARIA ELISA FERREIRA PINTO. APOSENTADORIA
POR IDADE A RURÍCOLA. DOCUMENTAÇÃO NOVA (ART. 966, INC. VII, DO CÓDIGO DE
PROCESSO CIVIL DE 2015): DESCARACTERIZAÇÃO NA ESPÉCIE. MATÉRIA PRELIMINAR
REJEITADA. PEDIDO FORMULADO NA ACTIO RESCISORIA JULGADO IMPROCEDENTE.
- A preliminar de decadência foi afastada por despacho não recorrido. De qualquer modo,
proposta a demanda em 02/08/2019 e ocorrido o trânsito em julgado em 20/05/2019
(ID76218437), não se há falar tenha sido ultrapassado o prazo de dois anos.
- A Súmula 343 do Supremo Tribunal Federal não se aplica à hipótese simplesmente porque o
pleito da parte autora baseia-se, segundo afirma, na existência de documentação nova e não em
eventual violação de lei.
- Sobre a actio rescisoria apresentar caráter recursal, é tema que se confunde com o mérito e
como tal é apreciado e resolvido.
- A parte autora afirma ter trazido aos autos prova nova consistente na Carteira Profissional do
esposo, Jair Joaquim Pinto.
- A princípio, ao menos em tese, haveria possibilidade de aproveitamento da referida CTPS, haja
vista tratar-se de suposta obreira campesina, para qual o Superior Tribunal de Justiça tem
mitigado o rigorismo na apresentação de documentação, mesmo que injustificada sua não oferta
anteriormente, i. e., por ocasião da instrução do feito primígeno.
- Ocorre que a prestação de serviços para terceiros por parte do esposo da requerente não é
circunstância nova, já que expressamente examinada no pronunciamento judicial rescindendo.
- Na verdade, a Carteira Profissional em questão corrobora o fundamento de que não restou
caracterizado exercício de atividade rural em regime de economia familiar, tampouco invalida a
informação de que "a autora possui cadastro como contribuinte individual, descaracterizando o
regime de economia familiar e no período imediatamente anterior ao requisito etário, de
01.03.2013 a 31.01.2018."
- Não bastasse, o referido documento também não possui força suficiente para, de per se, alterar
o raciocínio expresso no julgado sob censura, porque a extensão da profissão do empregado
rural à esposa, como no caso em apreço, não convence como ocorre quando a prestação do
serviço na agricultura dá-se em regime de economia familiar.
- Nesta última modalidade de mourejo, a ideia de participação da cônjuge no amanho da terra é
imanente à definição do art. 11, inc. VII, § 1º, da LBPS, isso porque, segundo o dispositivo legal
em testilha “Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos
membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico
do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a
utilização de empregados permanentes”, o mesmo não ocorrendo, necessariamente, quando o
varão trabalha como empregado com registro na CTPS. Precedentes desta Corte.
- Condenada a parte autora em honorários advocatícios de R$ 1.100,00 (mil e cem reais),
devendo ser observado, porém, o art. 98, §§ 2º e 3º, do CPC/2015, inclusive no que concerne às
custas e despesas processuais.
- Matéria preliminar rejeitada. Pedido formulado na ação rescisória julgado improcedente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Seção, por
unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar arguida e julgar improcedente o pedido
formulado na ação rescisória, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante
do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
