
| D.E. Publicado em 21/05/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, julgar improcedente a ação rescisória, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0012738-20.2008.4.03.0000/SP
RELATÓRIO
A SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL LUCIA URSAIA:
Trata-se de ação rescisória ajuizada pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em face de Zulmira de Oliveira Cordeiro, com fulcro no artigo 485, V, do Código de Processo Civil/1973 (art. 966, inciso V, do CPC/15), visando à desconstituição do v. acórdão exarado no Processo nº 2007.03.99.026859-0, que deu provimento ao recurso de apelação da parte autora para condenar o INSS "a proceder a revisão do cálculo da RMI da aposentadoria por idade do marido falecido da requerente, utilizando para tanto a diretriz dos artigos 33 e 50 da Lei 8.213/91, a fim de que os reflexos advindos desse recálculo sejam considerados na pensão por morte da autora" (fls. 37/41).
Narra a autarquia previdenciária que houve violação literal à disposição de lei. Alega que "não se aplica a regra de transição do art. 142 da Lei n.º 8.213/91, pois na data de sua vigência não estava o 'de cujus' filiado à previdência social urbana" (fl. 8), que "contando-se o período de carência a parir de novembro de 1.991, quando o Sr. Alfredo passou a contribuir para o Regime Geral de Previdência Social instituído pelas Leis n.ºs 8.212 e 8.213/91, como determinado na lei e no regulamento acima transcritos, completou ele apenas 77 (setenta e sete) meses de contribuição, quando deveria cumprir, no mínimo, 102 (cento e dois) meses" (fl. 9) e que "o período de trabalhador rural anterior a 24.07.91, ainda que com registro em Carteira de Trabalho, não pode ser contado para efeito de carência, pois não havia contribuição do empregado" (fl. 11).
Devidamente citada (fls. 68), Zulmira de Oliveira Cordeiro apresentou contestação, sustentando que o período de atividade rural anterior à vigência da Lei n.º 8.213/91 deve ser computado para efeito de carência (fl. 80/83).
Decorrido o prazo para manifestação da parte autora (fl. 88).
À fl. 88, determinou-se o encaminhamento dos autos ao Ministério Público.
Em parecer, às fls. 89/92, o ilustre representante do Ministério Público Federal, manifestou-se pela improcedência da ação, sustentando que "O próprio art. 142 da Lei n.º 8.213/91 permite que o trabalhador rural obtenha aposentadoria por idade em 1991, desde que demonstrasse nesta data haver contribuído por 60 meses. Portanto, é evidente que não se pode iniciar a contagem das contribuições apenas a partir de 1991" e que "A existência de contratos de trabalho rurais registrados em CTPS faz presumir que as respectivas contribuições sociais foram retidas pelos empregadores e repassadas à autarquia previdenciária".
É o relatório.
VOTO
A SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL LUCIA URSAIA:
Registro que a presente ação rescisória foi ajuizada em 08/04/2008, ou seja, sob a égide do Código de Processo Civil de 1973.
Impõe-se observar que, publicada a r. decisão rescindenda e interposta a presente ação rescisória em data anterior a 18.03.2016, a partir de quando se torna eficaz o Novo Código de Processo Civil, consoante as conhecidas orientações a respeito do tema adotadas pelos C. Conselho Nacional de Justiça e Superior Tribunal de Justiça, as regras de interposição da presente ação a serem observadas em sua apreciação são aquelas próprias ao CPC/1973. Inteligência do art. 14 do NCPC.
Verifico que foi obedecido o prazo de dois anos estabelecido pelo artigo 495 do CPC/1973, considerando a certidão de fl. 43.
Cuida-se de ação rescisória com fulcro no art. 485, V (violação a literal disposição de lei), do anterior CPC/1973, visando desconstituir do v. acórdão exarado no Processo nº 2007.03.99.026859-0, que deu provimento ao recurso de apelação da parte autora para condenar o INSS "a proceder a revisão do cálculo da RMI da aposentadoria por idade do marido falecido da requerente, utilizando para tanto a diretriz dos artigos 33 e 50 da Lei 8.213/91, a fim de que os reflexos advindos desse recálculo sejam considerados na pensão por morte da autora" (fl. 41).
Dado o caráter excepcional de que se reveste a ação rescisória, para a configuração da hipótese de rescisão em questão, é certo que o julgado impugnado deve violar, de maneira flagrante, preceito legal de sentido unívoco e incontroverso.
Sobre o tema, anota Theotonio Negrão:
"Art. 485: 20. 'Para que a ação rescisória fundada no art. 485, V, do CPC prospere, é necessário que a interpretação dada pelo 'decisum' rescindendo seja de tal modo aberrante que viole o dispositivo legal em sua literalidade. Se, ao contrário, o acórdão rescindendo elege uma dentre as interpretações cabíveis, ainda que não seja a melhor, a ação rescisória não merece vingar, sob pena de tornar-se recurso ordinário com prazo de interposição de dois anos' (RSTJ 93/416. no mesmo sentido: RT 634/93." (Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor. São Paulo: Saraiva, 44ª edição, 2012, p. 600).
A controvérsia existente nos autos diz respeito à possibilidade de ser computado o período como empregado rural anterior ao advento da Lei 8.213/1991, com registro em CTPS, para efeito de carência/contribuição.
O artigo 48 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 9.032, de 28 de Abril de 1995, vigente ao tempo do implemento dos requisitos, dispõe que:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para 60 (sessenta) e 55 (cinqüenta e cinco) anos no caso dos que exercem atividades rurais, exceto os empresários, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a dos incisos I e IV e nos incisos VI e VII do art. 11 desta lei.
§ 2º Para os efeitos do disposto no parágrafo anterior, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido."
A concessão do benefício de aposentadoria por idade na forma do artigo 48, §§ 1º e 2º, da Lei n.º 8.213/91 é devida aos trabalhadores rurais, referidos no artigo 11, na alínea "a" dos incisos I e IV e nos incisos VI e VII, da Lei nº 8.213/91, aos 55 (cinquenta e cinco) à mulher e aos 60 (sessenta) anos ao homem (artigo 48, § 1º, do mesmo diploma legal), mediante a comprovação do trabalho rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, cumprindo-se o número de meses exigidos nos art. 25, inciso II, ou o número de meses exigidos no art. 142 da Lei 8.213/91, a depender do ano de implemento do requisito etário, dispensando-se, assim, a comprovação do efetivo recolhimento das contribuições mensais nesse período.
Enquanto que o benefício previsto no art. 143 da Lei nº 8.213/91 exige, para a sua concessão, a comprovação do exercício de trabalho rural, ainda que descontinuamente, mas no período imediatamente anterior ao ajuizamento da demanda, em número de meses idêntico à carência desse benefício, dispensando-se, assim, a comprovação do efetivo recolhimento das contribuições mensais nesse período.
A disposição contida no art. 143 é uma exceção à aplicação do art. 142 da Lei Previdenciária (Lei nº 8.213/91). Naquele, a intenção do legislador ao editá-lo foi garantir a prestação de um salário mínimo aos trabalhadores rurais que não tenham contribuído, diferentemente da hipótese prevista no art. 142, que, aplicado em conjunto com o art. 48, assegura o direito à aposentadoria aos trabalhadores urbanos e rurais que contribuíram regularmente à Previdência Social.
É sabido que a atividade rural na condição de segurado especial, exercida antes da Lei 8.213/1991, não pode ser computada para efeito de carência para fins de concessão de benefício previdenciário acima do valor mínimo, bem como que o período posterior somente pode ser averbado para fins de beneficio urbano, se precedido das respectivas contribuições (art. 55, § 2º da Lei 8.213/91).
É de se ressaltar que, desde a edição da Lei n.º 4.214/1963, as contribuições previdenciárias, no caso dos empregados rurais, ganharam caráter impositivo e não facultativo, constituindo obrigação do empregador, nos termos do artigo 79 de referido diploma legal. Com a edição da Lei Complementar n.º 11/1971, que criou o Fundo de Assistência do Trabalhador Rural - FUNRURAL, o recolhimento das contribuições previdenciárias continuou a cargo do empregador, conforme determinava seu artigo 15, inciso II, c.c. os artigos 2.º e 3.º do Decreto-lei n.º 1.146/1970. Tal disposição vigorou até a edição da Lei n.º 8.213/91, que criou o Regime Geral da Previdência Social, extinguiu o FUNRURAL e unificou os sistemas previdenciários de trabalhadores da iniciativa privada urbana e rural.
Frisa-se que, na espécie, não se trata de atividade cuja filiação à previdência tenha se tornado obrigatória apenas com a edição da Lei n.º 8.213/91, como na hipótese dos rurícolas que exercem seu trabalho em regime de economia familiar. Em se tratando de empregado rural, a sua filiação ao sistema previdenciário era obrigatória, assim como o recolhimento das contribuições respectivas, gerando a presunção de seu recolhimento, pelo empregador, conforme anteriormente mencionado. É de se observar que, ainda que o recolhimento não tenha se dado na época própria, não pode o trabalhador ser penalizado, uma vez que a autarquia previdenciária possui meios próprios para receber seus créditos.
Neste sentido, confira-se o seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça:
"PREVIDENCIÁRIO. EMPREGADO RURAL. ATIVIDADE DE FILIAÇÃO OBRIGATÓRIA. LEI N.º 4.214/1963. CONTRIBUIÇÃO. OBRIGAÇÃO. EMPREGADOR. EXPEDIÇÃO. CERTIDÃO. CONTAGEM RECÍPROCA. POSSIBILIDADE. ART. 94 DA LEI N.º 8.213/1991.
1. A partir da Lei n.º 4.214, de 02 de março de 1963 (Estatuto do Trabalhador Rural), os empregados rurais passaram a ser considerados segurados obrigatórios da previdência social.
2. Desde o advento do referido Estatuto, as contribuições previdenciárias, no caso dos empregados rurais, ganharam caráter impositivo e não facultativo, constituindo obrigação do empregador. Em casos de não-recolhimento na época própria, não pode ser o trabalhador penalizado, uma vez que a autarquia possui meios próprios para receber seus créditos. Precedente da Egrégia Quinta Turma
3. .....................................................................
4. Ocorrência de situação completamente distinta daquela referente aos trabalhadores rurais em regime de economia familiar, que vieram a ser enquadrados como segurados especiais tão-somente com a edição da Lei n.º 8.213/91, ocasião em que passaram a contribuir para o sistema previdenciário." (STJ; REsp nº 554068/SP, 5ª Turma, Relatora Ministra Laurita Vaz, por unanimidade, j. 14/10/2003, DJ 17/11/2003, pág. 378).
Dessa forma, a responsabilidade financeira pelas contribuições previdenciárias referentes ao tempo de serviço rural prestado na condição de empregado, com registro em CTPS, deve ser suportada pelos empregadores que se beneficiaram do trabalho da parte ré. Ao INSS incumbe, tão-somente, computar o período contributivo para fins de calcular o valor do benefício, eis que sendo trabalhador rural, com registro em CTPS, seu benefício não pode ser calculado pelo valor fixo de um salário mínimo previsto no art. 143 da Lei 8.213/1991.
No mesmo sentido, jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça em julgamento submetido à sistemática de recurso repetitivo:
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. AVERBAÇÃO DE TRABALHO RURAL COM REGISTRO EM CARTEIRA PROFISSIONAL PARA EFEITO DE CARÊNCIA. POSSIBILIDADE. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 55, § 2º, E 142 DA LEI 8.213/91. NÃO OCORRÊNCIA. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.
1. Caso em que o segurado ajuizou a presente ação em face do indeferimento administrativo de aposentadoria por tempo de serviço, no qual a autarquia sustentou insuficiência de carência.
2. Mostra-se incontroverso nos autos que o autor foi contratado por empregador rural, com registro em carteira profissional desde 1958, razão pela qual não há como responsabilizá-lo pela comprovação do recolhimento das contribuições.
3. Não ofende o § 2º do art. 55 da Lei 8.213/91 o reconhecimento do tempo de serviço exercido por trabalhador rural registrado em carteira profissional para efeito de carência, tendo em vista que o empregador rural, juntamente com as demais fontes previstas na legislação de regência, eram os responsáveis pelo custeio do fundo de assistência e previdência rural (FUNRURAL).
4. Recurso especial improvido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e Resolução STJ nº 8/2008." (REsp 1352791-SP, S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, julgamento em 27/11/2013, DJe 05/12/2013)
No caso em análise, consta dos autos que o "de cujus" exerceu atividade como rurícola, com anotação na CTPS, nos períodos de 02/06/1982 a 08/10/1982 (Empreiteira Santos LTDA), 03/05/1983 a 31/12/1983, 09/01/1984 a 26/10/1984, 26/01/1985 a 30/04/1985, 02/05/1985 a 24/10/1985, 18/11/1985 a 30/04/1986, 01/05/1986 a 22/11/1986, 01/12/1986 a 31/03/87, 01/04/1987 a 09/10/1987, 10/10/1987 a 22/04/1988, 20/12/1988 a 30/04/1989, 02/05/1989 a 08/11/1989, 13/11/1989 a 19/10/1991, 18/01/1993 a 10/09/2001 (Aldo Bellodi e Outros), 01/12/1983 a 30/03/1984 (Agro-Pecuária Gino Bellodi LTDA), 02/05/1988 a 18/11/1988 (Agro-Pecuária Cascavel LTDA) e 06/11/1991 a 24/09/1992 (José Luiz Polizel).
Tendo o "de cujus" implementado o requisito etário em 1998 (artigo 48, § 1.º, da Lei n.º 8.213/91), a carência é de 102 (cento e duas) contribuições mensais (tabela do artigo 142 da Lei nº 8.213/91), contando com a carência em número superior ao exigido.
No caso, a violação a disposição de lei não restou configurada, resultando a insurgência da autarquia de mero inconformismo com o teor do julgado rescindendo, que lhe foi desfavorável, insuficiente para justificar o desfazimento da coisa julgada, a teor do que estatui o artigo 485, inciso V, CPC, que exige, para tanto, ofensa à própria literalidade da norma, hipótese ausente, in casu.
Por oportuno, trago à colação o seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça:
"AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO. DISPOSIÇÃO. LEI. INEXISTÊNCIA. PRETENSÃO. REEXAME. PROVA. IMPOSSIBILIDADE.
1. Não importa em infringência de disposição de lei o acórdão que, em sede de recurso especial, decide a controvérsia com base em interpretação cabível de texto legal, pressupondo, o cabimento da ação rescisória fundada no art. 485, V, do CPC, que represente violação de sua literalidade, hipótese não caracterizada na espécie.
2. O reexame do conjunto fático-probatório é impróprio à via rescisória, objetivando corrigir erro de legalidade, dada a sua natureza excepcional. Precedentes.
3. Pedido julgado improcedente." (Ação Rescisória nº 2.994/SP, Relator Ministro Fernando Gonçalves, DJU 20/03/2006).
Assim sendo, é incabível a rescisão do julgado pela hipótese prevista art. 966, inciso V, do CPC, justificando-se a improcedência da ação rescisória.
Diante do exposto, com fundamento no artigo 487, inciso I, do CPC/15, JULGO IMPROCEDENTE A AÇÃO RESCISÓRIA, na forma da fundamentação adotada.
Condeno o INSS ao pagamento de verba honorária, fixada em R$ 1.000,00 (mil reais), em harmonia com o entendimento da Terceira Seção desta Corte Regional.
Oficie-se ao Juízo de Direito da Comarca de Guariba/SP, comunicando-lhe o inteiro teor deste julgado.
É o voto.
LUCIA URSAIA
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