Processo
AR - AçãO RESCISóRIA / SP
5013136-90.2019.4.03.0000
Relator(a)
Desembargador Federal MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA
Órgão Julgador
3ª Seção
Data do Julgamento
21/05/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 27/05/2020
Ementa
E M E N T A
AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. ERRO DE
FATO E PROVA NOVA NÃO CARACTERIZADOS.
1. Para se desconstituir a coisa julgada com fundamento em erro de fato é necessária a
verificação de sua efetiva ocorrência, no conceito estabelecido pelo próprio legislador, o que não
ocorreu no presente feito. Tendo o julgado rescindendo apreciado todos os elementos
probatórios, em especial os documentos carreados aos autos, é patente que a parte autora, ao
postular a rescisão do julgado, na verdade busca a reapreciação da prova produzida na ação
subjacente.
2. Certo é que a ação rescisória não é via apropriada para corrigir eventual injustiça decorrente de
equivocada valoração da prova, não se prestando, enfim, à simples rediscussão da lide, sem que
qualquer das questões tenha deixado de ser apreciada na demanda originária.
3. O artigo 966, VII, do novo CPC trata do cabimento da ação rescisória quando a parte autora,
depois do trânsito em julgado, obtiver prova nova, capaz de por si só alterar o resultado da
decisão que se pretende rescindir. A prova nova é aquela que não foi apresentada no feito
originário e cuja existência era ignorada pelo autor da ação rescisória ou de que não pode fazer
uso por motivo estranho à sua vontade. Deve ainda o documento/prova referir-se a fatos
alegados no processo original.
4. Não configura documento novo aquele que ainda não existia quando do julgamento do feito
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
subjacente, bem como aquele que, por si só, não seria capaz de acarretar um pronunciamento
judicial favorável.
5. Condenação da parte autora ao pagamento de verba honorária, arbitrada moderadamente em
R$ 1.000,00 (mil reais), de acordo com a orientação firmada por esta E. Terceira Seção e nos
termos do art. 85, § 2º e 3º do Código de Processo Civil.
6. Rescisória improcedente.
Acórdao
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5013136-90.2019.4.03.0000
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
AUTOR: VICENTE FLORA
Advogado do(a) AUTOR: HEIDE FOGACA CANALEZ - SP77363-N
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5013136-90.2019.4.03.0000
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
AUTOR: VICENTE FLORA
Advogado do(a) AUTOR: HEIDE FOGACA CANALEZ - SP77363-N
RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Trata-se de ação rescisória
ajuizada por Vicente Flora, com fundamento no artigo 966, inciso VII (prova nova) e VIII (erro de
fato), do Código de Processo Civil, visando desconstituir acórdão proferido pela 9ª Turma desta
Corte que deu provimento à apelação do INSS, para julgar improcedente o pedido de concessão
de aposentadoria por idade a trabalhador rural.
Sustenta a parte autora apresentar prova nova, existente à época, mas que ignorava em virtude
de suas condições pessoais vulnerabilizantes como trabalhador rural diarista/boia-fria e que, se
juntadas, promoveriam desfecho diverso. Alega que os documentos apresentados na ação
subjacente, quais sejam, certidão de casamento lavrada aos 13 de julho de 1974 e Certificado de
Dispensa e Incorporação datado de 1976, apesar de antigos, são públicos e possuem aptidão
como início de prova material do labor rural e, ainda assim, foi considerado inexistente o valor do
conjunto probatório, concluindo o julgando rescindendo pela prec de prova material precária e
remota, de modo que se verifica erro de fato. Afirma, assim, haver preenchido os requisitos legais
à concessão do benefício postulado.
Os benefícios da justiça gratuita foram concedidos e foi indeferida a tutela de urgência (ID
66430641).
Regularmente citada, a autarquia-ré apresentou contestação (ID 83435056), alegando que a
presente rescisória possui caráter recursal. Sustenta que o órgão julgador apreciou livremente a
prova produzida, atendo-se aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, deixando inequívoco
que para chegar à conclusão adotada (improcedência da ação), levou em conta o conjunto
probatório coligido. Frisa que a eventual má apreciação da prova, inocorrente no caso presente
não rende ensejo à rescisão do julgado, na medida em que, como já visto, a rescisória não se
confunde com recurso. Afirma a inocorrência de prova nova e de erro de fato.
Alegações finais apresentadas somente pela parte autora (ID 90409360).
O representante do Ministério Público Federal opinou pela improcedência da rescisória (ID
107350261).
É o relatório.
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5013136-90.2019.4.03.0000
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
AUTOR: VICENTE FLORA
Advogado do(a) AUTOR: HEIDE FOGACA CANALEZ - SP77363-N
RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Verifico que foi obedecido o
prazo de dois anos estabelecido pelo artigo 975 do CPC, considerando o ajuzamento da
rescisória em 24/05/2019 e o trânsito em julgado ocorrido em 12/04/2019 (ID 63930540 – pág. 2).
Pretende a autora a rescisão de acórdão proferido pela 9ª Turma desta Corte, nos autos da ação
nº 2018.03.99.021563-7, tendo por base a alegação de obtenção de prova nova e a ocorrência de
erro de fato, nos termos do artigo 966, incisos VII e VIII, do Código de Processo Civil.
Vicente Flora, nascido em 17/10/1955, ajuizou ação ordinária, em 03/09/2018, pleiteando a
concessão de aposentadoria por idade rural, desde o requerimento administrativo, protocolado
em 16/05/2016, alegando que sempre laborou no campo. Para comprovar o exercício de
atividade rural, juntou aos autos subjacentes certidão de casamento, celebrado em 13/7/1974, e
certificado de dispensa de incorporação (17/03/1976), nos quais o autor foi qualificado como
lavrador.
A decisão rescindenda (ID 63929065), que deu provimento à apelação do INSS para julgar
improcedente o pedido de concessão de aposentadoria por idade rural, foi proferida nos
seguintes termos:
"(...)
No caso em discussão, o requisito etário restou preenchido em 17/10/2015. O autor alega que
sempre trabalhou nas lides rurais, como boia-fria, em diversas propriedades da região, tendo
cumprido a carência exigida na Lei nº 8.213/91. - Quanto ao requisito do início de prova material,
consta dos autos apenas certidão de casamento, celebrado em 13/7/1974, e certificado de
dispensa de incorporação (1976), nos quais o autor foi qualificado como lavrador. Nada mais. -
Acerca do tempo rural, a jurisprudência se firmou no sentido de que o inicio de prova material não
precisa recobrir todo o período controvertido (v.g., STJ: AgRg no AREsp 415928 [DJe de
6.12.2013]). Todavia, da mesma forma que se louva a flexibilização hermenêutica, que decorreu
da atenção prestadas às dificuldades da vida no campo, é razoável que a mesma não deve ser
estendida ao ponto de se admitir inicio de prova extremamente precário e remoto para
demonstrar um extenso tempo de vários anos. - Ademais, segundo dados do CNIS de f. 24, o
requerente possui apenas um único vínculo empregatício, na condição de motorista de caminhão
(CBO 0985-60), no interstício de 2/1/1997 a 3/5/1997, bem como verteu recolhimentos
previdenciários, como segurado facultativo, de 1º/5/2006 a 30/6/2006. Considerando que o último
início de prova documental é de vínculo urbano, mais de 18 (dezoito) anos antes da idade legal
atingida em 2015, entendo que a prova é precária em relação à atividade rural alegada. -
Diferentemente de tempos pretéritos, não é razoável que o autor não possua alguma anotação de
vínculo empregatício rural em sua CTPS. - Por seu turno, a prova oral, entrementes, é bastante
fraca, principalmente quanto ao período quando a autora implementou a idade para a
aposentadoria. Praticamente idênticos, os depoimentos de Abner Soares da Silva e Ademir José
dos Santos, pouco ou nada esclareceram, visto que se limitaram a indicar alguns poucos locais
de trabalho e atividades exercidas, sem, contudo, precisar o período de labor exercido ou algum
outro elemento que suprisse a escassez do início de prova material. - Ou seja, não há mínima
comprovação do exercício de atividade rural pela autora no período imediatamente anterior ao
atingimento do requisito etário, igual ao número correspondente à carência do benefício
requerido, aplicando ao caso a inteligência do RESP 1.354.908, processado segundo a
sistemática de recurso representativo da controvérsia. - Vale repisar que para ser trabalhador
rural diarista e ter acesso às benesses previdenciárias, não basta a pessoa de forma esporádica,
vez ou outra, ter feito uma diária, havendo necessidade de perenidade da atividade, ainda que
considerada a situação própria dos trabalhadores campesinos, onde o serviço nem sempre é
diário. - Não se pode admitir que tão somente a prova oral produzida em audiência comprove que
a recorrida exerceu atividades rurais no período juridicamente relevante, pois isto, de maneira
transversa, fere a Súmula 149 do STJ, que impede a comprovação de atividade rural por meio de
prova exclusivamente testemunhal. - Indevida a concessão do benefício pretendido.
(...)"
Com efeito, não resta configurada a hipótese prevista no artigo 966, inciso VIII, § 1º, do Código de
Processo Civil, pois para a verificação do erro de fato, a ensejar a rescisão do julgado, é
necessário que este tenha admitido fato inexistente ou considerado inexistente fato efetivamente
ocorrido, bem como não tenha ocorrido controvérsia e nem pronunciamento judicial sobre o fato.
Não se presta a rescisória ao rejulgamento do feito, como ocorre na apreciação dos recursos.
Para se desconstituir a coisa julgada com fundamento em erro de fato é necessária a verificação
de sua efetiva ocorrência, no conceito estabelecido pelo próprio legislador.
No presente caso, a parte autora alega que houve erro de fato, pois a decisão rescindenda não
considerou os documentos juntados aos autos subjacentes, quais sejam, certidão de casamento
e certificado de dispensa de incorporação, nos quais o autor havia sido qualificado como lavrador,
como início de prova material do exercício de atividade rural. Na verdade, o julgado já transcrito
analisou os citados documentos, concluindo que o início de prova apresentado era precário e
remoto e ressaltou anotação de contrato de trabalho urbano mais recente, bem como considerou
que a prova oral mostrou-se frágil e insuficiente. Assim, considerou que o conjunto probatório
acostado aos autos não foi hábil a demonstrar o exercício de atividade rural no período
imediatamente anterior ao atingimento do requisito etário, igual ao número correspondente à
carência do benefício requerido.
Ensina Cassio Scarpinella Bueno: "O erro de fato não autoriza a rescisão da sentença e o
proferimento de nova decisão por má avaliação da prova ou da matéria controvertida em
julgamento. Não se trata de uma "nova chance" para rejulgamento da causa. Muito
diferentemente, o erro de fato que autoriza a ação rescisória é o que se verifica quando a decisão
leva em consideração fato inexistente nos autos ou desconsidera fato inconteste nos autos. Erro
de fato se dá, por outras palavras, quando existe nos autos elemento capaz, por si só, de
modificar o resultado do julgamento, embora ele não tenha sido considerado quando do seu
proferimento ou, inversamente, quando leva-se em consideração elemento bastante para
julgamento que não consta dos autos do processo"(in Código de Processo Civil Interpretado.
Coordenador Antonio Carlos Marcato. São Paulo: Atlas, 2004, p. 1480).
Sobre o tema, já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça nos seguintes termos:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO RESCISÓRIA.
ERRO DE FATO. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO.
1. O pleito rescisório não se presta a reexaminar provas, sendo necessário, ainda, que as razões
do especial versem unicamente sobre o cabimento da ação, e não sobre eventual desacerto da
decisão rescindenda. Precedentes do STJ.
2. Agravo regimental improvido.
(AgRg no REsp 897.957/CE, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado
em 05/05/2009, DJe 15/06/2009)
Confira-se, ainda, o entendimento adotado à unanimidade pela Terceira Seção desta Corte
Regional:
"AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. EXERCÍCIO DE
ATIVIDADE RURAL. ERRO DE FATO. NÃO OCORRÊNCIA. OFENSA A LITERAL DISPOSIÇÃO
DE LEI. MATÉRIA DE INTERPRETAÇÃO CONTROVERTIDA NOS TRIBUNAIS. REGIME DE
ECONOMIA FAMILIAR. NÃO CONFIGURAÇÃO.
I - O erro de fato, como resultado de atos ou fatos do processo, configura-se desde que admitido
fato inexistente, ou negado fato ocorrido, sem que, sobre a matéria, tenha havido controvérsia ou
pronunciamento judicial.
II - Hipótese em que houve expressa apreciação da matéria, restando assentado no acórdão que
os documentos que instruíram o pedido originário não servem para traduzir início de prova
material, daí porque não se pode afirmar ter ocorrido admissão de fato inexistente, ou que tenha
sido considerado inexistente fato efetivamente verificado, ainda que se possa, em tese, aventar a
injustiça do julgamento, controvérsia, porém, que gira em torno de valoração da prova,
insuscetível, nesse passo, de ser reexaminada em sede de ação rescisória. Aplicação do art. 485,
inc. IX e §§ 1º e 2º, CPC."
III - A matéria referente à utilidade ou não, como início razoável de prova material, da
documentação trazida ao feito originário, em razão de referir-se, toda, ao marido da autora, e
também em vista de nada demonstrar no tocante a um eventual exercício da atividade em regime
de economia familiar, recebeu tratamento divergente pelos tribunais, ora afirmando a sua
possibilidade, ora negando-a, dissensão somente pacificada com a edição da Súmula 149/STJ,
que assentou entendimento no sentido da vedação ao reconhecimento desse tempo de serviço
sem outras provas.
IV - O aresto rescindendo, que adotou orientação contrária à autora, pela imprestabilidade dos
documentos trazidos à colação para servir de prova indiciária, não infringiu qualquer disposição
literal de lei, a teor do que dispõe o art. 485, V, CPC. Orientação da Súmula nº 343/STF.
V - Além disso, os elementos carreados aos autos da ação subjacente não são suficientes à
comprovação do regime de economia familiar, no qual o trabalho é exercido pelos membros da
família, em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados,
tido como indispensável à própria subsistência, nos termos do art. 11, § 1º, da Lei nº 8.213/91,
sendo tal conceito, aliás, já esboçado no artigo 160 do Estatuto do Trabalhador Rural - Lei nº
4.214, de 02 de março de 1963.
VI - Demonstrou-se, naquele feito, que o marido da autora é proprietário de dois imóveis rurais: o
primeiro, de 75,6250 hectares, ou 31 alqueires e ¼, adquirido em 09 de junho de 1958,
denominado "Fazenda Macaúbas" e localizado no Município de Magda/SP, conforme a cópia de
certidão expedida pelo Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Nhandeara/SP (fls. 26); o
segundo, adquirido em 18 de agosto de 1964, em área contígua à propriedade anterior, medindo
36 hectares, 90 ares e 51 centiares, ou 15 alqueires e uma quarta, constituído de duas glebas de
24,20 hectares e 12,10 hectares, conforme as cópias da escritura de venda e compra (fls. 25) e
das certidões emanadas do mesmo cartório, trazidas à colação, ainda, cópias de notas fiscais de
produtor, abrangendo o período de 1990 a 1997, nas quais apenas se atesta a inscrição do
cônjuge varão perante o fisco estadual, à época.
VII - É de ser assentada, em conseqüência, a ausência de qualquer documento que pudesse
fornecer esclarecimento acerca do tipo de exploração econômica da propriedade, tal como
inscrição dos imóveis rurais junto ao INCRA, a fim de se averiguar se havia, ou não, o concurso
de empregados, o que, em caso positivo, serviria para descaracterizar o alegado exercício da
atividade em regime de economia familiar.
VIII - Ressalve-se ter vindo à colação cópia da Certidão de Casamento da autora, em que seu
marido aparece qualificado como lavrador, documento que se revela de nenhum interesse para a
causa, eis que, por si só, não têm o condão de assentar a natureza do exercício do labor
supostamente desenvolvido, vale dizer, se a forma de exploração das propriedades se dava com
a utilização de empregados ou somente por meio do trabalho prestado pelos membros da família.
IX - Ação rescisória julgada improcedente." (AR n.º 1325/SP, Relatora Desembargadora Federal
Marisa Santos, j. 11/05/2005, DJ 14/07/2005).
Por outro lado, o artigo 966, VII, do novo CPC trata do cabimento da ação rescisória quando a
parte autora, depois do trânsito em julgado, obtiver prova nova, capaz de por si só alterar o
resultado da decisão que se pretende rescindir. A prova nova é aquela que não foi apresentada
no feito originário e cuja existência era ignorada pelo autor da ação rescisória ou de que não pode
fazer uso por motivo estranho à sua vontade. Deve ainda o documento/prova referir-se a fatos
alegados no processo original.
Nas palavras do eminente processualista Vicente Grecco Filho: "O documento novo não quer
dizer produzido após a sentença, mas documento até então desconhecido ou de utilização
impossível. A impossibilidade de utilização deve ser causada por circunstâncias alheias à vontade
do autor da rescisória. A negligência não justifica o seu não-uso na ação anterior. Aliás, esta
última situação é de ocorrência comum. A parte (ou o advogado) negligencia na pesquisa de
documentos, que muitas vezes estão à sua disposição em repartições públicas ou cartórios. Essa
omissão não propicia a rescisão, mesmo que a culpa seja do advogado e não da parte. A esta
cabe ação de perdas e danos, eventualmente. Como no inciso anterior, o documento novo deve
ser suficiente para alterar o julgamento, ao menos em parte, senão a sentença se mantém."
(Direito Processual Civil Brasileiro. 2º v., São Paulo: Saraiva, 1996, p. 426).
No caso dos autos, a parte autora aponta, como prova nova, os seguintes documentos:
certidões de nascimento dos filhos, nas quais está qualificado como lavrador:
Neiva Aparecida, nascida em 18/04/1975 (ID 63921630)
Vanildo Israel, nascido em 19/05/1977 (ID 63924432)
Cesar Rodrigo, nascido em 10/06/1979 (ID 63924435)
Abraão Fernando, nascido em 24/04/1980 (ID 63924433)
Samuel Willian, nascido em 27/04/1989 (ID 63924444)
Vinicius Fidelis, nascido em 03/01/1996 (ID 63924441)
cópia do processo ajuizado pela esposa do requerente, em 2010, visando aposentadoria por
idade rural, julgada procedente (ID 64178274, 63926001, 63925984, 63925994, 63926006,
63926009 e 64193588)
certidão da Justiça Eleitoral, datada de 16/05/2019, na qual consta que nos dados cadastrais, o
autor se declarou trabalhador rural (ID 63924449).
Analisando a documentação juntada aos presentes autos, observa-se que a certidão da Justiça
Eleitoral, apontando a ocupação de trabalhador rural, não caracteriza início de prova material,
uma vez que expressamente certifica serem dados meramente declarados pelo requerente, sem
valor probatório.
No que tange à cópia do feito de nº 443.01.2010.002778-5, na qual houve o reconhecimento do
direito da esposa do autor ao benefício de aposentadoria rural por idade, cumpre anotar que tal
documento não se reporta a fato vinculado ao ora demandante, consistindo, na verdade,
declaração judicial emitida após valoração de provas referentes a fatos pretéritos ocorridos com a
sua cônjuge. Conforme disposto no art. 504, inciso II, do CPC, a verdade dos fatos, estabelecida
como fundamento da sentença, não faz coisa julgada, permitindo que a convicção formada pelo
Juízo que reconheceu a condição de rurícola da esposa do autor não impeça nova discussão
acerca do mesmo tema, já que a ação subjacente é diversa daquela. (Precedente: TRF3, AR
2017.03.00.001757-5 - Rel. Juíza Federal Convocada Sylvia de Castro, j. em 08/08/2018, v.u,
D.E. 22/08/2018)
Ademais, ainda que tivessem instruído o feito subjacente, não seriam capazes, por si sós, de
garantir um pronunciamento judicial favorável, considerando que o autor completou o requisito
etário em 2015 e a decisão rescindenda entendeu que “não há mínima comprovação do exercício
de atividade rural pela autora no período imediatamente anterior ao atingimento do requisito
etário, igual ao número correspondente à carência do benefício requerido quantidade suficiente. ”
Em simetria, o Colendo Superior Tribunal de Justiça firmou tese em sessão de julgamento
realizada em 09/09/2015, em sede de recurso representativo da controvérsia (Tema 642 -
Recurso Especial repetitivo 1.354.2908/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques), no sentido de
que o segurado especial deve estar trabalhando no campo quando do preenchimento do requisito
etário, momento em que poderá requerer seu benefício, ressalvada a hipótese em que, "embora
não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no
passado, ambos os requisitos carência e idade".
Saliente-se que não se presta a rescisória ao rejulgamento do feito, como ocorre na apreciação
dos recursos, ou uma nova oportunidade para a complementação das provas.
Sobre o tema, já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça nos seguintes termos:
"PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. CPC, ART. 485, VII. DOCUMENTO NOVO.
QUALIFICAÇÃO.
I - O documento novo que se presta para embasar ação rescisória, nos termos do artigo 485, VII,
do CPC, é aquele que tem aptidão, por si só, de garantir um pronunciamento judicial favorável.
II - Não pode ser considerado documento novo, aquele produzido após o trânsito em julgado do
acórdão rescindendo.
III - Desqualifica-se como documento novo o que não foi produzido na ação principal por desídia
da parte.
IV - Agravo regimental desprovido." (AgRegAI nº 569.546, Relator Ministro Antônio de Pádua
Ribeiro, DJU 11/10/2004, p. 318)
No mesmo sentido, precedentes da Terceira Seção desta Corte Regional:
"PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO RESCISÓRIA. DOCUMENTO NOVO E
ERRO DE FATO. IMPROCEDÊNCIA PRIMA FACIE. DECISÃO FUNDAMENTADA.
(...)
II - Julgado agravado dispôs, expressamente, sobre a inexistência de erro de fato: decisão
rescindenda apreciou o conjunto probatório e concluiu pela inexistência de prova do labor rurícola
da autora, depois do óbito do cônjuge, em 1990. Afastou a fotografia acostada como documento
novo, por não retratar a autora no pleno exercício da atividade rural." (AR nº 2009.03.00.044293-
9, Relatora Desembargadora Federal Marianina Galante, j. 08/09/2011, DJ-e 16/09/2011, p. 243).
Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO formulado na presente ação rescisória,
nos termos da fundamentação acima.
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em R$1.000,00 (mil
reais), cuja exigibilidade fica suspensa, nos termos do art. 98, §3º, do CPC/2015, por ser
beneficiária da assistência judiciária gratuita, conforme entendimento majoritário da 3ª Seção
desta Corte.
É o voto.
E M E N T A
AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. ERRO DE
FATO E PROVA NOVA NÃO CARACTERIZADOS.
1. Para se desconstituir a coisa julgada com fundamento em erro de fato é necessária a
verificação de sua efetiva ocorrência, no conceito estabelecido pelo próprio legislador, o que não
ocorreu no presente feito. Tendo o julgado rescindendo apreciado todos os elementos
probatórios, em especial os documentos carreados aos autos, é patente que a parte autora, ao
postular a rescisão do julgado, na verdade busca a reapreciação da prova produzida na ação
subjacente.
2. Certo é que a ação rescisória não é via apropriada para corrigir eventual injustiça decorrente de
equivocada valoração da prova, não se prestando, enfim, à simples rediscussão da lide, sem que
qualquer das questões tenha deixado de ser apreciada na demanda originária.
3. O artigo 966, VII, do novo CPC trata do cabimento da ação rescisória quando a parte autora,
depois do trânsito em julgado, obtiver prova nova, capaz de por si só alterar o resultado da
decisão que se pretende rescindir. A prova nova é aquela que não foi apresentada no feito
originário e cuja existência era ignorada pelo autor da ação rescisória ou de que não pode fazer
uso por motivo estranho à sua vontade. Deve ainda o documento/prova referir-se a fatos
alegados no processo original.
4. Não configura documento novo aquele que ainda não existia quando do julgamento do feito
subjacente, bem como aquele que, por si só, não seria capaz de acarretar um pronunciamento
judicial favorável.
5. Condenação da parte autora ao pagamento de verba honorária, arbitrada moderadamente em
R$ 1.000,00 (mil reais), de acordo com a orientação firmada por esta E. Terceira Seção e nos
termos do art. 85, § 2º e 3º do Código de Processo Civil.
6. Rescisória improcedente. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Terceira Seção
do Tribunal Regional Federal da 3ª Região decidiu, por unanimidade, julgar improcedente a
rescisória, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA