Processo
AR - AÇÃO RESCISÓRIA / SP
5027132-58.2019.4.03.0000
Relator(a)
Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN
Órgão Julgador
3ª Seção
Data do Julgamento
03/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 09/11/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA PROPOSTA COM FUNDAMENTO NOS INCISOS IV e
V, DO ART. 966, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. INOCORRÊNCIA DE OFENSA À COISA
JULGADA E MANIFESTA VIOLAÇÃO À NORMA JURÍDICA. AUXÍLIO-DOENÇA E
APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. CONSECTÁRIOS.
- O artigo 966 do Código de Processo Civil elenca, de modo taxativo, as hipóteses de cabimento
da ação rescisória, dentre as quais, o inciso V prevê a possibilidade de desconstituição do julgado
na hipótese de violação manifesta de norma jurídica e o inciso VIII dispõe sobre a rescisão de
decisão fundada em erro de fato, resultante de atos ou de documentos da causa.
- As decisões judiciais devem, por meio de interpretação teleológica, escorar-se no ordenamento
jurídico e atender aos fins sociais, exigindo-se a devida fundamentação e observação dos
precedentes jurisprudenciais sobre a matéria.
- O inciso V, do art. 966 do CPC/15 indicam o cabimento de ação rescisória quando houver
violação evidente de norma jurídica, ou seja, demonstrada com prova pré-constituída juntada pelo
autor.
- A ofensa à coisa julgada como hipótese de rescisão do julgado, prevista no inciso IV, do art.
966, do CPC, pode ocorrer em relação à proibição de nova decisão quando já existente coisa
julgada sobre a questão ou, ainda, no tocante à obrigatoriedade de se levar em consideração a
coisa julgada de outra lide.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
- Na ação rescisória, o INSS requer a rescisão do julgado em razão de ofensa à coisa julgada na
anterior ação ajuizada em 01/07/2008, de n. 0004851-85.2008.8.26.0363, que teve curso na 2ª
Vara de Jaguariúna/SP e transitou em julgado em 21.09.12, com julgamento final de
improcedência do pedido.
- A ação subjacente n. 0005671-77.2009.8.26.0296, cujo julgado se pretende rescindir, trouxe à
lume o agravamento do estado do segurado autor e, muito embora tivesse as mesmas partes e
pedido, possuía causa de pedir diversa daquela constante da ação anteriormente ajuizada com
trânsito em julgado.
- O autor trouxe elementos posteriores ao trânsito em julgado da primeira ação que indicavam o
agravamento da doença, a saber, receitas médicas e uma declaração médica que dão conta de
que o autor encontrava-se em tratamento pelas mesmas moléstias indicadas na ação anterior.
- Ainda, o próprio INSS reconheceu a incapacidade do segurado falecido administrativamente
para a concessão do benefício de prestação continuada em DIB 12/09/2011, data posterior à
conclusão do primeiro perito.
- Desse modo, era possível nova disceptação judicial, para que fosse constatada a real situação
do requerente, pelo que não é o caso de reconhecimento da coisa julgada material, tampouco de
violação das normas jurídicas insculpidas nos artigos 485, V, 337, VII §§ 1º, 2º e 4º, 502, 503;
505, 507 e 508, todos do Código de Processo Civil, a ensejar, em juízo rescindendo, a
improcedência do pedido.
- Condenada a parte autora em honorários advocatícios fixados em R$1.000,00, conforme o
entendimento firmado pela Eg. Terceira Seção desta Corte.
- Com o julgamento do pedido desta ação rescisória, fica prejudicado o agravo regimental
interposto da decisão que indeferiu a antecipação de tutela.
- Pedido, em juízo rescindente, julgado improcedente e prejudicado o agravo regimental.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Seção
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5027132-58.2019.4.03.0000
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
REU: HELENA SILVA DOS SANTOS, B. D. S. S., DAIANE DOS SANTOS SOUZA,
GEFERSON DOS SANTOS SOUZA
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região3ª Seção
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5027132-58.2019.4.03.0000
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
REU: HELENA SILVA DOS SANTOS, B. D. S. S., DAIANE DOS SANTOS SOUZA,
GEFERSON DOS SANTOS SOUZA
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL GILBERTO JORDAN (Relator). Trata-se
de ação rescisória, com pedido de antecipação de tutela, ajuizada em 17/10/19 pelo
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL-INSS em face de HELENA SILVA DOS
SANTOS, BEATRIZ DOS SANTOS SOUZA, DAIANE DOS SANTOS SOUZA e GEFERSON
DOS SANTOS SOUZA, com fulcro nos incisos IV (ofensa à coisa julgada) e V (violação de
norma jurídica), ambos do art. 966, do Código de Processo Civil, objetivando a desconstituição
do v. acórdão proferido por este E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região na ação de n.
0005671-77.2009.8.26.0296, que tramitou perante a 1ª Vara da Comarca de Jaguariúna/SP,
com trânsito em julgado em 14/09/2018, que, em suma, reformou a sentença de Primeiro Grau
para prover o apelo do segurado e condenar o INSS a conceder-lhe o benefício de
aposentadoria por invalidez desde a cessação do auxílio-doença em 22.04.08 até seu óbito.
Dada à causa o valor de R$ 1.000,00.
O requerente alega que o acórdão rescindendo violou a coisa jugada, o que autoriza a rescisão
do julgado, nos termos do art. 337, §§ 1º e 2º c.c art. 966, IV, do CPC, pois existe ação anterior
ajuizada em 01.07.08 idêntica, com decisão transitada em julgado no sentido da improcedência
do pedido de concessão de auxílio-doença (n. 0004851-85.2008.8.26.0363, que teve curso na
2ª Vara de Jaguariúna/SP).
Aduz, outrossim, que ao deixar de reconhecer a coisa julgada e de proceder à extinção do
processo sem resolução do mérito, a decisão rescindenda ofendeu acoisa julgada e violou
manifestamente os artigos 485, V, 337, VII §§ 1º, 2º e 4º; 502; 503; 505, caput; 507; 508, todos
do Código de Processo Civil.
Em decisão de fls. 876/877, id 107313566, foi indeferida a tutela de urgência, reconhecida a
tempestividade da ação, dispensado o depósito do inc. II do art. 968 do CPC e determinada a
citação do réu.
Contra a decisão em epígrafe, o INSS interpôs agravo interno de fls. 888/898, id 116393335,
pleiteando a suspensão da execução do julgado e o direito à sustentação oral no agravo.
Em contestação de fls. 899/900, id 123330242, os réu requereram, em síntese, a improcedência
do pedido. Não houve pedido de concessão da gratuidade da justiça.
Após a réplica (id 130893668) e decisão mantendo a decisão agravada por seus próprios
fundamentos, as partes foram instadas a manifestarem-se sobre eventual interesse na
produção de provas,oportunidade em que o INSS requereu o prosseguimento do feito, sem
interesse em produção de outras provas senão asdocumentais já coligidas aos autos (fls.
909/916, id 132441394) e os réus quedaram-se inertes.
Aberta vista às partes (fl. 917, id 134301973), em alegações finais, o autor reiterou a existência
de agravo interno pendente de deliberação e, no mais, pediu a procedência do pedido da inicial
(fl. 918, id 136397511). Não houve manifestação dos réus.
O MPF, em parecer de fls. 920/926, id 141121833, opinou pela procedência do pedido.
É o relatório.
Peço dia para julgamento.
ks
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região3ª Seção
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5027132-58.2019.4.03.0000
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
REU: HELENA SILVA DOS SANTOS, B. D. S. S., DAIANE DOS SANTOS SOUZA,
GEFERSON DOS SANTOS SOUZA
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL GILBERTO JORDAN (Relator).
Trata-se de ação rescisória, com pedido de antecipação de tutela, ajuizada pelo INSTITUTO
NACIONAL DO SEGURO SOCIAL-INSS em face de HELENA SILVA DOS SANTOS, BEATRIZ
DOS SANTOS SOUZA, DAIANE DOS SANTOS SOUZA e GEFERSON DOS SANTOS SOUZA,
com fulcro nos incisos IV (ofensa à coisa julgada) e V (violação de norma jurídica), do art. 966,
do Código de Processo Civil, objetivando a desconstituição do v. acórdão proferido por este E.
Tribunal Regional Federal da 3ª Região na ação de n. 0005671-77.2009.8.26.0296, que
tramitou perante a 1ª Vara da Comarca de Jaguariúna/SP, que, em suma, reformou a sentença
de Primeiro Grau para prover o apelo do segurado e condenar o INSS a conceder-lhe o
benefício de aposentadoria por invalidez desde a cessação do auxílio-doença em 22.04.08 até
seu óbito.
ADMISSIBILIDADE
Competente esta Eg. Corte para o processamento e julgamento da ação, partes legítimas e
bem representadas e tempestiva a ação, uma vez que, considerando o trânsito em julgado nos
autos subjacentes em 14/09/2018 (certidão de fl. 791, id 97956667) e ajuizada esta ação em
17/10/19, o protocolo se deu dentro do prazo decadencial legal.
Presentes as condições da ação e os pressupostos processuais.
Inexigível o depósito previsto no inciso II, do art. 968, do Código de Processo Civil nos termos
do § 1 do mesmo artigo, combinado com o disposto no artigo 8º da Lei n.º 8.620/93 e enunciado
da Súmula 175 do STJ.
HIPÓTESES DE RESCINDIBILIDADE
O artigo 966 do Código de Processo Civil de 2015 prevê, de modo taxativo, as hipóteses de
cabimento da ação rescisória, conforme abaixo transcrito, in verbis:
“Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
I - se verificar que foi proferida por força de prevaricação, concussão ou corrupção do juiz;
II - for proferida por juiz impedido ou por juízo absolutamente incompetente;
III - resultar de dolo ou coação da parte vencedora em detrimento da parte vencida ou, ainda,
de simulação ou colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei;
IV - ofender a coisa julgada;
V - violar manifestamente norma jurídica;
VI - for fundada em prova cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou venha a
ser demonstrada na própria ação rescisória;
VII - obtiver o autor, posteriormente ao trânsito em julgado, prova nova cuja existência ignorava
ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável;
VIII - for fundada em erro de fato verificável do exame dos autos.
§ 1º Há erro de fato quando a decisão rescindenda admitir fato inexistente ou quando
considerar inexistente fato efetivamente ocorrido, sendo indispensável, em ambos os casos,
que o fato não represente ponto controvertido sobre o qual o juiz deveria ter se pronunciado.
§ 2º Nas hipóteses previstas nos incisos do caput , será rescindível a decisão transitada em
julgado que, embora não seja de mérito, impeça:
I - nova propositura da demanda; ou
II - admissibilidade do recurso correspondente.
§ 3º A ação rescisória pode ter por objeto apenas 1 (um) capítulo da decisão.
§ 4º Os atos de disposição de direitos, praticados pelas partes ou por outros participantes do
processo e homologados pelo juízo, bem como os atos homologatórios praticados no curso da
execução, estão sujeitos à anulação, nos termos da lei.
§ 5º Cabe ação rescisória, com fundamento no inciso V do caput deste artigo, contra decisão
baseada em enunciado de súmula ou acórdão proferido em julgamento de casos repetitivos que
não tenha considerado a existência de distinção entre a questão discutida no processo e o
padrão decisório que lhe deu fundamento. (Incluído pela Lei nº 13.256, de 2016) (Vigência)
§ 6º Quando a ação rescisória fundar-se na hipótese do § 5º deste artigo, caberá ao autor, sob
pena de inépcia, demonstrar, fundamentadamente, tratar-se de situação particularizada por
hipótese fática distinta ou de questão jurídica não examinada, a impor outra solução jurídica.”
As hipóteses acima listadas têm por escopo a correção de defeitos processuais e decisões
desarrazoadas.
De se ressaltar que cada fundamento previsto no art. 485 do CPC/73 e no art. 966 do CPC/15
corresponde a uma causa de pedir para o juízo rescindente, ao qual fica adstrito o Tribunal
(arts. 141 e 492, do CPC), sendo certo que para o juízo rescisório, a causa de pedir deverá ser
a mesma da ação originária.
JUÍZO RESCINDENTE E RESCISÓRIO
Para julgamento da ação rescisória, mister proceder o tribunal inicialmente ao juízo de
admissibilidade da ação.
Ao depois, compete à Corte o juízo de mérito quanto ao pedido de rescisão do julgado,
chamado de juízo rescindente ou iudicium rescindens.
Sendo o caso e havendo pedido de novo julgamento e desde que acolhido o pedido de rescisão
do julgado, o tribunal procederá ao rejulgamento do feito por meio do juízo rescisório ou
iudicium rescissorium.
Sobre o tema, confira-se o ensinamento de Fredie Didier Jr.:
"O exercício do juízo 'rescissorium', como se percebe, depende do prévio acolhimento do juízo
'rescindens'. O iudicium rescindens é preliminar ao iudicium rescissorium. Mas nem sempre há
juízo rescisório, conforme visto. Por isso, o art. 968, I, CPC, prescreve que o autor cumulará o
pedido de rejulgamento 'se for o caso'; Por isso, também, o art. 974 determina apenas se for o
caso o tribunal procederá a novo julgamento, caso rescinda a decisão.
(...)
Desconstituída a decisão, com o acolhimento do pedido de rescisão, passa, se for o caso, o
tribunal ao exame do juízo rescissorium, procedendo a um novo julgamento da causa, para
julgar procedente ou improcedente o pedido formulado na causa originária e renovado na
petição inicial da ação rescisória. "Percebe-se, então, que a vitória no juízo rescindente não é,
em regra, garantia de vitória no juízo rescisório - e é por isso que o primeiro é preliminar ao
segundo." (in: Curso de Direito Processual Civil, v.3, 13ª ed., 2016, p. 520).
MANIFESTA VIOLAÇÃO À NORMA JURÍDICA
Para correção de error in procedendo ou in judicando ou decisão contra precedente obrigatório,
a ação rescisória proposta com fundamento em violação de norma jurídica deve indicar a norma
ou o precedente violado.
As decisões judiciais devem, por meio de interpretação teleológica, escorar-se no ordenamento
jurídico e atender aos fins sociais, exigindo-se a devida fundamentação e observação dos
precedentes jurisprudenciais sobre a matéria.
Conforme preleciona Fredie Didier "quando se diz que uma norma foi violada, o que se violou
foi a interpretação dada à fonte do direito utilizada no caso." (op. cit., p. 492).
A expressão norma jurídica refere-se a princípios, à lei, à Constituição, a normas infralegais, a
negócios jurídicos e precedentes judiciais.
O inciso V, do art. 966, do Código de Processo Civil prevê o cabimento de ação rescisória
quando houver violação evidente, ou seja, demonstrada com prova pré-constituída juntada pelo
autor, de norma jurídica geral, ou seja, lei em sentido amplo, processual ou material. A violação
a normas jurídicas individuais não admite a ação rescisória, cabendo, eventualmente e antes do
trânsito em julgado, reclamação.
Nesse sentido, é o comentário ao art. 485, do CPC/73 de Nelson Nery Junior e Rosa Maria de
Andrade Nery citando Pontes de Miranda e Barbosa Moreira: "Lei aqui tem sentido amplo, seja
de caráter material ou processual, em qualquer nível (federal, estadual, municipal e distrital),
abrangendo a CF, MedProv., DLeg, etc". (Código de Processo Civil Comentado: legislação
Extravagante, 10ª ed., 2008).
Com efeito, a interpretação dada pelo pronunciamento rescindendo deve ser desarrazoado de
tal modo que viole a norma jurídica em sua literalidade. Contudo, se a decisão rescindenda
eleger uma dentre as interpretações cabíveis, ainda que não seja a melhor, não é caso de ação
rescisória, sob pena de desvirtuar sua natureza, dando-lhe contorno de recurso. Nesse sentido,
é a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça. (Theotonio Negrão, in Código de
Processo Civil e Legislação Processual em vigor, 41ª ed., nota 20 ao art. 485, V, CPC).
Ainda, quanto à rescisão do julgado com fundamento no inciso V, do art. 966, do CPC, ensina
Fredie Didier Jr:
"Se a alegação de violação puder ser comprovada pela prova juntada aos autos com a petição
inicial, cabe a ação rescisória com base no inciso V, do art. 966; se houver necessidade de
dilação probatória, então essa rescisória é inadmissível. A manifesta violação a qualquer norma
jurídica possibilita o ingresso da ação rescisória, com vistas a desconstituir a decisão transitada
em julgado. A norma manifestamente violada pode ser uma regra ou um princípio.
Se a decisão rescindenda tiver conferido uma interpretação sem qualquer razoabilidade ao
texto normativo, haverá manifesta violação à norma jurídica. Também há manifesta violação à
norma jurídica quando se conferir uma interpretação incoerente e sem integridade com o
ordenamento jurídico. Se a decisão tratou o caso de modo desigual a casos semelhantes, sem
haver ou ser demonstrada qualquer distinção, haverá manifesta violação à norma jurídica. É
preciso que a interpretação conferida pela decisão seja coerente. Já se viu que texto e norma
não se confundem, mas o texto ou enunciado normativo tem uma importante função de servir
de limite mínimo, a partir do qual se constrói a norma jurídica. Se a decisão atenta contra esse
limite mínimo, sendo proferida contra legem, desatendendo o próprio texto, sem qualquer
razoabilidade, haverá também 'manifesta violação' à norma jurídica." (g.n., op. cit., p. 495).
E ainda:
"Cabe ação rescisória, nos termos do inciso V do art. 966 do CPC, contra decisão baseada em
enunciado de súmula ou acórdão de julgamento de casos repetitivos, que não tenha
considerado a existência e distinção entre questão discutida no processo e o padrão decisório
que lhe deu fundamento (art. 966, §5º, CPC). A regra aplica-se, por extensão, à decisão
baseada em acórdão de assunção de competência, que também não tenha observado a
existência de distinção.
Nesse caso, cabe ao autor da ação rescisória demostrar, sob pena de inépcia e consequente
indeferimento da petição inicial, fundamentadamente, que se trata de situação particularizada
por hipótese fática distinta ou questão jurídica não examinada, a exigir a adoção de outra
solução jurídica (art. 966, §6º, CPC)."
SÚMULA N. 343, DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
O enunciado da Súmula em epígrafe encontra-se vazado nos seguintes termos: "não cabe ação
rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado
em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais".
Sobre a incidência da Súmula, ensina Fredie Didier Jr. que "Enquanto se mantém a divergência
sem que haja a definição da questão de direito pelo tribunal superior, ainda é aplicável o
enunciado 343 do STF". (op. cit., p. 496).
Frise-se que não incide o enunciado da Súmula nº 343 do C. STF, quando a matéria objeto de
rescisão tenha sido controvertida nos tribunais, todavia, quando da prolação da decisão
rescindenda, já havia decisão sedimentada pelos tribunais superiores.
De outra parte, se a matéria ventilada em ação rescisória é circunspecta à ordem constitucional,
não se aplica a orientação prescrita na Súmula 343, adstrita às ações rescisórias cujo objeto
seja de natureza infraconstitucional ou infralegal.
Confira-se:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO RESCISÓRIA. MATÉRIA
CONSTITUCIONAL. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 343.
2. Inaplicabilidade da Súmula 343 em matéria constitucional, sob pena de infringência à força
normativa da Constituição e ao princípio da máxima efetividade da norma constitucional.
Precedente do Plenário. Agravo regimental a que se nega provimento (AI-AgR nº555806; 2ª
Turma do STF; por unanimidade; Relator Ministro EROS GRAU; 01/04/2008)
COISA JULGADA
A ofensa à coisa julgada pode ocorrer em relação à proibição de nova decisão quando já
existente coisa julgada sobre a questão ou, ainda, no tocante à obrigatoriedade de se levar em
consideração a coisa julgada de outra lide. A primeira ofensa ocorre quando se decide
novamente a mesma lide e a segunda quando a questão prejudicial da segunda lide é questão
principal da primeira, como no caso da ação de investigação de paternidade e alimentos. O
reconhecimento da paternidade objeto de trânsito em julgado não pode deixar de ser levado em
consideração como questão prejudicial em futura ação de alimentos.
Na hipótese de rescisória fundada em ofensa à coisa julgada por repetição de ação, o Tribunal
não poderá rejulgar a demanda, o que ofenderia novamente a coisa julgada.
Já no caso em que a coisa julgada é questão prejudicial da segunda ação, o Tribunal deve
julgar novamente o pedido, agora com respeito à coisa julgada.
AÇÃO RESCISÓRIA E JUÍZO RESCINDENTE
Na presente ação rescisória, o INSS requer a rescisão do julgado à conta de ofensa à coisa
julgada, que teria se operado na anterior ação ajuizada em 01/07/2008, de n. 0004851-
85.2008.8.26.0363, que teve curso na 2ª Vara de Jaguariúna/SP e transitou em julgado em
21.09.12, com julgamento final de improcedência do pedido.
No caso, o falecido segurado ajuizou uma primeira ação de n. 0004851-85.2008.8.26.0363 em
01.07.2008, em que afirmou na inicial que "encontrava-se afastado em benefício de auxílio-
doença, haja vista se encontrar acometido de: TRANSTORNOS MENTAIS E
COMPORTAMENTAIS, DEPENDÊNCIA DE ENTORPECENTES, TRANSTORNOS FÓBICOS
ANSIOSOS COM CRISES DE PERDA DE AUTOCONTROLE, SÍNDROME DE DEPENDÊNCIA
QUÍMICA, COM DEMÊNCIA, CRISES EPILÉTICAS E ESQUIZOFRENIA (CIDS: F 14.2, F 10.2,
F 15.2, F32.3, F20, G40)" (fls. 449/461, ordem crescente, id 97956660).
O pedido na inicial é de restabelecimento do auxílio-doença de NB 560.044.068-1, que cessara
em 21.4.08. Confira-se fragmento do pedido:
“(...) ao final, em sendo reconhecida a incapacidade do Autor, seja julgada totalmente
procedente a presente ação, com a concessão do benefício de auxílio-doença e ou,
aposentadoria por invalidez, conforme seja constatado pelo médico perito judicial, a inaptidão
total do Autor. Devendo estes, retroagirem ao dia em que o benefício foi negado, ou seja,
21/04/2008, que o valor dos benefícios retroativos sejam acrescidos de atualização monetária e
juros legais até a data do devido pagamento;”
Com a inicial o segurado juntou cópia do indeferimento de auxílio-doença requerido em
27.05.08, atestados médicos e receitas de medicamentos datados de novembro de 2003 a maio
de 2008 (fls. 470/521, id 97956660).
O laudo médico pericial (fls. 694/697, id 97956662), atestou que o segurado na data da perícia,
em 22.06.10, não apresentava incapacidade laborativa, conforme fragmento a seguir transcrito:
“O periciando está há 7 anos em abstinência alcoólica (SIC). Medicação em uso é de
manutenção. Controlado, inclusive, por medicamentes para as alterações do
Eletroencefalograma. Não há incapacidade laboral, do ponto de vista psiquiátrico.”
Com esteio no laudo, foi proferida sentença de improcedência (fls. 721/724, id 97956662) e esta
Corte, em decisão da lavra do Des. Fed. Hélio Nogueira (fls. 747/750, id 97956662) negou
seguimento ao apelo do autor, com trânsito em julgado em 21.09.12 (fl. 752, id 97956662).
Na segunda ação nº 0005671-77.2009.8.26.0296, movida em 22.10.09, em que prolatada a
decisão que se pretende rescindir, o falecido segurado requereu o restabelecimento do auxílio-
doença desde a cessação (em 21.04.08, fl. 47, id 97956673) ou, ainda, a concessão de auxílio-
doença ou aposentadoria por invalidez desde o indeferimento do pedido formulado na
viaadministrativa em27.05.2008 (fl. 48, id 97956673), ao fundamento de que, conforme relatório
médico de 2009 que instruiu a ação, apresenta incapacidade decorrente das seguintes
moléstias: síndrome de dependência, transtorno mental e de comportamento pelo uso de álcool
e transtorno psicótico agudo e transitório (fls. 19/32 doid 97956673 e fls. 822/833 doid
97956667).
Ainda na exordial, alegou que “a doença é degenerativa conforme os exames realizados,
apresentando sempre progressão degenerativa e piora.”
Com a inicial, o segurado juntou receituários de medicação (fls. 38/46 doid 97956673) e
declaração médica (fl. 37 do id 97956673), datada de 16.10.09, no sentido de que se
encontrava em tratamento desde 20.11.02 e padecia de afecções catalogadas na CID sob os
códigos F17.2 e F10.23, ou seja, “transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de
álcool e doenças relacionadas”.
A título de esclarecimento, o auxílio-doença NB- 5600440681 -que o falecido recebia desde
10.05.06-,cessou em 21.04.08 (CNIS de fl. 249 do id 97956673) e houve requerimentos
administrativos em 22.04.08, 27.05.08 e 05.03.10 (fls. 88/91 doid 97956673), tendo a primeira
ação sido ajuizada em 01.07.08 e a segunda em 22.10.09.
Ante o falecimento do autor, nesta segunda ação, em 2012, foi determinada perícia médica
indireta (fl. 258, id 97956673).
Na perícia indireta datada de 16.02.15 (fls. 287/288 doid 97956659), o expert atestou que o
autor, nascido em 20.09.71, de profissão auxiliar de produção, apresentava incapacidade total e
permanente para o labor, fixando a DII em 2003. Confira-se trecho do laudo:
“DISCUSSÃO E CONCLUSÃO. Trata-se de portador de patologias mentais caracterizadas por
transtornos psicóticos recorrentes com alterações comportamentais desencadeadas por
alcoolismo crônico, responsáveis por diversas internações psiquiátricas desde 2003
comprovadas por declarações médicas e tratamentos contínuos até o óbito ocorrido em
240912. Pode-se concluir que os sintomas e sinais das doenças psiquiátricas persistiram,
retirando seu discernimento de capacidade de auto gestão, criando assim, incapacidade total e
permanente desde a data da primeira internação. DII = DID = 031203”
A sentença prolatada em 25.9.15 julgou improcedente o pedido de concessão de benefício por
incapacidade e de conversão do LOAS em pensão por morte(fls. 251/254doid 97956659).
Interposto apelo (fls. 285/286doid 97956659), em sessão de 26.07.16, a Oitava Turma, por
unanimidade, tendo como Relatora a E. Des. Fed. Lúcia Ursaia, de ofício, anulou a sentença e,
aplicando o disposto no inciso III, do § 3º, do artigo 1.013 do Código de Processo Civil, julgou
parcialmente procedente o pedido da parte autora, para condenar o ente público ao pagamento
de aposentadoria por invalidez desde 22/04/2008 (dia seguinte à cessação do auxílio-doença)
até o falecimento do autor sucedido, restando prejudicada a apelação (processo registrado no
Tribunal Regional Federal da Terceira Região sob o nº 0004227-28.2016.4.03.9999).
Confira-se o teor do voto exarado no julgamento realizado:
“A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Inicialmente, ressalto que pelo
princípio da adstrição do julgamento ao pedido, a lide deve ser julgada nos limites em que foi
posta (artigos 141 e 492 do NCPC), sob pena de se proferir julgamento citra petita, extra petita
ou ultra petita.
Depreende-se da petição inicial que Gerson Barreto Souza postulou o restabelecimento de
auxílio-doença e posterior conversão em aposentadoria por invalidez (fls. 02/15). Informado o
óbito do autor (fl. 177), foi requerida a habilitação de herdeiros e a conversão do pedido em
concessão de pensão por morte (fls. 168). O MM. Juízo a quo deferiu a habilitação dos
herdeiros e converteu a ação em pensão por morte (fl. 252). Entretanto, a teor do disposto no
parágrafo único do art. 264 do CPC de 1973, vigente à época em que os sucessores do autor
requereram a inovação do pedido, não é permitida a alteração do pedido após o saneamento do
processo, em nenhuma hipótese, o que é o caso dos autos.
Por oportuno, ressalto que, embora a aposentadoria por invalidez pleiteada seja de caráter
personalíssimo, vindo a falecer o autor no curso do processo, antes do julgamento de seu
pedido, caso faça jus ao benefício, os valores devidos até o óbito são transmissíveis aos
herdeiros regularmente habilitados.
Assim, resta configurada a nulidade da sentença, diante da impossibilidade de conversão do
pedido após o saneamento do feito e considerando que o juiz está adstrito ao pedido e à causa
de pedir, para acolhê-lo ou rejeitá-lo, sendo esta a razão do brocardo ne procedat iudex vel ultra
vel extra petita partium.
Embora nula a sentença, não é o caso de se restituir os autos à primeira instância para que
outra seja prolatada, podendo as questões ventiladas nos autos ser imediatamente apreciadas
pelo Tribunal, incidindo, na espécie, a regra do inciso II do § 3º do art. 1.013 do novo Código de
Processo Civil.
Os requisitos para a concessão da aposentadoria por invalidez, de acordo com o artigo 42,
caput e § 2.º, da Lei n.º 8.213/91, são os seguintes: 1) qualidade de segurado; 2) cumprimento
da carência, quando for o caso; 3) incapacidade insuscetível de reabilitação para o exercício de
atividade que garanta a subsistência; 4) não serem a doença ou a lesão existentes antes da
filiação à Previdência Social, salvo se a incapacidade sobrevier por motivo de agravamento
daquelas.
A qualidade de segurado da parte autora e o cumprimento da carência prevista no inciso I do
artigo 25 da Lei nº 8.213/91 restaram comprovadas, uma vez que ela esteve em gozo de
auxílio-doença, benefício este que lhe foi concedido administrativamente até 21/04/2008,
conforme se verifica do documento juntado à fl. 31. Ainda que a presente ação tenha sido
ajuizada posteriormente ao "período de graça" disposto no artigo 15, II, da Lei nº 8.213/91, não
há falar em perda da condição de segurado, uma vez que se verifica do conjunto probatório
carreado aos autos, em especial o laudo médico pericial (fls. 240/241), que a parte autora
continuou incapacitada para o trabalho após a cessação do benefício. Logo, em decorrência do
agravamento de seus males, a parte autora deixou de trabalhar, tendo sido a sua incapacidade
devidamente apurada em Juízo. Note-se que a perda da qualidade de segurado somente se
verifica quando o desligamento da Previdência Social é voluntário, não determinado por motivos
alheios à vontade do segurado, consoante iterativa jurisprudência do Superior Tribunal de
Justiça, de que é exemplo a ementa de julgado a seguir transcrita:
''PREVIDENCIÁRIO - APOSENTADORIA POR INVALIDEZ - PERDA DA QUALIDADE DE
SEGURADO.
1. Não perde a qualidade de segurado o trabalhador que, por motivo de doença, deixa de
recolher as contribuições previdenciárias.
2. Precedente do Tribunal.
3. Recurso não conhecido'' (REsp nº 134212-SP, j. 25/08/98, Relator Ministro ANSELMO
SANTIAGO, DJ 13/10/1998, p. 193).
Para a solução da lide, é de substancial importância a prova técnica produzida. Nesse passo, a
incapacidade para o exercício de trabalho foi atestada pelo laudo pericial indireto realizado após
o óbito do segurado (fls. 240/241). De acordo com referido laudo pericial, a parte autora estava
incapacitada de forma total e permanente para o trabalho, desde 03/12/2003.
Assim, uma vez preenchidos os requisitos legais, fazia jus a segurada à aposentadoria por
invalidez pleiteada.
O termo inicial do benefício deve ser mantido no dia imediatamente posterior à cessação
indevida do auxílio-doença anteriormente concedido à parte autora (21/04/2008 - fl. 31) até a
data do óbito (24/09/2012), uma vez que o conjunto probatório existente nos autos revela que o
mal de que ela é portadora não cessou desde então, não tendo sido recuperada a capacidade
laborativa, devendo ser descontados eventuais valores pagos administrativamente.
Juros de mora e correção monetária na forma prevista no Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, com a redação atualizada pela Resolução
267/2013, observando-se, no que couber, o decidido pelo C. STF no julgado das ADI's 4.357 e
4.425.
Em virtude da sucumbência, arcará o INSS com os honorários advocatícios, ora arbitrados em
15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, conforme entendimento sufragado pela
10ª Turma desta Corte Regional.
Por fim, a autarquia previdenciária está isenta do pagamento de custas e emolumentos, nos
termos do art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96, do art. 24-A da Lei nº 9.028/95 (dispositivo
acrescentado pela Medida Provisória nº 2.180-35/01) e do art. 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/93, o
que não inclui as despesas processuais. Todavia, a isenção de que goza a autarquia não obsta
a obrigação de reembolsar as custas suportadas pela parte autora, quando esta é vencedora na
lide. Entretanto, no presente caso, não há falar em custas ou despesas processuais, por ser a
autora beneficiária da assistência judiciária gratuita.
Diante do exposto, ANULO A SENTENÇA, DE OFÍCIO, em face de sua natureza "extra petita"
e, aplicando analogicamente o disposto no inciso II do § 3º do art. 1.013 do novo Código de
Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO DA PARTE AUTORA,
condenando o INSS à concessão de aposentadoria por invalidez, com termo inicial, termo final,
correção monetária, juros de mora e honorários advocatícios, na forma da fundamentação,
RESTANDO PREJUDICADA A ANÁLISE DO MÉRITO DA APELAÇÃO.
É o voto.”
Ainda, o MPFinterpôs recurso especial por entender possível, sobrevindo o óbito do segurado,
converter a aposentadoria por invalidez em pensão por morte. Este recurso não foi admitido (fls.
365/366, id 97956659) e o MPF interpôs agravo (fls. 369/372 id 97956659) que foi desprovido
(fls. 391/392, id 97956659), com o trânsito em julgado em 14.09.18 (fl. 428, id 97956659).
Como se verifica de todo o narrado, sob o fundamento de ser portador dos mesmos transtornos
mentais, o falecido segurado requereu o restabelecimento do benefício de nº 31/560.044.068-1,
cessado em 21/04/2008 e, ainda, indicou requerimento de concessão administrativa de auxílio-
doença de 27/05/08.
Ao longo da instrução processual de cada feito, chegou-se a conclusões distintas, conforme
fragmentos dos laudos médicos periciais transcritos.
Éde se observar que a coisa julgada se caracteriza pela existência, entre duas causas, da
tríplice identidade de partes, pedido e causa de pedir, que tenha sido definitivamente julgada,
em face do esgotamento dos recursos possíveis.
Desse modo, é possível, em tese, em ações previdenciárias, que tratam de relações jurídicas
de trato sucessivo, o ajuizamento de outra ação quando a pretensão jurídica, embora já tenha
sido decidida em processo anteriormente ajuizado e que já tenha transitado em julgado, se
discuta um novo pedido, inclusive em razão do agravamento da enfermidade, como é no
presente caso, em que o agravamento dos males levou o então autor à morte.
Outro fato que chama a atenção é que foi realizada perícia indireta, sendo que o perito médico
concluiu que o falecido estava incapaz desde o ano de 2003.
A desconstituição de julgado com base no art. 966, IV, do Código de Processo Civil, pressupõe
a propositura de duas ações idênticas, vale dizer, com identidade de partes, pedido e causa de
pedir, e que a decisão rescindenda tenha sido proferida após o trânsito em julgado da decisão
alcançada pela coisa julgada supostamente violada.
Segundo o disposto nos §§ 2º e 4º do artigo 337 do Código de Processo Civil/2015:
§ 2º Uma ação é idêntica a outra quando possui as mesmas partes, a mesma causa de pedir e
o mesmo pedido.
§ 4º Há coisa julgada , quando se repete ação que já foi decidida por decisão transitada em
julgado.
De fato, a teor do art. 337, §§ 2º e 4º do CPC/2015, "uma ação é idêntica à outra quando possui
as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido"; e "há coisa julgada quando se
repete ação que já foi decidida por decisão transitada em julgado".
De acordo com o ilustrado escólio de Nelson Nery Júnior, caracteriza-se a identidade de ações
"quando tiverem rigorosamente, os mesmos elementos e subelementos: partes, causa de pedir
(próxima e remota) e pedido (imediato e mediato)" (in: Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de
Andrade Nery, CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL COMENTADO E LEGISLAÇÃO
EXTRAVAGANTE, 12ª ed. , SP, RT, 2012, pág. 683).
Desse modo, é possível, em tese, em ações previdenciárias, que tratam de relações jurídicas
de trato sucessivo, o ajuizamento de outra ação quando a pretensão jurídica, embora já tenha
sido decidida em processo anteriormente ajuizado e que já tenha transitado em julgado, se
discuta um novo pedido com data de início diverso e posterior ao primeiro pedido.
Nesse sentido, é o artigo 505 do Código de Processo Civil/2015, que assim prescreve:
“Art. 505. Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas, relativas à mesma lide,
salvo:
I - se, tratando-se de relação jurídica de trato continuado, sobreveio modificação no estado de
fato ou de direito; caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença;
II - nos demais casos prescritos em lei.”
Da análise dos elementos coligidos nesta ação, vislumbra-se que os processos não são
idênticos já que, não obstante possuam as mesmas partes e o mesmo pedido, não têm a
mesma causa de pedir.
De acordo com a definição do artigo 337, § 2º, do Código de Processo Civil/2015, para que as
ações sejam idênticas é preciso que, in verbis:
Uma ação é idêntica a outra quando possui as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o
mesmo pedido.
In casu, em ambas as ações em que se alega repetição, as partes são as mesmas, ou seja, o
INSS como réu e a ré como parte autora; o pedido é latu sensu o mesmo - aposentadoria por
invalidez/auxílio-doença; porém, a causa de pedir é outra, qual seja, declarar que, no momento
do pedido, a parte segurada logrou comprovar que preenchera todos os requisitos necessários
à concessão do benefício. Assim, patente que a causa de pedir nas duas ações são diferentes.
Desta forma, quando a parte formula novo pedido, esta nova formulação não é tecnicamente
uma renovação do pedido anterior, mas um novo pedido declaratório do preenchimento dos
requisitos a partir deste novo pedido.
E por tal razão, o pedido somente produz efeitos jurídicos e financeiros contra o INSS somente
a partir da data do novo pedido, no qual se reconhecera que no momento do pedido a parte
lograra comprovar o preenchimento de todos os requisitos para obtenção do benefício.
Assim, em existindo prévio requerimento administrativo, há sim o controle judicial de ato
administrativo complexo destinado à concessão ou não de aposentadoria, de modo que, nestas
circunstâncias, não se caracteriza a repetição da ação ajuizada anteriormente.
Desse modo, em não existindo prévio requerimento administrativo, há um novo pedido
destinado à concessão, ou não, de aposentadoria, em cujo pedido a causa de pedir é o
preenchimento dos requisitos para a obtenção do benefício, no momento deste novo pedido, e
como o juiz não delibera, além do que for necessário para conceder ou negar o benefício, ou
seja, para decidir sobre o pedido, o que não integra expressamente o pedido, não forma coisa
julgada.
Ainda, segundo entendimento no âmbito do STJ, ainda que as partes e pedido sejam idênticos,
se a causa de pedir estiver alicerçada em outros elementos de prova, não haverá identidade de
ações.
Com efeito, tratando-se de benefício por incapacidade a jurisprudência do C. STJ e desta Eg.
Corte admite a propositura de nova ação, pleiteando o mesmo benefício, quando fundada em
diversa causa de pedir, decorrente de eventual agravamento do estado de saúde da parte, que
resulte em alteração no estado de fato do segurado, conforme fragmentos abaixo transcritos:
“(...) tendo em vista o indeferimento de novo requerimento administrativo, formulado em
18.02.2016, e indeferido pela autarquia, e, não obstante pendia o julgamento da ação referida,
considerou-se a possibilidade de agravamento do estado de saúde do segurado, que
demandou a exigência de novo requerimento administrativo, não se vislumbrando, portanto, a
identidade de causa de pedir e, portanto, a litispendência. (...)”(TRF3, ApCiv 5950717-
90.2019.4.03.9999, relator Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO, DJ
02/10/2020).
“(...) É sabido que as demandas nas quais se postula benefícios porincapacidade(aposentadoria
por invalidez/auxílio-doença), caracterizam-se por terem como objeto relações continuativas e,
portanto, as sentenças nelas proferidas se vinculam aos pressupostos do tempo em que foram
formuladas, sem, contudo, extinguir a própria relação jurídica, que continua sujeita à variação
de seus elementos, eis que assentenças contêm implícita a cláusula rebus sic stantibus, de
forma que, alteradas/modificadas as condições fáticas ou jurídicas, tem-se nova causa de pedir
próxima ou remota (...) (TRF3, ApCiv 6071467-24.2019.4.03.9999, relatora Desembargadora
Federal MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA, DJ 01/10/2020)
“(...) e no surgimento de novas doenças (progressão/agravamento da enfermidade em sua
coluna cervical e em suas pernas), situações essas que a incapacitariam para o trabalho,
ressaltando ter efetuado novo requerimento administrativo. Assim, entendo que o pedido e a
causa de pedir destaação,ao menos em sede de cognição primária, são diversos daquele outro
feito (...)” (TRF3, ApCiv 5007047-29.2019.4.03.6183, relator Desembargador Federal TORU
YAMAMOTO, DJ 06/10/2020)
“(...) Em se tratando deaçãopara concessão de benefício de aposentadoria por invalidez, ou
auxílio-doença, existe a possibilidade deagravamentoda condição médica ou do surgimento de
outras moléstias incapacitantes, o que permite ao demandante requerer novamente o benefício,
não havendo que se falar emcoisajulgada material. (...)” (TRF3, ApCiv 5019864-
62.2018.4.03.6183, relator Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO
JUNIOR, DJ 25/11/2020)
Como se vê, a causa de pedir das duas ações é diversa, e da análise dos documentos coligidos
à ação subjacente tem-se que o autor trouxe elementos posteriores ao trânsito em julgado da
primeira ação que indicavam o agravamento da doença, como receitas médicas e a declaração
médica de 2009 de que se encontrava em tratamento pelas mesmas moléstias indicadas na
ação anterior.
Ainda, o próprio INSS reconheceu a incapacidade do segurado falecido administrativamente
para a concessão do benefício de prestação continuada em DIB 12/09/2011, data posterior à
conclusão do primeiro perito.
Desse modo, era possível nova disceptação judicial, para que fosse constatada a real situação
do requerente, pelo que não é o caso de reconhecimento da coisa julgada material, tampouco
de violação das normas jurídicas insculpidas nos artigos 485, V, 337, VII §§ 1º, 2º e 4º, 502,
503; 505, 507 e 508, todos do Código de Processo Civil, a ensejar, em juízo rescindendo, a
improcedência do pedido.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Condeno a parte AUTORA em honorários advocatícios fixados em R$1.000,00, conforme o
entendimento firmado pela Eg. Terceira Seção desta Corte.
AGRAVO REGIMENTAL
Com o julgamento do pedido desta ação rescisória, fica prejudicado o agravo regimental
interposto da decisão que indeferiu a antecipação de tutela.
DISPOSITIVO
Diante do exposto, julgo improcedente o pedido deduzido na presente ação rescisória e
prejudicado o agravo regimental.
Tendo em vista que os autos subjacentes tramitaram perante o Juízo da 1ª Vara da Comarca
de Jaguariúna/ SP, oficie-se àquele Juízo, após o trânsito em julgado da presente decisão,
dando-lhe ciência do inteiro teor do acórdão.
Com o trânsito em julgado, arquivem-se os autos.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA PROPOSTA COM FUNDAMENTO NOS INCISOS IV
e V, DO ART. 966, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. INOCORRÊNCIA DE OFENSA À
COISA JULGADA E MANIFESTA VIOLAÇÃO À NORMA JURÍDICA. AUXÍLIO-DOENÇA E
APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. CONSECTÁRIOS.
- O artigo 966 do Código de Processo Civil elenca, de modo taxativo, as hipóteses de
cabimento da ação rescisória, dentre as quais, o inciso V prevê a possibilidade de
desconstituição do julgado na hipótese de violação manifesta de norma jurídica e o inciso VIII
dispõe sobre a rescisão de decisão fundada em erro de fato, resultante de atos ou de
documentos da causa.
- As decisões judiciais devem, por meio de interpretação teleológica, escorar-se no
ordenamento jurídico e atender aos fins sociais, exigindo-se a devida fundamentação e
observação dos precedentes jurisprudenciais sobre a matéria.
- O inciso V, do art. 966 do CPC/15 indicam o cabimento de ação rescisória quando houver
violação evidente de norma jurídica, ou seja, demonstrada com prova pré-constituída juntada
pelo autor.
- A ofensa à coisa julgada como hipótese de rescisão do julgado, prevista no inciso IV, do art.
966, do CPC, pode ocorrer em relação à proibição de nova decisão quando já existente coisa
julgada sobre a questão ou, ainda, no tocante à obrigatoriedade de se levar em consideração a
coisa julgada de outra lide.
- Na ação rescisória, o INSS requer a rescisão do julgado em razão de ofensa à coisa julgada
na anterior ação ajuizada em 01/07/2008, de n. 0004851-85.2008.8.26.0363, que teve curso na
2ª Vara de Jaguariúna/SP e transitou em julgado em 21.09.12, com julgamento final de
improcedência do pedido.
- A ação subjacente n. 0005671-77.2009.8.26.0296, cujo julgado se pretende rescindir, trouxe à
lume o agravamento do estado do segurado autor e, muito embora tivesse as mesmas partes e
pedido, possuía causa de pedir diversa daquela constante da ação anteriormente ajuizada com
trânsito em julgado.
- O autor trouxe elementos posteriores ao trânsito em julgado da primeira ação que indicavam o
agravamento da doença, a saber, receitas médicas e uma declaração médica que dão conta de
que o autor encontrava-se em tratamento pelas mesmas moléstias indicadas na ação anterior.
- Ainda, o próprio INSS reconheceu a incapacidade do segurado falecido administrativamente
para a concessão do benefício de prestação continuada em DIB 12/09/2011, data posterior à
conclusão do primeiro perito.
- Desse modo, era possível nova disceptação judicial, para que fosse constatada a real situação
do requerente, pelo que não é o caso de reconhecimento da coisa julgada material, tampouco
de violação das normas jurídicas insculpidas nos artigos 485, V, 337, VII §§ 1º, 2º e 4º, 502,
503; 505, 507 e 508, todos do Código de Processo Civil, a ensejar, em juízo rescindendo, a
improcedência do pedido.
- Condenada a parte autora em honorários advocatícios fixados em R$1.000,00, conforme o
entendimento firmado pela Eg. Terceira Seção desta Corte.
- Com o julgamento do pedido desta ação rescisória, fica prejudicado o agravo regimental
interposto da decisão que indeferiu a antecipação de tutela.
- Pedido, em juízo rescindente, julgado improcedente e prejudicado o agravo regimental.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Seção, por
maioria, decidiu julgar improcedente o pedido deduzido na presente ação rescisória e
prejudicado o agravo regimental, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
