
| D.E. Publicado em 08/06/2018 |
EMENTA
- A alegação preliminar suscitada pelo MPF em parecer e pelo réu em contestação de que é vedado o manejo da ação rescisória para reexame das provas coligidas no feito subjacente confunde-se com o mérito e com ele deve ser analisada.
- O artigo 966 do Código de Processo Civil atual prevê, de modo taxativo, as hipóteses de cabimento da ação rescisória, que têm por escopo a correção de defeitos processuais e decisões desarrazoadas.
- As decisões judiciais devem, por meio de interpretação teleológica, escorar-se no ordenamento jurídico e atender aos fins sociais, exigindo-se a devida fundamentação e observação dos precedentes jurisprudenciais sobre a matéria.
- O inciso V, do art. 966, do CPC prevê o cabimento de ação rescisória quando houver violação evidente, ou seja, demonstrada com prova pré-constituída juntada pelo autor, de norma jurídica geral.
- A teor do §1º, do inciso VIII, do art. 966, do CPC, para a rescisão do julgado em razão do erro de fato, mister que o erro tenha sido a causa da conclusão da sentença, seja verificável pelo simples exame dos documentos e peças dos autos e não haja controvérsia sobre o fato.
- O erro de fato é o erro de apreciação da prova trazida aos autos, com a falsa percepção dos fatos, dele decorrendo o reconhecimento pelo julgador de um fato inexistente ou da inexistência de um fato existente, não se confundindo com a interpretação dada pelo juiz à prova coligida nos autos subjacentes.
- É assegurado o benefício da aposentadoria por idade aos trabalhadores rurais, na forma da Lei n. 8.213/91, ao segurado que completar 60 (sessenta) anos de idade, se homem ou 55 (cinquenta e cinco) anos, se mulher mediante a comprovação do exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período equivalente à carência exigida, nos termos do art. 26, III, e art. 142 do referido texto legal.
- Ausente erro na percepção dos fatos e falto a condição da autora dos requisitos legais indispensáveis à concessão do benefício pleiteado, o entendimento exarado na decisão transitada em julgado é consentâneo com o ordenamento jurídico e a jurisprudência pátria, pelo que inadmissível a desconstituição do julgado. Ainda, a ação rescisória não se confunde com nova instância recursal, exigindo que o posicionamento adotado desborde do razoável, agrida a literalidade ou o propósito da norma, o que não ocorreu no presente caso.
- Ajustado o entendimento adotado pela v. decisão transitada no feito subjacente aos ditames da Constituição da República, da Lei nº 8.213/91, da Lei n. 8212/93 e do Decreto 3.048/99, não se concretizaram as hipóteses de rescisão previstas nos incisos V e VIII, do art. 966, do Código de Processo Civil, sendo de rigor a improcedência do pedido rescindente.
- Honorários advocatícios fixados em 10% do valor da causa, observada a gratuidade da justiça.
- Pedido rescindente julgado improcedente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, julgar improcedente o pedido, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0009655-15.2016.4.03.0000/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL GILBERTO JORDAN (Relator). Trata-se de ação rescisória, ajuizada em 24 de maio de 2016, com fundamento nos incisos V e VIII, do artigo 966, do Código de Processo Civil (violação manifesta de norma jurídica e erro de fato) em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando a desconstituição do v. julgado proferido pelo eminente Des. Fed. Newton de Lucca, transitado em julgado em 23.04.15 (fl. 100).
A decisão monocrática rescindenda de fls. 95/97 deu provimento à apelação do INSS para julgar improcedente o pedido de concessão de aposentadoria rural por idade, sob o fundamento, em suma, de ausência de início de prova material do labor rural.
Em sua inicial, sustentou a autora fazer jus ao benefício, uma vez que a ela se estende a condição de rural do esposo, que não se afasta em função da existência de vínculo urbano de 9 dias, pois não ultrapassa o período de entressafra de 120 dias, previsto no inciso III, do §10, da Lei 8212/91. Ainda, aduziu ser de natureza rural a função de tratorista exercida pelo esposo em empresa rural. Indicou violação manifesta pelo julgado rescindendo ao inciso III, do §10, da Lei 8212/91 e erro de fato no que se refere à condição de trabalhador rural do marido. Pediu a concessão de tutela de urgência, a rescisão do julgamento e, em novo julgamento, a concessão do benefício de aposentadoria rural por idade. Valor da causa: R$ 10.560,00.
Com a inicial foram acostados documentos de fls. 13/103.
Instada, a autora manifestou desinteresse na autocomposição (fls. 106/107).
Em decisão de fls. 109/110 foi reconhecida a tempestividade da ação, indeferida a tutela de urgência, concedida a gratuidade da justiça e determinada a citação do réu.
Citado em 24 de agosto de 2016, o INSS apresentou contestação, oportunidade em que alegou, preliminarmente, ausência de interesse de agir, ao argumento de que é vedado o manejo da ação rescisória para a rediscussão do quadro fático-probatório produzido na lide originária, buscando a renovação da lide subjacente. No mérito, aduziu inexistência de violação manifesta à norma jurídica, porquanto a profissão de tratorista exercida pelo esposo da autora é de natureza urbana, conforme já assentado na Súmula 70, de 13.03.2013, da Turma Nacional de Uniformização e jurisprudência desta Eg. Corte. Outrossim, informou que o marido da autora é beneficiário de aposentadoria por tempo de contribuição urbana.
Ainda na contestação, o INSS impugnou a ocorrência de erro de fato diante da existência de controvérsia e pronunciamento judicial sobre os fatos alegados e aduziu não fazer a autora jus ao benefício pleiteado por ausência dos requisitos legais.
Em manifestação de fl. 137, a autora requereu a produção de prova documental e pericial, quedando-se inerte sobre a contestação e documentos que a acompanharam, embora regularmente intimida conforme despacho de fl. 135.
Regularmente intimada, a autora deixou de apresentar alegações finais e o réu reiterou a contestação (fl. 139-v).
O Ministério Público Federal manifestou-se, preliminarmente, pelo não conhecimento da ação, ante a necessidade de reanálise de provas do feito originário e, no mérito, pela improcedência do pedido (fls. 142/146).
É o relatório.
Peço dia para julgamento.
Desembargador Federal Relator
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0009655-15.2016.4.03.0000/SP
VOTO
ADMISSIBILIDADE
Competente esta Eg. Corte para o processamento e julgamento da ação, partes legítimas e bem representadas, tempestiva a ação por ajuizada no prazo decadencial legal, conforme já exarado às fls. 109/110, presentes suas condições e pressupostos processuais e inexigível o depósito previsto no inciso II, do artigo 968, do Código de Processo Civil aos beneficiários da gratuidade da justiça, a teor do §1º, do mesmo artigo.
INTERESSE DE AGIR.
O INSS requereu o reconhecimento de ausência de interesse de agir, por não se admitir o manejo da presente ação para reexame das provas coligidas no feito subjacente.
Todavia, a questão confunde-se com o mérito e com ele será analisada, ficando rejeitada a matéria preliminar arguida.
Vencida a matéria preliminar, passa-se ao exame das hipóteses de cabimento da ação rescisória.
HIPÓTESES DE RESCINDIBILIDADE
O art. 485 do Código de Processo Civil de 1973 previa as hipóteses de cabimento de ação rescisória para rescindir decisão transitada em julgado.
O artigo 966 do Código de Processo Civil atual prevê, de modo taxativo, as hipóteses de cabimento da ação rescisória, conforme abaixo transcrito, in verbis:
As hipóteses listadas em epígrafe têm por escopo a correção de defeitos processuais e decisões desarrazoadas.
De se ressaltar que cada fundamento previsto no art. 966, do CPC corresponde a uma causa de pedir para o juízo rescindente, ao qual fica adstrito o Tribunal (arts. 141 e 492, do CPC), sendo certo que para o juízo rescisório, a causa de pedir deverá ser a mesma da ação originária.
JUÍZO RESCINDENTE E RESCISÓRIO
Para julgamento da ação rescisória, mister proceder o tribunal inicialmente ao juízo de admissibilidade da ação.
Ao depois, compete à Corte o juízo de mérito quanto ao pedido de rescisão do julgado, chamado de juízo rescindente ou iudicium rescindens.
Sendo o caso e havendo pedido de novo julgamento e desde que acolhido o pedido de rescisão do julgado, o tribunal procederá ao rejulgamento do feito por meio do juízo rescisório ou iudicium rescissorium.
Sobre o tema, confira-se o ensinamento de Fredie Didier Jr.:
MANIFESTA VIOLAÇÃO À NORMA JURÍDICA
Para correção de error in procedendo ou in judicando ou decisão contra precedente obrigatório, a ação rescisória proposta com fundamento em violação de norma jurídica deve indicar a norma ou o precedente violado.
As decisões judiciais devem, por meio de interpretação teleológica, escorar-se no ordenamento jurídico e atender aos fins sociais, exigindo-se a devida fundamentação e observação dos precedentes jurisprudenciais sobre a matéria.
Conforme preleciona Fredie Didier "quando se diz que uma norma foi violada, o que se violou foi a interpretação dada à fonte do direito utilizada no caso." (op. cit., p. 492).
A expressão norma jurídica refere-se a princípios, à lei, à Constituição, a normas infralegais, a negócios jurídicos e precedentes judiciais.
O inciso V, do art. 966, do CPC prevê o cabimento de ação rescisória quando houver violação evidente, ou seja, demonstrada com prova pré-constituída juntada pelo autor, de norma jurídica geral, ou seja, lei em sentido amplo, processual ou material. A violação a normas jurídicas individuais não admite a ação rescisória, cabendo, eventualmente e antes do trânsito em julgado, reclamação.
Nesse sentido, é o comentário ao art. 485, do CPC/73 de Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery citando Pontes de Miranda e Barbosa Moreira: "Lei aqui tem sentido amplo, seja de caráter material ou processual, em qualquer nível (federal, estadual, municipal e distrital), abrangendo a CF, MedProv., DLeg, etc". (Código de Processo Civil Comentado: legislação Extravagante, 10ª ed., 2008).
Com efeito, a interpretação dada pelo pronunciamento rescindendo deve ser desarrazoado de tal modo que viole a norma jurídica em sua literalidade. Contudo, se a decisão rescindenda eleger uma dentre as interpretações cabíveis, ainda que não seja a melhor, não é caso de ação rescisória, sob pena de desvirtuar sua natureza, dando-lhe contorno de recurso. Nesse sentido, é a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça. (Theotonio Negrão, in Código de Processo Civil e Legislação Processual em vigor, 41ª ed., nota 20 ao art. 485, V, CPC).
Ainda, quanto à rescisão do julgado com fundamento no inciso V, do art. 966, do CPC, ensina Fredie Didier Jr:
E ainda:
ERRO DE FATO
A teor do §1º, do inciso VIII, do art. 966, do CPC, "há erro de fato quando a decisão rescindenda admitir fato inexistente ou quando considerar inexistente fato efetivamente ocorrido, sendo indispensável, em ambos os casos, que o fato não represente ponto controvertido sobre o qual o juiz deveria ter se pronunciado". (g.n.)
Para a rescisão do julgado em razão do erro de fato, mister que o erro tenha sido a causa da conclusão da sentença, seja verificável pelo simples exame dos documentos e peças dos autos e não haja controvérsia sobre o fato.
A inexistência de controvérsia dá-se em casos em que o fato, que poderia ser conhecido de ofício, não é alegado; quando o fato é admitido; se o fato não é impugnado.
Confira-se a doutrina sobre o tema:
O erro de fato, portanto, é o erro de apreciação da prova trazida aos autos, com a falsa percepção dos fatos, dele decorrendo o reconhecimento pelo julgador de um fato inexistente ou da inexistência de um fato existente, não se confundindo com a interpretação dada pelo juiz à prova coligida nos autos subjacentes.
Corolário lógico, inviável o manejo da ação rescisória para o reexame das provas com base nas quais o juízo formou sua convicção em relação aos fatos relevantes e controvertidos do processo.
A propósito, de se trazer à colação julgado representativo de controvérsia sobre o erro de fato em ação rescisória:
SÚMULA N. 343 DO STJ
O enunciado da Súmula em epígrafe encontra-se vazado nos seguintes termos: "não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal e interpretação controvertida nos tribunais".
Sobre a incidência da Súmula, ensina Fredie Didier Jr. que "Enquanto se mantém a divergência sem que haja a definição da questão de direito pelo tribunal superior, ainda é aplicável o enunciado 343 do STF". (op. cit., p. 496).
DO CASO DOS AUTOS
Pretende a autora na presente ação rescisória, fundada nos incisos V e VIII, do artigo 966, do Código de Processo Civil, a desconstituição do julgado que deu provimento à apelação do INSS para julgar improcedente o pedido de concessão de aposentadoria por idade rural e, em novo julgamento, a concessão do benefício pleiteado.
Requer a autora a rescisão do julgado e novo julgamento com a concessão do benefício outrora pleiteado, ao argumento de que a ela se estende a condição de rural do esposo, que não se afasta em função da existência de vínculo urbano de 9 dias, pois não ultrapassa o período de entressafra de 120 dias, previsto no inciso III, do §10, da Lei 8212/91. Aduz ser de natureza rural a função de tratorista exercida pelo esposo em empresa rural. Indica violação manifesta pelo julgado rescindendo ao inciso III, do §10, da Lei 8212/91 e erro de fato no que se refere à condição de trabalhador rural do marido. e
A decisão impugnada, da lavra do eminente Des. Fed. Newton de Lucca encontra-se vazada nos seguintes termos:
Analisando a decisão monocrática rescindenda, observa-se que o eminente Desembargador Relator entendeu presente o requisito etário e ausente a comprovação do exercício da atividade no campo pela autora.
A autora pretendendo a extensão do início de prova material de labor rural do marido, juntou aos autos subjacentes, dentre vários documentos, cópias da CTPS do esposo.
Ocorre que naquele documento encontram-se registros urbanos nos períodos de 18.08.76 a 26.08.76 e de 01.12.90 a 29.04.03, na função de tratorista (fls. 33/34).
O eminente relator do julgado rescindendo, analisando detidamente os autos, deixou claro que, em virtude dos vínculos urbanos indicados, havia predominância da atividade urbana pelo esposo da autora, colacionando jurisprudência que equiparava a atividade de tratorista com a de motorista.
Ademais, supervenientemente fora concedida aposentadoria por tempo de contribuição urbana ao esposo da autora, corroborando a preponderância da natureza urbana de suas atividades.
Assim, considerando a inexistência de erro na percepção da existência de um fato, não se confundindo o erro com a interpretação dada pelo juiz à prova coligida, além de o objeto de controvérsia ter sido exaustivamente analisado, bem como os documentos a ele pertinentes, restando evidenciado o intuito da autora de reexame nesta ação das provas outrora analisadas no feito subjacente, de rigor a improcedência do pedido de rescisão do julgado com fundamento no inciso VIII, do art. 966, do CPC.
Corolário lógico, inviável o manejo da ação rescisória para o reexame das provas com base nas quais o juízo formou sua convicção em relação aos fatos relevantes e controvertidos do processo.
Outrossim, ausente requisito legal indispensável à concessão do benefício pleiteado, o entendimento exarado pelo eminente relator é consentâneo com o ordenamento jurídico e a jurisprudência pátria.
Também inadmissível a desconstituição do julgado na hipótese vertente com fundamento no inciso V, do art. 966, do CPC, uma vez que a ação rescisória não se confunde com nova instância recursal, exigindo que o posicionamento adotado desborde do razoável, agrida a literalidade ou o propósito da norma, o que não ocorreu no presente caso.
Com efeito, a decisão rescindenda apreciou o conjunto probatório em sua inteireza, concluindo pelo indeferimento do benefício pleiteado, nos estritos termos da legislação pertinente.
DISPOSITIVO
GILBERTO JORDAN
Desembargador Federal
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