D.E. Publicado em 24/04/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria preliminar e julgar improcedente a ação rescisória, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal Relatora
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0042322-35.2008.4.03.0000/SP
RELATÓRIO
Trata-se de ação rescisória proposta por NILCI XAVIER DE OLIVEIRA com fundamento no Art. 485, VII (documento novo), do Código de Processo Civil/1973, visando desconstituir decisão que reformou sentença para julgar improcedente pedido de concessão de aposentadoria por idade rural.
Alega a autora, em síntese, que as provas materiais colacionadas na ação originária são inequívocas e estão respaldadas pelas testemunhas, aptas a comprovar o pedido para fins de comprovação de tempo de serviço junto ao meio rural. Ressalta as condições desiguais vivenciadas pelos trabalhadores rurais, inclusive com a adoção da solução 'pro misero', ainda que preexistente à propositura da ação originária, devendo ser considerada para efeito do artigo 485, VII, do Código de Processo Civil. Requer a desconstituição da decisão rescindenda para que, em novo julgamento, seja-lhe deferido o benefício.
A inicial foi distribuída ao Superior Tribunal de Justiça, em que houve concessão dos benefícios da Justiça Gratuita (fl. 232) e citação do INSS (fls. 237/238).
Em contestação, o INSS alegou preliminarmente, a incompetência do STJ para o julgamento da presente ação rescisória e, no mérito, a improcedência do pedido rescisório (fls. 241/245).
Às fls. 247/249, declarou-se a incompetência absoluta do Superior Tribunal de Justiça, determinando a remessa dos autos a esta Corte, nos termos do disposto no artigo 113, § único, do CPC/1973.
Houve nova citação e contestação do INSS, requerendo, preliminarmente, a impossibilidade de remessa ao juízo competente, pleiteando sua extinção sem julgamento de mérito e a carência da ação pela ausência do interesse de agir, por entender que a autora pretende apenas a rediscussão do quadro fático-probatório produzido na lide originária. No mérito, pugna pela improcedência da ação rescisória uma vez que não houve a apresentação de documento novo, fazendo a autora uso da documentação já existente na ação primeva.
Réplica da parte autora a fls. 279/282, em que reitera ser a documentação probante acostada aos autos robusta, tanto material como testemunhal.
Razões finais da parte autora (fls. 288/292) e do INSS (fls. 293/300).
O MPF opinou pela extinção do processo sem julgamento de mérito, nos termos do artigo 267, inciso I, do CPC, uma vez que os documentos mencionados na inicial da ação rescisória já foram utilizados na ação originária.
É o relatório.
VOTO
Registro que a presente ação rescisória foi ajuizada sob a égide do Código de Processo Civil de 1973. Impõe-se observar que, publicada a r. decisão rescindenda e interposta a presente ação rescisória em data anterior a 18.03.2016, a partir de quando se torna eficaz o Novo Código de Processo Civil, consoante as conhecidas orientações a respeito do tema adotadas pelos C. Conselho Nacional de Justiça e Superior Tribunal de Justiça, as regras de interposição da presente ação a serem observadas em sua apreciação são aquelas próprias ao CPC/1973. Inteligência do art. 14 do NCPC.
No tocante à preliminar de impossibilidade de remessa do STJ a esta Corte, entendo pela possibilidade de remessa dos presentes autos ao juízo competente, uma vez que a parte autora expressamente pleiteou, em sua petição inicial, a rescisão do julgado deste Tribunal Regional. Da mesma forma, não houve enfrentamento do mérito da questão posta no feito subjacente pela Corte Superior, a ensejar a substituição do julgado rescindendo.
A preliminar de carência de ação se confunde com o mérito, âmbito em que deverá ser analisada.
Superada a matéria preliminar, passo a me pronunciar em juízo rescindente.
A autora propôs ação de conhecimento em que objetivava a concessão de aposentadoria por idade rural, sob a alegação de que exerceu atividade na lavoura pelo tempo legalmente exigido.
O feito foi instruído com cópias dos seguintes documentos:
- certidão de casamento da autora, em que consta qualificada como prendas domésticas e seu marido como barbeiro (16/09/1971; fl. 37);
- declaração de João Luiz Ribeiro (fl. 39), relativa à prestação de serviços da parte autora como rural na última safra do ano de 2005;
- declaração de Ricardo Desiderio Junqueira (fl. 40), relativa à prestação de serviços da parte autora como rural nos anos de 1994 e 1995;
- carteira do Sindicato dos Trabalhadores rurais da cidade de José Bonifácio em nome da autora (data rasurada; fl. 41);
- certidão de óbito de Urbino Xavier da Cruz (pai da autora), qualificado como lavrador (16/09/2004; fl. 42);
- certidão de casamento do irmão da autora (José Xavier da Cruz), qualificado como lavrador (21/07/1979; fl. 43);
- certidão de casamento do irmão da autora (Eurípedes Xavier da Cruz), qualificado como lavrador (24/02/1990; fl. 44);
- certidão de casamento do irmão da autora (Lourival Xavier da Cruz), qualificado como lavrador (27/09/1981; fl. 45);
- CTPS da autora, sem vínculos (fl. 46)
A r. sentença proferida naqueles autos julgou procedente o pedido (fl. 58):
"(...)
A pretensão da autora merece acolhida. As testemunhas foram unânimes em declarar que a autora, diarista e empregada rural, sempre trabalhou no campo, durante muito mais de 144 meses, sendo, por conseguinte, segurada obrigatória da Previdência Social nos termos do artigo 11, inciso I, alínea "a", inciso IV (atual inciso V, letra g) e inciso VII, da Lei 8.213/91. A prova oral colhida nesta oportunidade, deu conta de demonstrar que a autora exerce atividade rural até os dias atuais, tendo trabalhado com as testemunhas Augusto Silvério e João Borges Gomes. Em que pese à súmula 149 do E. STJ, "a lei não veda a comprovação da qualidade de rurícola exclusivamente por testemunhas. Ao contrário, só excepciona na hipótese de aposentadoria por tempo de serviço". (1ª Turma do TRF/1ª Região, Ac 89.03.33346-2, Rel. Juiz SILVEIRA BUENO), vez que o rol do artigo 106 do PBPS é meramente exemplificativo. Mesmo que não se admitisse a prova exclusivamente testemunhal, a inicial veio acompanhada de prova material que reforça a convicção do Juízo. O documento de fls. 20 demonstra que a autora possui a condição de lavradora, representando início suficiente de prova material para o convencimento da procedência da ação. A autora é filha e irmã de trabalhadores rurais conforme documento de fls. 21/24. Por outro lado, o recolhimento de contribuições previdenciárias não é pressuposto imprescindível à concessão do benefício durante o período de transição a que alude o artigo 143 da Lei 8.213/91. Ante o exposto, julgo procedente o pedido, condenando o requerido a pagar a autora aposentadoria por idade, no valor de um (01) salário mínimo, bem como ao décimo terceiro salário, a partir da citação (...)"
Por sua vez, a decisão rescindenda, de lavra do Des. Fed. Antonio Cedenho (fls. 106/119), ao dar provimento à apelação interposta pela Autarquia Previdenciária, manifestou-se nos seguintes termos:
"(...)
Entretanto, em que pese tal linha de entendimento, no feito em pauta a Autora não logrou comprovar o efetivo exercício laborativo no campo, nos moldes impostos pela legislação previdenciária.
Embora o documento apresentado nos autos pela Autora (Certidão de Casamento, celebrado em 16/09/1971 - fl. 16) seja hábil a comprovar o efetivo exercício de atividade rural, pois constitui início razoável início de prova material, qualificando o marido como lavrador, devendo tal característica de um dos cônjuges ser estendida ao outro, não há como conceder o benefício se a prova testemunhal não vem a corroborar a prova material produzida. Ademais, consta nos depoimentos que o marido da autora exerce a profissão de borracheiro, atividade tipicamente urbana.
Mesmo admitindo-se, à data das núpcias, a extensão da atividade rurícola do marido à autora, seria necessária a produção de outras provas, ainda que testemunhais, aptas a demonstrar a continuidade do alegado labor rural pelo período legalmente exigido.
Da leitura dos documentos, prestados às fls. 75/82, nota-se que são extremamente frágeis em relação à atividade rurícola prestada, sendo insuficientes para a comprovação do efetivo exercício do labor no campo pelo período legalmente exigido, necessário à concessão do benefício; eis que não demonstraram, por exemplo, os períodos trabalhados nas propriedades agrícolas citadas. Não há datas, ainda que indicativas, de que tal atividade tenha mesmo sido desenvolvida.
Para que se declare isto melhor, cumpre referir a trechos os depoimentos carreados aos autos:
A Autora Senhora Nilci Xavier de Oliveira afirmou que sempre trabalhou roça, como diarista; que trabalhou para diversos empreiteiros, que trabalhou para o Sr. Augusto; que lhe pagava a diária de quinze reais; que ia de ônibus e caminhão; que nunca trabalhou na cidade; que o marido era borracheiro". (fl. 77)
O Senhor Augusto Silvério afirmou que conhece a Autora de treze a quinze anos; que ela trabalhou ultimamente arrancando feijão para o Pedro Barbosa, plantando, agora no mês de julho; que ganhava de dez a doze reais por dia; que o marido da Autora é borracheiro; que a Autora trabalha na roça, uma semana para um e para outro; que não era trabalho fixo". (fl. 80)
O Senhor Antonio Borges afirmou que conhece a Dona Nilci há quarenta anos; que ela sempre trabalhou na roça, como diarista; que já trabalhou em vários locais, como por exemplo, Fazenda Providência, Fazenda Bela Vista e Caturama; que a última vez que trabalhou foi na Fazenda Providência, que faz tempo que não trabalha na lavoura, que parou de trabalhar há quinze anos, mas que a Autora continua trabalhando até hoje como bóia-fria; para empreiteiros, tais como Alceu e Ovídio; que não sabe se a Autora trabalhou na cidade; que o marido da Autora é borracheiro e ela toda vida trabalhou na roça". (fls. 80/82)
(...)
Dessa feita, a Autora não conseguiu comprovar o exercício da atividade rural, mesmo de forma descontínua, a teor das regras insertas no artigo 142 da Lei nº 8.213/91)
(...)"
De acordo com o Art. 485, do CPC/73, vigente na época de propositura da presente ação rescisória, a sentença de mérito transitada em julgado pode ser rescindida quando, entre outras hipóteses, depois da sentença a parte autora obtiver documento novo, cuja existência ignorava, ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável.
Deste modo, reputa-se documento novo, de molde a ensejar a propositura da ação rescisória, aquele que preexistia ao tempo do julgado rescindendo, cuja existência a parte autora ignorava ou, por razão justificável, não pôde fazer uso durante o curso da ação subjacente.
Além disso, é preponderante que o documento novo seja de tal ordem capaz, por si só, de alterar o resultado do julgado rescindendo, assegurando pronunciamento judicial favorável à parte autora.
A jurisprudência já tem se pronunciado nessa linha de raciocínio, conforme precedentes do C. Superior Tribunal de Justiça: REsp 906740/MT, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, j. 06/09/2007, DJ 11/10/2007, p. 314; AgRg no Ag 569546/RS, Rel. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, Terceira Turma, j. 24/08/2004, DJ 11/10/2004, p. 318.
É de se salientar que, em relação aos rurícolas, a jurisprudência flexibilizou a exigência de demonstração de que o autor da rescisória ignorava a existência dos documentos novos, ou de que deles não pode fazer uso no momento oportuno, considerando adequada a solução pro misero àqueles que, em situação bastante desigual à de outros trabalhadores, não possuem noções mínimas de seus direitos fundamentais, conforme numerosos precedentes nesse sentido, oriundos desta Corte e do Colendo Superior Tribunal de Justiça.
Todavia, a parte autora não trouxe nessa ação rescisória nenhum documento diverso daqueles juntados na peça inicial da ação originária, limitando-se a insistir na tese que, mesmo seu marido trabalhando como urbano, a vida toda teria exercido atividade rural, com seus pais e irmãos, conforme documentos que trouxe nos autos.
Conforme ressaltado pelo representante ministerial, "a autora, apoiada em jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, alega que documento preexistente à propositura da ação deve ser considerado para os efeitos do art. 485, inciso VII, do Código de Processo Civil. Porém, tal possibilidade não abrange o documento já utilizado na ação originária, o qual de forma alguma pode ser considerado como novo".
Por conseguinte, de rigor a improcedência do pedido formulado na inicial.
Ainda que se admita que a decisão rescindenda tenha considerado o marido da autora qualificado como lavrador quando, na verdade, está qualificado como barbeiro na certidão de casamento e, no depoimento pessoal da autora e das testemunhas como borracheiro, tal fato não alteraria o resultado do julgamento.
A condição de rurícola da autora não pode decorrer da extensão da qualificação de seus irmãos e seu pai como lavradores nos documentos trazidos, na medida em que ela teria se casado (1971) antes do falecimento do pai (2004) e formado, assim, núcleo familiar próprio.
Nessa hipótese a jurisprudência não lhe favorece:
Além da circunstância de a proponente ser casada, a problematizar, após a celebração do matrimônio, o emprego de documentos em nome do genitor e irmãos, certo é que em consulta ao CNIS - Cadastro Nacional de Informações Sociais também se verifica que o irmão da autora, José Xavier da Cruz, possui vínculos urbanos: Estado de São Paulo (14/05/1996 a 11/1996; 26/11/1996 a 12/1996); Município de Zacarias (02/01/1999 a 03/2012); Zacarias Camara Municipal (01/01/2001 a 12/2004); e como contribuinte individual de 01/04/2003 a 31/12/2013. A própria autora possui vínculo urbano de 02/04/1984 a 17/02/1989 (Município de Planalto). Recebe amparo social ao idoso com DIB 12/07/2016 e seu marido aposentadoria por idade, na atividade comerciário, DIB 24/01/2013.
Ressalto que a improcedência do pedido fundamentou-se também na fragilidade da prova testemunhal. Assim, sob qualquer ângulo, conclui-se que o resultado da demanda não tem como ser alterado.
Condeno a parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios, que arbitro em 10% sobre o valor da causa, nos termos do § 2º do art. 85 do Novo Código de Processo Civil/2015, observando-se a suspensão de exigibilidade prevista no § 3º do art. 98 do mesmo diploma legal.
Ante o exposto, REJEITO A MATÉRIA PRELIMINAR E, NO MÉRITO, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO DE RESCISÃO DO JULGADO.
É o voto.
LUCIA URSAIA
Desembargadora Federal
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Data e Hora: | 17/04/2018 19:12:10 |