
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 0027657-67.2015.4.03.0000
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RÉU: MARIA GRAZIELA DE OLIVEIRA
Advogado do(a) RÉU: SERGIO ANTONIO NATTES - SP189352-A
OUTROS PARTICIPANTES:
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 0027657-67.2015.4.03.0000
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RÉU: MARIA GRAZIELA DE OLIVEIRA
Advogado do(a) RÉU: SERGIO ANTONIO NATTES - SP189352-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Desembargadora Federal MARISA SANTOS (Relatora):
Ação rescisória ajuizada pelo INSS, com fundamento no art. 485, inciso V, do CPC/1973, visando desconstituir acórdão da 7ª Turma que negou provimento ao seu agravo legal, restando mantida decisão monocrática que acolheu parcialmente os embargos de declaração opostos pelos autores, a fim de fixar a data de início do benefício de pensão por morte na data do óbito, tão somente em relação ao filho menor do falecido.
A autarquia sustenta que o instituidor do benefício ingressou no RGPS em fevereiro de 2008, na condição de contribuinte individual. A pessoa jurídica tomadora dos serviços recolheu contribuições previdenciárias no valor de R$ 19,80 (competência de fevereiro/2008) e R$ 15,95 (competência de abril/2008), calculadas a partir da aplicação do percentual de 11% sobre a remuneração de R$ 180,00 e R$ 145,00, respectivamente.
Contudo, prossegue, "estas contribuições foram inferiores ao limite mínimo do salário-de-contribuição, e o segurado, na época própria, não as complementou para que fosse atingido o valor mínimo, de modo que, nesse caso, não se aperfeiçoou a filiação e, consequentemente, não houve aquisição da qualidade de segurado".
Acrescenta que os dependentes recolheram os valores referentes às complementações em 30/07/2008, após o óbito do de cujus, ocorrido em 28/05/2008. Porém, alega, o recolhimento post mortem das contribuições previdenciárias não é admitido pelo ordenamento jurídico, conforme pacífica jurisprudência do STJ.
Assim, conclui, os dependentes não fazem jus à pensão por morte, por ausência de qualidade de segurado do de cujus na data do óbito, restando violados os arts. 21, 28, III e §3º, e 30, II, da Lei 8.212/91, bem como os arts. 74 da Lei 8.213/91 e 5º da Lei 10.666/2003.
Pede a rescisão do julgado e, após, que "seja realizado novo julgamento para o fim de julgar o processo com a apreciação do seu mérito".
Requer a concessão da tutela antecipada, a fim de suspender a execução do julgado rescindendo.
A inicial veio acompanhada de documentos de fls. 12/185.
Por meio de despacho de fl. 187, a análise do pedido de antecipação de tutela foi postergada, a fim de aguardar a contestação.
Após tentativas infrutíferas, os réus foram citados, conforme certidão de fl. 261. Em contestação, Maria Graziela de Oliveira e seu filho, José Gabriel de Oliveira Tomaz Duarte, menor impúbere - representado por sua genitora -, sustentam que o feito deve ser extinto, sem julgamento de mérito, em decorrência da "perda do objeto superveniente ao ajuizamento da ação, (pois) a documentação em anexo demonstra que o processo originário, ou seja, o processo da decisão rescindenda já teve os alvarás expedidos e a parte já os recebeu". Acrescenta que, "se não bastasse isso, o valor da RMI já foi devidamente retificado pelo INSS para o salário mínimo, basta conferir a planilha de cálculos do INSS que ora apresenta, ao qual anuiu a Peticionante" (fl. 264). Juntaram documentos de fls. 265/289.
Em réplica, o INSS alega que não é carecedor do direito de ação, pois "existe um benefício concedido e pago, indevidamente, conforme narrado na petição inicial". Pugna pelo prosseguimento do feito (fl. 292).
Razões finais do autor às fls. 302/306.
O Ministério Público Federal opinou pela desnecessidade de sua intervenção. Diz que o filho do de cujus, embora menor à época da propositura da ação, atingiu a maioridade civil no curso do processo (fls. 308/309).
O acórdão rescindendo transitou em julgado em 22/04/2015 e esta ação rescisória foi ajuizada em 23/11/2015 (fl. 161).
É o relatório.
Peço dia para o julgamento.
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 0027657-67.2015.4.03.0000
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RÉU: MARIA GRAZIELA DE OLIVEIRA
Advogado do(a) RÉU: SERGIO ANTONIO NATTES - SP189352-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Desembargadora Federal MARISA SANTOS (Relatora):
O acórdão rescindendo transitou em julgado em 22/04/2015 e esta ação rescisória foi ajuizada em 23/11/2015, obedecido o prazo bienal decadencial.
Analiso a alegação de ocorrência de violação de lei sob a ótica do CPC/1973 (art. 485, V), vigente à época do julgado rescindendo.
Rejeito a preliminar de carência de ação, ao argumento de que "o processo da decisão rescindenda já teve os alvarás expedidos e a parte já os recebeu". Há interesse processual na desconstituição do julgado que teria violado literal disposição de lei, concedendo benefício que segue sendo pago a quem não faz jus, segundo alega a autarquia.
Maria Graziela de Oliveira e José Gabriel de Oliveira Tomaz Duarte, menor impúbere, ajuizaram a ação subjacente objetivando a concessão do benefício de pensão por morte em decorrência do óbito de Luciano Rogério Duarte, respectivamente companheiro e genitor dos autores.
O juízo a quo julgou procedente o pedido, condenando o INSS ao pagamento do benefício, a partir da citação (24/06/2009). Submeteu a sentença ao reexame necessário (fls. 73/76).
As partes não recorreram.
Nesta Corte, o Juiz Federal Convocado Douglas Camarinha Gonzales não conheceu da remessa oficial, ao argumento de que "o benefício de pensão por morte foi concedido no período compreendido entre a data da citação (24/06/2009-fl. 34) até a data da prolação da sentença (15/12/2009-fls. 62/65), de modo que o montante devido pela Autarquia Ré no período descrito, somado ao das doze prestações seguintes, com a incidência de juros e correção monetária não alcança o valor correspondente a sessenta salários mínimos" (fls. 93/94).
Os autores interpuseram agravo legal; o magistrado reconsiderou a decisão agravada e deu parcial provimento à remessa oficial, tão somente no tocante aos juros de mora e honorários advocatícios, nos seguintes termos (fls. 110/113):
"Vistos, etc.
Trata-se de agravo legal interposto pela parte autora contra decisão monocrática (fls. 51/51vº), que não conheceu da remessa oficial.
Alega a agravante que o montante devido pelo INSS supera o valor de 60 salários mínimos.
Requer a reconsideração da decisão de fls. 51/51vº, ou caso entender inviável o pedido, que seja o pleito recebido como agravo legal.
Decido.
Neste momento processual cabe-me, tão somente, verificar se é caso de reconsiderar a decisão ou submeter o agravo legal ao julgamento pela Turma.
Melhor examinando os presentes autos, verifico que o montante devido entre o termo inicial do benefício (data da citação) e a sentença, somado ao das doze prestações seguintes, com a incidência de juros e correção monetária é superior a 60 salários mínimos, razão pela qual reconsidero a decisão de fls.51/51vº.
Assim sendo, passo à análise do mérito da remessa oficial:
Trata-se de remessa oficial em face da r. sentença que julgou parcialmente procedente o pedido formulado, para conceder o benefício de pensão por morte nos termos dos arts. 74 a 79 da Lei nº 8.213/91, a partir da data da citação. Honorários advocatícios fixados em 10% do valor das parcelas em atraso. Foi concedida a antecipação dos efeitos da tutela.
Não foram interpostos recursos voluntários.
É o relatório.
A matéria discutida comporta julgamento nos termos do art. 557 do Código de Processo Civil.
A Lei nº 9.756, de 17 de dezembro de 1998, alterou, dentre outros, o artigo 557 do Código de Processo Civil, e conferiu ao relator a possibilidade de dar provimento ou negar seguimento ao recurso "se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior."
Nos termos do artigo 74 da Lei nº 8.213/91, para a concessão do benefício de pensão por morte, é necessário o preenchimento de dois requisitos: a comprovação de dependência econômica e a qualidade de segurado do falecido.
Art. 74. A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data: (Redação dada pela Lei nº 9528, de 1997)
I - do óbito, quando requerida até trinta dias depois deste; (Incluído pela Lei nº 9528, de 1997
II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior; (Incluído pela Lei nº 9528, 1997)
III - da decisão judicial, no caso de morte presumida. (Incluído pela Lei nº 9528, de 1997).
A pensão por morte é benefício que independe do cumprimento de carência, nos termos previstos no art. 26, I, da Lei 8.213/91.
O óbito do segurado ocorreu em 29/05/2008, conforme documento acostado à fl. 18.
Nos termos do art. 16, I, da Lei nº 8.213/91, são beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado, o cônjuge, a companheira ou companheiro, filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 anos ou inválido ou que tenha deficiência mental ou intelectual que o torne absoluta ou relativamente incapaz.
No caso dos autos, constata-se que a autor é filho do segurado falecido, conforme documento acostado à fl. 16, portanto, a dependência econômica é presumida, nos termos do art. 16, § 4º da Lei nº 8213/91.
Em relação à autora Maria Graziela de Oliveira, constata-se pelos depoimentos prestados pelas testemunhas (fls. 57, 59/60), que a mesma mantinha união estável com o segurado falecido. Além disso, a certidão de nascimento acostada aos autos comprova a existência de prole comum (fls. 16).
No tocante à qualidade de segurado do falecido, constata-se pelos documentos (fls. 22/26), que o falecido prestava serviços para a Prefeitura Municipal de Cardoso, comprovando, portanto, que ostentava a qualidade de segurado, enquadrando-se na hipótese do art. 15, II da Lei 8.213/91.
Assim, preenchidos os requisitos legais, reconhece-se o direito da parte autora ao beneficio de pensão por morte, a partir da data da citação, nos termos da r. sentença.
A correção monetária incide sobre as prestações em atraso, desde as respectivas competências, na forma da legislação de regência, observando-se que a partir de 11.08.2006 o IGP-DI deixa de ser utilizado como índice de atualização dos débitos previdenciários, devendo ser adotado, da retro aludida data (11.08.2006) em diante, o INPC em vez do IGP-DI, nos termos do art. 31 da Lei nº 10.741/2003 c.c o art. 41-A da Lei nº 8.213/91, com a redação que lhe foi dada pela Medida Provisória nº 316, de 11 de agosto de 2006, posteriormente convertida na Lei nº 11.430, de 26.12.2006.
Os juros de mora de meio por cento ao mês incidem, a partir da citação, de forma decrescente para as parcelas posteriores até a data da conta de liquidação, que der origem ao precatório ou a requisição de pequeno valor - RPV. Após o dia 10.01.2003, a taxa de juros de mora passa a ser de 1% ao mês, nos termos do art. 406 do Código Civil e do art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional.
Com o advento da Lei nº 11.960/09, a partir de 30.06.2009 os juros serão aqueles aplicados à caderneta de poupança (0,5%), conforme decidido pelo E. STJ nos Embargos de Divergência em RESP n° 1.207.197-RS
No que tange aos honorários advocatícios, em observância ao art. 20, parágrafo 3º, do Código de Processo Civil e a Súmula nº 111 do Colendo Superior Tribunal de Justiça, esta Turma firmou o entendimento no sentido de que os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% (dez por cento) sobre a soma das parcelas devidas até a data da prolação da sentença, de primeiro grau, ainda que improcedente ou anulada.
Ante o exposto, nos termos do art. 557, do Código de Processo Civil, reconsidero a r. decisão agravada e DOU PARCIAL PROVIMENTO à remessa oficial, no tocante aos juros de mora e honorários advocatícios, na forma acima explicitada.
Observadas as formalidades legais, remetam-se os autos à vara de origem.
Int.
São Paulo, 26 de setembro de 2013.
DOUGLAS CAMARINHA GONZALES
Juiz Federal Convocado"
Foram opostos embargos de declaração pelos autores, parcialmente acolhidos, por decisão monocrática, para fixar a data de início do benefício do filho José Gabriel na data do óbito do genitor (fls. 142/145).
O INSS interpôs agravo legal, aduzindo que, ainda que se trate de incapaz, "em não havendo requerimento administrativo, há de se considerar com(o) termo inicial do benefício a data da citação da presente ação" (fls. 148/150).
Sobreveio o acórdão rescindendo, por meio do qual a Sétima Turma negou provimento ao agravo legal (fls. 153/158).
Restou mantido, portanto, o decisum que, na parte que interessa, assim consignou (fls. 111/112): "No tocante à qualidade de segurado do falecido, constata-se pelos documentos (fls. 22/26), que o falecido prestava serviços para a Prefeitura Municipal de Cardoso, comprovando, portanto, que ostentava a qualidade de segurado, enquadrando-se na hipótese do art. 15, II da Lei 8.213/91.".
Os documentos aos quais se reporta o julgado são os seguintes (fls. 32/36; 22/26 dos autos originários):
- certidão expedida pela Prefeitura Municipal de Cardoso/SP, dando conta que Luciano Rogério Duarte prestou serviços à municipalidade no ano de 2008 e certificando que "os serviços prestados no período em questão foram efetuados os recolhimentos e os descontos previstos em legislação vigente";
- relatório de empenho por credor, no qual consta que Luciano Rogério Duarte recebeu da Prefeitura de Cardoso o montante de R$325,00, sendo R$180,00 em 02/2008 e R$ 145,00 em 04/2008;
- relação de pagamentos de contribuinte individual (Luciano Rogério Duarte): R$ 180,00 em 29/02/2008 e R$ 145,00 em 30/04/2008; R$ 19,80 e R$ 15,95 recolhidos sob o título "INSS"; e R$ 160,20 e R$ 129,05 sob a rubrica "LIQ".
Todos os documentos listados foram emitidos pela Prefeitura Municipal de Cardoso.
O CNIS, também juntado nos autos da ação originária (fls. 30/31), traz a informação de que a inscrição de Luciano Rogério Duarte perante a Previdência Social se deu em 22/02/2008, na condição de contribuinte individual (ocupação: pintor de letreiros). Há, ainda, consulta de recolhimentos efetuados, cujos dados essenciais faço transcrever na tabela abaixo:
Competência | Dt. Autenticação | Contribuição | Sal. Contribuição | Valor Autenticado | |
Recol | 02/2008 | 30/07/2008 | 542,86 | 2.714,30 | 622,88 |
GFIP | 02/2008 | 00/00/0000 | 19,80 | 180,00 | 0,00 |
Total | 02/2008 | 00/00/0000 | 0,00 | 2.894,30 | 0,00 |
Recol | 03/2008 | 30/07/2008 | 607,80 | 3.039,00 | 691,91 |
Recol | 04/2008 | 30/07/2008 | 578,80 | 2.894,00 | 653,81 |
GFIP | 04/2008 | 00/00/0000 | 15,95 | 145,00 | 0,00 |
Total | 04/2008 | 00/00/0000 | 0,00 | 3.039,00 | 0,00 |
O óbito ocorreu em 28/05/2008 (fl. 28).
Com relação à prestação de serviços junto à Prefeitura de Cardoso, os dados do CNIS corroboram as informações fornecidas pela municipalidade, no sentido de que houve dois recolhimentos aos cofres da Previdência, referentes às competências de fevereiro/2008 e abril/2008.
Pois bem.
De acordo com os dados da tabela supra, verifica-se que os dependentes efetuaram três recolhimentos previdenciários, referentes às competências de 02/2008, 03/2008 e 04/2008, baseando-se nos limites máximos dos salários-de-contribuição vigentes, quais sejam, R$ 2.894,28 em fevereiro/2008 e R$ 3.038,99 a partir de março/2008.
Ao que parece, cientes da necessidade de complementação, os dependentes agiram de modo temerário ao efetuá-la com base no limite máximo do salário-de-contribuição, com o intuito de obter benefício previdenciário de valor expressivo. Com efeito, a pensão por morte foi implantada com DIB em 24/06/2009 e data de início de pagamento (DIP) em 11/10/2010, com RMI de R$ 3.218,90 (fl. 163); após, em fase de cumprimento de sentença, a RMI foi alterada para R$ 465,00 (salário mínimo) (fl. 165), não havendo, ao que tudo indica, insurgência dos interessados.
Os recolhimentos post mortem não correspondiam aos ganhos reais do falecido, conforme se depreende do depoimento pessoal da coautora Maria Graziela de Oliveira, colhido na ação subjacente (fl. 70):
"Resido atualmente na Avenida Américo Marcos de Queiroz, Bairro Morumbi, nº 1326, Iturama/MG; convivi com o falecido Luciano e tive um filho com ele; morei com ele por quase 10 anos; o falecido era pintor e trabalhava para a Prefeitura (terceirizado); ele sofreu um acidente de moto; nessa época, ele estava trabalhando como pintor na Prefeitura, fazendo faixas; não estava registrado na Prefeitura, recebia por empreita; ele ganhava uns R$ 500,00, por mês, quando tinha serviço na Prefeitura; quando não tinha serviço de pintura, ele trabalhava na roça." (destaquei).
Conforme as informações da coautora, seu companheiro, à época do óbito, trabalhava na Prefeitura que, por sua vez, confirmou apenas os pagamentos já referidos, nos valores de R$ 180,00 em 29/02/2008 e R$ 145,00 em 30/04/2008.
Assim, soa inverídica a complementação feita com base no teto.
De todo modo, o INSS não questiona especificamente os valores recolhidos, mas sim o fato de que se deram em 30/07/2008, após o óbito do Sr. Luciano, ocorrido em 28/05/2008.
A questão que se coloca, portanto, é saber se esses recolhimentos post mortem foram feitos de acordo com a legislação de regência.
Penso que não.
Ao tratar das normas de arrecadação e recolhimento das contribuições, o art. 30, I, alínea "b" da Lei 8.212/91, com a redação vigente à época dos recolhimentos, dispunha que:
Art. 30. A arrecadação e o recolhimento das contribuições ou de outras importâncias devidas à Seguridade Social obedecem às seguintes normas:
I - a empresa é obrigada a:
b) recolher o produto arrecadado na forma da alínea a deste inciso, a contribuição a que se refere o inciso IV do caput do art. 22 desta Lei, assim como as contribuições a seu cargo incidentes sobre as remunerações pagas, devidas ou creditadas, a qualquer título, aos segurados empregados, trabalhadores avulsos e contribuintes individuais a seu serviço até o dia 10 (dez) do mês seguinte ao da competência; (Redação dada pela Lei nº 11.488, de 2007). (...)
Segundo o art. 21, caput, da Lei 8.212/91, a alíquota de contribuição do segurado contribuinte individual é de 20% sobre o respectivo salário-de-contribuição. O seu parágrafo 2º prevê a possibilidade de recolhimento de 11% sobre o valor correspondente ao limite mínimo mensal do salário-de-contribuição nos casos em que o contribuinte individual que trabalhe por conta própria, sem relação de trabalho com empresa ou equiparado, opte pela exclusão do direito ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
Com relação ao salário-de-contribuição, a Lei de Custeio assim dispõe:
Art. 28. Entende-se por salário-de-contribuição:
(...)
III - para o contribuinte individual: a remuneração auferida em uma ou mais empresas ou pelo exercício de sua atividade por conta própria, durante o mês, observado o limite máximo a que se refere o § 5o; (Redação dada pela Lei nº 9.876, de 1999).
(...)
§ 3º O limite mínimo do salário-de-contribuição corresponde ao piso salarial, legal ou normativo, da categoria ou, inexistindo este, ao salário mínimo, tomado no seu valor mensal, diário ou horário, conforme o ajustado e o tempo de trabalho efetivo durante o mês. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 10.12.97)
(...)
§ 5º O limite máximo do salário-de-contribuição é de Cr$ 170.000,00 (cento e setenta mil cruzeiros), reajustado a partir da data da entrada em vigor desta Lei, na mesma época e com os mesmos índices que os do reajustamento dos benefícios de prestação continuada da Previdência Social.
De acordo com o art. 4º da Lei 10.666/2003, a empresa é obrigada a arrecadar a contribuição do segurado contribuinte individual a seu serviço, descontando-a da respectiva remuneração, e a recolher o valor arrecadado juntamente com a contribuição a seu cargo.
O art. 5º da referida lei, por sua vez, determina que:
Art. 5º O contribuinte individual a que se refere o art. 4º é obrigado a complementar, diretamente, a contribuição até o valor mínimo mensal do salário-de-contribuição, quando as remunerações recebidas no mês, por serviços prestados a pessoas jurídicas, forem inferiores a este.
Assim, não obstante a pessoa jurídica seja obrigada a fazer a retenção e o posterior recolhimento da contribuição - na condição de responsável tributária por substituição -, cabe ao contribuinte individual providenciar a complementação dos valores devidos à Previdência, observados os limites mínimo e máximo determinados pela lei.
De acordo com os ensinamentos de Leandro Paulsen e Andrei Pitten Velloso, "a apuração e recolhimento da contribuição pelos segurados facultativos cabe a eles próprios. (...) Relativamente aos contribuintes individuais, a situação é mais complexa. Isso porque podem prestar serviços a pessoas físicas, que não estão obrigadas a qualquer retenção, ou a pessoas jurídicas, estas colocadas por lei como responsáveis tributárias, obrigadas à retenção e ao recolhimento. Como os contribuintes individuais prestam serviços, normalmente, a diversas pessoas, físicas e jurídicas, submeter-se-ão às retenções pelas pessoas jurídicas e terão de complementar os valores devidos relativamente à parcela da remuneração que não tenha sofrido retenção. Além disso, deverão atentar para que não seja extrapolado o limite máximo do salário de contribuição em face da sobreposição de retenções. De fato, as empresas a que os contribuintes individuais prestam serviços foram colocadas, pelo art. 4º da Lei 10.666/03, na posição de responsáveis tributárias por substituição: (...)" (Contribuições: teoria geral, contribuições em espécie. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010, p. 162-163).
No caso, os valores mínimos dos salários-de-contribuição eram de R$ 380,00 em fevereiro/2008 e R$ 415,00 em abril/2008, conforme salários mínimos vigentes à época.
Por óbvio, a falta de recolhimentos ou a eventual aplicação errônea da alíquota, por parte da pessoa jurídica, não podem prejudicar o trabalhador. Ocorre que, conforme certificado pela municipalidade, os valores efetivamente pagos a Luciano Rogério Duarte foram R$ 180,00 e R$ 145,00, inferiores aos limites mínimos, de modo que caberia ao interessado - e não ao empregador/tomador de serviços - o pagamento da diferença, nos termos do art. 5º da Lei 10.666/2003.
À época do óbito, vigorava o art. 45, §1º, da Lei nº 8.212/91, segundo o qual "para comprovar o exercício de atividade remunerada, com vistas à concessão de benefícios, será exigido do contribuinte individual, a qualquer tempo, o recolhimento das correspondentes contribuições".
A intepretação literal é a de que cabe ao próprio contribuinte individual - e não aos dependentes - regularizar as contribuições devidas. Decerto não há como ignorar que, em inúmeras situações, o segurado vem a óbito sem que tenha providenciado tal regularização e até mesmo sem sequer saber da existência dessa necessidade.
Talvez sensível a essa realidade, a própria autarquia chegou a admitir, em algumas hipóteses, que os dependentes efetivassem os recolhimentos post mortem (art. 282, III, da Instrução Normativa INSS 118/2005; art. 282, III, da Instrução Normativa INSS 11/2006).
Esse entendimento, porém, foi posteriormente alterado e, à época do óbito, o art. 282, caput e § 2º da Instrução Normativa 20/2007 dispunha que:
Art. 282. Caberá a concessão nas solicitações de pensão por morte em que haja débito decorrente do exercício de atividade do segurado contribuinte individual, desde que comprovada a manutenção da qualidade de segurado perante o RGPS, na data do óbito.
(...)
§ 2º Não será considerada a inscrição realizada após a morte do segurado pelos dependentes, bem como não serão consideradas as contribuições vertidas após a extemporânea inscrição para efeito de manutenção da qualidade de segurado.
A regra é específica para o contribuinte individual e não se mostrava desarrazoada, visto que a legislação previdenciária expressamente atribuiu a essa categoria de segurado a responsabilidade pelo recolhimento de suas contribuições ou pela sua complementação. A exceção é a hipótese trazida nos arts. 30, I, alínea "b" da Lei 8.212/91 e 4º da Lei 10.666/2003, já referidos, ou seja, a contribuição recolhida pela empresa, observados os limites mínimo e máximo do salário-de-contribuição.
À época do julgado rescindendo, a jurisprudência era consolidada, pela impossibilidade do recolhimento post mortem, em se tratando de contribuinte individual:
PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. INEXISTÊNCIA. PENSÃO POR MORTE. SEGURADO OBRIGATÓRIO. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. RECOLHIMENTO POST MORTEM . IMPOSSIBILIDADE. 1. Discute-se nos autos a possibilidade de a viúva, na qualidade dependente, efetuar o recolhimento das contribuições previdenciárias em atraso, após a morte do segurado. 2. Não há a alegada violação do art. 535 do CPC, pois a prestação jurisdicional foi dada na medida da pretensão deduzida, conforme se depreende da análise do acórdão recorrido. 3. Em relação ao recolhimento post mortem das contribuições previdenciária, esta Corte vem firmando orientação no sentido de que "é imprescindível o recolhimento das contribuições respectivas pelo próprio segurado quando em vida para que seus dependentes possam receber o benefício de pensão por morte. Desta forma, não há base legal para uma inscrição post mortem ou para que sejam regularizadas as contribuições pretéritas, não recolhidas em vida pelo de cujus." (REsp 1.328.298/PR, Rel. Ministro Castro Meira, DJe de 28.9.2012). 4. Decisões monocráticas no mesmo sentido: REsp 1.325.452/SC, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 19.03.2013; REsp 1.251.442/PR, Relatora Ministra Laurita Vaz, DJe 1°.2.2013; REsp 1.248.399/RS, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 14.11.2012; REsp 1.349.211/PR, Relatora Ministra Eliana Calmon, DJe 8.11.2012; REsp 1.328.298/PR, Relator Ministro Castro Meira, DJe 28.9.2012. Recurso especial provido. ..EMEN:
(RESP 1346852, Relator Ministro Humberto Martins, STJ - Segunda Turma, DJE: 28/05/2013)
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PENSÃO POR MORTE. AUSÊNCIA DA CONDIÇÃO DE SEGURADO. REGULARIZAÇÃO DE CONTRIBUIÇÕES APÓS A MORTE DO INSTITUIDOR DO BENEFÍCIO. IMPOSSIBILIDADE. 1. É firme a jurisprudência desta Corte Superior de Justiça no sentido de que não é possível a contribuição após a morte do segurado, pelos dependentes, a fim de regularizar o requisito de vínculo do de cujus com o sistema previdenciário. A propósito, confira-se: REsp 1.346.852/PR, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 28/5/2013. 2. Agravo regimental não provido.
(AGRESP 1258053, Relator Ministro Benedito Gonçalves, STJ - Primeira Turma, DJE: 26/05/2014)
REVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. RECOLHIMENTO OU COMPLEMENTAÇÃO POST MORTEM. IMPOSSIBILIDADE. 1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva a pensão. 2. A filiação do contribuinte individual à Previdência Social se dá com o exercício de atividade remunerada. Não obstante, como ao contribuinte individual compete o ônus de provar que efetivamente contribuiu (art. 30, II da Lei 8.212/91), o recolhimento de contribuições constitui condição necessária para assegurar a proteção previdenciária para si e para seus dependentes. 3. O recolhimento da contribuição, ou sua complementação, deve ser realizada antes do falecimento, uma vez que inviável a contribuição post mortem, consoante entendimento do Superior Tribunal de Justiça. 4. Em qualquer das hipóteses em que a responsabilidade pelo recolhimento das contribuições é do próprio contribuinte, é necessário, além do efetivo recolhimento (pelo contribuinte, e não por seu dependente, após o óbito, consoante entende o e. STJ), que a base de cálculo da contribuição atenda ao mínimo legal, ou seja, o valor do salário mínimo na respectiva competência. Sem isto, as condições para o reingresso no RGPS não se perfectibilizam, pois ausente um de seus pressupostos, qual seja a existência de contribuição válida.
(TRF4, REOAC 0017784-26.2014.4.04.9999, Sexta Turma, Relator Paulo Paim da Silva, D.E. 28/11/2014)
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. RECONHECIMENTO DA QUALIDADE DE SEGURADO PELO SIMPLES EXERCÍCIO DE ATIVIDADE INFORMAL. REGULARIZAÇÃO POST MORTEM DO RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES. IMPOSSIBILIDADE. INCIDENTE PROVIDO. 1. Este Colegiado possui entendimento consolidado no sentido de que a qualidade de segurado do contribuinte individual não decorre do simples exercício de atividade remunerada, mas do concomitante recolhimento das contribuições exigíveis. Assim, revela-se incabível, para fins de obtenção de pensão por morte, a regularização do recolhimento das contribuições posteriormente ao óbito (Cf. Pedilef 200870950025150, juíza federal Rosana Noya Weibel Kaufmann, DOU 08/04/2011; Pedilef 200870510019718, juíza federal Joana Carolina Lins Pereira, DOU 25/03/2011; Pedlief 200783005268923, juíza federal Jacqueline Michels Bilhalva, DJ 11/12/2008; Pedilef 200672950079373, juiz federal Manoel Rolim Campbell Penna, DJ 12/02/2009; Pedilef 200572950133107, juiz federal Marcos Roberto Araújo dos Santos, DJU 21/05/2007; Pedilef 200570950150393, juíza federal Maria Divina Vitória, DJU 17/03/2008.) 2. Sugere-se ao Presidente deste Colegiado que, com base no entendimento já consolidado nesta Turma, promova a devolução de todos os incidentes que objetivem o prestígio ou afastamento da tese de possibilidade de regularização do recolhimento das contribuições após o óbito do contribuinte individual, nos termos do artigo 7º do Regimento Interno desta Turma. 3. Incidente provido, com reforma do acórdão recorrido e reconhecimento da improcedência do pedido. Condenação da recorrente ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atribuído à causa, cuja cobrança fica suspensa por ser beneficiária de assistência judiciária gratuita. Questão de ordem n.º 2 deste Colegiado.
(TNU, Pedilef 200563020132909, Relatora Juíza Federal Simone dos Santos Lemos Fernandes, DOU 09/12/2011)
Desse modo, penso que tem razão de ser a alegação da autarquia, no sentido de que a filiação não se aperfeiçoou.
A filiação é o vínculo que se estabelece entre o segurado e a Previdência Social, constituindo uma relação jurídica da qual decorrem direitos e obrigações para ambas as partes. Para o contribuinte individual, há a obrigação de recolhimento em valor que corresponda, ao menos, ao salário-de-contribuição que "corresponde ao piso salarial, legal ou normativo, da categoria ou, inexistindo este, ao salário mínimo", nos termos do art. 28, III, § 3º, da Lei 8.212/91, o que não se verifica no caso dos autos.
Assim, não resta configurada a qualidade de segurado de Luciano Rogério Duarte.
O julgado rescindendo, portanto, incorreu em violação aos arts. 28 e 30, I, alínea "b" da Lei 8.212/91, art. 5º da Lei 10.666/2003 e art. 74 da Lei 8.213/91.
Diante do exposto, rescindo o acórdão proferido nos autos do Reexame Necessário Cível de nº 0040880-39.2010.4.03.9999/SP, com fundamento no art. 485, V, do CPC/1973.
Em juízo rescisório, na ausência de um dos requisitos necessários à concessão da pensão por morte, qual seja, a qualidade de segurado do de cujus (art. 74 da Lei 8.213/91), é de rigor a improcedência do pedido.
Rejeito a preliminar de carência da ação, julgo procedente o pedido formulado nesta ação rescisória para rescindir o acórdão proferido nos autos do Reexame Necessário Cível de nº 0040880-39.2010.4.03.9999/SP, com fundamento no art. 485, V, do CPC/1973, e, proferindo novo julgamento, julgo improcedente o pedido de pensão por morte.
Condeno os réus ao pagamento de honorários advocatícios que fixo em R$1.000,00 (um mil reais), cuja exigibilidade fica suspensa, nos termos do art. 98, §3º, do CPC/2015, por serem beneficiários da assistência judiciária gratuita.
Ante o teor do presente voto, e observado o disposto no artigo 955, caput, do Código de Processo Civil, defiro o pedido de tutela antecipada a fim de determinar a suspensão do pagamento do benefício de pensão por morte NB 152.378.631-8. Oficie-se.
Comunique-se o Juízo de Direito da Vara Única da Comarca de Cardoso/SP, por onde tramitam os autos de nº 0001411-73.2009.8.26.0128, dando-se ciência do inteiro teor deste acórdão.
É o voto.
VOTO VISTA
O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal Sérgio Nascimento: O INSS ajuizou a presente ação rescisória, com fulcro no artigo 485, inciso V, do CPC/1973, visando desconstituir o v. acórdão proferido pela 7ª Turma desta Corte, que negou provimento ao seu agravo legal, restando mantida decisão monocrática que acolheu parcialmente os embargos de declaração opostos pelos autores, a fim de fixar a data de início do benefício de pensão por morte na data do óbito, tão somente em relação ao filho menor do falecido.
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Marisa Santos, em seu brilhante voto, houve por bem julgar procedente o pedido formulado nesta ação rescisória, e, em novo julgamento, julgar improcedente o pedido de pensão por morte, por entender que o v. acórdão rescindendo incorreu em violação aos artigos 28 e 30, I, alínea “b” da Lei n. 8.212/91, art. 5º da Lei n. 10.666/2003 e art. 74 da Lei n. 8.213/91.
Esclarece a d. Relatora que “..os valores mínimos dos salários-de-contribuição eram de R$ 380,00 em fevereiro/2008 e R$ 415,00 em abril/2008, conforme salários mínimos vigentes à época...” e que “...conforme certificado pela municipalidade, os valores efetivamente pagos a Luciano Rogério Duarte foram R$ 180,00 e R$ 145,00, inferiores ao limites mínimos, de modo que caberia ao interessado – e não ao empregador/tomador de serviços – o pagamento da diferença, nos termos do art. 5º da Lei 10.666/2003..”.
Assinala, outrossim, que “...os dependentes efetuaram três recolhimentos previdenciários, referentes às competências de 02/2008, 03/2008 e 04/2008, baseando-se nos limites máximos dos salários-de-contribuição vigentes, quais sejam R$ 2.894,28 em fevereiro/2008 e R$ 3.038,99 a partir de março/2008..”, contudo pondera que “..cabe ao próprio contribuinte individual – e não aos dependentes – regularizar as contribuições devidas...”, acrescentando, pois, que “...À época do julgado rescindendo, a jurisprudência era consolidada, pela impossibilidade do recolhimento post mortem, em se tratando de contribuinte individual...”.
Conclui, por fim, pela não configuração da qualidade de segurado de Luciano Rogério Duarte por ocasião de seu óbito, ocorrido em 28.05.2008.
Pedi vista dos autos apenas para melhor reflexão quanto aos aspectos fáticos e jurídicos que envolvem a presente causa.
Com efeito, é consabido que compete ao próprio segurado contribuinte individual o recolhimento de sua contribuição, nos termos do art. 30, inciso II, da Lei n. 8.212/91.
De outra parte, foi conferida à empresa tomadora do serviço a obrigação de promover a retenção relativamente à contribuição do segurado contribuinte individual, conforme se vê do preceituado no art. 4º da Lei n. 10.666/2003, todavia remanesceu a responsabilidade deste segurado em complementar, diretamente, a contribuição até o valor mínimo mensal do salário-de-contribuição, quando as remunerações recebidas nos mês, por serviços prestados a pessoa jurídica, forem inferiores a este, a teor do art. 5º do mesmo diploma legal.
No caso em tela, como bem destacado pela i. Relatora, os valores pagos pela Municipalidade foram inferiores aos limites mínimos (R$ 180,00 em 02/2008 com valor mínimo de R$ 380,00 e R$ 145,00 em 04/2008 com valor mínimo de R$ 415,00), de modo que o falecido, para que pudesse ostentar a qualidade de segurado, deveria ter complementado os valores recolhidos, todavia não o fez à época própria.
Nesse mesmo sentido, confira-se julgado da 10ª Turma deste Tribunal, cuja ementa abaixo transcrevo:
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. QUALIDADE DE SEGURADO. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DO COMPLEMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES. REQUISITO NÃO PREENCHIDO. BENEFÍCIO INDEVIDO.
(...)
2. De acordo com o extrato do CNIS, o falecido recolheu uma contribuição como contribuinte individual referente à competência setembro/2014, de modo que teria mantido a condição de segurado por ocasião do falecimento, ocorrido em 22/06/2015.
3. Entretanto, tal recolhimento foi efetuado com base no salário de contribuição recebido no valor de R$ 432,64, quantia inferior ao salário mínimo em vigor à época (2014), qual seja, R$ 724,00.
4. Para os segurados contribuinte individual e facultativo, o limite mínimo do salário de contribuição corresponde ao salário mínimo, sendo que, caso o montante total da remuneração mensal recebida seja inferior a este limite, cabe ao segurado recolher diretamente a complementação da contribuição incidente sobre a diferença entre o limite mínimo do salário de contribuição e a remuneração total por ele auferida, aplicando sobre esta parcela complementar a alíquota de 20%.
5. Dessarte, tal período não pode ser considerado devido à ausência de recolhimento da complementação da respectiva contribuição, estando ausente a condição de segurado.
6. Ao contrário do segurado empregado, no caso do contribuinte individual o exercício de atividade remunerada não é suficiente para o reconhecimento da sua qualidade de segurado, exigindo-se, para tanto, o efetivo recolhimento das contribuições previdenciárias, não sendo possível, ainda, que tais recolhimentos sejam efetuados após o falecimento.
7. Ausente a condição de segurado, não restou preenchido o requisito exigido para concessão da pensão por morte, razão pela qual a parte autora não faz jus ao recebimento do benefício.
(...)
(TRF-3ª; AC. n. 5283418-48.2019.4.03.9999; 10ª Turma; Rel. Des. Fed. Nelson Porfírio; j. 18.12.2019; e-DJF3 13.01.2020)
Insta acentuar que os recolhimentos efetuados pelos dependentes posteriormente ao óbito do Sr. Luciano Rogério Duarte não tem o condão de suprir a ausência da complementação dos valores de contribuição para fins de regularização da qualidade de segurado do de cujus.
Como bem salientado pela d. Relatora, admitiu-se por um período, em determinadas hipóteses, a possibilidade de recolhimento pelos dependentes relativamente a segurado instituidor que estivesse em débito de contribuições, conforme se verifica da redação do §2º do art. 282 da Instrução Normativa nº 11/2006, porém tal ato normativo foi alterado pela Instrução Normativa nº 15, de 15.03.2007, que deixou de prever essa forma de adimplemento de contribuições em atraso. Acrescente-se que em 10.10.2007, sobreveio a Instrução Normativa nº 20, que revogou a Instrução Normativa nº 11/2006, mantendo os termos da Instrução Normativa nº 15, de 15.03.2007, que estava em vigor à época do óbito.
Em síntese, evidencia-se no caso vertente violação literal à disposição de lei, justificando-se assim a desconstituição do julgado e, no âmbito do juízo rescisório, a decretação da improcedência do pedido, ante a falta da qualidade de segurado do de cujus.
Diante do exposto, acompanho integralmente o voto da i. Relatora.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. PRELIMINAR DE CARÊNCIA DA AÇÃO. VIOLAÇÃO DE LEI. PENSÃO POR MORTE. QUALIDADE DE SEGURADO DO DE CUJUS. FILIAÇÃO COMO CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS DO TOMADOR DE SERVIÇOS INFERIORES AO LIMITE MÍNIMO DO SALÁRIO DE CONTRIBUIÇÃO. COMPLEMENTAÇÕES. RECOLHIMENTOS EFETUADOS POST MORTEM.
- Rejeição da preliminar de carência de ação, ao argumento de que "o processo da decisão rescindenda já teve os alvarás expedidos e a parte já os recebeu". Há interesse processual na desconstituição do julgado que teria violado literal disposição de lei, concedendo benefício que segue sendo pago a quem não faz jus, segundo alega a autarquia.
- O CNIS juntado nos autos da ação originária traz a informação de que a inscrição do de cujus perante a Previdência Social deu-se em 22/02/2008, na condição de contribuinte individual (ocupação: pintor de letreiros)
- Com relação à prestação de serviços junto à Prefeitura de Cardoso, os dados do CNIS corroboram as informações fornecidas pela municipalidade, no sentido de que houve dois recolhimentos aos cofres da Previdência, referentes às competências de fevereiro/2008 e abril/2008.
- Os dependentes do falecido efetuaram três recolhimentos previdenciários, referentes às competências de 02/2008, 03/2008 e 04/2008, baseando-se nos limites máximos dos salários-de-contribuição vigentes, quais sejam, R$ 2.894,28 em fevereiro/2008 e R$ 3.038,99 a partir de março/2008.
- Cientes da necessidade de complementação, os dependentes agiram de modo temerário ao efetuá-la com base no limite máximo do salário-de-contribuição, com o intuito de obter benefício previdenciário de valor expressivo. Com efeito, a pensão por morte foi implantada com DIB em 24/06/2009 e data de início de pagamento (DIP) em 11/10/2010, com RMI de R$ 3.218,90; após, em fase de cumprimento de sentença, a RMI foi alterada para R$ 465,00 (salário mínimo), não havendo, ao que tudo indica, insurgência dos interessados.
- Os recolhimentos post mortem não correspondiam aos ganhos reais do falecido, conforme se depreende do depoimento pessoal da coautora Maria Graziela de Oliveira, colhido na ação subjacente: "Resido atualmente na Avenida Américo Marcos de Queiroz, Bairro Morumbi, nº 1326, Iturama/MG; convivi com o falecido Luciano e tive um filho com ele; morei com ele por quase 10 anos; o falecido era pintor e trabalhava para a Prefeitura (terceirizado); ele sofreu um acidente de moto; nessa época, ele estava trabalhando como pintor na Prefeitura, fazendo faixas; não estava registrado na Prefeitura, recebia por empreita; ele ganhava uns R$ 500,00, por mês, quando tinha serviço na Prefeitura; quando não tinha serviço de pintura, ele trabalhava na roça."
- De todo modo, o INSS não questiona especificamente os valores recolhidos, mas sim o fato de que se deram em 30/07/2008, após o óbito do Sr. Luciano, ocorrido em 28/05/2008.
- Legislação de regência quanto à arrecadação e recolhimento das contribuições: Lei 8.212/91, art. 21, caput e §2º, art. 30, I, alínea b, e com relação ao salário de contribuição: art. 28, III, §§3º e 5º, da mesma Lei.
- De acordo com o art. 4º da Lei 10.666/2003, a empresa é obrigada a arrecadar a contribuição do segurado contribuinte individual a seu serviço, descontando-a da respectiva remuneração, e a recolher o valor arrecadado juntamente com a contribuição a seu cargo.
- O art. 5º da referida lei, por sua vez, determina que: Art. 5º O contribuinte individual a que se refere o art. 4º é obrigado a complementar, diretamente, a contribuição até o valor mínimo mensal do salário-de-contribuição, quando as remunerações recebidas no mês, por serviços prestados a pessoas jurídicas, forem inferiores a este.
- Assim, não obstante a pessoa jurídica seja obrigada a fazer a retenção e o posterior recolhimento da contribuição - na condição de responsável tributária por substituição -, cabe ao contribuinte individual providenciar a complementação dos valores devidos à Previdência, observados os limites mínimo e máximo determinados pela lei.
- No caso, os valores mínimos dos salários-de-contribuição eram de R$ 380,00 em fevereiro/2008 e R$ 415,00 em abril/2008, conforme salários mínimos vigentes à época.
- Por óbvio, a falta de recolhimentos ou a eventual aplicação errônea da alíquota, por parte da pessoa jurídica, não podem prejudicar o trabalhador. Ocorre que, conforme certificado pela municipalidade, os valores efetivamente pagos a Luciano Rogério Duarte foram R$ 180,00 e R$ 145,00, inferiores aos limites mínimos, de modo que caberia ao interessado - e não ao empregador/tomador de serviços - o pagamento da diferença, nos termos do art. 5º da Lei 10.666/2003.
- À época do julgado rescindendo, a jurisprudência era consolidada, pela impossibilidade do recolhimento post mortem, em se tratando de contribuinte individual. Precedentes.
- A filiação é o vínculo que se estabelece entre o segurado e a Previdência Social, constituindo uma relação jurídica da qual decorrem direitos e obrigações para ambas as partes. Para o contribuinte individual, há a obrigação de recolhimento em valor que corresponda, ao menos, ao salário-de-contribuição que "corresponde ao piso salarial, legal ou normativo, da categoria ou, inexistindo este, ao salário mínimo", nos termos do art. 28, III, § 3º, da Lei 8.212/91, o que não se verifica no caso dos autos.
- Assim, não resta configurada a qualidade de segurado de Luciano Rogério Duarte.
- O julgado rescindendo, portanto, incorreu em violação aos arts. 28 e 30, I, alínea "b" da Lei 8.212/91, art. 5º da Lei 10.666/2003 e art. 74 da Lei 8.213/91. Rescisão do julgado com fundamento no art. 485, V, do CPC/1973.
- Em juízo rescisório, na ausência de um dos requisitos necessários à concessão da pensão por morte, qual seja, a qualidade de segurado do de cujus (art. 74 da Lei 8.213/91), é de rigor a improcedência do pedido.
- Condenação dos réus em honorários advocatícios fixados em R$1.000,00 (um mil reais), cuja exigibilidade fica suspensa, nos termos do art. 98, §3º, do CPC/2015, por serem beneficiários da assistência judiciária gratuita.
- Deferimento do pedido de tutela antecipada a fim de determinar a suspensão do pagamento do benefício de pensão por morte NB 152.378.631-8.
- Rejeição da preliminar. Ação rescisória que se julga procedente. Improcedência do pedido de pensão por morte formulado na ação subjacente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, Prosseguindo no julgamento, após a apresentação do voto-vista do Desembargador Federal SÉRGIO NASCIMENTO, a Terceira Seção, por unanimidade, decidiu rejeitar a preliminar de carência da ação, julgar procedente o pedido formulado nesta ação rescisória para rescindir o acórdão, com fundamento no art. 485, V, do CPC/1973, e, proferindo novo julgamento, julgar improcedente o pedido de pensão por morte, deferindo o pedido de tutela antecipada a fim de determinar a sua suspensão, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.