
3ª Seção
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5016439-73.2023.4.03.0000
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
REU: CLEIDE MARIA ARAUJO DA SILVA
Advogado do(a) REU: EUNICE PEREIRA DA SILVA MAIA - SP67538-N
OUTROS PARTICIPANTES:
3ª Seção
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5016439-73.2023.4.03.0000
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
REU: CLEIDE MARIA ARAUJO DA SILVA
Advogado do(a) REU: EUNICE PEREIRA DA SILVA MAIA - SP67538-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL GILBERTO JORDAN (Relator). Trata-se de ação rescisória, com pedido de tutela provisória, ajuizada em 18.6.2023, pelo INSS em face de CLEIDE MARIA ARAUJO DA SILVA, com fulcro no art. 966, incisos V e VIII, do Código de Processo Civil, objetivando a desconstituição parcial do acórdão proferido pela E. Décima Turma desta Corte na apelação n. 6083939-57.2019.4.03.9999 (autos de origem nº 1002255-77.2018.8.26.0358), que teve curso perante a 1ª Vara Cível da Comarca de Mirassol/SP, que julgou procedente o pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição. Valorada a causa em R$ 1.000,00.
Alegou o INSS que “o v. acórdão, ao condenar a autarquia a conceder o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral, a contar de 04.10.2019, viola normas jurídicas, incidindo em erro de fato, pois, ainda que considerado o período de atividade especial judicialmente reconhecido, a ora Ré não atinge o tempo mínimo legalmente necessário à concessão do benefício, razão pela qual o ente público ajuíza a presente demanda, visando a desconstituição parcial do julgado, em relação ao capítulo que determina a concessão do benefício com base no disposto no artigo 966, incisos V e VIII e parágrafo 1º, do Código de Processo Civil, proferindo-se nova decisão, julgando improcedente o pedido.”
Requereu o autor a concessão de tutela antecipada para suspender o cumprimento de sentença até final julgamento do presente processo.
Fora reconhecida a tempestividade da ação, dispensado o depósito prévio, determinada a citação e deferida, em parte, a tutela de urgência para suspender a execução do julgado no que se refere aos valores atrasados até o julgamento final deste feito (ID-275787828).
O INSS interpôs agravo interno contra a decisão em epígrafe pleiteando sua reforma para se determinar também a suspensão do pagamento do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição implantado (ID-276848213).
Devidamente citada, a ré apresentou contestação de fls. 484/494, em que requereu a improcedência do pedido porque “tanto o juiz de primeira instancia como os Desembargadores em segunda instancia entenderam que a requerida faz jus ao fator de conversão de 1.4 e insalubridade no grau máximo pelas execuções dos serviços descritos nos PPP's e em 40% de insalubridade (ID-277460357).
Foi mantida a decisão agravada por seus próprios fundamentos e indicado que o julgamento do recurso de agravo se dará oportunamente perante o Órgão colegiado (ID-278608904).
Em manifestação sobre a contestação, o INSS requereu o julgamento antecipado da lide.
Saneado o feito, em alegações finais, o INSS reiterou os termos da inicial.
O Ministério Público Federal manifestou-se pelo prosseguimento do feito.
É o relatório.
Peço dia para julgamento.
KS
3ª Seção
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5016439-73.2023.4.03.0000
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
REU: CLEIDE MARIA ARAUJO DA SILVA
Advogado do(a) REU: EUNICE PEREIRA DA SILVA MAIA - SP67538-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL GILBERTO JORDAN (Relator). Trata-se de ação rescisória, com pedido de tutela provisória, ajuizada em 18.6.2023, pelo INSS contra CLEIDE MARIA ARAUJO DA SILVA, com fulcro no art. 966, incisos V e VIII, do Código de Processo Civil, objetivando a desconstituição parcial do acórdão proferido pela E. Décima Turma desta Corte na apelação nº 6083939-57.2019.4.03.9999 (autos de origem nº 1002255-77.2018.8.26.0358, que teve curso pela 1ª Vara Cível da Comarca de Mirassol, que julgou procedente o pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
ADMISSIBILIDADE
Competente esta Eg. Corte para o processamento e julgamento da ação, partes legítimas e bem representadas.
Tempestiva a ação, pois ajuizada no prazo decadencial legal, uma vez que o trânsito em julgado nos autos subjacentes ocorreu em 31.08.2021 e ação rescisória foi ajuizada em 18.06.2023.
Presentes os pressupostos processuais e inexigível o depósito previsto no inciso II, do artigo 968, do Código de Processo Civil, nos termos do artigo 968, § 1º, do Código de Processo Civil de 2015, combinado com o disposto no artigo 8º da Lei n.º 8.620/93 e da Súmula 175 do STJ.
HIPÓTESES DE RESCINDIBILIDADE
O artigo 966 do Código de Processo Civil atual prevê, de modo taxativo, as hipóteses de cabimento da ação rescisória, conforme abaixo transcrito, in verbis:
“Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
I - se verificar que foi proferida por força de prevaricação, concussão ou corrupção do juiz;
II - for proferida por juiz impedido ou por juízo absolutamente incompetente;
III - resultar de dolo ou coação da parte vencedora em detrimento da parte vencida ou, ainda, de simulação ou colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei;
IV - ofender a coisa julgada;
V - violar manifestamente norma jurídica;
VI - for fundada em prova cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou venha a ser demonstrada na própria ação rescisória;
VII - obtiver o autor, posteriormente ao trânsito em julgado, prova nova cuja existência ignorava ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável;
VIII - for fundada em erro de fato verificável do exame dos autos.
§ 1º Há erro de fato quando a decisão rescindenda admitir fato inexistente ou quando considerar inexistente fato efetivamente ocorrido, sendo indispensável, em ambos os casos, que o fato não represente ponto controvertido sobre o qual o juiz deveria ter se pronunciado.
§ 2º Nas hipóteses previstas nos incisos do caput , será rescindível a decisão transitada em julgado que, embora não seja de mérito, impeça:
I - nova propositura da demanda; ou
II - admissibilidade do recurso correspondente.
§ 3º A ação rescisória pode ter por objeto apenas 1 (um) capítulo da decisão.
§ 4º Os atos de disposição de direitos, praticados pelas partes ou por outros participantes do processo e homologados pelo juízo, bem como os atos homologatórios praticados no curso da execução, estão sujeitos à anulação, nos termos da lei.
§ 5º Cabe ação rescisória, com fundamento no inciso V do caput deste artigo, contra decisão baseada em enunciado de súmula ou acórdão proferido em julgamento de casos repetitivos que não tenha considerado a existência de distinção entre a questão discutida no processo e o padrão decisório que lhe deu fundamento. (Incluído pela Lei nº 13.256, de 2016) (Vigência)
§ 6º Quando a ação rescisória fundar-se na hipótese do § 5º deste artigo, caberá ao autor, sob pena de inépcia, demonstrar, fundamentadamente, tratar-se de situação particularizada por hipótese fática distinta ou de questão jurídica não examinada, a impor outra solução jurídica.”
As hipóteses acima listadas têm por escopo a correção de defeitos processuais e decisões desarrazoadas.
De se ressaltar que cada fundamento previsto no art. 966, do CPC corresponde a uma causa de pedir para o juízo rescindente, ao qual fica adstrito o Tribunal (arts. 141 e 492, do CPC), sendo certo que para o juízo rescisório, a causa de pedir deverá ser a mesma da ação originária.
JUÍZO RESCINDENTE E RESCISÓRIO
Para julgamento da ação rescisória, mister proceder o tribunal inicialmente ao juízo de admissibilidade da ação.
Ao depois, compete à Corte o juízo de mérito quanto ao pedido de rescisão do julgado, chamado de juízo rescindente ou iudicium rescindens.
Sendo o caso e havendo pedido de novo julgamento e desde que acolhido o pedido de rescisão do julgado, o Tribunal procederá ao rejulgamento do feito por meio do juízo rescisório ou iudicium rescissorium.
Sobre o tema, confira-se o ensinamento de Fredie Didier Jr.:
"O exercício do juízo 'rescissorium', como se percebe, depende do prévio acolhimento do juízo 'rescindens'. O iudicium rescindens é preliminar ao iudicium rescissorium. Mas nem sempre há juízo rescisório, conforme visto. Por isso, o art. 968, I, CPC, prescreve que o autor cumulará o pedido de rejulgamento 'se for o caso'; Por isso, também, o art. 974 determina apenas se for o caso o tribunal procederá a novo julgamento, caso rescinda a decisão.
(...)
Desconstituída a decisão, com o acolhimento do pedido de rescisão, passa, se for o caso, o tribunal ao exame do juízo rescissorium, procedendo a um novo julgamento da causa, para julgar procedente ou improcedente o pedido formulado na causa originária e renovado na petição inicial da ação rescisória. "Percebe-se, então, que a vitória no juízo rescindente não é, em regra, garantia de vitória no juízo rescisório - e é por isso que o primeiro é preliminar ao segundo." (in: Curso de Direito Processual Civil, v.3, 13ª ed., 2016, p. 520).
ERRO DE FATO
A teor do §1º, do inciso VIII, do art. 966, do CPC, "há erro de fato quando a decisão rescindenda admitir fato inexistente ou quando considerar inexistente fato efetivamente ocorrido, sendo indispensável, em ambos os casos, que o fato não represente ponto controvertido sobre o qual o juiz deveria ter se pronunciado". (g.n.)
Para a rescisão do julgado em razão do erro de fato, mister que o erro tenha sido a causa da conclusão da sentença, seja verificável pelo simples exame dos documentos e peças dos autos e não haja controvérsia sobre o fato.
A inexistência de controvérsia dá-se em casos em que o fato, que poderia ser conhecido de ofício, não é alegado; e quando admitido; não é impugnado.
Confira-se a doutrina sobre o tema:
"IX:28. Erro de fato. 'Para que o erro de fato legitime a propositura da ação rescisória, é preciso que tenha influído decisivamente no julgamento rescindendo. Em outras palavras: é preciso que a sentença seja efeito do erro de fato; que haja entre aquela e este um nexo de causalidade ' (Sydney Sanches, RT 501/25). Devem estar presentes os seguintes requisitos para que se possa rescindir sentença por erro de fato: a) a sentença deve estar baseada no erro de fato; b) sobre ele não pode ter havido controvérsia entre as partes; c) sobre ele não pode ter havido pronunciamento judicial; d) que seja aferível pelo exame das provas já constantes dos autos da ação matriz, sendo inadmissível a produção, na rescisória, de nova provas para demonstrá-lo."
(Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, in Código de Processo Civil Comentado: leg. extravagante, 8ª ed., 2004, p. 912)
O erro de fato, portanto, é o erro de apreciação da prova trazida aos autos, com a falsa percepção dos fatos, dele decorrendo o reconhecimento pelo julgador de um fato inexistente ou da inexistência de um fato existente, não se confundindo com a interpretação dada pelo juiz à prova coligida nos autos subjacentes.
Corolário lógico, inviável o manejo da ação rescisória para o reexame das provas com base nas quais o juízo formou sua convicção em relação aos fatos relevantes e controvertidos do processo.
A propósito, de se trazer à colação julgado representativo de controvérsia sobre o erro de fato em ação rescisória:
"PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. ERRO DE FATO. ART. 485, IX, DO CPC. INOCORRÊNCIA. TRIBUTO SUJEITO LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. DENÚNCIA ESPONTÂNEA. PARCELAMENTO. TRIBUTO PAGO A DESTEMPO. MATÉRIA SUBMETIDA AO REGIME DE RECURSOS REPETITIVOS. ART.543-C, DO CPC. VIOLAÇÃO AO ART. 535, DO CPC. INOCORRÊNCIA.
1. A rescindibilidade advinda do erro de fato decorre da má percepção da situação fática resultante de atos ou documentos da causa dos quais o magistrado não se valeu para o julgamento, a despeito de existentes nos autos.
2. Assim, há erro de fato quando o juiz, desconhecendo a novação acostado aos autos, condena o réu no quantum originário. "O erro de fato supõe fato suscitado e não resolvido", porque o fato "não alegado" fica superado pela eficácia preclusiva do julgado - tantum iudicatum quantum disputatum debeat (artigo 474, do CPC). Em conseqüência, "o erro que justifica a rescisória é aquele decorrente da desatenção do julgador quanto à prova, não o decorrente do acerto ou desacerto do julgado em decorrência da apreciação dela" porquanto a má valoração da prova encerra injustiça, irreparável pela via rescisória.
3. A interpretação autêntica inserta nos §§ 1º e 2º dissipa qualquer dúvida, ao preceituar que há erro quando a sentença admitir um fato inexistente, ou quando considerar inexistente um fato efetivamente ocorrido, sendo indispensável, num como noutro caso, que não tenha havido controvérsia, nem pronunciamento judicial sobre o fato.
4. Doutrina abalizada elucida que: "Devem estar presentes os seguintes requisitos para que se possa rescindir sentença por erro de fato: a) a sentença deve estar baseada no erro de fato; b) sobre ele não pode ter havido controvérsia entre as partes; c) sobre ele não pode ter havido pronunciamento judicial; d) que seja aferível pelo exame das provas já constantes dos autos da ação matriz, sendo inadmissível a produção, na rescisória, de novas provas para demonstrá-lo." (Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, in Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante, 9ª ed., Ed. Revista dos Tribunais, 2006, pág. 681); e "Quatro pressupostos hão de concorrer para que o erro de fato dê causa à rescindibilidade: a) que a sentença nele seja fundada, isto é, que sem ele a conclusão do juiz houvesse de ser diferente; b) que o erro seja apurável mediante o simples exame dos documentos e mais peças dos autos, não se admitindo de modo algum, na rescisória, a produção de quaisquer outras provas tendentes a demonstrar que não existia o fato admitido pelo juiz, ou que ocorrera o fato por ele considerado inexistente; c) que 'não tenha havido controvérsia' sobre o fato (§ 2º); d) que sobre ele tampouco tenha havido 'pronunciamento judicial' (§ 2º)." (José Carlos Barbosa Moreira, in Comentários ao Código de Processo Civil, Volume V - Arts. 476 a 565, 11ª ed., Ed. Forense, págs. 148/149).
5. A insurgência especial funda-se na assertiva de que violado o artigo 485, IX, do CPC, haja vista que o v. acórdão rescindendo fundou-se em equivocada captação de elementos da causa, na medida em que pressupôs que a lide versava apenas sobre denúncia espontânea através de parcelamento, quando na realidade versava também sobre pagamentos efetuados em atraso e de forma integral.
6. O esgotamento do debate realizado no curso da ação ordinária acerca de suposto erro de fato na abordagem da causa de pedir inviabiliza o manuseio da ação rescisória fundada no inciso IX do artigo 485 do CPC.
7. A aferição acerca da conjuração do erro de fato pela instância a quo é interditada pela Súmula n.º 07/STJ.
8. É pressuposto para o cabimento da ação rescisória por erro de fato que sobre ele não tenha havido controvérsia ou pronunciamento judicial no processo anterior. Precedentes da Corte: AR 834/RN, DJ 18/10/2004; AR 464/RJ, DJ 19/12/2003; AR 679/DF, DJ 22/04/2002.
9. Não se presta a ação rescisória, ajuizada com base em erro de fato (art. 485, IX, do CPC), à reavaliação das provas dos autos.
10. O tribunal originário se manifestou nos termos que vem sendo decidido nesta Corte Superior, no sentido de não configurar denúncia espontânea o tributo declarado, mas pago a destempo, bem como os tributos pagos parceladamente. Precedentes: REsp 962379/RS, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe 28/10/2008; REsp 1102577/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/04/2009, DJe 18/05/2009, recursos submetidos ao regime de repetitivos, art. 543-C, do CPC.
11. Os embargos de declaração que enfrentam explicitamente a questão embargada não ensejam recurso especial pela violação do artigo 535, II, do CPC, sendo certo que o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.
12. A matéria foi devidamente tratada e esgotada em todos os fundamentos no âmbito do recurso de apelação. Não obstante, a recorrente opôs seguidamente dois embargos de declaração, com fundamentos idênticos que os caracterizaram como manifestamente protelatórios, passível de ensejar a multa de 1% (um por cento) sobre o valor da causa, nos termos do art. 538, § único, do CPC.
13. Recurso especial parcialmente conhecido e desprovido." (g.n.)
(REsp 1065913/CE, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/08/2009, DJe 10/09/2009)
MANIFESTA VIOLAÇÃO À NORMA JURÍDICA
Para correção de error in procedendo ou in judicando ou decisão contra precedente obrigatório, a ação rescisória proposta com fundamento em violação de norma jurídica deve indicar a norma ou o precedente violado.
As decisões judiciais devem, por meio de interpretação teleológica, escorar-se no ordenamento jurídico e atender aos fins sociais, exigindo-se a devida fundamentação e observação dos precedentes jurisprudenciais sobre a matéria.
Conforme preleciona Fredie Didier "quando se diz que uma norma foi violada, o que se violou foi a interpretação dada à fonte do direito utilizada no caso." (op. cit., p. 492).
A expressão norma jurídica refere-se a princípios, à lei, à Constituição, a normas infralegais, a negócios jurídicos e precedentes judiciais.
O inciso V, do art. 966, do Código de Processo Civil prevê o cabimento de ação rescisória quando houver violação evidente, ou seja, demonstrada com prova pré-constituída juntada pelo autor, de norma jurídica geral, ou seja, lei em sentido amplo, processual ou material. A violação a normas jurídicas individuais não admite a ação rescisória, cabendo, eventualmente e antes do trânsito em julgado, reclamação.
Nesse sentido, é o comentário ao art. 485, do CPC/73 de Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery citando Pontes de Miranda e Barbosa Moreira: "Lei aqui tem sentido amplo, seja de caráter material ou processual, em qualquer nível (federal, estadual, municipal e distrital), abrangendo a CF, MedProv., DLeg, etc". (Código de Processo Civil Comentado: legislação Extravagante, 10ª ed., 2008).
Com efeito, a interpretação dada pelo pronunciamento rescindendo deve ser desarrazoado de tal modo que viole a norma jurídica em sua literalidade. Contudo, se a decisão rescindenda eleger uma dentre as interpretações cabíveis, ainda que não seja a melhor, não é caso de ação rescisória, sob pena de desvirtuar sua natureza, dando-lhe contorno de recurso. Nesse sentido, é a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça. (Theotonio Negrão, in Código de Processo Civil e Legislação Processual em vigor, 41ª ed., nota 20 ao art. 485, V, CPC).
Ainda, quanto à rescisão do julgado com fundamento no inciso V, do art. 966, do CPC, ensina Fredie Didier Jr:
"Se a alegação de violação puder ser comprovada pela prova juntada aos autos com a petição inicial, cabe a ação rescisória com base no inciso V, do art. 966; se houver necessidade de dilação probatória, então essa rescisória é inadmissível. A manifesta violação a qualquer norma jurídica possibilita o ingresso da ação rescisória, com vistas a desconstituir a decisão transitada em julgado. A norma manifestamente violada pode ser uma regra ou um princípio.
Se a decisão rescindenda tiver conferido uma interpretação sem qualquer razoabilidade ao texto normativo, haverá manifesta violação à norma jurídica. Também há manifesta violação à norma jurídica quando se conferir uma interpretação incoerente e sem integridade com o ordenamento jurídico. Se a decisão tratou o caso de modo desigual a casos semelhantes, sem haver ou ser demonstrada qualquer distinção, haverá manifesta violação à norma jurídica. É preciso que a interpretação conferida pela decisão seja coerente. Já se viu que texto e norma não se confundem, mas o texto ou enunciado normativo tem uma importante função de servir de limite mínimo, a partir do qual se constrói a norma jurídica. Se a decisão atenta contra esse limite mínimo, sendo proferida contra legem, desatendendo o próprio texto, sem qualquer razoabilidade, haverá também 'manifesta violação' à norma jurídica." (g.n., op. cit., p. 495).
E ainda:
"Cabe ação rescisória, nos termos do inciso V do art. 966 do CPC, contra decisão baseada em enunciado de súmula ou acórdão de julgamento de casos repetitivos, que não tenha considerado a existência e distinção entre questão discutida no processo e o padrão decisório que lhe deu fundamento (art. 966, §5º, CPC). A regra aplica-se, por extensão, à decisão baseada em acórdão de assunção de competência, que também não tenha observado a existência de distinção.
Nesse caso, cabe ao autor da ação rescisória demostrar, sob pena de inépcia e consequente indeferimento da petição inicial, fundamentadamente, que se trata de situação particularizada por hipótese fática distinta ou questão jurídica não examinada, a exigir a adoção de outra solução jurídica (art. 966, §6º, CPC)."
SÚMULA N. 343, DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
O enunciado da Súmula em epígrafe encontra-se vazado nos seguintes termos: "não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais".
Sobre a incidência da Súmula, ensina Fredie Didier Jr. que "Enquanto se mantém a divergência sem que haja a definição da questão de direito pelo tribunal superior, ainda é aplicável o enunciado 343 do STF". (op. cit., p. 496).
Frise-se que não incide o enunciado da Súmula nº 343 do C. STF, quando a matéria objeto de rescisão tenha sido controvertida nos tribunais, todavia, quando da prolação da decisão rescindenda, já havia decisão sedimentada pelos tribunais superiores.
De outra parte, o STF, inicialmente, posicionou-se no sentido de que se a matéria ventilada em ação rescisória fosse circunspecta à ordem constitucional, seria de se afastar o impedimento à ação, conforme julgado de 2008. Confira-se:
“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO RESCISÓRIA. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 343.
2. Inaplicabilidade da Súmula 343 em matéria constitucional, sob pena de infringência à força normativa da Constituição e ao princípio da máxima efetividade da norma constitucional. Precedente do Plenário. Agravo regimental a que se nega provimento.” (AI-AgR nº555806; 2ª Turma do STF; por unanimidade; Relator Ministro EROS GRAU; 01/04/2008)
Com o advento do julgamento do RE nº 590.809/RS, de relatoria do Ministro Marco Aurélio - DJe de 24/11/2014 - submetido ao rito do art. 543-B do CPC/73, a Suprema Corte esclareceu incidir a vedação da Súmula n. 343 que obsta a ação rescisória com fundamento em violação de norma jurídica quando a matéria era controvertida nos Tribunais à época do julgamento, excepcionados os casos submetidos a controle concentrado de constitucionalidade, como extrai do julgado abaixo:
“AÇÃO RESCISÓRIA VERSUS UNIFORMIZAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA. O Direito possui princípios, institutos, expressões e vocábulos com sentido próprio, não cabendo colar a sinonímia às expressões “ação rescisória” e “uniformização da jurisprudência”. AÇÃO RESCISÓRIA – VERBETE Nº 343 DA SÚMULA DO SUPREMO. O Verbete nº 343 da Súmula do Supremo deve de ser observado em situação jurídica na qual, inexistente controle concentrado de constitucionalidade, haja entendimentos diversos sobre o alcance da norma, mormente quando o Supremo tenha sinalizado, num primeiro passo, óptica coincidente com a revelada na decisão rescindenda.”(RE 590809, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em22/10/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-230DIVULG 21-11-2014 PUBLIC 24-11-2014)
Confira-se ainda:
"EMENTA DIREITO CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. CONSELHO DE FISCALIZAÇÃO DO EXERCÍCIO PROFISSIONAL. NATUREZA JURÍDICA DE AUTARQUIA. NECESSIDADE DE MOTIVAÇÃO DA DISPENSA DE PESSOAL. JULGAMENTO COM BASE EM NORMA DECLARADA INCONSTITUCIONAL PELO STF. AÇÃO RESCISÓRIA. RE 590.809-RG (TEMA Nº 136). SÚMULA Nº 343/STF. INAPLICABILIDADE. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. PRECEDENTES. AGRAVO NÃO PROVIDO
1. O entendimento da Corte de origem, nos moldes do assinalado na decisão agravada, não diverge da jurisprudência firmada no Supremo Tribunal Federal.
2. Ao exame do RE 590.809/RS, submetido à sistemática da repercussão geral (Tema nº 136), de relatoria do Ministro Marco Aurélio, o Tribunal firmou entendimento que restringiu, minimamente, o cabimento de ação rescisória, aplicando a Súmula nº 343/STF mesmo quando a matéria versada nos autos for de índole constitucional.
3. Firmada, naquela oportunidade, compreensão segundo a qual, acaso a decisão rescindenda esteja em harmonia com precedentes do próprio STF à época, a posterior alteração de entendimento por esta Casa não autoriza a rescisória, aplicando-se a Súmula nº 343/STF.
4. A limitação do cabimento da ação rescisória em matéria constitucional cingiu-se a duas hipóteses específicas, quais sejam, (i) quando o acórdão rescindendo estiver em conformidade com a jurisprudência do Plenário desta Casa à época, mesmo que posteriormente alterada, e (ii) quando a matéria seja controvertida no âmbito deste Supremo Tribunal Federal. Precedentes.
5. Para efeito de aplicação da Súmula nº 343/STF em matéria constitucional indispensável perquirir (i) se a matéria era controvertida neste STF e (ii) se a decisão rescindenda estava em consonância com o entendimento deste Tribunal à época. Assim, caso a resposta para ambos os questionamentos seja negativa, inaplicável o entendimento sumulado e, portanto, cabível, em tese, a rescisória. Precedentes.
6. Consolidada jurisprudência desta Corte no sentido da inaplicabilidade da Súmula nº 343/STF quando a matéria versada nos autos for de índole constitucional, mesmo que a decisão objeto da rescisória tenha sido fundamentada em interpretação controvertida em outros Tribunais judiciários ou anterior à orientação fixada pelo Supremo Tribunal Federal, ressalvadas as hipóteses acima explicitadas.
7. As razões do agravo interno não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada.
8. A teor do art. 85, § 11, do CPC/2015, o “tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento”.
9. Agravo interno conhecido e não provido.
(RE 1389170 AgR / SP - SÃO PAULO AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO Relator(a): Min. ROSA WEBER; Julgamento: 19/09/2022; Publicação: 22/09/2022 Órgão julgador: Primeira Turma)
E ainda, no âmbito do STJ, quanto à aplicação da Súmula 343, do STF, em matéria constitucional, assim já se decidiu:
“PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. SÚMULA N. 343 DO STF. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7 DO STJ.
I - Na origem, trata-se de ação rescisória pretendendo desconstituir o acórdão que rejeitou a preliminar de ilegitimidade ativa e reformou a sentença, no reexame necessário procedido de ofício, para julgar improcedentes os pedidos iniciais, prejudicadas as apelações. No Tribunal a quo, a sentença foi mantida.
II - Sobre a alegada inviabilidade da aplicação da Súmula n. 343 do STF, quando a ação rescisória versar sobre violação da matéria constitucional, observa-se que o STF, no RE n. 590.809/RS, julgado em regime de repercussão geral, pacificou o entendimento no sentido de que não há impedimento para a aplicação da súmula quando inexiste controle concentrado de constitucionalidade e existem entendimentos diferentes sobre o alcance da norma. Nesse sentido: AR n. 5.601/MA, relator Ministro Og Fernandes, Primeira Seção, julgado em 14/8/2019, DJe 19/8/2019 e AR n. 5.261/RS, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, julgado em 23/10/2019, DJe 19/11/2019 .
III - Por outro lado, no tocante à aduzida impossibilidade de aplicação da Súmula n. 343 do STF em desfavor de divergência do mesmo Tribunal, verifica-se que esse tema não foi abordado no âmbito do acórdão recorrido, atraindo o comando da Súmula n. 282/STF, tendo em vista a ausência do necessário pré-questionamento.
IV - Por fim, observe-se que, para aferir a aplicabilidade da referida súmula, no tocante à divergência jurisprudencial do tema entelado, seria impositivo revisitar o conjunto probatório dos autos, ou mesmo efetivar dilação probatória, o que é inviável na estreita via do recurso especial. Incidência da Súmula n. 7/STJ.
V - Agravo interno improvido.”
(AgInt no AREsp 1457130/MG, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/02/2022, DJe 16/02/2022).
Como se vê, houve alteração na orientação do C. STF, passando a ser aplicada a Súmula 343/STF, em matéria constitucional, para não se admitir ação rescisória por violação de norma jurídica, quando o acórdão rescindendo estiver em conformidade com a jurisprudência do Plenário do próprio STF à época, mesmo que posteriormente alterada, e quando a matéria for controvertida no âmbito do STF.
DO CASO DOS AUTOS
Em 03.6.2018, a Ré, nascida em 05.6.1962, ajuizou ação objetivando o enquadramento como especial do lapso de 11.12.95 a 04.10.17 e a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a contar da DER em 04.10.2017 (processo nº 1002255-77.2018.8.26.0358, que teve curso pela 1ª Vara Cível da Comarca de Mirassol).
A r. sentença julgou procedente o pedido para reconhecer o labor especial de 11/12/95 “até os dias atuais” e condenou o INSS a conceder o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER em 04/10/2017 (ID-281525536, pág. 31).
Em segundo grau de jurisdição, em acórdão da lavra do E. Des. Fed. Baptista Pereira, a E. Décima Turma reformou em parte a r. sentença para delimitar o reconhecimento da especialidade das funções exercidas ao período de 11.12.95 a 04.10.17, mantendo a condenação da autarquia no pagamento do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a partir de 04.10.17 (AC 6083939-57.2019.4.03.9999). Confira-se fragmentos do voto que interessam ao presente julgamento:
“(...) Tecidas essas considerações gerais a respeito da matéria, passo a análise da documentação do caso em tela.
Assim fazendo, verifico que a parte autora comprovou que exerceu atividade especial no período de 11/12/95 a 04/10/17 (DER), laborado na Fundação Faculdade Regional de Medicina de São José do Rio Preto, no cargo de auxiliar de lavanderia, no setor de lavanderia, exposta a agentes biológicos como fezes, sangue e urina, decorrente do manuseio de material contaminado, agentes nocivos previstos nos itens 1.3.2 do Decreto 53.831/64, item 2.1.3, do Decreto 83.080/79 e item 3.0.1, “a”, do anexo IV, dos Decretos 2.172/97 e 3.048/99, conforme consta do PPP e do Laudo Técnico de Condições do Ambiente de Trabalho – LTCAT. Constou ainda do LTCAT de 25/2/19, que a eficácia dos EPIs está comprometida “pela precariedade de tecnologia dos equipamentos de proteção e pela falta de legislação na época.
A descrição das atividades descritas no referido PPP, revela que a parte autora, no desempenho dos trabalhos, permaneceu exposta aos agentes agressivos, nos aludidos períodos, de modo habitual e permanente, não ocasional e nem intermitente.
O tempo total de serviço, contado até a DER (04/10/17), incluídos os períodos em atividades especiais com o acréscimo da conversão em tempo comum, alcança o suficiente para a aposentadoria integral por tempo de contribuição.
Destarte, é de se manter a r. sentença quanto à matéria de fundo, devendo o réu averbar no cadastro da parte autora como trabalhado em condições especiais, com o acréscimo da conversão em tempo comum, o período de 11/12/95 a 04/10/17, conceder o benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição a partir de 04/10/17, e pagar as parcelas vencidas corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora.
(...) Ante o exposto, dou parcial provimento à remessa oficial, havida como submetida, e à apelação para delimitar o reconhecimento da especialidade ao período constante deste voto e para adequar os consectários legais e os honorários advocatícios.”
Sem recursos, o acórdão transitou em julgado em 31.08.21.
Baixados os autos, iniciou-se a fase de cumprimento de sentença.
Nesta ação, o INSS alega que a o v. acórdão, ao condená-lo a conceder o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral à segurada, a contar de 04.10.2017, viola normas jurídicas e incorre em erro de fato, pois, ainda que considerado o período de atividade especial judicialmente reconhecido, a somatória não atinge o tempo mínimo legalmente necessário à concessão do benefício, razão pela qual requer a desconstituição parcial do julgado, em relação ao capítulo que determina a concessão do benefício, com base no disposto no artigo 966, proferindo-se nova decisão, julgando-se improcedente o pedido.
De fato, na DER de 04/10/17, com a conversão do período enquadrado como especial de 11/12/95 a 04/10/17, a segurada contabilizava 26 anos, 2 meses e 5 dias de tempo de contribuição, insuficientes à aposentação.
Conforme reconhecido em contestação pela ré, o julgado rescindendo aplicou fator de conversão 1,40 (fator fixado em lei para homens) de cuja incidência, naquela oportunidade, importou na totalização de tempo superior a 30 anos e na concessão do benefício vindicado.
Ocorre que a parte autora da ação subjacente, ora ré, é do sexo feminino, pelo que, de acordo com a legislação de regência, o fator de conversão é 1,20.
Nesse contexto, há que se reconhecer a existência de erro de fato no julgado rescindendo, na medida em que a somatória de tempo operada pelo julgado destoa da realidade e influiu decisivamente no julgamento, na medida em que o fator de conversão previsto em lei para o caso da segurada mulher, é de 1,20.
O erro na apreciação da prova trazida aos autos, que decorre da desatenção do julgador, com a falsa percepção dos fatos, e reconhecimento de um fato inexistente ou da inexistência de um fato existente, não se confunde com a interpretação dada pelo juiz à prova.
Não houve controvérsia e pronunciamento judicial sobre o fator de conversão, sendo certo que, no caso, o reconhecimento pelo julgador de fato inexistente é identificável por meio do simples exame dos documentos coligidos aos autos.
Na mesma medida, o julgado rescindendo, ao aplicar fator de conversão diverso daquele expressamente previsto em lei, contabilizando tempo de contribuição indevido, importou em violação manifesta das normas jurídicas indicadas na inicial desta ação rescisória.
Sobre o tema, confira-se:
"PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. ERRO DE FATO. ART. 485, IX, DO CPC. INOCORRÊNCIA. TRIBUTO SUJEITO LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. DENÚNCIA ESPONTÂNEA. PARCELAMENTO. TRIBUTO PAGO A DESTEMPO. MATÉRIA SUBMETIDA AO REGIME DE RECURSOS REPETITIVOS. ART.543-C, DO CPC. VIOLAÇÃO AO ART. 535, DO CPC. INOCORRÊNCIA.1. A rescindibilidade advinda do erro de fato decorre da má percepção da situação fática resultante de atos ou documentos da causa dos quais o magistrado não se valeu para o julgamento, a despeito de existentes nos autos.
2. Assim, há erro de fato quando o juiz, desconhecendo a novação acostado aos autos, condena o réu no quantum originário. "O erro de fato supõe fato suscitado e não resolvido", porque o fato "não alegado" fica superado pela eficácia preclusiva do julgado - tantum iudicatum quantum disputatum debeat (artigo 474, do CPC). Em conseqüência, "o erro que justifica a rescisória é aquele decorrente da desatenção do julgador quanto à prova, não o decorrente do acerto ou desacerto do julgado em decorrência da apreciação dela" porquanto a má valoração da prova encerra injustiça, irreparável pela via rescisória. (g.n.) (...) (REsp 1065913/CE, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/08/2009, DJe 10/09/2009)
Do explanado, de rigor a desconstituição parcial do julgado no capítulo que computara tempo indevido e concedera o benefício, com fundamento nos incisos V e VIII, do art. 966, do CPC.
Passa-se ao juízo rescisório.
1. DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/ CONTRIBUIÇÃO
O primeiro diploma legal brasileiro a dispor sobre a aposentadoria por tempo de serviço foi a Lei Eloy Chaves, Decreto nº 4.682, de 24 de janeiro de 1923. Referido benefício era concedido apenas aos ferroviários, possuindo como requisito a idade mínima de 50 (cinquenta) anos, tendo sido suspensa no ano de 1940.
Somente em 1948 tal aposentadoria foi restabelecida, tendo sido mantida pela Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960 (Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS), que preconizava como requisito para a concessão do benefício o limite de idade de 55 (cinquenta e cinco) anos, abolido, posteriormente, pela Lei nº 4.130, de 28 de agosto de 1962, passando a adotar apenas o requisito tempo de serviço.
A Constituição Federal de 1967 e sua Emenda Constitucional nº 1/69, também disciplinaram tal benefício com salário integral, sem alterar, no entanto, a sua essência.
A atual Carta Magna manteve o benefício, disciplinando-o em seu art. 202 (redação original) da seguinte forma:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a média dos trinta e seis últimos salários-de-contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e comprovada a regularidade dos reajustes dos salários-de-contribuição de modo a preservar seus valores reais e obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo inferior, se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a integridade física, definidas em lei:
(...)
§1º: É facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e, após vinte e cinco, à mulher."
Antes da Emenda Constitucional n. 20/98, de 15 de dezembro de 1998, preceituava a Lei nº 8.213/91, nos arts. 52 e seguintes, que o benefício de aposentadoria por tempo de serviço era devido ao segurado que, após cumprir o período de carência constante da tabela progressiva estabelecida pelo art. 142 do referido texto legal, completar 30 anos de serviço, se homem, ou 25, se mulher, iniciando no percentual de 70% do salário-de-benefício até o máximo de 100% para o tempo integral aos que completarem 30 anos de trabalho se mulher, e 35 anos de trabalho se homem.
Na redação original do art. 29, caput, §1º, da Lei de Benefícios, o salário-de-benefício consiste na média aritmética simples de todos os últimos salários-de-contribuição dos meses imediatamente anteriores ao afastamento da atividade ou da data da entrada do requerimento, até o máximo de 36, apurados no período não superior a 48 meses. Ao segurado que contava com menos de 24 contribuições no período máximo estabelecido, o referido salário corresponde a 1/24 da soma dos salários-de-contribuição.
Com o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço foi convertida em aposentadoria por tempo de contribuição, tendo sido excluída do ordenamento jurídico a aposentadoria proporcional, passando a estabelecer, nos arts. 201 e 202 da Constituição Federal:
"Art. 201 A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei a:
(...)
§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidos as seguintes condições:
I - 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem, e 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher;
Art. 202 O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar.
(...)"
Entretanto, o art. 3º da referida Emenda garantiu o direito adquirido à concessão da aposentadoria por tempo de serviço a todos aqueles que até a data da sua publicação, em 16 de dezembro de 1998, tivessem cumprido todos os requisitos legais, com base nos critérios da legislação então vigente.
Foram contempladas, portanto, três hipóteses distintas à concessão da benesse: segurados que cumpriram os requisitos necessários à concessão do benefício até a data da publicação da EC n. 20/98 (16/12/1998); segurados que, embora filiados, não preencheram os requisitos até o mesmo prazo e, por fim, segurados filiados após a vigência daquelas novas disposições legais.
DO CASO DOS AUTOS
Somados os períodos reconhecidos pelo julgado rescindendo no quanto mantido (11/12/95 a 04/10/17), contava a autora na DER, com 26 anos, 2 meses e 5 dias de tempo de contribuição, insuficientes à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição integral ou proporcional.
De outro lado, o Superior Tribunal de Justiça ao julgar o Recurso Especial nº 1.727.064 - SP, em que se discutia o Tema 995, assegurou a possibilidade de reafirmação da data de entrada do requerimento para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir.
Conforme consulta, em 01/04/24, ao extrato do CNIS pelo sítio da Previdência Social , a autora continuou trabalhando na mesma função de 11/12/95 até 09/08/18, verteu contribuições ao sistema na condição de contribuinte individual de 01/12/18 a 28/02/19 e percebeu auxílios-doença previdenciários nos lapsos de 23/12/11 a 04/03/12, 29/05/13 a 13/07/13 e 06/11/18 a 07/09/21.
Contabilizado tempo de contribuição até 09/8/18 e as contribuições vertidas como contribuinte individual, a segurada não contaria com tempo suficiente à concessão do benefício, ainda que proporcional.
Não se desconhece que para a contabilização de tempo de contribuição no período em que a segurada esteve em gozo de benefício por incapacidade é necessário que os lapsos sejam intercalados com períodos contributivos ou de efetivo trabalho, na forma do art. 55, II, da Lei 8213/91, do art. 60, III, do Decreto 3048/99 e Súmula 102, do TRF da 4ª Região, Súmula 76 do TNU e, ainda, na forma do quanto decidido no Tema 1.125/STF, em que se reconheceu a possibilidade do acréscimo do tempo em gozo de benefício por incapacidade, inclusive para fins de carência.
Confira-se redação do art. 55, inc. II, da Lei 8213/91:
“Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
I - o tempo de serviço militar, inclusive o voluntário, e o previsto no § 1º do art. 143 da Constituição Federal, ainda que anterior à filiação ao Regime Geral de Previdência Social, desde que não tenha sido contado para inatividade remunerada nas Forças Armadas ou aposentadoria no serviço público;
II - o tempo intercalado em que esteve em gozo de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez;”
Com base na legislação de regência acima indicada, a segurada teria direito à inclusão, mediante reafirmação da DER, dos lapsos de 05/10/17 a 09/08/18, haja vista as contribuições vertidas como contribuinte individual e aos períodos em gozo de auxílios-doença de 23/12/11 a 04/03/12 e de 29/05/13 a 13/07/13.
Quanto ao lapso de 06/11/18 a 07/09/21, em que esteve a autora também esteve em gozo de auxílios-doença, em princípio, não seria possível a inclusão no tempo da autora, porque não está intercalado com períodos de contribuição ou labor.
Todavia, conforme se dessume de todo o processado, de se dar solução diversa ao caso específico dos autos.
Na ação subjacente a sentença foi de procedência, sem concessão de tutela antecipada e o acórdão manteve a concessão do benefício, ao fundamento de que até a DER (04/10/17), incluídos os períodos em atividades especiais com o acréscimo da conversão em tempo comum, a autora alcançava tempo suficiente à aposentação, com trânsito em julgado em 31.08.21.
Em 11/11/21, a autora pediu a implantação do benefício.
Através da petição sob ID-275729178, pág. 76, a autora informou que o INSS deixou de cumpriu o julgado porque a segurada não teria tempo de contribuição suficiente (já que contava com 26 anos, 2 meses e 4 dias) e requereu a concessão de tutela de urgência.
O juízo de piso proferiu decisão, em 28.01.2022, determinando nova expedição de ofício ao INSS requisitando a implantação do benefício.
Em 30/01/2022, o INSS informou que cumprira a determinação de implantação do benefício com DDB em 29.01.22 (momento em que o benefício foi efetivamente autorizado pelo INSS).
Nesse contexto, é certo que a autora deixou de contribuir para o INSS após 7/9/21 (data em que findou o último auxílio-doença), em virtude do fato de já haver transitado em julgado em 31/8/21 o acórdão que lhe concedera o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
Não se lhe poderia exigir conduta diversa, já que o benefício de auxílio-doença foi pago até 7/9/21 e o trânsito em julgado se deu em 31/8/21.
Na hipótese específica dos autos, entendo seja de rigor a contabilização do tempo em gozo de auxílio-doença de 6/11/18 a 7/9/21, porque a autora já se encontrava aposentada por tempo de contribuição.
Assim, somados os períodos acima indicados, contava a autora em 7/9/21, com 30 anos, 5 meses e 7 dias de tempo de contribuição.
EMENDA CONSTITUCIONAL N. 103, DE 13.11.2019
A Emenda Constitucional 103, publicada em 13/11/2019, alterou as regras de aposentadoria para os regimes próprio e geral da previdência social e estabeleceu regras de transição para os segurados filiados aos regimes indicados até a data da entrada em vigor da emenda.
As alterações da Emenda Constitucional n. 103 não atingem quem já recebia um benefício na data de sua promulgação, tampouco se aplica àqueles que começaram a receber algum benefício após sua vigência, desde que comprovado o direito antes da Reforma da Previdência, na forma do §4º, do Decreto 3048/99, alterado pelo Decreto n. 10.410, de 30.06.20.
A Emenda Constitucional n. 103, de 13.11.2019 revogou o fator previdenciário, exceto uma norma transitória e a regra de pontos do artigo 29-C da Lei n. 8.213/91.
Para aqueles que entraram no sistema previdenciário após sua vigência, a aposentadoria passou a requerer idade mínima de 65 anos para homens e de 62 para mulheres. Para a aposentadoria especial, há normas específicas para trabalhadores rurais e professores, observado o tempo mínimo de contribuição de 20 anos para homens e de 15 anos para mulheres (artigo 201, § 7º, CF e artigo 19 da EC n. 103/19).
Ainda, a Reforma da Previdência estabeleceu cinco novas regras de transição para os segurados filiados ao RGPS até a data de entrada em vigor da EC n. 103/2019, as quais estão descritas nos seus arts. 15 a 20 da referida e atualmente regulamentados pela Portaria nº 405, de 3 de abril de 2020, do INSS. São elas:
1) Por pontos (art. 15 da EC n. 103/19): ao computar 35 (homem) ou 30 (mulher) anos de e somar 96 (homem) ou 86 (mulher) pontos, respectivamente, de idade e tempo de contribuição. A pontuação será acrescida de um ponto a cada início de ano, a partir de 2020, até o limite de 105 pontos para o homem, em 01.01.2029, e de 100 pontos para a mulher, em 01.01.2033.
2) Por tempo de contribuição e idade mínima (art. 16 da EC n. 103/19): com 35 (homem) e 30 (mulher) anos de contribuição, e completar 61 ou 56 anos de idade, respectivamente. O requisito etário será anualmente acrescido de seis meses, a partir do início de 2020, até quando atingidos 65 anos de idade para o homem, em 01.01.2027, e 62 anos para a mulher, em 01.01.2031.
3) Com “pedágio” de 50% e fator previdenciário (art. 17 da EC n. 103/19): os segurados que, na vigência da EC 103 em 13.11.2019 contavam com mais de 33 anos de contribuição, o homem, ou 28 anos, a mulher, poderão aposentar-se se cumprido o requisito de tempo de 35 ou 30 anos, respectivamente, acrescido de período correspondente a 50% do tempo que, na data da publicação da emenda, faltava para atingir aqueles totais.
4) Com “pedágio” de 100% e idade mínima (artigo 20 da EC n. 103/19): ao preencher os requisitos etário (60 anos, o homem, ou 57, a mulher) e de tempo contributivo (35 ou 30 anos, respectivamente), cumulado com período adicional de contribuição equivalente a 100% do tempo que, em 13.11.2019, faltava para atingir os mencionados 35 ou 30 anos de contribuição.
5) Por idade (artigo 18 da EC n. 103/19): ao completar 65 anos (homem) ou 60 anos de idade (mulher), além de 15 anos de contribuição (ambos os sexos). O requisito etário feminino será anualmente acrescido de seis meses, a partir do início de 2020, até o patamar de 62 anos, em 01.01.2023.
Considerando que a autora continuou na mesma atividade no mesmo hospital até 9/8/18, reconheço a especialidade do lapso posterior à DER de 4/10/17 até 9/8/18.
No caso, a autora, nascida em 05/9/62, na data em que entrou em vigor a EC 103/19, contava com 57 anos, 2 meses e 9 dias de idade e 29 anos, 1 mês e 4 dias de tempo de contribuição.
Nesse passo, de se analisar a possibilidade de aposentação conforme regras transitórias da EC 103/19.
Conforme o art. 15, da EC 103, de 13.11.19, o segurado filiado ao regime geral de previdência social até a data da entrada em vigor desta emenda tem direito à aposentadoria se preencher, cumulativamente, se mulher, o somatório de idade e tempo de 86 pontos.
Somados idade e tempo, a autora contava com mais de 86 pontos, fazendo jus à aposentação com base na regra de transição do art. 15 da EC 103/19.
Quanto às demais regras de transição, na forma do art. 16, da EC 103, de 13.11.19, o segurado filiado ao regime geral de previdência social até a data da entrada em vigor desta emenda tem direito à aposentadoria se preencher, cumulativamente, se mulher, 30 anos de contribuição e 56 anos de idade. Todavia, a autora não contava com 30 anos de contribuição na data da EC 103/19.
Ainda, na forma do art. 18 da EC 103/19 a autora teria que contar com 62 anos de idade na data da emenda, o que não ocorreu.
De outro lado, conforme o art. 17, da EC 103, de 13.11.19, a segurado filiada ao Regime Geral de Previdência Social até a data da entrada em vigor desta emenda tem direito à aposentadoria se preencher, cumulativamente, se mulher, 28 anos de contribuição e pedágio de 50% do tempo que faltava para atingir 30 anos na data da EC. Na data da EC 103, a autora contava com 29 anos, 1 mês e 4 dias de tempo de contribuição, faltando-lhe 10 meses e 26 dias de tempo de contribuição que, acrescidos de 50%, ultimam, 1 ano, 4 meses e 9 dias.
Todavia, em 7/9/21, a autora contava com 30 anos, 8 meses e 3 dias de tempo de contribuição, suficientes à aposentação com base no art. 17 da EC 103/19.
Nesse contexto, a segurada tem direito à averbação do tempo especial reconhecido na ação subjacente (11/12/95 a 04/10/17) e nesta ação de 5/10/17 a 9/8/18 e ao tempo em que gozou auxílio-doença até 7/9/21, com concessão de aposentadoria por tempo de contribuição na data em que implementou os requisitos à jubilação, a saber, 7/9/21, com base no art. 15 da EC 103/19, que, em princípio, seria mais vantajoso, já que no art. 17 há incidência do fator previdenciário.
Todavia, na fase de cumprimento de sentença, o autor tem o direito de optar pelo benefício que lhe for mais vantajoso, conforme já assentado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE n° 630.501/RS-RG, quando preenchidos os requisitos mínimos para a aposentação.
Confira-se:
“Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Previdenciário. Desconstituição da aposentadoria integral. Opção pela aposentadoria proporcional. Direito adquirido ao benefício mais vantajoso após a reunião dos requisitos. Possibilidade. Precedentes. 1. O segurado tem direito adquirido ao benefício mais vantajoso, consideradas as datas a partir das quais a aposentadoria proporcional poderia ter sido requerida e desde que preenchidos os requisitos pertinentes. 2. Agravo regimental não provido.” (STF, AG.REG. NO RE 705.456/RJ, Primeira Turma, Min. Dias Toffoli, 28/10/2014).
TERMO INICIAL NO CASO DE REAFIRMAÇÃO DA DER
In casu, em virtude da somatória do tempo de contribuição após a data do requerimento administrativo e ao ajuizamento da ação, o termo inicial do benefício deve ser fixado na data do cumprimento do requisito temporal exigido.
JUROS DE MORA NO CASO DE REAFIRMAÇÃO DA DER
Conforme disposição inserta no art. 219 do Código de Processo Civil 1973 (atual art. 240 Código de Processo Civil - Lei nº 13.105/2015), os juros de mora são devidos a partir da citação na ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02, após, à razão de 1% ao mês, consonante com o art. 406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº 11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997), calculados nos termos deste diploma legal.
Neste ponto, insta ressaltar que, nos termos do julgado do C. STJ em sede de embargos declaratórios opostos no representativo de controvérsia Resp nº 1.727.064 - SP, tema 995, apenas quarenta e cinco dias após o INSS não efetivar a implantação do benefício é que deve ter início a incidência dos juros de mora, na forma acima disposta.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NO CASO DE REAFIRMAÇÃO DA DER
No caso dos autos, a reafirmação da DER se deu no decorrer da ação, ficando, assim, isento de pagar honorários advocatícios ao(s) patrono(s) da parte adversa, conforme decidido pelo C. STJ no Tema 995.
CORREÇÃO MONETÁRIA
A correção monetária deve ser aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação superveniente (conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal), observados os termos da decisão final no julgamento do RE n. 870.947, Rel. Min. Luiz Fux.
DA APLICAÇÃO DA SELIC A PARTIR DA EC 113, DE 08 DE DEZEMBRO DE 2021
Desde o mês de promulgação da Emenda Constitucional n. 113, de 8/12/21, a apuração do débito se dará unicamente pela Selic, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência da Selic acumulada com juros de mora e correção monetária.
PRESCRIÇÃO QUINQUENAL PARCELAS ATRASADAS
O Superior Tribunal de Justiça já pacificou a questão da prescrição das parcelas vencidas anteriormente ao ajuizamento da ação previdenciária, com a edição da Súmula 85:
"Nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública - aqui incluído o INSS - figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do quinquênio anterior a propositura da ação."
Considerando a data da concessão do benefício em 2021 e do ajuizamento da matriz, não há que se falar em prescrição.
DISPOSIÇÕES RELATIVAS À EXECUÇÃO DE SENTENÇA
Na liquidação da obrigação de fazer a que o INSS foi condenado nestes autos serão observadas as seguintes determinações:
Caberá ao INSS calcular o tempo de serviço para a concessão do benefício de acordo com os períodos reconhecidos nos autos, vinculado aos termos da coisa julgada, somando-se ao tempo de contribuição incontroverso.
Deixo consignado, também, que não cabe ao Poder Judiciário, através de sua contadoria, elaborar cálculos para a identificação de qual benefício é o mais vantajoso para o segurado, cabendo ao INSS orientar quanto ao exercício deste direito de opção.
Fica o INSS autorizado a compensar valores pagos administrativamente ao autor no período abrangido pela presente condenação, efetivados a título de benefício previdenciário que não pode ser cumulado com o presente.
AGRAVO REGIMENTAL
Com o presente julgamento, resta prejudicado o agravo regimental interposto pelo INSS contra a decisão que deferiu em parte a tutela de urgência requerida.
DISPOSITIVO
Ante todo o exposto, com fundamento no artigo 966, incisos V e VIII, do CPC, em juízo rescindente, julgo procedente a presente ação rescisória, a fim de desconstituir a coisa julgada formada no feito subjacente e, em juízo rescisório, mantenho a averbação do tempo especial já reconhecido na ação subjacente (processo nº 1002255-77.2018.8.26.0358), reconheço como especial o período de 5/10/17 a 9/8/18, e os períodos em que a ré esteve em gozo de auxílio por incapacidade temporária e julgo procedente o pedido originário a fim de conceder à segurada, ora ré, aposentadoria por tempo de contribuição, com reafirmação da DER (DIB em 7/9/2021), nos termos da fundamentação.
Tendo em vista que os autos subjacentes tramitaram perante o Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Mirassol/SP, oficie-se àquele Juízo, após o trânsito em julgado da presente decisão, dando-lhe ciência do inteiro teor do acórdão.
Com o trânsito em julgado, arquivem-se os autos.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA MOVIDA COM FUNDAMENTO NOS INCISOS V E VIII, DO ART. 966, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. TEMPO ESPECIAL. APLICAÇÃO DO FATOR 1,40 À AUTORA. ERRO NA CONTAGEM DO TEMPO RECONHECIDO. BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REAFIRMAÇÃO DA DER. DEFERIMENTO DO BENEFÍCIO EM JUÍZO RESCISÓRIO.
- o julgado rescindendo aplicou fator de conversão 1,40 (fator fixado em lei para homens) de cuja incidência, naquela oportunidade, importou na totalização de tempo superior a 30 anos e na concessão do benefício vindicado.
- Ocorre que a parte autora da ação subjacente, ora ré, é do sexo feminino, pelo que, de acordo com a legislação de regência, o fator de conversão é 1,20.
- O julgado rescindendo, ao aplicar fator de conversão diverso daquele expressamente previsto em lei, contabilizando tempo de contribuição indevido, importou em violação manifesta das normas jurídicas indicadas na inicial desta ação rescisória.
- de rigor a desconstituição parcial do julgado no capítulo que computara tempo indevido e concedera o benefício, com fundamento nos incisos V e VIII, do art. 966, do CPC.
- O Superior Tribunal de Justiça ao julgar o Recurso Especial nº 1.727.064 - SP, em que se discutia o Tema 995, assegurou a possibilidade de reafirmação da data de entrada do requerimento para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir.
- Não se desconhece que para a contabilização de tempo de contribuição no período em que a segurada esteve em gozo de benefício por incapacidade é necessário que os lapsos sejam intercalados com períodos contributivos ou de efetivo trabalho, na forma do art. 55, II, da Lei 8213/91, do art. 60, III, do Decreto 3048/99 e Súmula 102, do TRF da 4ª Região, Súmula 76 do TNU e, ainda, na forma do quanto decidido no Tema 1.125/STF, em que se reconheceu a possibilidade do acréscimo do tempo em gozo de benefício por incapacidade, inclusive para fins de carência.
- Com base na legislação de regência acima indicada, a segurada teria direito à inclusão, mediante reafirmação da DER, dos lapsos de 05/10/17 a 09/08/18, haja vista as contribuições vertidas como contribuinte individual e aos períodos em gozo de auxílios-doença de 23/12/11 a 04/03/12 e de 29/05/13 a 13/07/13.
- Quanto ao lapso de 06/11/18 a 07/09/21, em que esteve a autora também esteve em gozo de auxílios-doença, em princípio, não seria possível a inclusão no tempo da autora, porque não está intercalado com períodos de contribuição ou labor.
- Na ação subjacente a sentença foi de procedência, sem concessão de tutela antecipada e o acórdão manteve a concessão do benefício, ao fundamento de que até a DER (04/10/17), incluídos os períodos em atividades especiais com o acréscimo da conversão em tempo comum, a autora alcançava tempo suficiente à aposentação, com trânsito em julgado em 31.08.21.
- a autora deixou de contribuir para o INSS após 7/9/21 (data em que findou o último auxílio-doença), em virtude do fato de já haver transitado em julgado em 31/8/21 o acórdão que lhe concedera o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição. Não se lhe poderia exigir conduta diversa, já que o benefício de auxílio-doença foi pago até 7/9/21 e o trânsito em julgado se deu em 31/8/21.
- entendo seja de rigor a contabilização do tempo em gozo de auxílio-doença de 6/11/18 a 7/9/21, porque a autora já se encontrava aposentada por tempo de contribuição.
- somados os períodos acima indicados, contava a autora em 7/9/21, com 30 anos, 5 meses e 7 dias de tempo de contribuição.
- Considerando que a autora continuou na mesma atividade no mesmo hospital até 9/8/18, reconheço a especialidade do lapso posterior à DER de 4/10/17 até 9/8/18.
- a autora, nascida em 05/9/62, na data em que entrou em vigor a EC 103/19, contava com 57 anos, 2 meses e 9 dias de idade e 29 anos, 1 mês e 4 dias de tempo de contribuição.
- de se analisar a possibilidade de aposentação conforme regras transitórias da EC 103/19.
- Somados idade e tempo, a autora contava com mais de 86 pontos, fazendo jus à aposentação com base na regra de transição do art. 15 da EC 103/19.
- em 7/9/21, a autora contava com 30 anos, 8 meses e 3 dias de tempo de contribuição, suficientes à aposentação com base no art. 17 da EC 103/19.
- Nesse contexto, a segurada tem direito à averbação do tempo especial reconhecido na ação subjacente (11/12/95 a 04/10/17) e nesta ação de 5/10/17 a 9/8/18 e ao tempo em que gozou auxílio-doença até 7/9/21, com concessão de aposentadoria por tempo de contribuição na data em que implementou os requisitos à jubilação, a saber, 7/9/21, com base no art. 15 da EC 103/19, que, em princípio, seria mais vantajoso, já que no art. 17 há incidência do fator previdenciário.
- na fase de cumprimento de sentença, o autor tem o direito de optar pelo benefício que lhe for mais vantajoso, conforme já assentado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE n° 630.501/RS-RG, quando preenchidos os requisitos mínimos para a aposentação.
- A reafirmação da DER se deu no decorrer da ação, ficando, assim, isento de pagar honorários advocatícios ao(s) patrono(s) da parte adversa, conforme decidido pelo C. STJ no Tema 995.
- Ação rescisória julgada procedente em juízo rescindente e, em juízo rescisório, mantida a averbação do tempo especial já reconhecido na ação subjacente, reconhecido como especial o período de 5/10/17 a 9/8/18, e os períodos em que a ré esteve em gozo de auxílio por incapacidade temporária. Julgado procedente o pedido originário a fim de conceder à ora ré, aposentadoria por tempo de contribuição, com reafirmação da DER (DIB em 7/9/2021).
