
| D.E. Publicado em 24/04/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, julgar improcedente a ação rescisória, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal Relatora
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0050541-37.2008.4.03.0000/SP
RELATÓRIO
Trata-se de ação rescisória ajuizada por Maria Leopoldina Estarapoli Menegussi, com fundamento no artigo 485, incisos V, VII e IX, do Código de Processo Civil de 1973, visando desconstituir acórdão proferido pela 8ª Turma desta Corte que, ao negar provimento à apelação da parte autora, manteve sentença de improcedência de pedido de aposentadoria por idade rural.
Aduz que o julgado rescindendo pronunciou-se em sentido contrário ao determinado nos dispositivos legais, especificamente no que se refere ao enquadramento como rurícola, com a mesma valoração outorgada a documentos idênticos ou semelhantes relacionados de forma exemplificativa no rol do artigo 106 da Lei nº 8.213/1991 e diante do disposto nos artigos 11, inciso VII, 55, § 3º e 143 da mesma Lei. Traz como documentos novos declarações de proprietários rurais, sob alegação de que comprovariam o desempenho das funções rurícolas da autora mesmo após o seu esposo passar a laborar na atividade urbana. Requer a rescisão do julgado e a procedência do pedido em novo julgamento.
Os benefícios da justiça gratuita foram concedidos e a tutela foi indeferida (fls. 294/295).
O INSS ofertou contestação sustentando, preliminarmente, a carência da ação, por ausência de interesse processual, em face da inadequação da via eleita. No mérito, requer a improcedência da presente ação, pois ausentes as hipótese de cabimento da rescisória (fls. 304/314).
Réplica da parte autora (fls. 344/361) reiterando os termos da inicial. Razões finais da autora (fls. 367/383) e pelo INSS às fls. 385/395.
O representante do Ministério Público Federal opinou pela improcedência do pedido (fls. 397/403).
É o relatório.
VOTO
Registro que a presente ação rescisória foi ajuizada sob a égide do Código de Processo Civil de 1973. Impõe-se observar que, publicada a r. decisão rescindenda e interposta a presente ação rescisória em data anterior a 18.03.2016, a partir de quando se torna eficaz o Novo Código de Processo Civil, consoante as conhecidas orientações a respeito do tema adotadas pelos C. Conselho Nacional de Justiça e Superior Tribunal de Justiça, as regras de interposição da presente ação a serem observadas em sua apreciação são aquelas próprias ao CPC/1973. Inteligência do art. 14 do NCPC.
A preliminar de carência de ação confunde-se com o mérito e com ele será analisada.
Pretende a autora a rescisão de acórdão proferido nos autos da ação Ordinária nº 2005.03.99.008994-7, de relatoria da Juíza Federal Convocada Dra. Marcia Hoffmann, sob fundamento de ocorrência violação de lei, de erro de fato, e documento novo, nos termos do artigo 485, incisos V, VII e IX, do CPC/1973.
Dado o caráter excepcional de que se reveste a ação rescisória, para a configuração da hipótese de rescisão em caso de violação a literal dispositivo legal, é certo que o julgado impugnado deve violar, de maneira flagrante, preceito legal de sentido unívoco e incontroverso.
Sobre o tema, anota Theotonio Negrão:
"Art. 485: 20. 'Para que a ação rescisória fundada no art. 485, V, do CPC prospere, é necessário que a interpretação dada pelo 'decisum' rescindendo seja de tal modo aberrante que viole o dispositivo legal em sua literalidade. Se, ao contrário, o acórdão rescindendo elege uma dentre as interpretações cabíveis, ainda que não seja a melhor, a ação rescisória não merece vingar, sob pena de tornar-se recurso ordinário com prazo de interposição de dois anos' (RSTJ 93/416. no mesmo sentido: RT 634/93." (Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor. São Paulo: Saraiva, 44ª edição, 2012, p. 600).
Para que ocorra a rescisão respaldada no inciso IX do art. 485 do CPC/1973, atualizado para o art. 966, inciso VIII, do CPC/2015, deve ser demonstrada a conjugação dos seguintes fatores, a saber: a) o erro de fato deve ser determinante para a sentença; b) sobre o erro de fato suscitado não pode ter havido controvérsia entre as partes; c) sobre o erro de fato não pode ter havido pronunciamento judicial, d) o erro de fato deve ser apurável mediante simples exame das peças do processo originário.
A ação originária foi ajuizada visando a concessão de aposentadoria por idade rural, e a r. sentença julgou improcedente o pedido nos seguintes termos:
"(...) A ação é improcedente.
Os documentos juntados pela autora são cópias de fichas do sindicato rural, onde seu marido, está qualificado como lavrador (fls. 14/15).
Mas, em seu depoimento pessoal, a autora confirmou que seu marido trabalha na prefeitura Municipal de Santa Rita D´Oeste já faz 16 anos.
Assim, demonstrado que o marido da autora exerceu atividade urbana por longo período, ficando descaracterizados os documentos antigos como início de prova material dos fatos constitutivos do direito pleiteado.
Confira-se, a propósito, os seguintes julgados:
(...)
Afastada a prova documental produzida, incide o disposto na Súmula nº 149 do Colendo Superior Tribunal de Justiça.
Nestes termos, não há a comprovação necessária do exercício de atividade rural exigido pelo artigo 48, § 2º, da Lei nº 8.213/91.
(...)"
O julgado rescindendo manteve a improcedência do pedido, pelos fundamentos a seguir:
"(...)
A apelante possui mais de cinqüenta e cinco anos de idade (fls. 13), nascida em 23.01.1948. Completou a idade mínima necessária, na qualidade de rural, em 23.01.2003 e ajuizou a demanda em 11.09.2003.
Nos termos do artigo 142, da supracitada lei, o tempo correspondente à carência é de 132 meses.
Como elementos de prova juntou aos autos: 1) Guia de recolhimento de contribuição sindical, emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Santa Fé do Sul, em nome de seu marido, datado de 01.07.1985 (fls. 14); 2) Carteirinha do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Santa Fé do Sul, emitida em 28.07.1973, bem como recibos de pagamentos de mensalidades, do ano de 1984, em nome do marido da autora (fls. 15/16); 3) Ficha de identificação da Secretaria de Estado de Saúde, datada de 29.04.1998, constando a profissão da autora como lavradora (fls. 17); 4) Escritura Pública de Compra e Venda, constando a aquisição de imóvel rural com 7,26 hectares, pelo pai da autora, em 28.10.1954 (fls.19); 5) Escritura Pública de Compra e Venda, constando a aquisição de imóvel rural, com 14,52 hectares, pelo pai da autora, em 05.10.1966 (fls.20); 6) Matrícula do imóvel acima referido, constando a venda deste no ano de 1979 (fls.21-24); 7) Escritura de Doação com Reserva de Usufruto Vitalício Registro de Escritura constando a doação de imóvel rural, com área total de 25,3665 hectares à autora e seus irmãos, feita por seus pais, em 25.09.1992 (fls.25-27); 8) Certidão de Matrícula do referido imóvel (fls.30-31); 9) Notificação/comprovante de pagamento de Imposto Territorial Rural, em nome do pai da autora, dos anos de 1991/1994/1996 (fls.29).
Cabe destacar a produção de prova oral (fls. 64-66). A primeira testemunha afirma: "Conheci a autora e seu marido quando passaram a morar na cidade de Santa Rita, há 20 anos. O marido da autora está trabalhando na prefeitura, o que já faz muito tempo. A autora continua trabalhando na lavoura como diarista. Trabalhou nas propriedades da testemunha Joaquim para o Zola, onde tiver serviço". No mesmo sentido as demais testemunhas.
Vale ressaltar, ademais, o depoimento pessoal da autora que afirma: "Moro com o meu marido, Carlos Menegussi. Ele é funcionário público municipal da Prefeitura de Santa Rita já faz aproximadamente 16 anos. Atualmente, ele continua trabalhando na prefeitura. Temos uma propriedade rural no Córrego do Cascavel, no município de Aspásia. O sítio tem 10 alqueires, onde moram meus pais e um irmão meu. Antes, existia lavoura de café. Atualmente pasto e cereais. Trabalhei nesse sítio até 20 anos atrás, quando mudei para a cidade de Santa Rita. Eu continuei trabalhando na lavoura como 'volante', diarista. Eu trabalhei para Diorando, na lavoura de café, para o José Sato, em lavoura de café e cereais, e para o Zola, para o Sr. Joaquim".
Conforme afirmação da própria autora, das testemunhas e do INSS, que juntou em contestação extrato retirado do CNIS - Cadastro Nacional de Informações Sociais (fls. 57-61), a partir do ano de 1988, o marido da autora exerceu apenas trabalho urbano na Prefeitura Municipal de Santa Rita D'Oeste.
Desta forma nenhuma prova nos autos demonstra que o marido da autora exerceu atividade rural após 1988. Nesse contexto, não há como se pugnar pela extensão da qualificação do marido para concessão do benefício de aposentadoria por idade rural à autora, sendo de rigor o indeferimento do benefício.
Posto isto, nego provimento à apelação da autora.
É o voto."
Verifica-se das transcrições acima que, tanto a r. sentença como o v. acórdão analisaram as provas trazidas aos autos, mencionando-as expressamente, todavia consideraram-nas insuficientes a comprovar o período necessário à concessão do benefício.
Na ação originária os documentos trazidos foram os seguintes:
- Guia de recolhimento de contribuição sindical ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Santa Fé do Sul, em nome de Carlos Menegussi (marido da autora), datado de julho/1985 (fl. 58);
- Carteira de Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Santa Fé do Sul, em nome de Carlos Menegussi, do ano de 1973 e recibos de pagamento de 1984 (fls. 59/60);
- Ficha de Secretaria do Estado da Saúde em nome da autora, preenchida (a mão) em 29/04/1988 como ocupação lavradora (fl. 61);
- Escrituras Públicas de Compra e Venda, constando a aquisição de imóvel rural, em que consta o pai da autora (Jacomo Starapoli) como adquirente (28/10/1954 e 17/11/1966);
- Escritura de doação de reserva de usufruto vitalício para a autora e seus irmãos (marido da autora qualificado como motorista) em 25/09/1992;
- Notificações de IPTU de 1991, 1994 e 1996;
- Matrícula do imóvel rural constando como adquirente Jacomo Starapoli (Fazenda Ponte Pensa) em 21/06/1978.
As testemunhas apresentaram os depoimentos em audiência realizada em 06/04/2004:
ANTONIO LOPES PRETEL - "Conheci a autora e seu marido quando passaram a morar na cidade de Santa Rita, há 20 anos. O marido da autora está trabalhando na prefeitura, o que já faz muito tempo. A autora continuou trabalhando na lavoura como diarista. Trabalhou nas propriedades da testemunha Joaquim para o Zola, onde tiver serviço."
JOAQUIM DO NASCIMENTO COSTA - "Conheci a autora e seu marido quando passaram a morar na cidade de Santa Rita, há 20 anos. Eles trabalhavam na lavoura. O marido da autora está trabalhando na prefeitura, o qu já faz aproximadamente 18 anos. A autora continuou trabalhando na lavoura como diarista. Por várias vezes, trabalhou no meu sítio e no do meu irmão, colhendo algodão e arrancando feijão. Trabalhou também para outros sitiantes, para o Zola, para o Doca."
Tendo a autora nascido em 23/01/1948, completou a idade em 23/01/2003 (fl. 57), nos termos do artigo 48, § 1º, da Lei n.º 8.213/91, sendo necessário 132 meses de carência. Segundo extrato do CNIS - Cadastro Nacional de Informações Sociais, o marido da autora exerce atividade na Prefeitura de Santa Rita D'Oeste desde 02/01/1988 (fl. 102).
Ora, sem adentrar no mérito do acerto ou desacerto da tese firmada no aresto rescindendo, certo é que tal entendimento representa um entre tantos outros possíveis. Com efeito, concluiu-se, à luz dos elementos até então constantes dos autos, não cumpridos os requisitos à concessão da aposentadoria por idade rural postulada, pois o exercício de atividade urbana do marido desde 1988 impediria a extensão dos seus documentos na qualidade de rurícola à autora.
A admissão de documento em nome do marido ou companheiro, extensível à mulher, dá-se em consideração ao exercício da atividade que se presume ser comum ao casal. Se o marido deixou a lida rural em 1988 (fl. 102), não se pode afirmar que a mulher continuou exercendo atividade rural nesse regime até o implemento idade, em 2003. Por outro lado, se a autora passou a exercer a atividade rural independente, há necessidade de que traga para os autos início de prova material dessa condição após o início da atividade urbana de seu marido, o que não é o caso dos autos. Os documentos em nome do pai da autora, detentor de imóvel rural, não se prestam a esse desiderato, pois não demonstram o efetivo exercício de atividade rural e sendo a autora casada, possui núcleo familiar próprio. A propósito, recente julgado dessa 3ª Seção:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE DE TRABALHADOR RURAL. AÇÃO RESCISÓRIA. ART. 485, VII e IX, DO CPC/1973. DOCUMENTO NOVO. INAPTIDÃO, DE PER SI, A ASSEGURAR PRONUNCIAMENTO FAVORÁVEL AO REQUERENTE. ERRO DE FATO NÃO CONFIGURADO.
- No que diz respeito à rescisão do julgado, fundada no art. 485, VII, do CPC/1973, além da precedência do documento dito novo à decisão rescindenda e de sua aptidão, de per si, a assegurar pronunciamento favorável ao requerente, imperiosa a comprovação, por parte do autor da rescisória, de empeço à sua utilização no momento procedimentalmente adequado, vale dizer, no transcurso da ação originária.
- Tratando-se de trabalhador rural, sua condição social autoriza a relativização do conceito de documento novo. Paradigma da Terceira Seção desta C. Corte.
- Na busca da rescisão do decisum impugnado, a vindicante carreou aos autos documentos que não se mostram bastante à reversão do julgado guerreado.
- Recolhimentos pertinentes ao ITR e memorial descritivo de imóvel rural, por si sós, não têm aptidão bastante a funcionar como princípios de prova documental, por apenas denotarem que a autoria possui propriedade rural, sendo insuficientes e frágeis a correlacioná-la ao efetivo desempenho do mister campal.
- Da certidão de óbito do genitor da postulante, qualificado como "lavrador aposentado", não decorre a condição de rurícola da promovente, na medida em que ela teria se casado antes do falecimento do pai e formado, assim, núcleo familiar próprio, passando a residir em local diverso deste.
- Perfaz-se a hipótese de erro de fato quando o decisório impugnado haja admitido fato inexistente, ou considerado inexistente fato efetivamente ocorrido, sendo de mister, em qualquer das hipóteses, a ausência de controvérsia e/ou pronunciamento específico a respeito da apontada erronia, e ainda, que o indicado equívoco haja sido resoluto à sorte confiada à demanda.
- In casu, vislumbra-se que a decisão combatida não padece de tal atecnia e, bem por isso, não se sujeita à rescindibilidade.
- A via rescisória não se erige em sucedâneo recursal, nem tampouco se vocaciona à mera substituição de interpretações judiciais ou ao reexame do conjunto probatório, à cata da prolação de provimento jurisdicional favorável à sua autoria.
- Na forma de precedentes da Terceira Seção, condeno a parte autora em honorários advocatícios, à base de R$ 1.000,00.
- Pedido de rescisão julgado improcedente.
(AR 2014.03.00.013251-0, Relatora Des. Fed. Ana Pezarini, v.u., j. em 22/02/2017, D.E. 06/03/2018)
A Ficha de Secretaria do Estado de Saúde em consta a profissão da autora como lavradora trata-se de declaração unilateral sem nenhum cunho oficial a lhe conferir a credibilidade necessária à configuração do início razoável de prova material.
Oportuno, ainda, lembrar que a ação rescisória não se presta ao debate acerca da justiça ou injustiça da orientação perfilhada pelo julgado rescindendo, conforme a remansosa jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
"AÇÃO RESCISÓRIA. COMPETÊNCIA DO SUPERIOR TRIBINAL DE JUSTIÇA. USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO. POSSE EXERCIDA COM 'ANIMUS DOMINI'. INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO AQUISITIVA.
(...)
- A ação rescisória não é o remédio próprio para retificar a má apreciação da prova ou reparar a eventual injustiça na decisão. Ação julgada improcedente." (Ação Rescisória nº 386 - SP, 2ª Seção, Relator Ministro Barros Monteiro, unânime, DJU de 04.2.2002).
O mesmo se aplica à pretensão de mero reexame de teses já debatidas no feito subjacente, devendo o pedido rescindente referir-se a ofensa à própria literalidade da disposição que se tem por malferida.
Por oportuno, trago à colação o seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça:
"AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO. DISPOSIÇÃO. LEI. INEXISTÊNCIA. PRETENSÃO. REEXAME. PROVA. IMPOSSIBILIDADE.
1. Não importa em infringência de disposição de lei o acórdão que, em sede de recurso especial, decide a controvérsia com base em interpretação cabível de texto legal, pressupondo, o cabimento da ação rescisória fundada no art. 485, V, do CPC, que represente violação de sua literalidade, hipótese não caracterizada na espécie.
2. O reexame do conjunto fático-probatório é impróprio à via rescisória, objetivando corrigir erro de legalidade, dada a sua natureza excepcional. Precedentes.
3. Pedido julgado improcedente."
(STJ, Ação Rescisória nº 2.994 / SP, 3ª Seção, Relator Ministro Fernando Gonçalves, maioria, DJU de 20.3.2006).
Da mesma forma, para se desconstituir a coisa julgada com fundamento em erro de fato é necessária a verificação de sua efetiva ocorrência, no conceito estabelecido pelo próprio legislador.
É certo que, no feito subjacente, a tese apresentada pela parte autora alegando que mesmo após seu esposo passar a laborar em atividade urbana, continuou a desempenhar suas funções rurícolas, já foi apresentada em sede de apelação e apreciada pelo julgado rescindendo, conforme se depreende do trecho da peça recursal que ora transcrevo:
"(...)
Em relação ao documento anexado às fls. 57/61 dos autos, documentos dos quais demonstram que o marido da recorrente também exerceu atividade urbana, na condição de pedreiro, bem como trabalhando junto a Prefeitura Municipal de Santa Rita D'Oeste, em nada altera a condição de lavradora da recorrente, em razão de que o esposo da mesma mesmo antes de ingressar em atividade urbana também exerceu atividade rural.
Por outro lado, mesmo que o esposo da recorrente, tivesse laborado efetivamente em atividade urbana, não afeta a pessoa da recorrente, a qual continuou a trabalhar em atividade rural.
Assim sendo, não houve, portanto, qualquer alteração na prestação de serviços da família, sendo que o simples fato de o esposo da recorrente passar a laborar em outra atividade, efetivamente não alterou a realidade fática, da qual se deflui que a família sempre laborou de forma conjunta englobando, inclusive os filhos.
(...)"
No tocante ao documento novo, para fins de rescisão do julgado com fundamento no artigo 485, inciso VII, do Código de Processo Civil, é necessário que ele já exista quando da prolação da sentença, mas sua existência era ignorada pelo autor da ação rescisória, ou que dele não pôde fazer uso. O documento deve ser de tal ordem que, por si só, seja capaz de alterar o resultado da decisão rescindenda e assegurar pronunciamento favorável.
Imprescindível, ainda, a inexistência de desídia ou negligência da parte na não utilização de documento preexistente, por ocasião da demanda originária.
Nas palavras do eminente processualista Vicente Grecco Filho: "O documento novo não quer dizer produzido após a sentença, mas documento até então desconhecido ou de utilização impossível. A impossibilidade de utilização deve ser causada por circunstâncias alheias à vontade do autor da rescisória. A negligência não justifica o seu não-uso na ação anterior. Aliás, esta última situação é de ocorrência comum. A parte (ou o advogado) negligencia na pesquisa de documentos, que muitas vezes estão à sua disposição em repartições públicas ou cartórios. Essa omissão não propicia a rescisão, mesmo que a culpa seja do advogado e não da parte. A esta cabe ação de perdas e danos, eventualmente. Como no inciso anterior, o documento novo deve ser suficiente para alterar o julgamento, ao menos em parte, senão a sentença se mantém." (Direito Processual Civil Brasileiro. 2º v., São Paulo: Saraiva, 1996, p. 426).
No caso dos autos, a parte autora aponta, como documentos novos, declarações dos proprietários rurais, que deveriam demonstrar que mesmo após o seu marido passar a laborar na atividade urbana, continuou a desempenhar suas funções rurícolas (fls. 284/286). Transcrevo (nomes estão ilegíveis):
"Alexandre Sauriz... , brasileiro, portador do RG nº 4795982, CPF nº 474.533.548-20, residente e domiciliado junto ao estância A-7 estrada 54 DECLARA para os devidos fins de direito e sob as penas da lei que a Sra. MARIA LEOPOLDINA ESTAROPOLI MENEGUSSI, brasileira, casada, trabalhadora rural, portadora da carteira de identidade sob nº 25.161.216-8 e CPF nº 102.860.868-32, residente e domiciliada junto à Rua Avelino Fantin, nº 615, laborou em minha propriedade rural na função de diarista em atividade rural.
Por ser expressão da verdade, dato e assino a presente."
"... Domingos ... , brasileiro, portador do RG nº 5413471, CPF nº 141929268-49, residente e domiciliado junto ao Sítio Alegre Cargo da Maria Estrada DECLARA para os devidos fins de direito e sob as penas da lei que a Sra. MARIA LEOPOLDINA ESTAROPOLI MENEGUSSI, brasileira, casada, trabalhadora rural, portadora da carteira de identidade sob nº 25.161.216-8 e CPF nº 102.860.868-32, residente e domiciliada junto à Rua Avelino Fantin, nº 615, laborou em minha propriedade rural na função de diarista em atividade rural.
Por ser expressão da verdade, dato e assino a presente."
Contudo, considerando que tais documentos são datados de 26/11/2008 e houve o trânsito em julgado em 2007 não constitui "documentação nova", na acepção jurídica do termo. Da mesma forma não teriam o condão de alterar o resultado do julgamento, uma vez que declarações de particulares não têm eficácia de prova material, porquanto não contemporânea à época dos fatos declarados, nem foi extraída de assento ou de registro preexistentes. Na verdade, elas não mencionam nem ao menos os períodos trabalhados e nem teriam eficácia de prova testemunhal, uma vez que não foram colhidas sob o crivo do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, servindo tão-somente para comprovar que houve declaração, mas não o fato declarado, conforme dispõe o artigo 408, parágrafo único, do novo Código de Processo Civil.
Dessa forma, não reconheço a existência de violação à disposição literal de lei ou erro de fato no julgado, nem a hipótese prevista de documento novo, uma vez que houve apreciação do conjunto probatório, o qual foi valorado pelo Juízo originário segundo seu livre convencimento, de forma motivada e razoável, tendo sido adotado uma solução jurídica, dentre outras, admissível.
Ressalto, inclusive, que o entendimento adotado no julgado rescindendo se alinha com a tese posteriormente firmada no REsp 1.304.479/SP, submetido ao procedimento dos recursos repetitivos, cuja questão submetida a julgamento foi a repercussão de atividade urbana do cônjuge na pretensão de configuração jurídica de trabalhador rural previsto no art. 143 da Lei nº 8.213/91, tendo sido firmada a seguinte tese: "Em exceção à regra geral (...), a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana" (Tema Repetitivo nº 533. STJ. REsp 1.304.479/SP. Relator Min. Herman Benjamin. Data de afetação 21/03/2012. Julgado em 10/10/2012. Acórdão publicado em 19/12/2012. Trânsito em julgado em 05/03/2013).
Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO formulado na presente ação rescisória, nos termos da fundamentação acima.
Condeno a parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios, que arbitro em 10% sobre o valor da causa, nos termos do § 2º do art. 85 do Novo Código de Processo Civil/2015, observando-se a suspensão de exigibilidade prevista no § 3º do art. 98 do mesmo diploma legal.
É o voto.
LUCIA URSAIA
Desembargadora Federal
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