Processo
AR - AÇÃO RESCISÓRIA / SP
5002251-85.2017.4.03.0000
Relator(a)
Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR
Órgão Julgador
3ª Seção
Data do Julgamento
02/04/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 07/04/2020
Ementa
E M E N T A
AÇÃO RESCISÓRIA. PENSÃO POR MORTE. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. ART.
74 E 102 DA LEI N. 8.213/91. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. PROCEDÊNCIA.
1. Nos termos dos artigos 74 e 26 da Lei 8.213/91, a pensão por morte é devida ao conjunto dos
dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, independentemente de carência.
2. Tendo em vista o lapso temporal decorrido entre o fim do último vínculo empregatício e o
falecimento, conclui-se que o falecido já havia perdido sua condição de segurado à época do
óbito (art. 15 da Lei 8.213/91).
3. No presente caso, de acordo com as anotações em CTPS, bem como pelo extrato do CNIS,
seu último vínculo empregatício encerrou-se em 02.11.1986, tendo retornado ao Regime Geral na
condição de contribuinte individual em 03.2009, efetuando recolhimentos até 06.2009 (ID
470082). Por sua vez, o laudo pericial médico realizado nos autos subjacentes (ID 470425),
concluiu que a incapacidade teve início em 03.09.2007, em razão da biópsia realizada nessa
data, em que pese o INSS ter considerado as datas de 19.11.2009 e 19.04.2011, por ocasião do
deferimento dos benefícios de auxílio-doença NB 31/538.416.596-7 e NB 31/545.909.253-8, com
DER em 25.11.2009 e 28.04.2011, respectivamente. Assevere-se, por oportuno, que as datas
consideradas pelo INSS por ocasião da concessão dos aludidos benefícios foram revistas em
sede de revisão administrativa, fixando-se a DID em 19.11.2004 e a DII em 12.12.2007 (ID
470189).
4. A perda da qualidade de segurado constitui óbice à concessão da pensão por morte uma vez
que o de cujus não chegou a preencher, antes de sua morte, os requisitos para obtenção de
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
qualquer aposentadoria concedida pela Previdência Social, uma vez que não contava com tempo
de serviço ou com idade bastante para se aposentar.
5. Ação rescisória julgada procedente para rescindir o julgado. Pedido formulado na demanda
subjacente julgado improcedente, condenando a parte ré ao pagamento dos honorários
advocatícios, arbitrados em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 85 do Código de
Processo Civil/2015, ressalvando, quanto à execução das verbas de sucumbência, a suspensão
prevista no artigo 98, § 3º, do CPC/2015.
Acórdao
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5002251-85.2017.4.03.0000
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RÉU: NORMA BATISTA DE SENNA
Advogados do(a) RÉU: CARLOS EDUARDO BEARARE - SP237990-N, GEORGE STRAUS
BATISTA DE SENNA - SP280552-N
OUTROS PARTICIPANTES:
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5002251-85.2017.4.03.0000
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RÉU: NORMA BATISTA DE SENNA
Advogados do(a) RÉU: CARLOS EDUARDO BEARARE - SP237990-N, GEORGE STRAUS
BATISTA DE SENNA - SP280552-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de ação rescisória ajuizada
pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, com fundamento nos artigos 966,
inc. V e VIII, do CPC/2015, objetivando a rescisão do v. acórdão proferido nos autos da Apelação
Cível n. 2016.03.99.017363-4/SP - processo originário n. 0000565-11.2012.8.26.0400, que deu
provimento ao apelo da parte autora para condenar a autarquia previdenciária ao pagamento de
pensão à Norma Batista de Senna, decorrente do óbito de Straus Gonçalves Senna.
Sustenta o INSS, em síntese, que o julgado rescindendo incidiu em erro de fato e em violação à
norma jurídica, pois, em que pese o falecido estivesse recebendo o benefício de auxílio-doença
NB 545.909.253-8 (DIB em 19.04.2011) por ocasião de seu óbito (03.11.2011), “o benefício foi
alvo de auditagem interna e que a perícia médica administrativa concluiu que a data de início da
incapacidade inicialmente fixada pelo Instituto não correspondia à verdade dos fatos” (fl. 06, ID
470037), tendo uma junta médica concluído que a data do início da incapacidade (DII) era, no
mínimo, 12.12.2007, época em que o instituidor da pensão já não ostentava a qualidade de
segurado, uma vez que, afastado do Regime Geral desde o ano de 1986, seu reingresso no
sistema previdenciário ocorreu com o recolhimento de 04 (quatro) contribuições no período de
03.2009 a 06.2009, como contribuinte individual.
Aduz, ainda, que o laudo pericial produzido nos autos subjacentes “não infirmou as conclusões da
administração, ao contrário, em letras negritadas, afirmou o expert do juízo que em 03/09/2007 o
falecido já era portador de cirrose hepática grave, em decorrência de ser portador do vírus da
hepatite C anos antes” (fl. 07, ID 470037).
O pedido de antecipação dos efeitos da tutela foi indeferido (ID 578353).
A parte ré apresentou contestação (ID 885009), na qual sustenta, em síntese, a improcedência do
pedido, com a condenação do INSS nas penas por litigância de má-fé.
Réplica (ID 1044798).
As partes não postularam a produção de novas provas (ID 1202953 e ID 1229680).
Alegações finais do INSS (ID 1849538) e da parte ré (ID 1956055).
É o relatório.
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5002251-85.2017.4.03.0000
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RÉU: NORMA BATISTA DE SENNA
Advogados do(a) RÉU: CARLOS EDUARDO BEARARE - SP237990-N, GEORGE STRAUS
BATISTA DE SENNA - SP280552-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): De início, verifico que não houve o
transcurso do prazo decadencial de 02 (dois) anos para a propositura da ação rescisória, previsto
no artigo 975 do Código de Processo Civil/2015.
I - Da alegada violação a literal disposição de lei
Quanto a esta alegação, dispõe o art. 485, V, do Código de Processo Civil:
"Art. 485. A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
(...)
V - violar literal disposição de lei".
Com a entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil, a matéria está disciplinada no art.
966, inc. V, do CPC/2015, assim redigido:
"Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
(...)
V - violar manifestamente norma jurídica".
A viabilidade da ação rescisória fundada no artigo 966, inciso V, do CPC (2015) decorre da não
aplicação de uma determinada lei ou do seu emprego de tal modo aberrante que viole
frontalmente o dispositivo legal, dispensando-se o reexame dos fatos da causa originária.
O julgado rescindendo assim apreciou a matéria relativa à qualidade de segurada da instituidora
da pensão:
"A controvérsia reside na qualidade de segurado, pois a autarquia defende presença de doença
preexistente do falecido ao reingresso ao RGPS.
Em relação à qualidade, verifica-se do extrato do CNIS (fl. 63-65) que as últimas contribuições
previdenciárias reportam-se ao período de 03/2009 a 06/2009, tendo recebido benefício
previdenciário de auxílio-doença entre 28/04/2011 a 03/11/11 (fl. 20), tendo o mesmo cessado em
decorrência do óbito.
A respeito da incapacidade laboral, foi realizada perícia médica indireta em 13/11/13 (laudo fls.
311 e ss.). Foi determinada como causa da incapacidade "cirrose por hepatite C de grau
irreversível".
Após divergências consignadas em perícias realizadas no âmbito do INSS (fls. 47-49), acerca do
início da doença (ano de 2004 ou 2007), expert do laudo em epígrafe fixou como DID 03/09/07.
Ainda, a perícia médica administrativa fixou como início da incapacidade (DII) em 12/12/07 (fl.
51).
Conquanto a Lei nº 8.213/91 vede concessão de benefício por incapacidade decorrente de
doença preexistente, no mesmo preceito ressalva as enfermidades de caráter progressivo.
Na hipótese, restou caracterizado o caráter progressivo da doença (fl. 321).
Ademais, não prospera o argumento da perda qualidade de segurado, tendo em vista que a
autarquia concedeu administrativamente auxílio-doença ao de cujus, porquanto, tal requisito
estava presente à época da concessão, e reconhecido pelo INSS.
Além disso, vale reiterar que o falecido se submeteu a perícias médicas no âmbito do INSS (fls.
47-51), realizadas em 23/12/09, 21/10/10 e 14/06/11, nas quais foi reconhecida a incapacidade
laborativa.
Conforme documento de fl. 206 (INSS), consigna que o segurado Straus Gonçalves Senna (de
cujus) estava em gozo de benefício por doença, com DIB em 19/11/09, tendo passado por perícia
em 21/10/2010, na qual foi sugerida concessão de aposentadoria por invalidez. Tal perícia não foi
homologada e o benefício foi cessado em 21/01/11.
Ora, durante todo esse interregno o de cujus submeteu-se a exames médicos junto a autarquia,
recebendo benefício previdenciário por incapacidade, motivos esses que atestam a qualidade de
segurado, permanecendo nessa condição até o dia em que veio a óbito.
Por esses motivos, afasto a alegação da perda da qualidade de segurado do de cujus, e autora
(apelante) faz jus ao benefício de pensão por morte.
O benefício é devido desde a data do óbito 03/11/11 (fl. 16), considerando a apresentação do
requerimento administrativo em 08/11/11 (fl. 22)" (ID 470496).
Em sede de Pensão por Morte devem-se demonstrar, basicamente, os seguintes requisitos: (a)
qualidade de segurado do falecido, aposentado ou não; (b) dependência econômica do
interessado, a teor do artigo 74 e seguintes da Lei 8.213/91.
Verifica-se do inciso I, do artigo 16, da Lei 8.213/91, que os filhos menores de 21 anos são
beneficiários do Regime Geral de Previdência Social na condição de dependente do segurado.
Ainda, determina o §4º do referido artigo que a sua dependência econômica é presumida:
"Art. 16 - São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes
do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição,
menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;
("omissis")
§ 4º - A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais
deve ser comprovada.".
No caso dos autos, conforme alegado pelo próprio INSS na inicial, são incontroversos o óbito e a
condição de dependente da autora, ora ré, comprovada pela certidão de casamento juntada aos
autos.
Assim, a questão cinge-se ao preenchimento do requisito da qualidade de segurado pelo falecido.
De acordo com o artigo 74 da Lei n. 8.213/91, a pensão por morte somente é devida aos
dependentes de "segurado" que vier a falecer, vale dizer, é devida pensão por morte somente aos
dependentes daquele que possuía qualidade de segurado à época de seu falecimento. Ressalto
que a pensão por morte é benefício que independe de cumprimento de carência (artigo 26, I, da
LBPS).
Por sua vez, o art. 102 da Lei n. 8.213/91, em sua redação original, dispunha:
"A perda da qualidade de segurado após o preenchimento de todos os requisitos exigíveis para a
concessão de aposentadoria ou pensão não importa em extinção do direito a esses benefícios".
Com a nova redação dada pela Lei n. 9.528/97, o referido dispositivo ficou assim redigido:
"Art. 102. A perda da qualidade de segurado importa em caducidade dos direitos inerentes a essa
qualidade.
§ 1º A perda da qualidade de segurado não prejudica o direito à aposentadoria para cuja
concessão tenham sido preenchidos todos os requisitos, segundo a legislação em vigor à época
em que estes requisitos foram atendidos".
Extrai-se do aludido dispositivo que, caso o de cujus tenha perdido a qualidade de segurado mas,
antes de sua morte já possuía os requisitos para a concessão de qualquer aposentadoria
concedida pela Previdência Social, quais sejam, aposentadoria por tempo de serviço ou por
idade, a perda da qualidade de segurado não obstará também a concessão da pensão por morte.
Com relação à necessidade de comprovação da qualidade de segurado na data do óbito para a
concessão de pensão por morte, já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça, em sede de
recurso repetitivo:
"RECURSO ESPECIAL SUBMETIDO AOS DITAMES DO ART. 543-C DO CPC E DA
RESOLUÇÃO Nº 8/STJ. PENSÃO POR MORTE. PERDA PELO DE CUJUS DA CONDIÇÃO DE
SEGURADO. REQUISITO INDISPENSÁVEL AO DEFERIMENTO DO BENEFÍCIO. EXCEÇÃO.
PREENCHIMENTO EM VIDA DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS À APOSENTAÇÃO.
INOCORRÊNCIA. RECURSO PROVIDO.
I - A condição de segurado do de cujus é requisito necessário ao deferimento do benefício de
pensão por morte ao(s) seu(s) dependente(s). Excepciona-se essa regra, porém, na hipótese de
o falecido ter preenchido, ainda em vida, os requisitos necessários à concessão de uma das
espécies de aposentadoria do Regime Geral de Previdência Social - RGPS. Precedentes.
II - In casu, não detendo a de cujus, quando do evento morte, a condição de segurada, nem tendo
preenchido em vida os requisitos necessários à sua aposentação, incabível o deferimento do
benefício de pensão por morte aos seus dependentes.
Recurso especial provido". (STJ, REsp 1110565/SE, 3ª Seção, DJe 03/08/2009 - Rel. Min. Felix
Fischer).
A questão foi objeto de edição do enunciado da Súmula416 do STJ: "É devida a pensão por
morte aos dependentes do segurado que, apesar de ter perdido essa qualidade, preencheu os
requisitos legais para a obtenção de aposentadoria até a data do seu óbito".
No presente caso, de acordo com as anotações em CTPS, bem como pelo extrato do CNIS, o
último vínculo empregatício do falecido encerrou-se em 02.11.1986, tendo retornado ao Regime
Geral na condição de contribuinte individual em 03.2009, efetuando recolhimentos até 06.2009
(ID 470082). Por sua vez, o laudo pericial médico realizado nos autos subjacentes (ID 470425),
concluiu que a incapacidade teve início em 03.09.2007, em razão da biópsia realizada nessa
data, em que pese o INSS ter considerado as datas de 19.11.2009 e 19.04.2011, por ocasião do
deferimento dos benefícios de auxílio-doença NB 31/538.416.596-7 e NB 31/545.909.253-8, com
DER em 25.11.2009 e 28.04.2011, respectivamente.
Assevere-se, por oportuno, que as datas consideradas pelo INSS por ocasião da concessão dos
aludidos benefícios foram revistas em sede de revisão administrativa, fixando-se a DID em
19.11.2004 e a DII em 12.12.2007 (ID 470189).
Embora as contribuições vertidas ao INSS durante o período de 03.2009 a 06.2009 pudessem, a
princípio, assegurar o cumprimento do requisito carência e demonstrar a condição da qualidade
de segurado, nota-se que a incapacidade de que padecia o "de cujus" foi fixada pelo sr. perito
judicial em 03.09.2007, ou seja, surgiu em período no qual o instituidor da pensão já não
ostentava mais a qualidade de segurado, sendo, portanto, preexistente à nova filiação ocorrida
em março de 2009, impedindo, assim, a concessão do benefício pleiteado, de acordo com o art.
59, § 1º, da Lei nº 8.213/91.
Diante disso, tendo em vista que o óbito ocorreu em 03.11.2011, conclui-se que o falecido já
havia perdido sua condição de segurado à época, nos termos do artigo 15 da Lei 8.213/91.
No presente caso, portanto, a perda da qualidade de segurado constitui óbice à concessão da
pensão por morte uma vez que o de cujus não chegou a preencher, antes de sua morte, os
requisitos para obtenção de qualquer aposentadoria concedida pela Previdência Social, uma vez
que não contava com tempo de serviço ou com idade bastante para se aposentar.
Conclui-se, portanto, demonstrada a violação literal ao disposto nos artigos 74 e 102 da Lei n.
8.213/91, devendo ser rescindido o julgado em questão.
Condeno a parte ré ao pagamento dos honorários advocatícios, que arbitro em 10% sobre o valor
da causa, nos termos do art. 85 do Código de Processo Civil/2015, ressalvando, quanto à
execução das verbas de sucumbência, a suspensão prevista no artigo 98, § 3º, do CPC/2015.
Diante do exposto, julgo procedente o pedido formulado na presente demanda rescisória para
desconstituir o v. acórdão da 8ª Turma desta Corte, proferido na Apelação Cível n.
2016.03.99.017363-4, e, em juízo rescisório, julgar improcedente o pedido formulado na demanda
subjacente, condenando a parte ré ao pagamento dos honorários advocatícios, que arbitro em
10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 85 do Código de Processo Civil/2015,
ressalvando, quanto à execução das verbas de sucumbência, a suspensão prevista no artigo 98,
§ 3º, do CPC/2015.
É como voto.
A Desembargadora Federal THEREZINHA CAZERTA. Trata-se de ação rescisória ajuizada pelo
Instituto Nacional do Seguro Social, em que se argumenta, com fundamento no art. 966, incisos V
e VIII, do Código de Processo Civil, a existência de erro de fato e manifesta violação a norma
jurídica no acórdão proferido nos autos n.º 0000565-11.2012.8.26.0400, pelo qual concedido
benefício previdenciário de pensão por morte à requerente.
Nos termos do voto do Excelentíssimo Senhor Relator, propõe-se, em juízo rescindendo, a
procedência da ação rescisória, para desconstituir a coisa julgada do feito subjacente, uma vez
que “Embora as contribuições vertidas ao INSS durante o período de 03.2009 a 06.2009
pudessem, a princípio, assegurar o cumprimento do requisito carência e demonstrar a condição
da qualidade de segurado, nota-se que a incapacidade de que padecia o "de cujus" foi fixada pelo
sr. perito judicial em 03.09.2007, ou seja, surgiu em período no qual o instituidor da pensão já não
ostentava mais a qualidade de segurado, sendo, portanto, preexistente à nova filiação ocorrida
em março de 2009, impedindo, assim, a concessão do benefício pleiteado, de acordo com o art.
59, § 1º, da Lei nº 8.213/91”.
Melhor analisando a questão, entende-se por, respeitosamente, divergir do entendimento exarado
no voto em epígrafe.
A controvérsia cinge-se a se verificar se há violação manifesta anorma jurídica ou erro de fato na
hipótese em que o colegiado, ao analisar o feito, entende por presente qualidade de segurado
uma vez que o beneficiário recebia auxílio-doençca – sendo que, após auditagem interna, referido
benefício tivera seu termo inicial alterado, de modo a se concluir que o instituidor perdera a sua
condição de segurado no momento do falecimento.
O inciso VIII do artigo 966 do Código de Processo Civil dispõe quanto à possibilidade de se
rescindir a coisa julgada na hipótese em que fundada “em erro de fato verificável do exame dos
autos”, isto é, quando “a decisão rescindenda admitir fato inexistente ou quando considerar
inexistente fato efetivamente ocorrido, sendo indispensável, em ambos os casos, que o fato não
represente ponto controvertido sobre o qual o juiz deveria ter se pronunciado” (§ 1.º).
Válido ainda, a esse respeito, o ensinamento de José Carlos Barbosa, quanto à necessidade dos
seguintes pressupostos para que o erro de fato dê causa à rescindibilidade, a saber: "a) que a
sentença nele seja fundada, isto é, que sem ele a conclusão do juiz houvesse de ser diferente; b)
que o erro seja apurável mediante o simples exame dos documentos e mais peças dos autos, não
se admitindo de modo algum, na rescisória, a produção de quaisquer outras provas tendentes a
demonstrar que não existia o fato admitido pelo juiz, ou que ocorrera o fato por ele considerado
inexistente; c) que 'não tenha havido controvérsia' sobre o fato (§2º); d) que sobre ele tampouco
tenha havido 'pronunciamento judicial' (§ 2º)" (p. 148-149).
Por sua vez, o inciso V do artigo 966 do Código de Processo Civil firma a possibilidade de se
julgar procedente a rescisória na hipótese em que a decisão sob análise "violar manifestamente
norma jurídica".
Para a maciça doutrina processual, violar literal disposição de lei significa desbordar por inteiro do
texto e do contexto legal, importando flagrante desrespeito à lei, em ter a sentença de mérito sido
proferida com extremo disparate, completamente desarrazoada.
José Frederico Marques refere-se a "afronta a sentido unívoco e incontroverso do texto legal"
(Manual de Direito Processual Civil, vol. III, Bookseller, 1ª edição, p. 304). Vicente Greco Filho, a
seu turno, leciona que "a violação de lei para ensejar a rescisória deve ser frontal e induvidosa"
(Direito Processual Civil Brasileiro, 2º vol., Saraiva, 5ª edição, p. 385).
Por isso, é inadmissível a desconstituição do julgado com base em mera injustiça, em
interpretações controvertidas, embora fundadas.
A rescisória não se confunde com nova instância recursal. Exige-se mais, que o posicionamento
adotado desborde do razoável, que agrida a literalidade ou o propósito da norma.
No caso destes autos, os argumentos relativos tanto ao erro de fato quanto à manifesta violação
de norma jurídica sustentam-se na interpretação conferida pelo acórdão à concessão, pelo INSS,
de benefícios de auxílio-doença ao instituidor, a qual, por sua vez, teve como esteio a percepção
de que a incapacidade tivera início em 19.11.2009 e 28.4.2011.
Ocorre que o ponto – bem como a retificação apresentada pelo INSS a respeito – foi objeto de
análise expressa do acórdão que ora se busca rescindir, constituindo-se, a esse respeito,
interpretação que ensejou, a juízo, à época, dos julgadores, a concessão do benefício
previdenciário.
Nesse sentido, a ação rescisória não se destina, seja pela via do erro de fato, seja por meio do
argumento de manifesta violação à norma jurídica, a revisitar o conjunto probatório e proceder à
sua reanálise, justamente porquanto não é sucedâneo recursal, mas instrumento
verdadeiramente excepcional de correção de equívoco cometido pelo Poder Judiciário.
De mais a mais, sobre o fato que se discute nesta sede, qual seja, a presença dos requisitos
necessários à revisão de pensão por morte a partir dos indicativos apresentados com esse fim,
houve efetivo pronunciamento judicial, posto que contrário a seus interesses.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. ART. 966, V E VII, DO
CPC/2015. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ATIVIDADE RURAL. INCAPACIDADE
PARCIAL E PERMANENTE. NÃO COMPROVAÇÃO DO TRABALHO BRAÇAL. AUSÊNCIA DE
VIOLAÇÃO MANIFESTA DE NORMA JURÍDICA. PROVA NOVA. REQUISITOS NÃO
DEMONSTRADOS. INAPTIDÃO PARA A MODIFICAÇÃO DO JULGADO. IMPROCEDÊNCIA DA
AÇÃO.
-Ação rescisória ajuizada por contribuinte individual objetivando a desconstituição de acórdão que
confirmou decisão de improcedência de pedido de concessão de aposentadoria por invalidez, por
entender não comprovado o trabalho rural.
-Alegação de violação manifesta de normas jurídicas, por ter o v. acórdão, segundo a autora,
entendido não poder ela, como trabalhadora rural, recolher contribuições mensais à Previdência
acima do limite mínimo do salário-de-contribuição.
-Apresentação de documentos novos (cópias de escrituras públicas), para fins de comprovação
da condição de rurícola da autora, que afirma só os ter encontrado recentemente e desconhecer
até então sua existência.
-A autora filiou-se à Previdência Social com 55 anos de idade, em 01/2007, e, após 75 meses
ininterruptos de contribuições – as primeiras 42 como segurada facultativa (das quais 19 sobre o
valor mínimo e 23 sobre o dobro desse valor) e as 33 últimas como contribuinte individual, pagas
pelo teto –, requereu ao INSS em 16/04/2013 o benefício de auxílio-doença, cujo indeferimento,
por ausência de incapacidade laborativa, motivou a propositura da ação original.
-Foi realizada perícia judicial em 05/12/2013, que concluiu pela incapacidade parcial e
permanente, iniciada em 25/03/2013, para atividades com esforço físico, tal como a da autora,
que declarara exercer trabalho rural.
-Não houve comprovação da atividade rural que serviu de premissa à conclusão do perito judicial
e à sentença do Juízo de primeiro grau, pois a referência à prática dessa atividade decorreu de
declaração unilateral da própria autora, por ocasião da realização da perícia.
-Inexistente controvérsia sobre a carência e a qualidade de segurado, o julgado rescindendo deu
pela ausência de comprovação do trabalho característico da atividade rural, agravada pela
constatação de terem sido recolhidas contribuições baseadas no valor máximo dos salários-de-
contribuição (teto), considerado incompatível com o salário-de-contribuição do trabalhador rural,
tornando inócua a conclusão do perito judicial, que atestara a incapacidade somente para o
trabalho associado ao esforço físico.
-Nesse contexto, não há como reconhecer a violação manifesta de norma jurídica pelo julgado
rescindendo, visto que adotou orientação em consonância com a legislação de regência e o
material probatório constante dos autos originários.
-Inviabilidade da utilização da via rescisória como mais um recurso, além daqueles previstos na
Lei Processual, com vistas à correção de eventual injustiça contida na decisão rescindenda ou à
revisão do julgado, não se prestando a previsão do inciso V do artigo 966 do CPC – equivalente
ao art. 485, V, do CPC/1973 -- a justificar o reexame de fatos ou a reapreciação de provas,
consoante pacífica e reiterada jurisprudência do E. STJ. Precedentes desta Corte no mesmo
sentido.
-Embora os documentos trazidos nesta rescisória a título de prova nova já existissem antes da
propositura da ação primitiva, não há demonstração razoável de que a autora lhes desconhecia a
existência ou não pôde utilizá-los na instrução da inicial da referida ação, nem tampouco de que
só teve acesso a eles após o trânsito em julgado da decisão rescindenda.
-O aproveitamento dos referidos documentos exigiria a adoção da solução pro misero, que,
todavia, se revela inadequada no caso concreto, considerando-se o grau de instrução da autora e
sua situação socioeconômica privilegiada.
-Ainda que assim não fosse, tais documentos não satisfazem uma das condições necessárias à
rescisão, pois não se prestam, só por si, a modificar o julgado rescindendo e assegurar
pronunciamento judicial favorável à autora. Precedentes.
-Condenação da autora em custas e honorários advocatícios, arbitrados em 10% sobre o valor da
causa atualizado (art. 85, § 4º, III, do CPC), determinando-se a conversão do depósito prévio em
multa(art. 968, II, do CPC).
-Ação rescisória improcedente.
(TRF3, 3ª Seção, AR 5010223-09.2017.4.03.0000, Rel. Des. Fed. Diva Malervbi, 24.3.2020)
De rigor, portanto, a improcedência da ação rescisória.
No mais, ausentes elementos que confiram suporte ao argumento da requerida, no sentido de
que o INSS teria alterado a verdade dos fatos, o que justificaria a aplicação de multa por litigância
de má-fé, indefiro referido pleito.
Condeno o INSS ao pagamento de verba honorária, fixada nestes autos em R$ 1.000,00,
consoante entendimento desta 3.ª Seção.
Posto isso, divirjo do Excelentíssimo Senhor Relator para julgar improcedente o pedido rescisório
formulado.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal
E M E N T A
AÇÃO RESCISÓRIA. PENSÃO POR MORTE. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. ART.
74 E 102 DA LEI N. 8.213/91. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. PROCEDÊNCIA.
1. Nos termos dos artigos 74 e 26 da Lei 8.213/91, a pensão por morte é devida ao conjunto dos
dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, independentemente de carência.
2. Tendo em vista o lapso temporal decorrido entre o fim do último vínculo empregatício e o
falecimento, conclui-se que o falecido já havia perdido sua condição de segurado à época do
óbito (art. 15 da Lei 8.213/91).
3. No presente caso, de acordo com as anotações em CTPS, bem como pelo extrato do CNIS,
seu último vínculo empregatício encerrou-se em 02.11.1986, tendo retornado ao Regime Geral na
condição de contribuinte individual em 03.2009, efetuando recolhimentos até 06.2009 (ID
470082). Por sua vez, o laudo pericial médico realizado nos autos subjacentes (ID 470425),
concluiu que a incapacidade teve início em 03.09.2007, em razão da biópsia realizada nessa
data, em que pese o INSS ter considerado as datas de 19.11.2009 e 19.04.2011, por ocasião do
deferimento dos benefícios de auxílio-doença NB 31/538.416.596-7 e NB 31/545.909.253-8, com
DER em 25.11.2009 e 28.04.2011, respectivamente. Assevere-se, por oportuno, que as datas
consideradas pelo INSS por ocasião da concessão dos aludidos benefícios foram revistas em
sede de revisão administrativa, fixando-se a DID em 19.11.2004 e a DII em 12.12.2007 (ID
470189).
4. A perda da qualidade de segurado constitui óbice à concessão da pensão por morte uma vez
que o de cujus não chegou a preencher, antes de sua morte, os requisitos para obtenção de
qualquer aposentadoria concedida pela Previdência Social, uma vez que não contava com tempo
de serviço ou com idade bastante para se aposentar.
5. Ação rescisória julgada procedente para rescindir o julgado. Pedido formulado na demanda
subjacente julgado improcedente, condenando a parte ré ao pagamento dos honorários
advocatícios, arbitrados em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 85 do Código de
Processo Civil/2015, ressalvando, quanto à execução das verbas de sucumbência, a suspensão
prevista no artigo 98, § 3º, do CPC/2015. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Seção, por
maioria, decidiu j julgar procedente o pedido formulado na presente demanda rescisória para
desconstituir o v. acórdão da 8ª Turma desta Corte, proferido na Apelação Cível n.
2016.03.99.017363-4, e, em juízo rescisório, julgar improcedente o pedido formulado na demanda
subjacente, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
