
3ª Seção
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5025486-71.2023.4.03.0000
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
AUTOR: MARTA GOMES DE OLIVEIRA
Advogado do(a) AUTOR: RONALDO CARLOS PAVAO - SP213986-N
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
3ª Seção
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5025486-71.2023.4.03.0000
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
AUTOR: MARTA GOMES DE OLIVEIRA
Advogado do(a) AUTOR: RONALDO CARLOS PAVAO - SP213986-N
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de ação rescisória ajuizada por MARTA GOMES DE OLIVEIRA, com fundamento no artigo 966, incisos V e VIII, do Código de Processo Civil, visando a rescisão da sentença que julgou improcedente o pedido formulado no processo n. 1002597-43.2022.8.26.0457, que tramitou perante o Juízo de Direito da 2ª Vara da Comarca de Pirassununga, SP, tendo por objeto o restabelecimento do benefício de auxílio-doença desde a cessação ou a conversão em aposentadoria por invalidez.
Sustenta a autora, em síntese, que "em perícia médica judicial realizada em 23/08/2022 pelo médico perito nomeado, Dr. Luiz Augusto Martins Silva, foi constatada incapacidade laborativa total e temporária pelo período de 17/09/2019 a 23/08/2022" (ID 279688871 - Pág. 2), todavia, a sentença julgou improcedente o pedido.
Requer, portanto, a rescisão do julgado, pois "constatada a incapacidade total e temporária da Requerente em perícia judicial no período de 17/09/2019 a 23/08/2022, é de rigor a concessão do benefício por incapacidade com o pagamento dos valores respectivos" (ID 279688871 - Pág. 4).
A decisão de ID 280448628 deferiu os benefícios da gratuidade da justiça à autora.
Citado, o INSS apresentou contestação, sustentando, em preliminar, a ausência de interesse processual, ante o caráter recursal da presente ação, a impossibilidade jurídica do pedido e a carência da ação em relação ao pedido de recebimento dos valores relativos ao benefício de auxílio por incapacidade laborativa no interregno de 17.09.19 e 04.03.21. No mérito, pugnou pela improcedência do pedido (ID 282567529).
Réplica (ID 283893619).
As partes não requereram a produção de novas provas.
Alegações finais da parte autora (ID 287518265) e do INSS, nas quais aduz "a emissão da Carteira Nacional de Habilitação em 13.10.2021, para o que se fez necessária a realização de consulta médica em que há questionamento sobre a ingestão de medicamentos controlados" e, em "caso de procedência do pedido referente à concessão do benefício, faz-se necessária a expedição de ofício ao Detran notificando-se as reais condições de saúde da parte autora" (ID 289426805).
Manifestação do Ministério Público Federal pelo prosseguimento do feito (ID 290409816).
É o relatório.
3ª Seção
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5025486-71.2023.4.03.0000
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
AUTOR: MARTA GOMES DE OLIVEIRA
Advogado do(a) AUTOR: RONALDO CARLOS PAVAO - SP213986-N
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): conforme já observado, não houve o transcurso do prazo decadencial de 02 (dois) anos para a propositura da ação rescisória, previsto no artigo 975 do Código de Processo Civil.
Ressalto, por oportuno, que o documento trazido pelo INSS em suas alegações finais (CNH da parte autora), já constava dos autos na ocasião da distribuição da presente ação (ID 279689241), motivo pelo qual afigura-se desnecessária a abertura de vista para a parte autora.
A matéria preliminar diz respeito ao mérito, e com ele será analisada.
I - Da alegada violação a literal disposição de lei
Quanto a esta alegação, dispõe o art. 485, V, do Código de Processo Civil:
"Art. 485. A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
(...)
V - violar literal disposição de lei".
Com a entrada em vigor do Código de Processo Civil/2015, a matéria está disciplinada no art. 966, inc. V, do CPC, assim redigido:
"Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
(...)
V - violar manifestamente norma jurídica".
A viabilidade da ação rescisória fundada no artigo 966, inciso V, do CPC decorre da não aplicação de uma determinada lei ou do seu emprego de tal modo aberrante que viole frontalmente o dispositivo legal, dispensando-se o reexame dos fatos da causa originária.
O julgado rescindendo assim apreciou a matéria relativa à incapacidade da parte autora:
"Trata-se de ação em que a requerente pretende a condenação da autarquia requerida à concessão do benefício de auxílio-doença, alegando doença que o impossibilita de trabalhar.
Contudo, a perícia atestou que não existe doença incapacitante.
Segundo a conclusão do il expert do juízo:
“Não há doença incapacitante atual. Houve incapacidade total e temporária de 17/09/2019 conforme Laudo Médico acostado às fls. 9-19 dos autos até data de exame médico pericial em 23/08/2022. 52 anos. Escolaridade: Ensino Médio Completo. Formação técnico profissional: Planejadora e Controladora de Produção Percianda em acompanhamento ambulatorial e medicamentoso. Quadro estável. Não apresenta efeitos adversos decorrente do uso das medicações. Exame neurológico # Força muscular grau V global com reflexos osteotendinosos presentes e simétricos. Coordenação preservada. Marcha normal. Ausência de nistagmos. Pares cranianos preservados. Exame Neuropsicológico # Comparece ao exame com vestes e higiene adequada. Pensamento estruturado com curso e conteúdo regulares, não evidenciando atividades delirantes ou deliróides. Discurso conexo e atento à entrevista. Orientada no tempo, espaço e circunstâncias. Tem suficiente noção da natureza e finalidade deste exame. Humor adequado, sem sinais de ansiedade. Discernimento preservado. Não relata distúrbios senso-perceptivos durante esta avaliação pericial, nem suas atitudes os faz supor. Inteligência dentro dos limites da normalidade. Ideação concreta, evidenciando satisfatória capacidade de abstração, análise e interpretação. Demonstra compreensão adequada dos assuntos abordados. Pragmatismo preservado. Memória de evocação e fixação preservadas.” (fls. 106).
Portanto, não há que se falar em concessão de auxíliodoença ou aposentadoria por invalidez.
Ante o exposto, mantenho a decisão liminar de fls. 58/59 e JULGO IMPROCEDENTE o pedido autoral, extinguindo o processo nos termos do artigo 487, inciso I, do CPC. Condeno a parte autora ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como em honorários advocatícios que arbitro em 10% do valor da causa, ressalvada a gratuidade de justiça, nos termos do artigo 98, §3º, do CPC” (ID 279689258 - Pág. 2).
Não houve a interposição de recurso de apelação pela parte autora.
De fato, a perícia médica realizada no feito subjacente, em 23.08.2022, concluiu:
“Não há doença incapacitante atual. Houve incapacidade total e temporária de 17/09/2019 conforme Laudo Médico acostado às fls. 9-19 dos autos até data de exame médico pericial em 23/08/2022. 52 anos. Escolaridade: Ensino Médio Completo. Formação técnico profissional: Planejadora e Controladora de Produção
Percianda em acompanhamento ambulatorial e medicamentoso. Quadro estável. Não apresenta efeitos adversos decorrente do uso das medicações” (ID 279689253 - Pág. 9) (grifou-se).
Saliente-se, por oportuno, que a parte autora esteve em gozo de auxílio-doença no período de 24.04.2019 a 04.03.2021, de modo que em grande parte do período apontado pelo perito, houve a cobertura previdenciária. Ademais, verifica-se que o termo final fixado pelo perito na data da realização da perícia ocorreu de maneira genérica, pois não houve justificativa para a escolha de tal data. A propósito, na perícia administrativa realizada em 25.02.2021, constatou-se o seguinte: “considerações: apta. não apresenta sinais de sofrimento fisico ou mental incapacitantes, no momento, não trazendo dados tecnicos que justifiquem concessão de beneficio por incapacidade. podendo manter tratamento ambulatorial enquanto exerce suas atividades. esteve em afastamento por tempo suficiente para controle clinico” (ID 280118959 - Pág. 149).
Desse modo, verifico que os argumentos deduzidos pela autora evidenciam tratar-se de pretensão rescisória direcionada ao questionamento do critério de valoração adotado no julgado rescindendo quanto às provas produzidas na ação originária, fundamentado no livre convencimento motivado, buscando assim uma nova valoração das provas segundo os critérios que entende corretos, o que se afigura inadmissível na via estreita da ação rescisória com fundamento no artigo 966, V do Código de Processo Civil. Nesse sentido, as orientações pacíficas da E. Terceira Seção deste Tribunal Regional Federal e do C. Superior Tribunal de Justiça:
"AÇÃO RESCISÓRIA. CPC, ARTIGO 485, INCISO V. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. PRETENSÃO DE NOVA ANÁLISE DO CASO. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI.
- (...).
- (...)
- A rescisória não se confunde com nova instância recursal, exigindo-se que o posicionamento seguido desborde do razoável, agredindo a literalidade ou o propósito da norma, não servindo à desconstituição, com fulcro no inciso V do artigo 485 do CPC, a veiculação de pedido com base em mera injustiça ou má apreciação das provas." (TRF 3ª Região, TERCEIRA SEÇÃO, AR 0008904-67.2012.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL THEREZINHA CAZERTA, julgado em 22/05/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/06/2014).
"AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI E ERRO DE FATO. PEDIDO DE RESCISÃO QUE DEPENDE DE REEXAME DA PROVA. IMPOSSIBILIDADE. AÇÃO RESCISÓRIA QUE SE JULGA IMPROCEDENTE.
1) Na ação rescisória, não se examina o direito da parte, mas a decisão passada em julgado, que só se rescinde nos específicos casos do art. 485 do CPC.
2) Os dispositivos tidos por violados (arts. 157, IX, da CF de 1946, e 165, X, da CF de 1967, e arts. 55, § 3º, e 106, da Lei 8213/91) só se aplicam a quem tenha exercido atividade laboral (no caso, rural).
3) O colegiado, analisando as provas (material e testemunhal), concluiu que, no período questionado (de 2/12/1964 a 1/11/1975), o autor não era trabalhador rural, mas estudante.
4) Logo, não há como concluir que tenha havido violação a literal disposição de lei ou erro de fato, pois que, além da controvérsia sobre o tema, houve pronunciamento judicial sobre ele.
5) A má apreciação da prova não autoriza o exercício da ação rescisória.
6) Ação rescisória que se julga improcedente." (TRF 3ª Região, TERCEIRA SEÇÃO, AR 0046332-25.2008.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS, julgado em 08/08/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/08/2013).
"AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. NÃO CONFIGURAÇÃO. JULGADO FUNDADO NA ANÁLISE DE FATOS E PROVAS. NOVO REJULGAMENTO DA CAUSA EM RESCISÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. AÇÃO DE ÍNDOLE RESTRITA. DECISÃO MANTIDA PELOS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS.
1. (...).
2. A violação a literal dispositivo de lei autoriza o manejo da ação rescisória apenas se do conteúdo do julgado que se pretende rescindir extrai-se ofensa direta a disposição literal de lei, dispensando-se o reexame de fatos da causa.
3. Demanda rescisória não é instrumento hábil a rediscutir a lide, pois é de restrito cabimento, nos termos dos arts. 485 e seguintes do CPC.
4. Decisão recorrida que deve ser mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos, tendo em vista a ausência de argumentos novos aptos a modificá-la.
5. Agravo regimental não provido." (AgRg no AREsp 450.787/GO, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 15/05/2014, DJe 26/05/2014).
Conclui-se, portanto, não caracterizada a hipótese de rescindibilidade prevista no art. 966, V, do Código de Processo Civil.
II - Do alegado erro de fato
Para efeito de rescisão do julgado, entende-se configurado o erro de fato (art. 966, VIII, do CPC) quando o julgador não percebe ou tem falsa percepção acerca da existência ou inexistência de um fato incontroverso e essencial à alteração do resultado da decisão. Não se cuida, portanto, de um mero erro de julgamento, mas de uma falha no exame do processo a respeito de um ponto decisivo para a solução da lide.
Considerando o previsto no § 1º do artigo 966, do Código de Processo Civil é, ainda, indispensável para o exame da rescisória com fundamento em erro de fato, que não tenha havido controvérsia, nem pronunciamento judicial sobre o fato, e que o erro se evidencie nos autos do feito em que foi proferida a decisão rescindenda, sendo inaceitável a produção de provas para demonstrá-lo na ação rescisória.
No presente caso, o julgado rescindendo analisou efetivamente a prova constante dos autos, sopesou-as e entendeu pelo não preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício.
Logo, não considerou a existência de um fato inexistente, nem inexistente um fato efetivamente ocorrido, não incidindo assim no alegado erro de fato que viabilizaria a rescisão da decisão passada em julgado. Observe-se, finalmente, que a ação rescisória não se presta ao "reexame de fatos e provas considerados no acórdão rescindendo, para saber se foi ou não bem apreciada a demanda" (STF, AR 1111, Rel. Min. Néri da Silveira).
Diante de todo o exposto, julgo improcedente o pedido formulado na presente ação rescisória, extinguindo o processo, com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil.
Condeno a parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios, que arbitro em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 85 do Código de Processo Civil, cuja execução observará o disposto no art. 98, § 3º, do citado diploma legal.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO DE NORMA JURÍDICA. ERRO DE FATO. ART. 966, V E VIII, DO CPC. INOCORRÊNCIA. MANUTENÇÃO DO JULGADO RESCINDENDO.
1. Os argumentos deduzidos pela autora evidenciam tratar-se de pretensão rescisória direcionada ao questionamento do critério de valoração adotado no julgado rescindendo quanto às provas produzidas na ação originária, fundamentado no livre convencimento motivado, buscando assim uma nova valoração das provas segundo os critérios que entende corretos, o que se afigura inadmissível na via estreita da ação rescisória com fundamento no artigo 966, V do Código de Processo Civil.
2. Considerando o previsto no § 1º do artigo 966, do Código de Processo Civil, é indispensável para o exame da rescisória com fundamento em erro de fato, que não tenha havido controvérsia, nem pronunciamento judicial sobre o fato, e que o erro se evidencie nos autos do feito em que foi proferida a decisão rescindenda, sendo inaceitável a produção de provas para demonstrá-lo na ação rescisória. No presente caso, o julgado rescindendo analisou efetivamente a prova constante dos autos, sopesou-as e entendeu pelo não preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício.
3. Improcedência do pedido formulado em ação rescisória. Honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 85 do Código de Processo Civil, cuja execução observará o disposto no art. 98, § 3º, do citado diploma legal.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
