Processo
AR - AÇÃO RESCISÓRIA / SP
5032681-49.2019.4.03.0000
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA
Órgão Julgador
3ª Seção
Data do Julgamento
14/09/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 17/09/2020
Ementa
E M E N T A
AÇÃO RESCISÓRIA. PROCESSUAL CIVIL. ART. 966, V, DO CPC. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO
DOENÇA E APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA
REFORMADA EM SEDE DE APELAÇÃO. ACOLHIMENTO DA ALEGAÇÃO DE
PREEXISTÊNCIA DA INCAPACIDADE DO SEGURADO. AUSÊNCIA APRECIAÇÃO DO
PEDIDO SUBSIDIÁRIO DE RECONHECIMENTO DA CONDIÇÃO DE SEGURADO NA DATA DO
INÍCIO DA INCAPACIDADE. CONFIGURAÇÃO DO VÍCIO DE JULGAMENTO CITRA PETITA.
DECISÃO RESCINDIDA. NOVO JULGAMENTO DA CAUSA. SATISFAÇÃO DOS REQUISITOS
NECESSÁRIOS AO BENEFÍCIO. SENTENÇA SUBJACENTE PARCIALMENTE REFORMADA.
1. As preliminares de carência da ação e de incidência do enunciado de Súmula n° 343/STF
confundem-se com o mérito, âmbito em que devem ser analisadas.
2. Restou configurado o vício de julgamento citra petita, na medida em que o acórdão
rescindendo, ao reformar a sentença de primeira instância, julgando improcedente o pedido
principal de restabelecimento do auxílio doença e concessão de aposentadoria por invalidez,
deixou de apreciar o pedido subsidiário de reconhecimento daqualidade de segurado no mês de
junho de 2004,época apontada pela autarquia previdenciária comodata deinício da incapacidade
(DII), com base no vínculo empregatício iniciado no mês de janeiro do mesmo ano.
3. A incapacidade do autor foi demonstrada, tendo sido reconhecida no âmbito administrativo e
em juízo, além de estar largamente comprovada nos autos, tornando-se incontroversa.
4. No que tange à qualidade de segurado, como bem salientado no parecer ofertado pelo
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Ministério Público Federal, "a documentação juntada ao feito originário comprova que, antes da
primeira internação (tida como início da incapacidade pelo próprio INSS) o autor já residia na
chácara de Neusa Olivieri e trabalhava como caseiro". Ademais, na data do requerimento, em
31/01/2011, o autor estava qualificado como segurado obrigatório, na condição de empregado
doméstico.
5. Preenchidos os requisitos, é de se reconhecer o direito do autor ao restabelecimento do
benefício de auxílio doença desde a cessação indevida, e à sua conversão em aposentadoria por
invalidez a partir da citação nos autos originários, pois indiscutível a falta de capacitação e de
oportunidades de reabilitação para a assunção de outras atividades, sendo possível afirmar que
se encontra sem condições de reingressar no mercado de trabalho.
6. Matéria preliminar rejeitada. Pedido de rescisão do julgado procedente e pedido originário
parcialmente procedente.
Acórdao
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5032681-49.2019.4.03.0000
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
AUTOR: JOSE FLAVIO QUADROS
Advogado do(a) AUTOR: MILENE SPAGNOL SECHINATO - SP288829
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5032681-49.2019.4.03.0000
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
AUTOR: JOSE FLAVIO QUADROS
Advogado do(a) AUTOR: MILENE SPAGNOL SECHINATO - SP288829
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação rescisória proposta com fundamento no Art. 966, V, do Código de Processo
Civil, em que se objetiva a desconstituição do v. acórdão proferido nos autos da apelação cível nº
0001898-10.2015.4.03.6109, que deu provimento parcial à apelação interposta pelo INSS para
reformar a sentença e julgar improcedente o pedido de restabelecimento de auxílio doença e
concessão de aposentadoria por invalidez, reconhecendo a preexistência da incapacidade do
autor e declarando, ainda, a inexigibilidade do débito referente ao auxílio doença recebido no
período de 15/01/2011 a 09/07/2014.
O acórdão rescindendo, reproduzido no documento Id 104917482/01-09, foi assim ementado:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE PREEXISTENTE À
REFILIAÇÃO. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ. INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO.
- Pedido de restabelecimento de auxílio-doença e posterior conversão em aposentadoria por
invalidez, com pedido subsidiário de declaração de inexigibilidade de débito.
- Extrato do CNIS informa vínculos empregatícios em nome do autor, sendo o último de
01/10/1989 a 31/10/1997. Consta, ainda, o recolhimento de contribuições previdenciárias, de
11/1997 a 04/1998, de 07/2004 a 04/2008 e de 06/2008 a 01/2011. Por fim, há a informação de
que houve concessão de auxílio-doença, de 15/01/2011 a 09/07/2014.
- Foi juntado ofício enviado pelo INSS ao segurado, informando que houve revisão do benefício
de auxílio-doença, com a alteração da data de início da incapacidade (DII) para 20/06/2004, o que
resultou na cessação do benefício por preexistência da incapacidade.
- O laudo atesta que a parte autora apresenta insuficiência renal e realiza hemodiálise desde
2004. Conclui pela existência de incapacidade total e permanente para o trabalho, pelo menos
desde julho de 2004, quando iniciou a hemodiálise, quatro vezes por semana. Afirma, ainda, que
a nefropatia grave já existia há anos, até chegar à insuficiência renal completa e necessitar
hemodiálise.
- Verifica-se dos documentos apresentados que a parte autora esteve vinculada ao Regime Geral
de Previdência Social por mais de 12 (doze) meses. Recolheu contribuições até 04/1998, deixou
de contribuir por longo período e voltou a filiar-se à Previdência Social, recolhendo contribuições a
partir de 07/2004.
- Entretanto, o conjunto probatório revela o surgimento da enfermidade incapacitante, desde
antes do seu reingresso ao sistema previdenciário.
- Neste caso, o perito informa que a incapacidade já existia ao menos desde julho de 2004, data
do reinício dos recolhimentos. Portanto, é possível concluir que a incapacidade já existia antes
mesmo da sua refiliação junto à Previdência Social e, ainda, não restou demonstrado que o
quadro apresentado progrediu ou agravou-se, após seu reingresso no RGPS, o que afasta a
concessão dos benefícios pleiteados, nos termos dos artigos 42, § 2º, e 59, parágrafo único, da
Lei nº 8.213/91.
- Por outro lado, há nos autos pedido de declaração de inexigibilidade de débito, no valor de R$
46.213,91, referente ao pagamento de auxílio-doença recebido no período de 15/01/2011 a
09/07/2014.
- Entendo indevida a devolução dos valores recebidos de boa-fé pelo segurado, notadamente em
razão da natureza alimentar dos benefícios previdenciários. Enfatizo que não há notícia nos autos
de que a parte autora tenha agido em fraude ou má-fé a fim de influenciar as decisões
equivocadas da administração.
- Nesse diapasão, cumpre observar que o C. STJ firmou entendimento de que, demonstrado o
recebimento de boa-fé pelo segurado ou beneficiário, não são passíveis de devolução os valores
recebidos a título de benefício previdenciário, posto que se destinam à sua própria sobrevivência,
circunstância que o reveste de nítido caráter alimentar.
- Reexame necessário não conhecido. Apelação parcialmente provida. Tutela antecipada
cassada."
Os embargos de declaração supervenientes foram rejeitados e orecurso especialinterposto não
foi admitido (Id 108252732/30-34 e Id 108252736/05-09). Oagravo contra a decisão
denegatóriafoi conhecido para não conhecer do recurso especial (Id 108252736/33-35). Por fim, o
agravo interno interposto foi desprovido (Id 108252736/54-58).
O trânsito em julgado ocorreu aos 19/09/2018 (Id 108252736/63). Esta ação foi ajuizada em
16/12/2019 (Id 108250008).
O autor sustenta, em síntese, que o v. acórdão incorreu em violação aos Arts. 141, 489, 492 e
1.013, do CPC, uma vez que reformou a sentença de primeiro grau para julgar improcedente o
pedido principal, sem, contudo, manifestar-se sobre o pedido subsidiário, por meio do qual
pretendia o reconhecimento de sua qualidade de segurado na data de início da incapacidade
(20/06/2004),em razão de sua atividade como caseiro, desde 01/01/2004, constante em registro
na CTPS e confirmada pela própria empregadora. Argumenta que tal pedido constou não
somente na inicial da ação subjacente como também nas contrarrazões ao recurso de apelação
interposto pela autarquia previdenciária; tendo, ainda, sido reiterado em sede de embargos de
declaração, porémjamais chegou a ser apreciado, configurando-se, assim, o vício de julgamento
citra petita. Requer a concessão da tutela provisória de urgência para imediata concessão de
aposentadoria por invalidezou, ainda, para o prontorestabelecimentodo auxílio doença, desde a
cessação indevida. Pleiteia, também,a tutela provisória de urgência para que seja determinado ao
INSS que emita as guias referentes às contribuições em atraso (competências de janeiro a junho
de 2004), a fim de que a empregadora possa efetuar os respectivos recolhimentos, comojá
requerido na via administrativa. No mérito, pede a procedência da ação para que seja rescindido
o julgado, com a prolação de novo julgamento que analise o pedido subsidiário formulado nos
autos subjacentes, reconhecendo-se a sua qualidade de segurado obrigatório desde 01/01/2004.
Pleiteia, ainda, que seja restabelecidoo auxílio doença concedido e mantido entre 15/01/2011 e
09/07/2014, a partir da indevida cessação, devendo ser convertido em aposentadoria por
invalidez a partir da citação nos autos originários. Subsidiariamente, pleiteia a determinação de
retorno dos autos à origem para que se oportunize a reabertura da dilação probatória.
Concedidos os benefícios da gratuidade da justiça (Id 126555584).
Regularmente citado, o réu argui, em sede de preliminar, a carência de ação, por ausência do
interesse de agir, sob o argumento de que se pretende apenas a rediscussão do quadro fático-
probatório produzido nos autos subjacentes. No mérito, sustenta a inexistência de violação
manifesta de norma jurídica no julgado, porquanto a questão sobre o reconhecimento da
condição de segurado do autor na data do início da incapacidade foi devidamente apreciada pela
Turma julgadora, porém, em sentidocontrário à sua pretensão. Afirma que as provas dos autos
corroboram o entendimentoadotado a respeito da preexistência da incapacitação para o trabalho.
Pelo princípio da eventualidade, pugna pela improcedência do pedido originário, contudo, no caso
de procedência dos pedidos, pleiteia a compensação do valores devidos em razão da
condenação judicial comos valores pagos na via administrativa. Requerer, por fim,a expedição de
ofício à Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Piracicaba a fim de que seja encaminhado o
prontuário médico do autor,com o intuito de verificar eventual existência da doença em data
anterior à internação hospitalar ocorrida em 20/06/2004, tendo em vista que já naquela
oportunidade foi constatado o acometimento de insuficiência renal crônica (Id 125404702).
Réplica da parte autora (Id129076077).
Dispensada a produção de novas provas (Id 130073945).
O réu reiterou o seu pedido de expedição de ofícioà Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de
Piracicaba (Id131045770).
O autor apresentou suas razões finais (Id 133754544).
Em seu parecer, o Ministério Público Federal opinou pela procedência do pedido de rescisão do
julgado, para que, em juízo rescisório, seja declarado o direito do autor ao restabelecimento do
auxílio doença e à sua conversão em aposentadoria por invalidez, desde a cessação indevida
ocorrida em 2014 (Id 137584319).
É o relatório.
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5032681-49.2019.4.03.0000
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
AUTOR: JOSE FLAVIO QUADROS
Advogado do(a) AUTOR: MILENE SPAGNOL SECHINATO - SP288829
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
De início, reitero meu entendimento pessoal acerca da desnecessidade da produção de novas
provas, por se tratar de demanda que envolve questão exclusivamente de direito, cuja análise
deve ser realizada com base nos elementos já carreados aos autos.
Quanto às preliminares de carência da ação e de incidência do enunciado de Súmula n° 343/STF,
confundem-se com o mérito, âmbito em que devem ser objeto de apreciação.Passo a examinar a
questão de fundo.
A parte autora sustenta que, em ação em que objetivava o restabelecimento do benefício
deauxílio doença eaconcessão de aposentadoria por invalidez, não foi apreciado seu pedido
subsidiário, por meio do qual pleiteava o reconhecimento da qualidade de segurado em
20/06/2004, marco apontado pelo INSS como data de início da incapacidade (DII).
O benefício fora concedido em 15/01/2011, tendo sido cessado após a perícia em junta médica
realizada na datade 29/01/2014, que concluiu pela necessidade de alteração dos parâmetros
médicos periciais (Id108250021/50 e Id108250024/01), nos seguintes termos:
"CONCLUSÃO PERICIAL: Requerente contribuinte autônomo, informa caseiro (descrição no
SABI), portador de insuficiência renal crônica, em hemodiálise desde 23/06/2014. Comprova
tratamento e acompanhamento médico regulares. Teve vários benefícios indeferidos por falta de
qualidade de segurado até que é perícia de 09/02/2011 teve novamente o reconhecimento de sua
incapacidade laboral, porém sem fundamentação nos parâmetros registrados no SABI, sobre a
data do início da incapacidade. Após essa Junta médica, concluiu-se que há elementos de
convicção para mudança nos parâmetros periciais.
[...]
DID: 19/06/2004
DII: 20/06/2004
DCB: LI
CID: N 18
Doença isenta de período de carência".
Diante disso, considerou a autarquia previdenciária que a incapacidade do autor teve início antes
do seu reingresso ao RGPS, pelo que não fazia jus ao auxílio doença, devendohaver arestituição
dos valores indevidamente recebidos (Id108250024/27-28).
Em sua defesa administrativa,foram apresentados pelo autor a) declaração prestada por sua
empregadora, Neusa Olivieri, na qual afirmou ser o autor funcionário em sua chácara, na
profissão de caseiro, "desde JANEIRO/2004, e não JUNHO/2.004, conforme declaraçãodatada
em 07/04/2014, já apresentada no processo administrativo", acrescentando que "em razão de ser
minha responsabilidade fazer o repasse da contribuição ao INSS, reitero meu interesse em
solicitar junto ao INSS o pagamento de todas as contribuições atrasadas"; e b) cópia da segunda
via da CTPS, emitida em 13/01/2011, com o registro de que a CTPS anterior fora extraviada,
constando, ainda, a anotação do contrato de trabalho junto à empregadora Neusa Olivieri, no
cargo de caseiro, a partir de 1º de janeiro de 2004 (Id108250025/06-08).
Na decisão de indeferimentodo recurso administrativo, consignou a autarquia previdenciária que
"da análise da defesa apresentada observa-se que não houve prova suficiente, ou mesmo adição
de novos elementos que pudessem caracterizar o direito o benefício" (grifo nosso), motivo pelo
qual o benefício foi suspenso, passando a ser cobrada do autor a quantia de R$ 46.213,91, a
título de devolução dos valores indevidamente recebidos (Id108250025/20-21).
Foram essas as circunstânciasfáticas que deram ensejo ao ajuizamento da ação subjacente, a
evidenciar o interesse do autor pelo reconhecimento do seu direito ao benefíciopor incapacidade,
ou pelo reconhecimento da sua qualidade de segurado em junho de 2004, com base no seu
vínculo empregatício iniciado no mês de janeiro daquele ano.
A r. sentença proferida naqueles autos julgou procedente o pedido para condenar o INSS a
conceder ao autor o benefício de aposentadoria por invalidez desde o requerimento administrativo
formulado em 26/05/2005 (Id 108250030/02-06)
Por sua vez, o v. acórdão proferido por este Tribunal, complementado pelo aresto prolatado em
sede de embargos de declaração, deu provimento parcial à apelação interposta pela autarquia
previdenciária para reformar a decisão de primeiro grau, julgando improcedente o pedido de
restabelecimento de auxílio doença e posterior conversão em aposentadoria por invalidez, tendo
reconhecido a ausência da qualidade de segurado do autor na data de início da incapacidade,
declarando, ainda, a inexigibilidade do débito referente ao auxílio doença recebido no período de
15/01/2011 a 09/07/2014.
Ocorre que, não obstante a insistência do autor na apreciação do pedido subsidiário, o qual foi
repetido nas contrarrazões ao recurso de apelação, e expressamente reiterado nos embargos de
declaração opostoscontra o acórdão rescindendo, o pleito nunca foi analisado, como se
podeverificar das razões expostas no julgamento dos aclaratórios:
"Conquanto sejam os embargos declaratórios meio específico para escoimar o acórdão dos vícios
que possam ser danosos ao cumprimento do julgado, não se constata a presença de
contradições, obscuridades ou omissões a serem supridas, uma vez que o v. acórdão
embargado, de forma clara e precisa, concluiu que a incapacidade já existia antes mesmo da sua
refiliação junto à Previdência Social e, ainda, não restou demonstrado que o quadro apresentado
progrediu ou agravou-se, após seu reingresso no RGPS, o que afasta a concessão dos
benefícios pleiteados, nos termos dos artigos 42, § 2º, e 59, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91.
Neste caso, o laudo atesta que a parte autora apresenta insuficiência renal e realiza hemodiálise
desde 2004. Conclui pela existência de incapacidade total e permanente para o trabalho, pelo
menos desde julho de 2004, quando iniciou a hemodiálise, quatro vezes por semana. Afirma,
ainda, que a nefropatia grave já existia há anos, até chegar à insuficiência renal completa e
necessitar hemodiálise.
Ressalte-se que a parte autora esteve vinculada ao Regime Geral de Previdência Social por mais
de 12 (doze) meses. Recolheu contribuições até 04/1998, deixou de contribuir por longo período e
voltou a filiar-se à Previdência Social, recolhendo contribuições a partir de 07/2004.
Por sua vez, o perito informa que a incapacidade já existia ao menos desde julho de 2004, data
do reinício dos recolhimentos.
Dessa forma, o conjunto probatório revela o surgimento da enfermidade incapacitante, desde
antes do seu reingresso ao sistema previdenciário.
Nesta esteira, agasalhado o v. acórdão recorrido em fundamento consistente, não se encontra o
magistrado obrigado a exaustivamente responder a todas as alegações das partes, nem
tampouco ater-se aos fundamentos por elas indicados ou, ainda, a explanar acerca de todos os
textos normativos propostos, não havendo, portanto, qualquer violação ao artigo 1.022 do CPC".
Em que pesem os alicerçadosfundamentos que orientarama decisão prolatada pela Turma
julgadora, não houve qualquer pronunciamento sobre a questão controvertida, a qual se revelava
de crucial importância para a resolução da causa.
Nesse sentido, cumpre transcrever o parecer dailustre representante do Ministério Público
Federal, a bem elucidar o caso dos autos, pelo que dele me sirvo como razão de decidir:
No caso concreto, o autor ajuizou a ação originária em face do INSS buscando o
restabelecimento de auxílio-doença e a sua conversão em aposentadoria por invalidez.
O autor, nascido em 17/01/1963, é segurado do RGPS desde 01/01/1979. Após algum tempo
sem verter contribuições previdenciárias, retornou à condição de segurado obrigatório, na
qualidade de empregado doméstico, a partir de janeiro de 2004, quando foi contratado como
“caseiro” na chácara de Neusa Olivieri.
Os recolhimentos previdenciários, contudo, iniciaram-se somente em julho de 2004 por culpa
exclusiva da empregadora.
A fim de comprovar sua qualidade de segurado, juntou ao feito originário declarações prestadas
por sua empregadora, bem como o registro em sua CTPS, emitida em 13/01/2011, já que a
anterior, com o registro original, havia sido extraviada.
Em 20/06/2004, o autor foi diagnosticado com insuficiência renal crônica, CID10:N18. Afirma,
contudo, que a doença começou a agravar-se em meados de 2005.
Em maio de 2005, o autor requereu pela primeira vez o auxílio-doença ao INSS. O benefício foi
indeferido sob a alegação de que o autor já estava incapacitado desde a internação hospitalar
ocorrida em junho de 2004. Apesar de suas limitações físicas, todavia, não havia deixado de
exercer sua função de caseiro na chácara de sua empregadora.
Em razão do agravamento da doença, teve o benefício previdenciário deferido em 15/01/2011.
Contudo, em perícia realizada 13/11/2013, o INSS alterou a data de início da incapacidade para
20/06/2004, data da primeira internação. Por conseguinte, o INSS considerou irregular a
concessão do benefício previdenciário, tendo em vista que, ao tempo do início da incapacidade,
ele não mantinha a qualidade de segurado (os recolhimentos previdenciários iniciaram-se apenas
em julho de 2004).
Na ação originária, o autor pleiteou o restabelecimento do auxílio-doença com termo de início em
maio de 2005 (data do primeiro requerimento administrativo). Subsidiariamente, requereu o
reconhecimento da sua qualidade de segurado desde janeiro de 2004, já que a incapacidade foi
fixada pelo INSS em junho de 2004, sob a alegação de que não pode ser responsabilizado pelo
não recolhimento das contribuições previdenciárias por parte de sua empregadora.
O v. acórdão rescindendo considerou que “o perito informa que a incapacidade já existia ao
menos desde julho de 2004, data do reinício dos recolhimentos” e que “portanto, é possível
concluir que a incapacidade já existia antes mesmo da sua refiliação junto à Previdência Social e,
ainda, não restou demonstrado que o quadro apresentado progrediu ou agravou-se, após seu
reingresso no RGPS, o que afasta a concessão dos benefícios pleiteados, nos termos dos artigos
42, § 2º, e 59, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91.”
Na presente ação rescisória, o autor alega que o v. acórdão é citra petita, tendo em vista que não
apreciou seu pedido subsidiário, consistente no reconhecimento de que ele mantinha a qualidade
de segurado desde janeiro de 2004.
Ao analisar a questão da qualidade de segurado do autor, o v. acórdão rescindendo apontou que:
“Extrato do CNIS informa vínculos empregatícios em nome do autor, sendo o último de
01/10/1989 a 31/10/1997. Consta, ainda, o recolhimento de contribuições previdenciárias, de
11/1997 a 04/1998, de 07/2004 a 04/2008 e de 06/2008 a 01/2011. Por fim, há a informação de
que houve concessão de auxílio-doença, de 15/01/2011 a 09/07/2014.
(...)
O laudo atesta que a parte autora apresenta insuficiência renal e realiza hemodiálise desde 2004.
Conclui pela existência de incapacidade total e permanente para o trabalho, pelo menos desde
julho de 2004, quando iniciou a hemodiálise, quatro vezes por semana. Afirma, ainda, que a
nefropatia grave já existia há anos, até chegar à insuficiência renal completa e necessitar
hemodiálise.
Verifica-se dos documentos apresentados que a parte autora esteve vinculada ao Regime Geral
de Previdência Social por mais de 12 (doze) meses. Recolheu contribuições até 04/1998, deixou
de contribuir por longo período e voltou a filiar-se à Previdência Social, recolhendo contribuições a
partir de 07/2004.
Entretanto, o conjunto probatório revela o surgimento da enfermidade incapacitante, desde antes
do seu reingresso ao sistema previdenciário.
Neste caso, o perito informa que a incapacidade já existia ao menos desde julho de 2004, data do
reinício dos recolhimentos. Portanto, é possível concluir que a incapacidade já existia antes
mesmo da sua refiliação junto à Previdência Social e, ainda, não restou demonstrado que o
quadro apresentado progrediu ou agravou-se, após seu reingresso no RGPS, o que afasta a
concessão dos benefícios pleiteados, nos termos dos artigos 42, § 2º, e 59, parágrafo único, da
Lei nº 8.213/91”.
Verifica-se, assim, que o v. acórdão não apreciou a alegação do autor de que, em janeiro de
2004, ele se encontrava empregado como caseiro e, por conseguinte, ostentava a qualidade de
segurado para receber o auxílio-doença e pleitear a sua conversão em aposentadoria por
invalidez. O pedido subsidiário deduzido pelo autor, aliás, sequer é citado.
no v. acórdão.
A análise dessa questão era fundamental ao deslinde da ação originária, tendo em vista que uma
vez reconhecido que o vínculo empregatício do autor remontava a janeiro de 2004, não há
qualquer dúvida quanto ao seu direito ao recebimento do benefício previdenciário, já que o início
da incapacidade foi fixado em julho de 2004.
Desta forma, merece ser rescindido o v. acórdão, por citra petita, e violação aos artigos 141 e 492
do Código de Processo Civil:
Art. 141. O juiz decidirá o mérito nos limites propostos pelas partes, sendo-lhe vedado conhecer
de questões não suscitadas a cujo respeito a lei exige iniciativa da parte.
Art. 492. É vedado ao juiz proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a
parte em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado"
Oportuno destacar que, para que se configure a hipótese prevista no Art. 966, V, do CPC, impõe-
se que a violação à norma seja frontal e direta. Sobre o tema, leciona a doutrina de Humberto
Theodoro Júnior, ainda que sobre o conceito de "violação a literal disposição de lei", expresso no
Código Processual Civil revogado, que:
"O conceito de violação "literal de disposição de lei" vem sendo motivo de largas controvérsias
desde o Código anterior. Não obstante, o novo estatuto deliberou conservar a mesma expressão.
O melhor entendimento, a nosso modo de ver, é o de Amaral dos Santos, para quem sentença
proferida contra literal disposição de lei não é apenas a que ofende a letra escrita de um diploma
legal; "é aquela que ofende flagrantemente a lei, tanto quando a decisão é repulsiva à lei (error in
judicando), como quando é proferida com absoluto menosprezo ao modo e forma estabelecidos
em lei para a sua prolação (error in procedendo).
Não se cogita de justiça ou injustiça no modo de interpretar a lei. Nem se pode pretender rescindir
a sentença sob invocação de melhor interpretação da norma jurídica aplicada pelo órgão
julgador".
(THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual. Vol. I. 50 ed. Rio de Janeiro: Forense,
2009, pp. 701-702).
A respeito do estatuto processual em vigor, acrescenta:
"Violação manifesta, referida pelo art. 966, V, do atual Código exprime bem a que se apresenta
frontal e evidente à norma, e não a que decorre apenas de sua interpretação diante da incidência,
sobre determinado quadro fático. Reconhece-se que toda norma tem um núcleo mínimo ou
específico de compreensão, mesmo quando esteja formulada em termos vagos ou imprecisos. É
esse núcleo que não pode ser ignorado ou ultrapassado pelo intérprete e aplicador da norma. Ir
contra seu conteúdo implica, segundo Sérgio Bermudes, proferir sentença “inequivocamente
contrária à norma”, justificando-se a rescisória por sua manifesta violação".
(THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol. III. 53 ed. rev. e atual. Rio de
Janeiro: Forense, p. 826).
Ao substituir o termo "violação a literal disposição de lei" por "violação manifesta de norma
jurídica", o novo Código pacificou a controvérsia doutrinária e jurisprudencial em torno do
cabimento dessa hipótese de rescindibilidade não só para os casos em que há ofensa a texto de
dispositivo de Lei, em sua literalidade, como também quando se viola princípios e regras
integrantes do ordenamento jurídico. Por sua vez, a Lei nº 13.256/16, ao introduzir os §§ 5º e 6º,
do Art. 966, do CPC, passou a prever sua aplicação contra decisão baseada em enunciado de
súmula ou acórdão proferido em julgamento de casos repetitivos que não tenha considerado a
existência de distinção entre a questão discutida no processo e o padrão decisório que lhe deu
fundamento.
No caso em análise, resta patente a configuração do vício de julgamento citra petita, na medida
em que o acórdão rescindendo não apreciou os pedidos formulados pela parte autora em toda a
sua amplitude, deixando de se manifestar sobre o pedido subsidiário de reconhecimento
daqualidade de segurado no mês de junho de 2004,época apontadaadministrativamente pela
autarquia previdenciária comodata deinício da incapacidade (DII).
Impõe-se, portanto, a rescisão do julgado nos termos do Art. 966, V, do CPC, em razão da
ofensaao princípio da congruência, disciplinado nos Arts. 141 e 492, do mesmo diploma legal.
Em novo julgamento da causa, insta aferir se o autor faz jus a um dos benefícios por
incapacidade, sem olvidar da análise sobre a questão da qualidade de segurado na DII,
considerados os pedidos principal esubsidiário formulados e a documentação apresentada no
feito originário.
O benefício de auxílio doença está previsto no Art. 59, da Lei nº 8.213/91,in verbis:
"Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o
período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua
atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos".
Portanto, cuida-se de benefício devido ao segurado incapacitado por moléstia que inviabilize
temporariamente o exercício de sua profissão.
Por sua vez, o benefício de aposentadoria por invalidez está disciplinado no Art. 42, da Lei
8.213/91, com a seguinte redação:
"Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida,
será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio doença, for considerado
incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a
subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição."
A incapacidade do autor foi demonstrada de forma suficiente, vez que reconhecida no âmbito
administrativo e em juízo, além de estar largamente comprovada nos autos, revelando-se
incontroversa.
Por outro turno, no que tange à qualidade de segurado, acolho também nesse ponto as razões
ofertadas no parecer ministerial:
"O início do vínculo empregatício em janeiro de 2004 foi expressamente declarado pela
empregadora no documento ID 108250025, p.6, inclusive, com o reconhecimento da sua
exclusiva responsabilidade pela ausência de recolhimentos ao RGPS.
Como se sabe, é do empregador a exclusiva responsabilidade pelo recolhimento das
contribuições previdenciárias:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. REEXAME NECESSÁRIO. APOSENTADORIA POR
IDADE URBANA. ART. 48, "CAPUT", DA LEI 8.213/91. REQUISITOS PREENCHIDOS.
BENEFÍCIO DEVIDO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA.
1. Cumprida a carência exigida no art. 142 da Lei n.º 8.213/91, levando-se em conta o ano em
que a parte autora implementou o requisito etário, é devida a concessão do benefício de
aposentadoria por idade urbana prevista no artigo 48, caput, da Lei n.º 8.213/91.
2. O fato de o Instituto não localizar registro da anotação no Cadastro Nacional de Informações
Sociais (CNIS) não transfere ao empregado a obrigação de comprovar os recolhimentos das
contribuições do período laborativo anotado na carteira profissional, uma vez que é de
responsabilidade exclusiva do empregador a anotação do contrato de trabalho na CTPS, o
desconto e o recolhimento das contribuições devidas à Previdência Social, não podendo o
segurado ser prejudicado pela conduta negligente cometida por seu empregador, que efetuou as
anotações dos vínculos empregatícios, mas não recolheu as contribuições.
3. Não está comprovado o prejuízo sofrido pela parte autora. Enfim, não restou demonstrado que
a dúvida quanto ao direito ao benefício não fosse razoável, tendo em vista o fato de a autarquia
previdenciária não ter encontrado em seu banco de dados os recolhimento necessários para a
concessão, sendo certo que a negativa de concessão do benefício não significa, por si só, a
ocorrência de dano moral.
4. À míngua de comprovação de protocolização de requerimento administrativo de aposentadoria
por idade, posterior ao implemento da idade, o benefício é devido a partir da data da citação do
INSS, pois desde então o Instituto foi constituído em mora, nos termos do artigo 240 do Novo
Código de Processo Civil.
5. A correção monetária e os juros de mora serão aplicados de acordo com o vigente Manual de
Cálculos da Justiça Federal, atualmente a Resolução nº 267/2013, observado o julgamento final
do RE 870.947/SE em Repercussão Geral, em razão da suspensão do seu decisum deferida nos
embargos de declaração opostos pelos entes federativos estaduais e INSS, conforme r. decisão
do Ministro Luiz Fux, em 24/09/2018.
6. Honorários advocatícios a cargo do INSS, fixados nos termos do artigo 85, §§ 3º e 4º, II, do
Novo Código de Processo Civil/2015, e da Súmula 111 do STJ.
7. Sem custas ou despesas processuais, por ser a parte autora beneficiária da assistência
judiciária gratuita.
8. Apelação provida.
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5744703-74.2019.4.03.9999, Rel.
Desembargador Federal MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA, julgado em 13/11/2019,
Intimação via sistema DATA: 22/11/2019)
Na CTPS do autor, o vínculo em questão também foi
registrado com início em janeiro de 2004 (ID 108250025, p. 8). Esse documento, contudo, foi
produzido apenas em 2011, em razão do extravio da CTPS original.
No laudo médico emitido por serviço de saúde da Prefeitura Municipal de Piracicaba em 20 de
junho de 2004 (ID 108250025, p. 34) e no documento emitido pela Santa Casa de Misericórdia de
Piracicaba em 26 de junho de 2004 (ID 108250025, p. 35), o autor é qualificado como caseiro e
residente na Rua Ana Mariano Bortolo, nº 165, o mesmo endereço da chácara de Neusa Olivieri.
Sendo assim, a documentação juntada ao feito originário comprova que, antes da primeira
internação (tida como início da incapacidade pelo próprio INSS) o autor já residia na chácara de
Neusa Olivieri e trabalhava como caseiro.
O autor instruiu ainda o feito originário com alguns recibos de pagamentos efetuados por Neusa
Olivieri, sendo um datado de fevereiro de 2004, e outro de abril de 2004 (ID 108250026, p. 39/40).
Logo, o pedido subsidiário deduzido pelo autor merece ser acolhido, tendo em vista que a perícia
judicial fixou o início da incapacidade em julho de 2004, quando o autor passou a realizar 4
sessões semanais de hemodiálise. Nessa época o autor ostentava a qualidade de segurado
porque estava exercendo atividade profissional, como contribuinte obrigatório do RGPS desde
01/01/2004, na condição de empregado doméstico na chácara de NEUSA OLIVIERI. A
obrigatoriedade da arrecadação e do recolhimento das contribuições previdenciárias são
exclusivamente de seu empregador, a teor do art. 11, II, da Lei nº 8.213/91 e do art. 30, V, da Lei
nº 8.212/91”.
Assim, tem o autor direito ao restabelecimento do
benefício do auxílio-doença desde a indevida cessação em 2014, bem como a sua conversão em
aposentadoria por invalidez".
Com efeito, segundo a perícia administrativa e o laudo judicial, a incapacidade da parte autora,
em decorrência da enfermidade de insuficiência renal crônica, teve início em meados de 2004,
quando passou a realizar 4 sessões semanais de hemodiálise.
Para fins de verificação da qualidade de segurado, os extratos do CNIS e a CTPS juntados aos
autos demonstram que o autor possui contribuições como empregado nos períodos de
01/01/1979 a 30/04/1980, 01/10/1981 a 20/10/1982, 09/05/1985 a 22/12/1985, 13/06/1986 a
23/06/1987, 01/03/1989 a 30/08/1989, 01/10/1989 a 31/10/1987. Efetuou recolhimentos como
autônomo no intervalo de 01/11/1997 a 30/04/1998. Após isso, reingressou no RGPS em
1º/01/2004, possuindo contribuições como empregado doméstico nos períodos de 01/07/2004 a
30/04/2008 e de 01/06/2008 a 31/01/2011. Em 15/01/2011 passou a receber o benefício de
auxílio doença, pago até 09/07/2014 (Id108250021/35 e Id 108250025/07-8).
Quanto ao contrato de trabalho iniciado em 1°/01/2004, não restam dúvidas sobre a sua
veracidade, vez que regularmente anotado na CTPS e confirmado pela declaração firmada pela
empregadora, em que informou que o vínculo estabeleceu-se a partir de janeiro/2004, e não em
junho/2004 como informado anteriormente, no curso do processo administrativo, reiterando,
outrossim, seu interesse em saldar junto ao INSS o pagamento de todas as contribuições
atrasadas. A corroborar os dados constantes nos documentos, observa-se ainda a juntada dos
recibos de pagamento dos salários do autor, em decorrência do serviços prestados a Neusa
Olivieri, na função de caseiro em sua residência, relativos aos meses entre fevereiro/2004 a
abril/2010 (Id 108250025/06, Id 108250026/39-50 e Id 108250027/01-06).
Ressalte-se que ausência dos recolhimentos contributivos não tem o condão de obstar o cômputo
do tempo de trabalho prestado pelosegurado empregado, pelo empregado doméstico e pelo
trabalhador avulso, os quais, assim como seus dependentes, farão jus aos benefícios para cuja
concessão tenham satisfeito as condições.
Em talhipótese, deverá a autarquia previdenciária, pelo princípio da automaticidade das
prestações, realizar o deferimento do benefício, independentemente de as contribuições terem
sido ou não recolhidas.
É de se anotar que essas contribuiçõesgozam da presunção legal de recolhimento. Caso, porém,
se observe que não foram efetuadas, como no caso dos autos, caberáà Secretaria da Receita
Federal do Brasil providenciar a cobrança do empregador, a quem a Lei atribui a responsabilidade
tributária pelas contribuições previdenciárias devidas pelos trabalhadores a seu serviço, na forma
estabelecida no Art. 33, caput e § 5º, da Lei 8.212/91, que assim prevê:
"Art. 33. À Secretaria da Receita Federal do Brasil compete planejar, executar, acompanhar e
avaliar as atividades relativas à tributação, à fiscalização, à arrecadação, à cobrança e ao
recolhimento das contribuições sociais previstas no parágrafo único do art. 11 desta Lei, das
contribuições incidentes a título de substituição e das devidas a outras entidades e fundos.
(Redação dada pela Lei nº 11.941, de 2009).
(...)
§ 5º O desconto de contribuição e de consignação legalmente autorizadas sempre se presume
feito oportuna e regularmente pela empresa a isso obrigada, não lhe sendo lícito alegar omissão
para se eximir do recolhimento, ficando diretamente responsável pela importância que deixou de
receber ou arrecadou em desacordo com o disposto nesta Lei".
Ainda sobre esse tema, é de notar que há expressa previsão legal, nos termos do Art. 34, inciso I,
da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei Complementar nº 150/2015, que determina que, no
cálculo do valor da renda mensal do benefício do segurado empregado, inclusive o doméstico, e o
trabalhador avulso, serão computados os salários de contribuição referentes aos meses de
contribuições devidas, ainda que não recolhidas pela empresa ou pelo empregador doméstico,
sem prejuízo da respectiva cobrança e da aplicação das penalidades cabíveis.
O autor formulou o requerimento administrativo para a concessão do auxílio doença na data de
31/01/2011, época em que estava qualificado como segurado obrigatório, na condição de
empregado doméstico, sendo-lhe deferido o benefício a partir de 15/01/2011, o qual foi pago até
09/07/2014 (Id 108250024/11).
A ação subjacente foi proposta em em 14/03/2015 (Id 108250021/03-29).
Analisando o conjunto probatório e considerando o parecer do sr. Perito judicial, é de se
reconhecer o direito do autor à percepção do benefício de auxílio doença e à sua conversão em
aposentadoria por invalidez, vez que indiscutível a falta de capacitação e de oportunidades de
reabilitação para a assunção de outras atividades, sendo possível afirmar que se encontra sem
condições de reingressar no mercado de trabalho.
Confiram-se julgados, nesse sentido, do e. Superior Tribunal de Justiça:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REEXAME DE CONTEÚDO FÁTICO-
PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ.
1. O art. 42 da Lei 8.213/91 dispõe que a aposentadoria por invalidez é devida quando o
segurado for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que
lhe garanta a subsistência.
2. No caso, concluindo o juízo de origem, com base no contexto fático-probatório dos autos, que a
parte autora faz jus ao benefício, a revisão desse posicionamento encontra óbice na Súmula
7/STJ.
3. Agravo Regimental não provido.
(AgRg no AREsp 215563/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado
em 07/03/2013, DJe 20/03/2013) e
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO PERICIAL.
INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE RECONHECIDA. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-
PROBATÓRIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7 DO STJ.
1. Tendo o Tribunal de origem concluído, com base nas provas constantes dos autos, pela
incapacidade total e permanente do segurado é cabível a concessão do benefício de
aposentadoria por invalidez.
2. O reexame dos fundamentos fáticos do acórdão recorrido não é viável em recurso especial,
ante o óbice da Súmula 7/STJ.
3. Agravo regimental não provido.
(AgRg no AREsp 153552/GO, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA,
julgado em 26/06/2012, DJe 02/08/2012)".
O benefício de auxílio doença deve ser restabelecido desde o dia imediatamente posterior à
cessação indevida (10/07/2014), e a conversão em aposentadoria por invalidez deverá ser feita a
partir da data da citação nos autos subjacentes (26/03/2015 - Id108250027/10), conforme
requerido na inicial.
Destarte, em juízo rescisório, é de se reformar em parte a r. sentença proferida nos autos
subjacentes (Id 108250030/02-06), devendo o réu restabelecer o benefício de auxílio doença do
autor desde 10/07/2014, convertendo-o em aposentadoria por invalidez a partir de 26/03/2015, e
pagar as prestações vencidas, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora.
A correção monetária, que incide sobre as prestações em atraso desde as respectivas
competências, e os juros de mora devem ser aplicados de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.
Os juros de mora incidirão até a data da expedição do precatório/RPV, conforme decidido em
19.04.2017 pelo Pleno do e. Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do RE 579431,
com repercussão geral reconhecida. A partir de então deve ser observada a Súmula Vinculante nº
17.
Convém alertar que das prestações vencidas devem ser descontadas aquelas pagas
administrativamente ou por força de liminar, e insuscetíveis de cumulação com o benefício
concedido, na forma do Art. 124, da Lei nº 8.213/91.
Os honorários advocatícios devem observar as disposições contidas no inciso II, do § 4º, do Art.
85, do CPC, e a Súmula 111, do e. STJ.
A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da Lei
nº 9.289/96, do Art. 24-A, da Lei nº 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP nº 2.180-
35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/92. As demais despesas processuais (honorários
periciais, condução de testemunhas, etc.) são devidas.
Independentemente do trânsito em julgado desta decisão, determino seja enviado e-mail ao
INSS, instruído com os documentos da parte autora, em cumprimento ao Provimento Conjunto nº
69/2006, alterado pelo Provimento Conjunto nº 71/2006, ambos da Corregedoria Regional da
Justiça Federal da Terceira Região e da Coordenadoria dos Juizados Especiais Federais da
Terceira Região, a fim de que se adotem as providências cabíveis ao imediato cumprimento deste
julgado, conforme os dados do tópico síntese do julgado abaixo transcrito.
Tópico síntese do julgado:
a) nome do segurado: José Flávio Quadros;
b) benefícios: auxílio doença e aposentadoria por invalidez;
c) números dos benefícios: NB (31) 5445975408 e nº a ser indicado pelo INSS;
d) renda mensal: RMI e RMA a ser calculada pelo INSS;
e) DIB: 15/01/2011 (auxílio doença restabelecido) e DIB: 10/07/2014 (aposentadoria por invalidez)
Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, julgo procedente o pedido para rescindir
o julgado e, em novo julgamento da causa, dou parcial provimento à apelação interposta nos
autos subjacentes para reformar em parte a r. sentença, a fim de determinar o restabelecimento
do auxílio doença do autor a partir de 10/07/2014, e a conversão do benefício em aposentadoria
por invalidez a partir de 26/03/2015, deferindo a concessão da tutela de urgência para a imediata
implantação do benefício.
É o voto.
E M E N T A
AÇÃO RESCISÓRIA. PROCESSUAL CIVIL. ART. 966, V, DO CPC. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO
DOENÇA E APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA
REFORMADA EM SEDE DE APELAÇÃO. ACOLHIMENTO DA ALEGAÇÃO DE
PREEXISTÊNCIA DA INCAPACIDADE DO SEGURADO. AUSÊNCIA APRECIAÇÃO DO
PEDIDO SUBSIDIÁRIO DE RECONHECIMENTO DA CONDIÇÃO DE SEGURADO NA DATA DO
INÍCIO DA INCAPACIDADE. CONFIGURAÇÃO DO VÍCIO DE JULGAMENTO CITRA PETITA.
DECISÃO RESCINDIDA. NOVO JULGAMENTO DA CAUSA. SATISFAÇÃO DOS REQUISITOS
NECESSÁRIOS AO BENEFÍCIO. SENTENÇA SUBJACENTE PARCIALMENTE REFORMADA.
1. As preliminares de carência da ação e de incidência do enunciado de Súmula n° 343/STF
confundem-se com o mérito, âmbito em que devem ser analisadas.
2. Restou configurado o vício de julgamento citra petita, na medida em que o acórdão
rescindendo, ao reformar a sentença de primeira instância, julgando improcedente o pedido
principal de restabelecimento do auxílio doença e concessão de aposentadoria por invalidez,
deixou de apreciar o pedido subsidiário de reconhecimento daqualidade de segurado no mês de
junho de 2004,época apontada pela autarquia previdenciária comodata deinício da incapacidade
(DII), com base no vínculo empregatício iniciado no mês de janeiro do mesmo ano.
3. A incapacidade do autor foi demonstrada, tendo sido reconhecida no âmbito administrativo e
em juízo, além de estar largamente comprovada nos autos, tornando-se incontroversa.
4. No que tange à qualidade de segurado, como bem salientado no parecer ofertado pelo
Ministério Público Federal, "a documentação juntada ao feito originário comprova que, antes da
primeira internação (tida como início da incapacidade pelo próprio INSS) o autor já residia na
chácara de Neusa Olivieri e trabalhava como caseiro". Ademais, na data do requerimento, em
31/01/2011, o autor estava qualificado como segurado obrigatório, na condição de empregado
doméstico.
5. Preenchidos os requisitos, é de se reconhecer o direito do autor ao restabelecimento do
benefício de auxílio doença desde a cessação indevida, e à sua conversão em aposentadoria por
invalidez a partir da citação nos autos originários, pois indiscutível a falta de capacitação e de
oportunidades de reabilitação para a assunção de outras atividades, sendo possível afirmar que
se encontra sem condições de reingressar no mercado de trabalho.
6. Matéria preliminar rejeitada. Pedido de rescisão do julgado procedente e pedido originário
parcialmente procedente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Seção, por
unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar e, no mérito, julgar procedente o pedido para
rescindir o julgado e, em novo julgamento da causa, deu parcial provimento à apelação interposta
nos autos subjacentes para reformar em parte a r. sentença, a fim de determinar o
restabelecimento do auxílio doença do autor a partir de 10/07/2014, e a conversão do benefício
em aposentadoria por invalidez a partir de 26/03/2015, deferindo a concessão da tutela de
urgência para a imediata implantação do benefício, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
