
| D.E. Publicado em 28/11/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria preliminar e julgar improcedente o pedido formulado na ação rescisória, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0020140-16.2012.4.03.0000/SP
RELATÓRIO
A SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL LUCIA URSAIA:
Trata-se de ação rescisória proposta por ANA NOGUEIRA DOS SANTOS com fundamento no Art. 485, VII (documento novo), do Código de Processo Civil/1973, visando desconstituir acórdão proferido pela E. 8ª Turma que, ao negar provimento ao agravo legal, manteve decisão que reformou sentença para julgar improcedente pedido de concessão de aposentadoria por idade rural.
Alega a autora, em síntese, que as provas materiais colacionadas na ação originária são inequívocas e estão respaldadas pelas testemunhas, aptas a comprovar o pedido para fins de comprovação de tempo de serviço junto ao meio rural. Ressalta que tomou conhecimento de outros documentos além da Certidão de Casamento que poderiam ter sido utilizados para a comprovação do exercício profissional de rurícola na condição de diarista ou bóia-fria, os quais não tinha conhecimento de sua existência, pois caso contrário, instruiria a inicial do feito, cujo resultado seria diverso. Informa que o documento apresentado como novo (ficha cadastral expedida pela Unidade Básica de Saúde de Pracinha - Departamento de Saúde - DRS-9 Marília, onde consta a ocupação laborativa da autora como lavradora) foi apresentado na interposição do agravo interno, mas, não fora acolhido e nem examinado. Requer a desconstituição da decisão rescindenda para que, em novo julgamento, seja-lhe deferido o benefício.
Em contestação, o INSS alegou preliminarmente, a inépcia da inicial, por não ter cumulado ao pedido de rescisão o novo julgamento da causa, deixando de atender o disposto no artigo 488, inciso I, do CPC/73; bem como a carência da ação, por ausência de interesse de agir. No mérito, sustenta a inexistência de violação a literal disposição de lei, erro de fato ou documento novo a ensejar a rescisão do julgado (fls. 167/187).
Manifestou-se a parte autora sobre a contestação às fls. 188/193 e apresentou razões finais (fls. 202/208). O INSS reiterou os termos da contestação (fls. 210/211).
O representante ministerial ofertou parecer no sentido de improcedência da ação originária, uma vez que o documento mencionado na inicial da ação rescisória já foi utilizado na ação originária e, além disso, não possui natureza documental, pois não há subscrição do emitente, de forma que não pode ser equiparado a uma certidão.
É o relatório.
VOTO
A SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL LUCIA URSAIA:
Registro que a presente ação rescisória foi ajuizada sob a égide do Código de Processo Civil de 1973. Impõe-se observar que, publicada a r. decisão rescindenda e interposta a presente ação rescisória em data anterior a 18.03.2016, a partir de quando se torna eficaz o Novo Código de Processo Civil, as regras de interposição da presente ação a serem observadas em sua apreciação são aquelas próprias ao CPC/1973. Inteligência do art. 14 do NCPC.
Quanto à alegação de inépcia da exordial, sabe-se que o Direito Processual Civil é pautado pelo princípio da formalidade. Contudo, a petição inicial somente pode ser considerada inepta quando de sua análise não se puder identificar o pedido, a causa de pedir, bem como da narração dos fatos não decorrer logicamente pedido juridicamente amparado pelo ordenamento jurídico.
No caso em análise, a petição inicial contém a suficiente exposição dos fatos para o regular compreensão da demanda, bem como preenche os requisitos dos artigos 282 e 283 do Código de Processo Civil de 1973, não se podendo falar em inépcia da petição inicial, sustentando-se a procedência do pedido, pelo preenchimento dos requisitos à concessão do benefício.
Contudo, verifico que, a despeito de a parte autora ter citado os incisos V, VII e X, do artigo 485, do CPC, o teor da petição inicial fundamenta-se apenas no inciso VII, não havendo qualquer descrição a eventual violação a literal disposição de lei ou erro de fato, motivo pelo qual a análise do feito será com base em documento novo.
A preliminar de carência de ação se confunde com o mérito, âmbito em que deverá ser analisada.
Superadas tais questões prévias, passo ao exame e julgamento do mérito da demanda.
A autora propôs ação de conhecimento em que objetivava a concessão de aposentadoria por idade rural, sob a alegação de que exerceu atividade na lavoura pelo tempo legalmente exigido, ora em regime de economia familiar, ora como diarista, ou seja "bóia fria".
A petição inicial foi instruída com cópia da certidão de nascimento da autora (16/03/1947), expedida em 28/11/1990, onde consta a qualificação de seu pai como lavrador (fl. 29). Após, antes da sentença, foi juntada cópia da certidão de casamento da irmã da autora, Alayde Nogueira dos Santos, ocorrido em 10/06/1978, em que o marido Lino do Prado Lorenzo consta como lavrador ; bem como certificado de dispensa de incorporação do mesmo (por residir em zona rural de município tributário de órgão de formação de reserva) e título eleitoral em que consta como lavrador (26/06/1974); e, ainda, atestado escolar da irmã (constando as notas da 1ª e 2 ª série na Escola Mista de Emergência da Fazenda Primavera em Sagres) e declaração de Jorge Marcino de Camargo sobre o trabalho da irmã em sua propriedade rural, na condição de porcenteira, de 05/07/1093 a 06/06/1989 e 01/04/1990 a 10/1997 (fls. 75/79).
Foram ouvidas 3 (três) testemunhas (fls. 65/67):
JAIME ZANELLI: "Conhece a autora desde 1963. A autora e o pai trabalharam na propriedade vizinha à do depoente no período de 1963 a 1979, como diaristas no Sítio São José. Após este período, a autora mudou-se e foi morar com o cunhado. O depoente sempre avista a autora indo para o trabalho, pela manhã, embora a autora não mais trabalhe na propriedade vizinha à do depoente. A autora trabalhou até o mês de junho do presente ano, sendo certo que o depoente a via todos os dias porque sai para trabalhar no mesmo dia que ela." Reperguntas: "O cunhado da autora morava no sítio situado na frente da propriedade do depoente. Residiram no local até o ano de 1983, sendo que nessa época a autora permaneceu trabalhando como diarista. Após, a autora mudou juntamente com o cunhado para Pracinha. Aos sábados via a autora trabalhando na roça, pois comparecia às propriedades para buscar frutas."
OSVALDO DIAS DA SILVA: "Conhece a autora desde 1970. A autora trabalhou no sítio São José até o ano de 1976. Após, mudou-se para o sítio situado na frente da propriedade do depoente. Ali residiu até 1983. O depoente via a autora trabalhando todos os dias. Após, a autora mudou-se com o cunhado para Pracinha, onde trabalhou até Julho do presente ano em diversas propriedades, como a de Gimenes, Maia, dentre outras. O depoente fazia o transporte de bóias-frias, razão pela qual sabe informar que a autora continuou trabalhando como bóia-fria. Além disso, o depoente via a autora todos os dias saindo para o trabalho, pela manhã." Reperguntas: "Por diversas vezes viu a autora trabalhando na Fazenda do Gimenes e do Maia, pois efetuava o transporte dos trabalhadores para eles. O depoente viu a autora trabalhando nas referidas fazendas, pela última vez, no mês de Julho deste ano."
ADELCIO SOARES DA SILVA: "Conhece a autora desde 1970. A autora trabalhou com o pai no sítio São José até o ano de 1976. O depoente tem conhecimento de tal fato porque tinha parentes morando na propriedade vizinha ao sítio São José, comparecendo com frequência ao local. Após, a autora mudou-se para outra Fazenda onde permaneceu até 1983, ainda trabalhando como diarista. Posteriormente, mudou-se para Pracinha, local onde o depoente mora. Na verdade, o depoente mora na mesma rua que a autora. Vê a autora sair para o trabalho todos os dias. A autora trabalhou até o mês de Julho deste ano. Nos últimos anos, frequentemente o depoente comparecia até a fazenda do Maia e via a autora trabalhando na roça." Sem reperguntas.
A r. sentença proferida naqueles autos julgou procedente o pedido (fls. 85/89):
"(...)
Aduz o Instituto réu que as provas apresentadas pela autora não podem ser aceitas, uma vez que não se adequam às exigências legais, porém, não lhe assiste razão.
As testemunhas ouvidas no decorrer da instrução processual foram categóricas ao afirmar os dados discriminados na inicial, concernentes ao efetivo exercício de trabalho na lavoura, bem como o tempo de duração deste tipo de atividade.
Com efeito, as testemunhas foram unânimes e coerentes ao afirmarem que a autora realmente trabalhou na lavoura, durante o período por ela alegado, o que reforça a convicção no sentido da veracidade das alegações contidas na inicial.
E, embora não tenha trazido aos autos quaisquer provas materiais, tal fato, por si só, não impede a análise da pretensão deduzida na inicial, pois é cediço que a despeito das regras contidas na Lei de Benefícios, a prova testemunhal tem o mesmo valor da prova documental e, assim, mesmo que isolada, é apta a provar qualquer fato."
Por sua vez, a decisão rescindenda, de lavra da Des. Fed. Marianina Galante (fls. 106/119), ao dar provimento à apelação interposta pela Autarquia Previdenciária, manifestou-se nos seguintes termos:
"(...)
Bem, neste caso, embora a autora tenha completado 55 anos em 2002, a prova produzida não é hábil a demonstrar o exercício da atividade no campo, pelo período de carência legalmente exigido, segundo o artigo 142 da Lei 8.213/91, de 126 meses.
Compulsando os autos, verifica-se que os documentos juntados, não apresentam qualquer informação de que a requerente tenha desenvolvido o trabalho rural.
Além do que, os depoimentos das testemunhas são vagos e imprecisos, não esclarecendo detalhes sobre a atividade campesina da requerente, apenas afirmando genericamente o labor rural.
Dessa forma, as provas materiais e testemunhais são insuficientes para concessão do benefício pleiteado.
(...)"
Anteriormente ao julgamento do agravo legal, a parte autora requereu a juntada de documento, o mesmo que apresenta nesta ação rescisória como documento novo, consistente em ficha de identificação em Unidade Básica de Saúde de Pracinha, preenchida manualmente, em que consta sua ocupação como lavradora (fl. 141).
De acordo com o Art. 485, VII, do CPC/73, vigente na época de propositura da presente ação rescisória, a sentença de mérito transitada em julgado pode ser rescindida quando, entre outras hipóteses, depois da sentença a parte autora obtiver documento novo, cuja existência ignorava, ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável.
Deste modo, reputa-se documento novo, de molde a ensejar a propositura da ação rescisória, aquele que preexistia ao tempo do julgado rescindendo, cuja existência a parte autora ignorava ou, por razão justificável, não pôde fazer uso durante o curso da ação subjacente.
Além disso, é preponderante que o documento novo seja de tal ordem capaz, por si só, de alterar o resultado do julgado rescindendo, assegurando pronunciamento judicial favorável à parte autora.
A jurisprudência já tem se pronunciado nessa linha de raciocínio, conforme precedentes do C. Superior Tribunal de Justiça: REsp 906740/MT, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, j. 06/09/2007, DJ 11/10/2007, p. 314; AgRg no Ag 569546/RS, Rel. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, Terceira Turma, j. 24/08/2004, DJ 11/10/2004, p. 318.
É de se salientar que, em relação aos rurícolas, a jurisprudência flexibilizou a exigência de demonstração de que o autor da rescisória ignorava a existência dos documentos novos, ou de que deles não pode fazer uso no momento oportuno, considerando adequada a solução pro misero àqueles que, em situação bastante desigual à de outros trabalhadores, não possuem noções mínimas de seus direitos fundamentais, conforme numerosos precedentes nesse sentido, oriundos desta Corte e do Colendo Superior Tribunal de Justiça.
Todavia, a parte autora não trouxe nessa ação rescisória nenhum documento diverso daqueles juntados na ação originária, mitigando o conceito de que ignorava a existência do mesmo.
E, ainda que se admita como documento novo, este não seria hábil a alterar o resultado do julgamento, pois, conforme ressaltado pelo representante ministerial, "tal matrícula não tem natureza documental, uma vez que não há subscrição do emitente, de forma que não pode ser equiparado a uma certidão."
Ademais, em consulta ao Cadastro Nacional de Seguro Social - CNIS, em terminal instalado no gabinete desta Relatora, constata-se que tanto o cunhado como a irmã da autora possuem vínculos urbanos, a saber:
Lino Prado Lorenzo -
- Construtora Ubiratan; filiado empregado; 04/11/1982 a 04/07/1983;
- Empresa Municipal de Urbanização de Lucelia; filiado empregado; 07/06/1989 a 24/11/1989;
- Daniel Artur Baumgartner e outra; filiado empregado; 19/12/1989 a 31/03/1990;
- Câmara Municipal de Pracinha: filiado empregado; de 01/01/1997, última remuneração em 12/2004;
- MZ Serviços Temporários Ltda; filiado empregado; 17/07/2001 a 14/10/2001;
- Município de Pracinha; filiado empregado; 01/01/2009 a 05/04/2012;
- Município de Pracinha; filiado empregado; 05/03/2013 a 14/01/2015;
- Recolhimentos como contribuinte individual de 01/01/2016 a 30/06/2016 e 01/08/2016 a 31/03/2018
Alayde Nogueira Lorenzo -
- Município de Lucélia - filiado empregado - 08/11/1993 a 31/05/1994;
- Recolhimentos como empregado doméstico - de 01/06/1998 a 30/11/1999; 01/11/2007 a 31/03/2010; 01/07/2011 a 30/09/2013
- Aposentadoria por invalidez como empregada doméstica com DIB em 13/08/2013
Ressalto que a improcedência do pedido fundamentou-se também na fragilidade da prova testemunhal. Assim, sob qualquer ângulo, conclui-se que o resultado da demanda não tem como ser alterado.
Condeno a parte autora no pagamento de honorários advocatícios que fixo em R$1.000,00 (mil reais), cuja exigibilidade fica suspensa, nos termos do art. 98, §3º, do CPC/2015, por ser beneficiária da assistência judiciária gratuita, conforme entendimento majoritário da 3ª Seção desta Corte, levando em conta o valor irrisório atribuído à causa.
Ante o exposto, REJEITO A MATÉRIA PRELIMINAR E, NO MÉRITO, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO DE RESCISÃO DO JULGADO.
É o voto.
LUCIA URSAIA
Desembargadora Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA:10063 |
| Nº de Série do Certificado: | 1B1C8410F7039C36 |
| Data e Hora: | 09/11/2018 18:37:00 |
