Processo
AR - AÇÃO RESCISÓRIA / SP
5001659-75.2016.4.03.0000
Relator(a)
Juiz Federal Convocado NILSON MARTINS LOPES JUNIOR
Órgão Julgador
3ª Seção
Data do Julgamento
02/03/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 04/03/2020
Ementa
E M E N T A
AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR
INVALIDEZ. VIOLAÇÃO. MANIFESTA NORMA JURÍDICA E ERRO DE FATO NÃO
CONFIGURADOS. DOCUMENTOS NOVOS NÃO ALTERAM JULGAMENTO. REANÁLISE DO
CONJUNTO PROBATÓRIO. IMPROCEDÊNCIA.
1. Rejeitada preliminar de necessidade de prévio requerimento administrativo, vez que as
impugnações do INSS, em sede de contestação na lide originária, (ajuizada em 23/09/2010) e
nesta ação rescisória, caracterizam o interesse em agir pela resistência à pretensão.
2. Para a configuração da rescisão com fundamento em violação manifesta à norma jurídica, o
julgado impugnado deve violar, de maneira flagrante, preceito legal de sentido unívoco e
incontroverso.
3. O entendimento adotado pelo julgado rescindendo não desborda do razoável, tendo em vista
que entendeu pela perda da qualidade de segurada da parte autora. Conclui-se que o julgado
apenas deu aplicação aos preceitos tidos por violados, e o fez com base nas provas dos autos e
com suporte no princípio do livre convencimento motivado, não havendo força suficiente para a
alegação de violação à manifesta norma jurídica.
4. O artigo 966, VII, do novo CPC trata do cabimento da ação rescisória quando a parte autora,
depois do trânsito em julgado, obtiver prova nova, capaz de por si só alterar o resultado da
decisão que se pretende rescindir, o que não ocorreu no presente feito.
5. A desconstituição da coisa julgada com fundamento em erro de fato exige a verificação de sua
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
efetiva ocorrência, no conceito estabelecido pelo próprio legislador.
6. O julgador apreciou todos os elementos probatórios, em especial os documentos carreados
aos autos, tendo se pronunciado, quanto ao cumprimento dos requisitos para a concessão do
benefício postulado e concluído pela perda da qualidade de segurada da autora.
7. Ação rescisória não é via apropriada para corrigir eventual injustiça decorrente de equivocada
valoração da prova, não se prestando, enfim, à simples rediscussão da lide, sem que qualquer
das questões tenha deixado de ser apreciada na demanda originária.
8. Condenação da parte autora em honorários advocatícios fixados em R$1.000,00 (mil reais),
cuja exigibilidade fica suspensa, nos termos do art. 98, §3º, do CPC/2015, por ser beneficiária da
assistência judiciária gratuita, conforme entendimento majoritário da 3ª Seção desta Corte.
9. Matéria preliminar rejeitada. Rescisória improcedente.
Acórdao
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5001659-75.2016.4.03.0000
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
AUTOR: MARIA CAROLINA DE QUEIROZ
Advogado do(a) AUTOR: JOSE CARLOS GOMES PEREIRA MARQUES CARVALHEIRA -
SP139855-N
RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5001659-75.2016.4.03.0000
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
AUTOR: MARIA CAROLINA DE QUEIROZ
Advogado do(a) AUTOR: JOSE CARLOS GOMES PEREIRA MARQUES CARVALHEIRA -
SP139855-N
RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação rescisória ajuizada por Maria Carolina de Queiroz em face do Instituto Nacional
do Seguro Social, com fundamento no artigo 966, incisos V, VII e VIII, do CPC, visando
desconstituir acórdão que, ao manter decisão monocrática, reformou a r. sentença para julgar
improcedente o pedido de invalidez para trabalhadora rural.
Alega a parte autora que o decisum em questão deve ser rescindido, uma vez que reformou a
sentença e julgou improcedente o pedido formulado na inicial, sob o fundamento da ausência de
qualidade de segurado, uma vez que a autora demorou 10 (dez) anos para formular o pedido de
concessão do benefício. Afirma que incorreu em erro de fato, pois a “parte autora juntou farto
início de prova material e quando encontrava-se inválida para o trabalho, mantinha sim a
qualidade de segurada especial”, bem como houve violação aos artigos 39, inciso I, 42, e 55 §3º
da Lei nº 8.213/91, pois “o fato de não ter ingressado com a ação judicial, logo após o
aparecimento dos males incapacitantes, de forma alguma pode ensejar a perda da qualidade de
segurada”. Aduz apresentar prova nova preexistente à propositura da ação originária, aptaa
constituirinício razoável de prova suficiente da atividade rurícola da autora. Requer a rescisão do
julgado e a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez de trabalhadora rural.
Os benefícios da justiça gratuita foram concedidos e, regularmente citado, o INSS apresentou
contestação (id 444718) alegando, preliminarmente, falta de interesse de agir pela necessidade
de requerimento administrativo. No mérito, sustenta que a autora, ao pleitear o benefício, já havia
perdido a qualidade de segurada da previdência social. Ressalta a contradição no laudo pericial e
documentos apresentados pela parte autora, requerendo a improcedência da ação.
A parte autora apresentou alegações finais (id 6496023), assim como o INSS (id 6536644).
O Ministério Público Federal opinou pelo regular processamento do feito (id 7171356).
É o relatório.
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5001659-75.2016.4.03.0000
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
AUTOR: MARIA CAROLINA DE QUEIROZ
Advogado do(a) AUTOR: JOSE CARLOS GOMES PEREIRA MARQUES CARVALHEIRA -
SP139855-N
RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Verifico que foi obedecido o prazo de dois anos estabelecido pelo artigo 975 do NCPC, uma vez
que ajuizada a ação rescisória em 19/09/2016 e o trânsito em julgado se deu 21/03/2016 (id
231048 – fl. 82).
Rejeito a argumentação preliminar de necessidade de prévio requerimento administrativo, vez
que as impugnações do INSS, em sede de contestação na lide originária(ajuizada em
23/09/2010) e nesta ação rescisória, caracterizam o interesse em agir pela resistência à
pretensão, conforme entendimento adotado pelo Colendo Supremo Tribunal Federal, nos autos
do Recurso Extraordinário RE 631.240/MG, com repercussão geral reconhecida: "6 (...); (ii) caso
o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela
resistência à pretensão;" (STF, RE 631240/MG, rel. Min. Roberto Barroso, Pleno, j. 03/09/2014,
DJe-220, DIVULG. 07/11/2014, PUBLIC. 10/11/2014).
Pretende a parte autora a rescisão de acórdão proferido nos autos da ação nº
2012.03.99.018285-0, sob o fundamento de violação manifesta a norma jurídica, prova nova e
erro de fato,nos termos do artigo 966, incisos V, VII e VIII, do CPC.
A autora, nascida em 23/12/1929, ajuizou ação ordinária, em 24/05/2012, postulando a
concessão de aposentadoria por invalidez, auxílio acidente ou auxílio doença, alegando laborar
como boia-fria na lavoura “até pouco tempo atrás”, tendo parado de trabalhar em virtude de
problemas de saúde (hipertensão essencial - primária – cid I10; diabetes mellitus não insulino
dependente – E11; artrose do joelho M17). Não houve requerimento administrativo.
Para comprovar a sua incapacidade laborativa juntou laudo médico (id 2310103 – fl. 38)
atestando que a autora “é acompanhada ambulatorialmente por (CID10 – I10, E11, M17-0),
necessitando tratamento contínuo e sem previsão de alta, estando incapacitada para atividades
laborativas rurais”, datado de 01/06/2010.
O exame pericial, realizado em 15/03/2011, concluiu pela incapacidade total e permanente da
parte autora (id 231023 – fl. 36/56). No tocante ao período de início da incapacidade, afirmou
“este Medico Perito conclui que a Autora se apresentava com a mesma incapacidade encontrada
na data do ajuizamento da presente Ação, visto que as patologias incapacitantes alegadas na
inicial do feito são as mesmas constatadas por este Medico Perito na data do exame pericial”.
Dado o caráter excepcional de que se reveste a ação rescisória, para a configuração da hipótese
de rescisão com fundamento em violação manifesta à norma jurídica, é certo que o julgado
impugnado deve violar, de maneira flagrante, preceito legal de sentido unívoco e incontroverso.
Sobre o tema, anota Theotonio Negrão:
"Art. 485: 20. 'Para que a ação rescisória fundada no art. 485, V, do CPC prospere, é necessário
que a interpretação dada pelo 'decisum' rescindendo seja de tal modo aberrante que viole o
dispositivo legal em sua literalidade. Se, ao contrário, o acórdão rescindendo elege uma dentre as
interpretações cabíveis, ainda que não seja a melhor, a ação rescisória não merece vingar, sob
pena de tornar-se recurso ordinário com prazo de interposição de dois anos' (RSTJ 93/416. no
mesmo sentido: RT 634/93." (Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor. São
Paulo: Saraiva, 44ª edição, 2012, p. 600).
Os requisitos para a concessão da aposentadoria por invalidez, de acordo com o artigo 42, caput
e § 2.º, da Lei n.º 8.213/91, são os que seguem: 1) qualidade de segurado; 2) cumprimento da
carência, quando for o caso; 3) incapacidade insuscetível de reabilitação para o exercício de
atividade que garanta a subsistência; 4) não serem a doença ou a lesão existentes antes da
filiação à Previdência Social, salvo se a incapacidade sobrevier por motivo de agravamento
daquelas.
Para a solução da lide, ainda, é de substancial importância a prova técnica produzida. Neste
passo, o laudo pericial, atestou que a autora, de 82/83 anos de idade à época, era portadora de
hipertensão arterial, diabetes mellitus e osteoartrose, concluindo por sua incapacidade total e
permanente.
A r. sentença julgou procedente o pedido, sendo reformada em grau de recurso de apelação do
INSS, nos seguintes termos:
“Não obstante o laudo pericial favorável às alegações contidas na peça de ingresso, com
incapacidade laborativa total e permanente fixada em 23.09.2011 (data do ajuizamento da ação -
fl. 101), a qualidade de segurada do RGPS não foi comprovada nos autos.
Outrossim, a autora informou que a paralisação das atividades laborativas, devido a
sintomatologia dos males descritos, ocorreu dez anos antes da realização da data da perícia
médica, que se deu em 15.03.2011 (fls. 96 e 114).
Destarte, não é crível que somente após uma década entre a suspensão do trabalho rural e o
ajuizamento da ação, a autora busque a proteção jurisdicional para obtenção da aposentadoria
por invalidez, haja vista a natureza alimentar do referido benefício que se justifica por ocorrência
de impossibilidade de consecução de atividades profissionais em razão de problemas
relacionados à saúde.
Com efeito, o que se verifica, é a perda da qualidade de segurada do RGPS, pois se presume
que uma pessoa doente, que não possa garantir a própria subsistência, busque a tutela
jurisdicional tão logo necessite do valor pago pelo INSS a título de sobrevivência, o que só foi
feito dez anos após a instalação das doenças, destacando-se que o laudo pericial somente fixou
o início da incapacidade a partir do ajuizamento da ação.
Demais disso, não se admite a contradição constatada entre as informações prestadas pela
própria autora e os depoentes ouvidos em Juízo, que narraram a paralisação das atividades da
requerente a partir de dois anos anteriores à audiência de instrução (fls. 124/125).
Desse modo, há provas de exercício rurícola, mas patente a perda da filiação à Previdência
Social pelo longo lapso temporal decorrido entre a paralisação das atividades laborativas e o
ajuizamento da presente lide.
Em vista das razões expostas, a parte autora não preencheu um dos requisitos legais
necessários para concessão de aposentadoria por invalidez.”
O entendimento adotado pelo julgado rescindendo não desborda do razoável, tendo em vista que
entendeu pela perda da qualidade de segurada da parte autora. Assentou que, da prova
produzida no feito originário, comprovou-se que a autora foi trabalhadora rural em período
anterior, apresentando início de prova material até o ano de 1999, data do óbito do seu marido,
quando então possuía 70 (setenta) anos. Entretanto, paralisou as atividades e, mais de dez anos
depois, as doenças se instalaram, tornando-a inválida, mas quando já não mais detinha a
qualidade de segurada da previdência social capaz de lhe conferir a aposentadoria por invalidez.
Ressalto que o período de trabalho como rural poderia lhe conferir outra espécie de
aposentadoria, mas não como carência para a aposentadoria por invalidez.
Conclui-se que o julgado apenas deu aplicação aos preceitos tidos por violados, e o fez com base
nas provas dos autos e com suporte no princípio do livre convencimento motivado, não havendo
força suficiente para a alegação de violação à manifesta norma jurídica.
Por sua vez, não se presta a rescisória ao rejulgamento do feito, como ocorre na apreciação dos
recursos, ou uma nova oportunidade para a complementação das provas.
Nesse sentido já se pronunciou esta E. Terceira Seção. Confira-se:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA . ART. 485, INCISOS V E IX DO
CPC/1973. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL QUANTO À
ALEGAÇÃO DE ERRO DE FATO. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI NÃO
CONFIGURADA. AÇÃO RESCISÓRIA QUE SE JULGA IMPROCEDENTE.
(...)5) Ação rescisória é julgamento de julgamento. Seu objetivo não é rescindir qualquer julgado,
mas somente aquele que incida numa das específicas hipóteses do art. 485 do CPC/1973 (art.
966 do CPC/2015), autorizando-se, a partir da rescisão e nos seus limites, a análise do mérito da
pretensão posta na lide originária.
6) Em sua análise, que teve como base o conjunto probatório que se formou nos autos da ação
subjacente, o órgão julgador considerou que a incapacidade, que restou comprovada por meio de
laudo médico, teve início antes do reingresso da autora ao RGPS.
7) O entendimento não desborda do razoável , tendo em vista que o laudo médico, datado de
setembro de 2012, indicou que a periciada, qualificada como doméstica, apresenta "bradicardia
sinusal tratada com marcapasso definitivo, diabetes, dislipidemia, hipertensão, espondiloartrose
lombar", quadro surgido "há 02 anos, com idade de 57 anos". Embora o perito tenha fixado o
termo inicial da incapacidade em janeiro de 2011 e o retorno ao RGPS tenha ocorrido antes, em
agosto de 2010, no entender do colegiado, o longo tempo de afastamento do regime contributivo
(cerca de quinze anos) e o súbito retorno, aos 57 anos, associados às enfermidades que
acometem a requerente, permitem concluir pela incapacidade preexistente à refiliação.
8) Não há que se falar em violação de lei, pois o juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo
formar a sua convicção com outros elementos ou fatos provados nos autos, conforme disposto no
art. 436 do CPC/1973, vigente à época do julgado rescindendo.
9) Ainda que se considere que a autora estava incapacitada desde janeiro de 2011 (após a
refiliação), conforme consta do laudo judicial - não impugnado pelas partes -, não houve o
cumprimento do período de carência mínima de doze contribuições mensais, nos termos dos arts.
24 e 25, I, da Lei 8.213/91.
10) Quanto à alegação de que exercia atividade rural, na condição de bóia-fria/diarista, até o
início do ano de 2010, estando "isenta de efetuar recolhimentos", cuida-se de matéria que não foi
objeto da decisão rescindenda. Tampouco foi abordada em razões de apelação. Descabe,
portanto, a sua análise em sede de ação rescisória .
11) Não há ilegalidade na decisão que, à luz do princípio do livre convencimento motivado, e
adotando uma das soluções possíveis, concluiu pela ausência dos requisitos necessários à
concessão do benefício pleiteado. Não se verifica dissenso à época do julgado acerca da matéria
debatida, motivo pelo qual não há que se falar em incidência da Súmula 343/STF.
12) Condenação da autora ao pagamento de honorários advocatícios fixados em R$1.000,00 (um
mil reais), cuja exigibilidade fica suspensa, nos termos do art. 98, §3º, do CPC/2015, por ser
beneficiária da justiça gratuita.
13) Extinção do feito sem apreciação do mérito em relação ao pleito de rescisão por erro de fato.
Ação rescisória que se julga improcedente.
(AR 2016.03.00.009812-1, Relator Desembargadora Federal Marisa Santos, v.u., j. em
11/10/2018; D.E. 24/10/2018)
Dessa forma, é incabível a rescisão do julgado pela hipótese prevista no art. 966, incisos V, do
CPC/15.
Por outro lado, da transcrição do julgado rescindendo, conclui-se que houve a análise das provas
trazidas aos autos, todavia consideraram-nas insuficientes a comprovar o exercício de atividade
rural no momento da incapacidade, fixada pelo perito na data do ajuizamento da ação
(23/09/2011). Os documentos trazidos a comprovar a atividade rural são em nome do marido da
autora, até a data de seu óbito (16/10/1999 – id 231013 – fl. 29), sendo que a autora afirmou ter
parado de trabalhar em meados de 2001 e a prova testemunhal se mostrou frágil e contraditória a
corroborar o labor até o momento da incapacidade.
Não se configura, desta forma, a hipótese prevista no artigo 966, inciso VIII, do CPC, já que para
a verificação do "erro de fato", a ensejar a rescisão do julgado, é necessário que este tenha
admitido fato inexistente ou considerado inexistente fato efetivamente ocorrido, bem como não
tenha ocorrido controvérsia ou pronunciamento judicial sobre o fato.
Nas palavras do eminente processualista Cassio Scarpinella Bueno: "O erro de fato não autoriza
a rescisão da sentença e o proferimento de nova decisão por má avaliação da prova ou da
matéria controvertida em julgamento. Não se trata de uma "nova chance" para rejulgamento da
causa. Muito diferentemente, o erro de fato que autoriza a ação rescisória é o que se verifica
quando a decisão leva em consideração fato inexistente nos autos ou desconsidera fato
inconteste nos autos. Erro de fato se dá, por outras palavras, quando existe nos autos elemento
capaz, por si só, de modificar o resultado do julgamento, embora ele não tenha sido considerado
quando do seu proferimento ou, inversamente, quando leva-se em consideração elemento
bastante para julgamento que não consta dos autos do processo" (in Código de Processo Civil
Interpretado. Coordenador Antonio Carlos Marcato. São Paulo: Atlas, 2004, p. 1480).
Sobre o tema, já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça nos seguintes termos:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. ERRO DE FATO.
AUSÊNCIA. RURÍCOLA. APOSENTADORIA POR IDADE. PROVA. VALORAÇÃO.
I - Ausência de erro de fato no julgado a ensejar propositura de ação rescisória, tendo em vista
que todas as provas juntadas aos autos foram valoradas.
II - A concessão de benefício previdenciário a rurícola depende de razoável comprovação
documental da atividade laborativa rural. Súmula 149-STJ.
III - Recurso não conhecido." (REsp nº 268.506/DF, Relator Ministro GILSON DIPP, j. 04/10/2001,
DJ 05/11/2001, p. 130).
Confira-se, ainda, o entendimento adotado à unanimidade pela Terceira Seção desta Corte
Regional:
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. CARÊNCIA DE
AÇÃO. MATÉRIA PRELIMINAR REJEITADA. INEXISTÊNCIA DE INCAPACIDADE PARA O
TRABALHO. VIOLAÇÃO À LITERAL DISPOSITIVO DE LEI. ARTIGOS 42 E 59 DA LEI N.
8.213/91. INTERPRETAÇÃO PLAUSÍVEL. ERRO DE FATO. INOCORRÊNCIA. JUSTIÇA
GRATUITA.
(...) IV - A r. decisão rescindenda, sopesando as provas constantes dos autos, notadamente o
laudo médico judicial, esposou o entendimento no sentido de que a parte autora não está
incapacitada para o labor, não fazendo jus ao benefício de incapacidade vindicado.
V - A interpretação dada pela r. decisão rescindenda, calcada no laudo médico judicial, mostra-se
condizente com os preceitos insertos nos artigos 42 e 59 da Lei n. 8.213/91, que condicionam a
concessão dos respectivos benefícios de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença à
constatação da incapacidade da segurada requerente ao trabalho.
VI - A r. decisão rescindenda estribou-se no laudo médico judicial elaborado em 12.03.2008, que
atestou encontrar-se a autora em um quadro caracterizado pela tristeza, apatia e desinteresse,
não evidenciando, contudo, ser portadora de doença mental ou desenvolvimento mental
incompleto ou retardado que tivesse o condão de incapacitá-la para o trabalho e para os demais
atos da vida civil.
VII - O referido laudo médico judicial foi elaborado por médico Especialista em Psiquiatria Forense
e Geral e Médico do Trabalho, profissional este de confiança do Juízo e equidistante das partes,
concluindo de maneira cabal pela ausência de incapacidade laboral da autora no momento da
perícia.
VIII - Não se admitiu um fato inexistente ou se considerou inexistente um fato efetivamente
ocorrido, pois houve controvérsia entre as partes no tocante à presença ou não de enfermidades
incapacitantes, bem como pronunciamento judicial explícito sobre o tema.
IX - Tendo em vista a autora tratar-se de beneficiária da Justiça Gratuita, não há ônus de
sucumbência a suportar.
X - Preliminar rejeitada. Ação rescisória cujo pedido se julga improcedente.
(TRF 3ª Região, TERCEIRA SEÇÃO, AR - AÇÃO RESCISÓRIA - 8753 - 0016676-
81.2012.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL SERGIO NASCIMENTO, julgado em
13/02/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:26/02/2014)
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO LITERAL À DISPOSITIVO
DE LEI (ART. 59, LEI 8.213/91). ERRO DE FATO. VALORAÇÃO DE PROVA. CONTROVÉRSIA
ENTRE AS PARTES. PRONUNCIAMENTO JUDICIAL SOBRE O FATO. LIVRE
CONVENCIMENTO MOTIVADO. RAZOABILIDADE. SOLUÇÃO JURÍDICA ADMISSÍVEL.
PARÂMETROS LEGAIS E JURISPRUDENCIAIS DE ÉPOCA. APOSENTADORIA POR
INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE LABORATIVA. ADOÇÃO DAS CONCLUSÕES
PERICIAIS. MATÉRIA NÃO ADSTRITA À CONTROVÉRSIA MERAMENTE JURÍDICA.
AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE INFIRMEM O PARECER DO EXPERTO. IUDICIUM
RESCINDENS. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. VERBA HONORÁRIA. CONDENAÇÃO.
(...) 5. Tem-se por inexistente o alegado erro de fato, seja em decorrência da controvérsia entre
as partes quanto à suposta incapacidade laborativa do autor, seja porque houve pronunciamento
judicial expresso sobre o fato, não tendo sido reconhecido o direito ao benefício uma vez que o
perito médico judicial afirmou a inexistência de incapacidade laborativa, independentemente de
ter anotado a profissão de pedreiro do autor, tendo reconhecido apenas a existência de limitação
para "tarefas onde seja necessário manter o ombro elevado acima da linha média por longos
períodos". Anota-se que, em perícia médica realizada no âmbito desta ação rescisória, veio a ser
constatada incapacidade laborativa total e temporária cujo termo inicial foi fixado após a data da
realização do exame médico-pericial realizado na demanda subjacente.
6. Da mesma forma que o juízo não está adstrito ao laudo pericial, ante o princípio do livre
convencimento motivado e o disposto nos artigos 436 do CPC/1973 e 479 do CPC/2015, a não
adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia
meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário
e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros
documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante
o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juízo o
destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame.
Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE:
26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
7. Ressalte-se que os benefícios previdenciários por incapacidade são concedidos ou indeferidos
rebus sic stantibus, ou seja, conforme a situação no momento da decisão. Com efeito, o próprio
legislador estabeleceu a necessidade de perícias periódicas tendo em vista que a incapacidade
laborativa, por sua própria essência, pode ser suscetível de alteração com o decurso do tempo.
Assim, a decisão judicial exarada se mantém íntegra enquanto perdurarem as condições aferidas
ao tempo da sua prolação, revelando-se a excepcionalidade de rescisão de julgados revestidos
da característica rebus sic stantibus. Em caso de alteração da situação jurídica ou fática, inclusive
por meio de novas provas, os pedidos podem ser renovados na esfera administrativa e/ou judicial.
8. No caso concreto, verifica-se que o conjunto probatório formado nos autos da demanda
subjacente foi apreciado e valorado pelo Juízo originário, que, com base em afirmação do perito
médico sobre a inexistência de incapacidade laborativa, e segundo seu livre convencimento, de
forma motivada e razoável, adotou uma solução jurídica, dentre outras, admissível, não se
afastando dos parâmetros legais e jurisprudenciais que existiam à época.
9. A ação rescisória não é meio adequado para corrigir eventuais interpretações equivocadas de
provas, erros de julgamento ou injustiças da decisão rescindenda, justamente porque não se trata
de sucedâneo recursal.
(...)
(TRF 3ª Região, TERCEIRA SEÇÃO, AR - AÇÃO RESCISÓRIA - 8523 - 0000801-
71.2012.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO, julgado em
24/05/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/06/2018 )
Outrossim, o artigo 966, VII, do novo CPC trata do cabimento da ação rescisória quando a parte
autora, depois do trânsito em julgado, obtiver prova nova, capaz de por si só alterar o resultado
da decisão que se pretende rescindir. A prova nova é aquela que não foi apresentada no feito
originário e cuja existência era ignorada pelo autor da ação rescisória ou de que não pode fazer
uso por motivo estranho à sua vontade. Deve ainda o documento/prova referir-se a fatos
alegados no processo original.
Nas palavras do eminente processualista Vicente Grecco Filho: "O documento novo não quer
dizer produzido após a sentença, mas documento até então desconhecido ou de utilização
impossível. A impossibilidade de utilização deve ser causada por circunstâncias alheias à vontade
do autor da rescisória. A negligência não justifica o seu não-uso na ação anterior. Aliás, esta
última situação é de ocorrência comum. A parte (ou o advogado) negligencia na pesquisa de
documentos, que muitas vezes estão à sua disposição em repartições públicas ou cartórios. Essa
omissão não propicia a rescisão, mesmo que a culpa seja do advogado e não da parte. A esta
cabe ação de perdas e danos, eventualmente. Como no inciso anterior, o documento novo deve
ser suficiente para alterar o julgamento, ao menos em parte, senão a sentença se mantém."
(Direito Processual Civil Brasileiro. 2º v., São Paulo: Saraiva, 1996, p. 426).
Os documentos trazidos como novos pela parte autora (Certidões de Nascimento de outros filhos
em que consta o marido como lavrador) são do mesmo período daqueles juntados na ação
subjacente, assim como a Certidão de Casamento do filho João Batista de Queiroz. A certidão de
casamento do filho Pedro Modesto Queiroz, ocorrido em 21/09/2013, não se refere ao período
que se pretende comprovar a qualidade de segurada.
Da mesma forma, a informação de recebimento do benefício de pensão por morte rural pela parte
autora, a partir de 17/10/1999, já constava dos autos da ação originária.
Portanto, no que se refere à documentação trazida como nova, mesmo que tivessem sido
juntados ao feito subjacente, não seriam capazes, por si sós, de garantir um pronunciamento
judicial favorável.
Diante do exposto, REJEITO A MATÉRIA PRELIMINAR E JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO
formulado na presente ação rescisória, nos termos da fundamentação acima.
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios que fixo em R$1.000,00 (mil
reais), cuja exigibilidade fica suspensa, nos termos do art. 98, §3º, do CPC/2015, por ser
beneficiária da assistência judiciária gratuita, conforme entendimento majoritário da 3ª Seção
desta Corte.
É o voto.
E M E N T A
AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR
INVALIDEZ. VIOLAÇÃO. MANIFESTA NORMA JURÍDICA E ERRO DE FATO NÃO
CONFIGURADOS. DOCUMENTOS NOVOS NÃO ALTERAM JULGAMENTO. REANÁLISE DO
CONJUNTO PROBATÓRIO. IMPROCEDÊNCIA.
1. Rejeitada preliminar de necessidade de prévio requerimento administrativo, vez que as
impugnações do INSS, em sede de contestação na lide originária, (ajuizada em 23/09/2010) e
nesta ação rescisória, caracterizam o interesse em agir pela resistência à pretensão.
2. Para a configuração da rescisão com fundamento em violação manifesta à norma jurídica, o
julgado impugnado deve violar, de maneira flagrante, preceito legal de sentido unívoco e
incontroverso.
3. O entendimento adotado pelo julgado rescindendo não desborda do razoável, tendo em vista
que entendeu pela perda da qualidade de segurada da parte autora. Conclui-se que o julgado
apenas deu aplicação aos preceitos tidos por violados, e o fez com base nas provas dos autos e
com suporte no princípio do livre convencimento motivado, não havendo força suficiente para a
alegação de violação à manifesta norma jurídica.
4. O artigo 966, VII, do novo CPC trata do cabimento da ação rescisória quando a parte autora,
depois do trânsito em julgado, obtiver prova nova, capaz de por si só alterar o resultado da
decisão que se pretende rescindir, o que não ocorreu no presente feito.
5. A desconstituição da coisa julgada com fundamento em erro de fato exige a verificação de sua
efetiva ocorrência, no conceito estabelecido pelo próprio legislador.
6. O julgador apreciou todos os elementos probatórios, em especial os documentos carreados
aos autos, tendo se pronunciado, quanto ao cumprimento dos requisitos para a concessão do
benefício postulado e concluído pela perda da qualidade de segurada da autora.
7. Ação rescisória não é via apropriada para corrigir eventual injustiça decorrente de equivocada
valoração da prova, não se prestando, enfim, à simples rediscussão da lide, sem que qualquer
das questões tenha deixado de ser apreciada na demanda originária.
8. Condenação da parte autora em honorários advocatícios fixados em R$1.000,00 (mil reais),
cuja exigibilidade fica suspensa, nos termos do art. 98, §3º, do CPC/2015, por ser beneficiária da
assistência judiciária gratuita, conforme entendimento majoritário da 3ª Seção desta Corte.
9. Matéria preliminar rejeitada. Rescisória improcedente. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Seção, por
unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar e julgar improcedente a ação rescisória , nos
termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
