Processo
AR - AÇÃO RESCISÓRIA / SP
5003983-62.2021.4.03.0000
Relator(a)
Desembargador Federal LUIZ DE LIMA STEFANINI
Órgão Julgador
3ª Seção
Data do Julgamento
19/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 24/11/2021
Ementa
E M E N T A
AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO MANIFESTA DE NORMA JURÍDICA. REDISCUSSÃO DO
QUADRO PROBATÓRIO. INVIABILIDADE. SÚMULA 343 DO STF. AÇÃO IMPROCEDENTE.
1.Para a maciça doutrina processual, violar literal disposição de lei significa desbordar por inteiro
do texto e do contexto legal, importando flagrante desrespeito à lei, em ter a sentença de mérito
sido proferida com extremo disparate, completamente desarrazoada.
2. Relativamente à alegação de manifesta violação de norma jurídica na certificação do trânsito
em julgado,não verifico ilegalidade na r. decisão "a quo", ratificada por decisão monocrática desta
Corte, já que é evidente que problemas técnicos "interna corporis" na procuradoria do INSS não
tem como ensejar a desconstituição da coisa julgada, à míngua de previsão legal nesse sentido,
até porque o próprio INSS reconheceu que a Subsecretaria do juízo "a quo" procedeu
corretamente nos atos de intimação das partes acerca da sentença.
3. Aautarquia não demonstrou que o valor da condenação na ação subjacente realmente
ultrapassaria mil salários mínimos, e que, portanto, a r. sentença deveria ter sido submetida ao
reexame necessário, ônus que lhe competia.
4.Relativamente à alegação de nulidade do laudo pericial, pelo fato de o perito nomeado pelo
juízo ser técnico em segurança do trabalho, com infringência, segundo aduz, aoartigo 58, § 1º, da
Lei nº 8.213/91,que exige que o laudo seja elaborado por engenheiro ou médico do trabalho,este
Tribunal já reconheceu a possibilidade de nomeação, como perito, de técnico em segurança do
trabalho.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
5. Assim,forçoso concluir, quanto ao ponto, que a r. sentença "a quo" não está baseada em
fundamentos absolutamente errôneos ou sem qualquer amparo legal e/ou jurisprudencial, de
maneira que a alegação do INSS não comporta acolhimento, com aplicação ao caso da Súmula
343 do STF.
6. No que concerne à alegada ilegalidade no reconhecimento de períodos rurais como especiais e
a sua conversão em tempo de atividade comum, é possível extrair do laudo pericial de
fls.204/233, ID 153441837, que em relação aos períodos trabalhados pelo requerido na área
ruralcomo rurícola e trabalhador rural polivalente em atividade de agropecuária, a partir de
02.01.1981,manipulava ele produtos químicos como algicidas,herbicidas, fungicidas e
praguicidas,para aplicação nas lavouras, sendo considerados especiais os períodosdescritos na
inicial e àfl. 208 do laudo técnico, exatamente sob esse fundamento, conforme conclusão do
perito às fls. 209e 226, ID 153441837.
7. Assim, ao contrário do afirmado pelo INSS, não se tratava de trabalho na lavoura de cana-de-
açúcar, mas de labor em atividade de agropecuária, em que o requerido tinha contato direto com
diversos agentes químicos insalubres. Por outro lado, ainda quefosse o caso de atividade na
lavoura de cana, tal fato não ensejaria a rescisão do r. julgado "a quo", porquanto é cediço que a
jurisprudência, inclusive deste Tribunal, até hoje ainda não é uníssona quanto ao reconhecimento
da especialidade de referido trabalho rural, o que ensejaria a aplicação da Súmula 343 do STF.
Precedentes desta Corte.
8. Quanto ao trabalho como pedreiro e serviços gerais, o laudo pericial é conclusivo quanto ao
contato e à manipulação pelo requerido de substâncias como poeira mineral proveniente do cal e
do cimento, e também ruído acima do limite legal (trabalho como pedreiro), além de germes, vírus
e bactérias, quando no exercício de suas atividades gerais de limpeza do lixão, em
quemovimentava lixo, executava roçada manual e remoção de materiais sólidos nacaixa de
decantação e nas lagoas de tratamento do "chorume"(fls. 209/210, ID 153441837), agentes
insalubres que afetam a saúde do trabalhador.
9. Portanto, não há qualquer dúvida de que a r. sentença rescindenda baseou-se em prova
técnica devidamente fundamentada por profissional nomeado pelo juízo, a fim de concluir pela
especialidade dos períodos reconhecidos, não havendo, nesse aspecto, qualquer teratologia na
conclusão judicial, que pudesse ensejarferimento a dispositivo de lei ou da Constituição Federal.
10. Não se trata, pois, de decisão que tenha desbordado do razoável ou agredido a literalidade ou
o propósito da norma aplicável ao caso, restando claro, assim, o intuito recursal da autarquia, a
fim de rediscutir os critérios adotados pelo julgado rescindendo na apreciação das provas, o que é
manifestamente vedado pela via da ação rescisória.
11. Ação rescisória improcedente.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Seção
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5003983-62.2021.4.03.0000
RELATOR:Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
REU: MILTON APARECIDO DA MATA
Advogado do(a) REU: ALESSANDRO DEL NERO MARTINS DE ARAUJO - SP233292-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região3ª Seção
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5003983-62.2021.4.03.0000
RELATOR:Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
REU: MILTON APARECIDO DA MATA
Advogado do(a) REU: ALESSANDRO DEL NERO MARTINS DE ARAUJO - SP233292-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação rescisória ajuizada pelo INSS, em face de MILTON APARECIDO DA MATA,
visando rescindir r. sentençaproferida pelo MMº Juízo de Direito da 1ª VARA CÍVEL DA
COMARCA DE FERNANDÓPOLIS - fls.358/364, ID 153441837 -, transitada em julgado em
11.03.2020, conforme certidão de fl. 370, ID 153441837, que concedeu ao requerido
aposentadoria integral por tempo de contribuição, tendo sido, ainda, o trânsito em julgado
ratificado pelo eminente Desembargador Federal Gilberto Jordan, em decisão monocrática
terminativa proferida nos autos do agravo de instrumento nº 5012455-86.2020.4.03.0000, cuja
decisão transitou em julgado em 05.10.2020 - ID 153441837, fls. 417/420.
O INSS alega, inicialmente, que houve falha no sistema ESAJ da procuradoria do INSS, não
tendo a r. sentença proferida no feito subjacente constado das planilhas de intimações do Portal
Eletrônico acessado pelo INSS. Assim, aduz que, "apesar do ato de intimação de fls. 365 ter
sido regularmente encaminhado por esta Egrégia vara, ela não constou da planilha extraída
pela Procuradoria no dia 15.01.2020".
Argumenta que peticionou ao r. juízo "a quo" pugnando pela ineficácia da certificação do
trânsito em julgado, requerendo ainda que o feito fosse encaminhado a este E. Tribunal para
julgamento do reexame necessário, o que foi negado pelo r. juízo de piso.
Informa, ademais, que em face desta decisãofoi apresentado agravo de instrumento, ao qual foi
negado provimento por esta Corte Regional, tendo esta decisão transitado em julgado em
05.10.2020.
Contudo, aduz que a r. sentença é ilíquida e que diante dos inúmeros períodos especiais
reconhecidos, não é possível presumir que o valor da condenação não ultrapassará os limites
previstos no artigo 496 do CPC/2015, de maneira que o conhecimento do reexame necessário
era medida que se impunha na ação subjacente, citando, nesse sentido, precedentes do STJ e,
inclusive, a Súmula 490 daquele Tribunal, "verbis":
"Súmula 490 do STJ: "A dispensa do reexame necessário, quando o valor da condenação ou do
direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças
ilíquidas". Dessa forma restou superado o entendimento de que "caso não seja líquida a
condenação, o parâmetro deve ser o valor da causa" (AgRg no RESP nº 1.067.559/PR, Rel.
Min Napoleão Nunes Maia Filho, 5ª Turma, in DJe de 13/04/2009)".
De outro vértice, alega que o laudo judicial que embasou o reconhecimento da especialidade
dos períodos é nulo e ineficaz, porquanto o perito nomeado pelo juízo é técnico em segurança
do trabalho, circunstância que manifestamente infringe o artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91, que
exige que o laudo pericial seja elaborado por engenheiro ou médico do trabalho, citando, nesse
sentido, precedentedesta Corte anulando sentença sob esse exato fundamento.
Ainda, alega que o reconhecimento dos períodos ruraiscomo especiais em período anterior à
Lei nº 8.213/91 é totalmente descabido, pois tais períodos eram regulados pela Lei
Complementar nº 11, a qual não permitia a aposentadoria especial, e,consequentemente, não
reconhecia a atividade exercida sob condições especiais para os trabalhadoresrurais. Ademais,
o autor da ação subjacente não carreou àquela ação provas documentais a fim de comprovar a
atividade especial.
Por fim, argumenta que o C. STJ já definiu em julgamento de pedido de uniformização de
interpretação de lei - Processo nº 452 - PE (2017/0260257-3) -, que o trabalhador rural cortador
de cana-de-açúcar não é equiparado aos trabalhadores da agropecuária para fins de
enquadramento como atividade especial. Conclui, assim, serindevido o enquadramento do autor
no código 2.2.1 do anexo ao Decreto nº 53.831/64, pois tal dispositivo não é aplicável ao
lavrador, nem ao Segurado Especial.
Outrossim, relativamente aos fundamentos legais ao ajuizamento da presente ação rescisória,
conclui que:
1) houve violação manifesta de norma jurídica e de disposição constitucional, já que o tempo de
atividade especial não poderia ter sido enquadrado com base em laudo feito por técnico em
segurança do trabalho, havendo violação, pois, aoartigo 201 § 1º, da Constituição da República
(redação vigente na época da DIB fixada na sentença, é dizer, em 10.07.2017, anteriormente,
portanto, à EC nº 103/2019) c/c artigo 57 da Lei nº 8.213/1991, bem assim ao artigo 64 do
Decreto nº 3.048/1999 (redação anterior à do Decreto nº 20.910/2020);deve, assim, ser
rescindida a r. decisão impugnada;
2) em juízo rescisório, alega que na DER, em 23.09.2015, o requerido não atingiu25 anos em
atividades especiais, tampouco 35 anos de tempo de contribuição -benefício nº42/171.702.732-
3, requerendo, pois, a improcedência do pedido originário,declarando-se que nenhum período
deve ser admitido como especial, e, por consequência, que seja negado o direito à
aposentadoria por tempo de contribuição.
Pleiteia, por derradeiro, a concessão da tutela de urgência, a fim de sobrestar o andamento do
processo nº1007113- 76.2018.8.26.0189, da 1ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE
FERNANDÓPOLIS, até julgamento final na presente ação rescisória.
Afirma, quanto ao ponto, que a autarquia sequer tem como apresentar os cálculos em sede de
liquidação, já que inexistem períodos especiais suficientes para tanto, conforme argumentação
supra. Além disso, demonstrado restou o risco de dano de difícil reparação, na hipótese de o
réu executar o acórdão rescindendo, sendo que, por outro lado, não há risco de irreversibilidade
ao requerido, já que o ente previdenciário é solvente em suas obrigações.
Com a inicial vieram documentos, com cópia integral do feito originário.
O pedido de tutela de urgência foi indeferido por decisão de ID 154075865, não tendo o INSS
recorrido.
A parte requerida foi citada e apresentou contestação. Impugnou, inicialmente, a alegação de
falha do sistema ESAJ, não comprovada pelo INSS. No mérito, aduziu que a presente ação
rescisória não possui embasamento em nenhum dos dispositivos legais previstos no artigo 966
do CPC, requerendo, pois, a improcedência desta ação.
As partes apresentaram razões finais, reiterando seus argumentos anteriores.
A E. Procuradoria Regional da República entendeu inexistir interesse público a justificar sua
intervenção nestes autos.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região3ª Seção
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5003983-62.2021.4.03.0000
RELATOR:Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
REU: MILTON APARECIDO DA MATA
Advogado do(a) REU: ALESSANDRO DEL NERO MARTINS DE ARAUJO - SP233292-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Por primeiro, verifico a tempestividade desta ação rescisória, porquanto o trânsito em julgado no
feito subjacente ocorreu em 11.03.2020 - ID 153441837, fl. 370 -, enquanto a inicial foi
distribuída nesta Corte em 27.02.2021, dentro, pois, do prazo decadencial de dois anos.
1. DO JUÍZO RESCINDENDO. VIOLAÇÃO MANIFESTA DE NORMA JURÍDICA
Para a maciça doutrina processual, violar literal disposição de lei significa desbordar por inteiro
do texto e do contexto legal, importando flagrante desrespeito à lei, em ter a sentença de mérito
sido proferida com extremo disparate, completamente desarrazoada.
José Frederico Marques refere-se a "afronta a sentido unívoco e incontroverso do texto legal"
(Manual de Direito Processual Civil, vol. III, Bookseller, 1ª edição, p. 304). Vicente Greco Filho,
a seu turno, leciona que "a violação de lei para ensejar a rescisória deve ser frontal e
induvidosa" (Direito Processual Civil Brasileiro, 2º vol., Saraiva, 5ª edição, p. 385). Também Ada
Pellegrini Grinover (obra citada), ao afirmar que a violação do direito em tese, para sustentar a
demanda rescisória, há de ser clara e insofismável.
Ainda, a respeito, a anotação de THEOTONIO NEGRÃO (Código de Processo Civil e legislação
processual em vigor, Saraiva, 38ª edição, pp. 567-568), ilustrando a jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça sobre o assunto:
"Art. 485: 20. 'Para ser julgado procedente, o pedido rescindendo deduzido em ação rescisória
fulcrada no inc. V do art. 485 do CPC depende, necessariamente, da existência de violação,
pelo v. acórdão rescindendo, a literal disposição de lei. A afronta deve ser direta - contra a
literalidade da norma jurídica - e não deduzível a partir de interpretações possíveis, restritivas
ou extensivas, ou mesmo integração analógica' (STJ-2ª Seção, AR 720-PR-EI, rel. Min. Nancy
Andrighi, j. 9.10.02, rejeitaram os embs., v.u., DJU 17.2.03, p. 214).
'Para que a ação rescisória fundada no art. 485, V, do CPC prospere, é necessário que a
interpretação dada pelo 'decisum' rescindendo seja de tal modo aberrante que viole o
dispositivo legal em sua literalidade. Se, ao contrário, o acórdão rescindendo elege uma dentre
as interpretações cabíveis, ainda que não seja a melhor, a ação rescisória não merece vingar,
sob pena de tornar-se recurso ordinário com prazo de interposição de dois anos' (RSTJ
93/416). No mesmo sentido: RT 634/93.
'Ação rescisória por ofensa a literal dispositivo de lei. Justifica-se o 'judicium rescindens', em
casos dessa ordem, somente quando a lei tida por ofendida o foi em sua literalidade, conforme,
aliás, a expressão do art. 485-V do CPC. Não o é ofendida, porém, dessa forma, quando o
acórdão rescindendo, dentre as interpretações cabíveis, elege uma delas e a interpretação
eleita não destoa da literalidade do texto de lei' (RSTJ 40/17). No mesmo sentido: STJ-RT
733/154."
Constata-se também o fato de o dispositivo resguardar não apenas a literalidade da norma, mas
seu sentido, sua finalidade, muitas vezes alcançados mediante métodos de interpretação
(Sérgio Rizzi, Ação Rescisória, São Paulo, RT, 1979, p. 105-107).
José Carlos Barbosa Moreira, criticando a expressão "literal disposição de lei", pondera: "O
ordenamento jurídico evidentemente não se exaure naquilo que a letra da lei revela à primeira
vista. Nem é menos grave o erro do julgar na solução da quaestio iuris quando afronte norma
que integra o ordenamento sem constar literalmente de texto algum" (Comentários ao Código
de Processo Civil, vol. V, Rio de Janeiro, Forense, 11ª edição, 2003, p.130).
Igualmente, Flávio Luiz Yarshell: "Tratando-se de error in iudicando ainda paira incerteza acerca
da interpretação que se deve dar ao dispositivo legal. Quando este fala em violação a 'literal'
disposição de lei, em primeiro lugar, há que se entender que está, aí, reafirmando o caráter
excepcional da ação rescisória, que não se presta simplesmente a corrigir injustiça da decisão,
tampouco se revelando simples abertura de uma nova instância recursal, ainda que de direito.
Contudo, exigir-se que a rescisória caiba dentro de tais estreitos limites não significa dizer que a
interpretação que se deva dar ao dispositivo violado seja literal, porque isso, para além dos
limites desse excepcional remédio, significaria um empobrecimento do próprio sistema,
entendido apenas pelo sentido literal de suas palavras. Daí por que é correto concluir que a lei,
nessa hipótese, exige que tenham sido frontal e diretamente violados o sentido e o propósito da
norma" (Ação Rescisória: juízos rescindente e rescisório, São Paulo, Malheiros, 2005, p. 323).
Conclui-se ser inadmissível a desconstituição do julgado com base em mera injustiça, em
interpretações controvertidas, embora fundadas. A rescisória não se confunde com nova
instância recursal. Exige-se mais, que o posicionamento adotado desborde do razoável, que
agrida a literalidade ou o propósito da norma.
1.1 DA FALHA DE INTIMAÇÃO EM PRIMEIRO GRAU DE JURISDIÇÃO E DA ALEGADA
NECESSIDADE DE REEXAME NECESSÁRIO
Peticionou o INSS ao MMº Juízo "a quo" informando falhas técnicas no sistema de
administração da procuradoria, o que levou a não constar a publicação da r. sentença
rescindenda na planilha de intimação pelo Portal Eletrônico, requerendo o recebimento de sua
petição como apelação, com pedido para que o reexame necessário seja conhecido e provido
por este Tribunal -fls. 371/378.
O pleito foi indeferido pelo MMº Juízo de piso, sob o argumento de que o valor da condenação
no feito originário não superará o limite de mil salários mínimos e que, portanto, não há falar-se
em reexame necessário, tampouco em recebimento do pedido como apelação, já que o INSS
deixou transcorrer o prazo sem apresentação a tempo de seu recurso - fl. 388, ID 153441837.
Desta decisão o INSS interpôs agravo de instrumento, que foi distribuído ao Exmo
Desembargador Federal Gilberto Jordan, que, ao apreciar o pedido de tutela de urgência, assim
decidiu:
"[...]À primeira vista, não há qualquer justificativa plausível a indicar prejuízo à ciência da
sentença e, consequentemente, a não observância dos prazos adequados pelo INSS para
acesso às vias recursais próprias.O fato do sistema informatizado da procuradoria apresentar
suposto problema de controle de atos não é causa interruptiva ou suspensiva de prazos
processuais. A rigor, as razões recursais estão no limite da má-fé processual, exsurgindo fortes
indícios de sua natureza protelatória, a fim de obstar o regular prosseguimento da execução de
título judicial, devendo ser analisada tal conduta pela Turma quando do julgamento final do
recurso. Ante o exposto, nego o efeito suspensivo. Intime-se o agravo nos termos do art. 1.019,
II, do CPC".
Referida decisão foi posteriormente confirmada por sua Excelência pela r. decisão monocrática
terminativa de fls. 417/419, ID 153441837, a qual transitou em julgado em 05.10.2020.
Portanto, relativamente à alegação de manifesta violação de norma jurídica na certificação do
trânsito em julgado,não verifico ilegalidade na r. decisão "a quo", ratificada por decisão
monocrática desta Corte, já que é evidente que problemas técnicos "interna corporis" na
procuradoria do INSS não tem como ensejar a desconstituição da coisa julgada, à míngua de
previsão legal nesse sentido, até porque o próprio INSS reconheceu que a Subsecretaria do
juízo "a quo" procedeu corretamente nos atos de intimação das partes acerca da sentença.
Ademais, a autarquia também não demonstrou que o valor da condenação na ação subjacente
realmente ultrapassaria mil salários mínimos, e que, portanto, a r. sentença deveria ter sido
submetida ao reexame necessário, ônus que lhe competia.
Nesse sentido, a matéria já está pacificada pelo C. STJ:
“PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. REMESSA
NECESSÁRIA. SENTENÇA ILÍQUIDA. ART. 496, § 3o., I DO CÓDIGO FUX. CONDENAÇÃO
OU PROVEITO ECONÔMICO INFERIOR A MIL SALÁRIOS MÍNIMOS. VALOR AFERÍVEL
POR CÁLCULO ARITMÉTICO. POSSIBILIDADE DE MENSURAÇÃO. RECURSO ESPECIAL
DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Esta Corte, no julgamento do REsp.
1.101.727/PR, representativo de controvérsia, fixou a orientação de que, tratando-se de
sentença ilíquida, deverá ser ela submetida ao reexame necessário, uma vez que não possui
valor certo, estabelecendo que a dispensabilidade da remessa necessária pressupunha a
certeza de que o valor da condenação não superaria o limite de 60 salários mínimos. 2.
Contudo, a nova legislação processual excluiu da remessa necessária a sentença proferida em
desfavor da União e suas respectivas Autarquias cujo proveito econômico seja inferior a 1.000
salários-mínimos. 3. As ações previdenciárias, mesmo nas hipóteses em que reconhecido o
direito do Segurado à percepção de benefício no valor do teto máximo previdenciário, não
alcançarão valor superior a 1.000 salários mínimos. 4. Assim, não obstante a aparente iliquidez
das condenações em causas de natureza previdenciária, a sentença que defere benefício
previdenciário é espécie absolutamente mensurável, visto que pode ser aferível por simples
cálculos aritméticos, os quais são expressamente previstos na lei de regência, e,
invariavelmente, não alcançará valor superior a 1.000 salários mínimos. 5. Recurso Especial do
INSS a que se nega provimento”. (STJ, 1.-ª Turma, REsp 1844937/PR, Rel. Min. Napoleão
Nunes Maia Filho, 22.11.2019) – grifei.
1.2. DA NULIDADE DO LAUDO PERICIAL, CONFECCIONADO POR TÉCNICO EM
SEGURANÇA DO TRABALHO
Relativamente à alegação de nulidade do laudo pericial, pelo fato de o perito nomeado pelo
juízo ser técnico em segurança do trabalho, com infringência, segundo aduz, aoartigo 58, § 1º,
da Lei nº 8.213/91,que exige que o laudo seja elaborado por engenheiro ou médico do
trabalho,este Tribunal já reconheceu a possibilidade de nomeação, como perito, de técnico em
segurança do trabalho, conforme os seguintes precedentes:
PREVIDENCIÁRIO. REEXAME NECESSÁRIO. CABIMENTO. NULIDADE DO LAUDO
PERICIAL. NÃO OCORRÊNCIA. ATIVIDADE ESPECIAL. LAUDO TÉCNICO OU PPP.
APOSENTADORIA ESPECIAL. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. BENEFÍCIO INDEVIDO.
1. Cabível o reexame necessário, nos termos da Súmula 490 do Superior Tribunal de Justiça. 2.
Salvo no tocante aos agentes físicos ruído e calor, é inexigível laudo técnico das condições
ambientais de trabalho para a comprovação de atividade especial até o advento da Lei nº
9.528/97, ou seja, até 10/12/97. Precedentes do STJ. 3. Comprovada a atividade insalubre por
meio de laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP por período inferior a 25
(vinte e cinco) anos, é indevida a concessão da aposentadoria especial. 4.Ainda que o laudo
pericial tenha sido elaborado por técnico em segurança do trabalho, tal fato não retira a sua
credibilidade, eis que o técnico também é especialista em sua área, sendo capaz de opinar
sobre as condições do ambiente de trabalho.5. Constatado o erro material, corrige-se o mesmo,
de ofício ou a pedido da parte. 6. Matéria preliminar rejeitada. Reexame necessário, tido por
interposto, e apelação do INSS parcialmente providos. (Processo nº00221197620184039999,
APELAÇÃO CÍVEL - 2313105 Relator(a)DESEMBARGADORA FEDERAL LUCIA URSAIATRF -
TERCEIRA REGIÃOÓrgão julgadorDÉCIMA TURMAData14/05/2019Data da publicação
22/05/2019) - grifei.
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ATIVIDADE
ESPECIAL COMPROVADA. APELAÇÃO DO INSS IMPROVIDA. 1. A aposentadoria especial
foi instituída pelo artigo 31 da Lei nº 3.807/60. 2. Por sua vez, dispõe o artigo 57 da Lei nº
8.213/91 que a aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta
Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou
a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme
dispuser a Lei. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995) 3. No presente caso, da análise da
documentação acostada aos autos, e de acordo com a legislação previdenciária vigente à
época, a parte autora comprovou o exercício de atividades especiais nos seguintes períodos: -
de 09/02/1987 a 13/05/2013, vez que exercia diversas funções de "servente", "ajudante de
manutenção" e de "eletricista", com exposição ao agente agressivo eletricidade acima de 250
volts, com base no código 1.1.8 do Decreto nº 53.831/64 (formulário, e Perfil Profissiográfico
Previdenciário, id. 100908086 - Pág. 57/65). 4. Cumpre, ainda, observar que, não obstante os
Decretos nºs 2.172/97 e 3.048/99 tenham deixado de prever a eletricidade como agente nocivo
para fins previdenciários, a jurisprudência tem entendido que a exposição ao referido agente
não deixou de ser perigosa.5. Observo que não merece prosperar a alegação de vício do laudo
pericial elaborado por Técnico em Segurança do Trabalho, tendo em vista que o perito
nomeado é profissional de confiança do Juiz, equidistante das partes e capaz de responder aos
quesitos elaborados pelas partes, bem como diante do fato de que o laudo produzido nos autos
apresenta informações claras e suficientes para o deslinde do feito. 6. Ademais, destaco que o
laudo realizado, bem como os demais elementos de prova presentes nos autos, se revelaram
claros e suficientes à formação do convencimento do magistrado. [...] (Processo
nº00226887720184039999ClasseAPELAÇÃO CÍVELRelator(a) Desembargador Federal
FERNANDO MARCELO MENDESTRF - TERCEIRA REGIÃOÓrgão julgador7ª
TurmaData08/01/2021) - grifei.
Veja-se que este Relator não desconhece julgados desta Corte no sentido exatamente oposto,
isto é, exigindo que o laudo pericial deva obrigatoriamente ser elaborado por profissionalmédico
ou engenheiro. Contudo, diante da divergência jurisprudencial sobre o tema, forçoso concluir,
quanto ao ponto, que a r. sentença "a quo" não está baseada em fundamentos absolutamente
errôneos ou sem qualquer amparo legal e/ou jurisprudencial, de maneira que a alegação do
INSS não comporta acolhimento, com aplicação ao caso da Súmula 343 do STF:
"Não cabe ação rescisória por ofensa a literal dispositivo de lei, quando a decisão rescindenda
se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais”
1.3. DA ILEGALIDADE NORECONHECIMENTO DA ESPECIALIDADE DE PERÍODOS RURAIS
Por primeiro, no tocante ao período de atividade rural reconhecido na r. sentença rescindenda,
em regime de economia familiar- de04 de julho de 1969 a 31 de dezembro de 1980 -, esclareço
que o INSS não impugna por meio desta ação rescisória o reconhecimento desse período rural.
Feita essa ressalva, alega a autarquia que o reconhecimento de períodos ruraiscomo especiais
em período anterior à Lei nº 8.213/91 é totalmente descabido, pois tais períodos eram
regulados pela Lei Complementar nº 11, a qual não permitia a aposentadoria especial,
e,consequentemente, não reconhecia a atividade exercida sob condições especiais para os
trabalhadoresrurais. Ademais, o autor da ação subjacente não carreou àquela ação provas
documentais a fim de comprovar a atividade especial.
Afirmaqueo C. STJ já definiu em julgamento de pedido de uniformização de interpretação de lei
- Processo nº 452 - PE (2017/0260257-3) -, que o trabalhador rural cortador de cana-de-açúcar
não é equiparado aos trabalhadores da agropecuária para fins de enquadramento como
atividade especial. Conclui, assim, serindevido o enquadramento do autor no código 2.2.1 do
anexo ao Decreto nº 53.831/64, pois tal dispositivo não é aplicável ao lavrador, nem ao
Segurado Especial.
Pois bem, esclareço, de início, que os períodos ruraisreconhecidos como especiaisna r.
sentença rescindenda foram laborados pelo requerido a partir de 02.01.1981, e, portanto,não se
confundem com o período rural supra destacado, em que reconhecido trabalho em regime de
economia familiar.
A r. sentença assim descreveu os períodos reconhecidos como especiais, "verbis":
"No caso dos autos, verifico que o autor trabalhou como: a) ajudante de serviços gerais, no
período de 02/01/1981 a 31/08/1981, na empresa José Praxedes; b) rurícola, no período de
03/09/1981 a 02/05/1989, na empresa Agro Pecuária CFM Ltda; c) rurícola, no período de
08/06/1989 a 28/04/1995, na empresa Agro Pecuária CFM Ltda; d) rurícola, no período de
29/04/1995 a 04/02/1998, na empresa Agro Pecuária CFM Ltda; e) trabalhador agrícola
polivalente, no período de 15/05/2002 a 17/12/2002, na empresa João Carlos Matta; f) servente,
no período de 01/09/2003 a 31/07/2006, na empresa GHM Construtora EIRELI; g) servente, no
período de 01/03/2007 a 25/02/2011, na empresa GHM Construtora EIRELI; h) servente, no
período de 01/10/2011 a 22/03/2013, na empresa GHM Construtora EIRELI; e i) auxiliar de
produção, no período de 09/08/2013 a 10/07/2017, na empresa Proposta Engenharia Ambiental
LTDA, tudo conforme anotação em sua CTPS (fls. 18/26) e extrato CNIS de fls. 29/37".
E, no que concerne ao reconhecimento dos períodos especiais e a sua conversão em tempo de
atividade comum, é possível extrair do laudo pericial de fls.204/233, ID 153441837, que em
relação aos períodostrabalhados pelo requerido na área ruralcomo rurícola e trabalhador rural
polivalente em atividade de agropecuária, a partir de 02.01.1981,manipulava ele produtos
químicos como algicidas,herbicidas, fungicidas e praguicidas,para aplicação nas lavouras,
sendo considerados especiais os períodosdescritos na inicial e àfl. 208 do laudo técnico,
exatamente sob esse fundamento, conforme conclusão do perito às fls. 209e 226, ID
153441837.
Assim, ao contrário do afirmado pelo INSS, não se tratava de trabalho na lavoura de cana-de-
açúcar, mas de labor em atividade de agropecuária, em que o requerido tinha contato direto
com diversos agentes químicos insalubres. Por outro lado, ainda quefosse o caso de atividade
na lavoura de cana, tal fato não ensejaria a rescisão do r. julgado "a quo", porquanto é cediço
que a jurisprudência, inclusive deste Tribunal, até hoje ainda não é uníssona quanto ao
reconhecimento da especialidade de referido trabalho rural, o que ensejaria a aplicação da
Súmula 343 do STF.
Senão vejamos:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AGRAVO DO §1º DO ART. 557 DO C.P.C.
TRABALHADOR RURAL. PEDREIRO DE MANUNTENÇÃO. LEI 9.528/1997. ATIVIDADE
ESPECIAL NÃO CARACTERIZADA. PROVA PERICIAL JUDICIAL. CERCEAMENTO DE
DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA. [...] II – Destacou-se que o trabalho rural não é considerado
especial, vez que a exposição a poeiras, sol e intempéries não justifica a contagem especial
para fins previdenciários, excetuadas as atividades em agropecuária e aos trabalhadores
ocupados na lavoura canavieira. (g.n.) [...] IV – Agravo da parte autora improvido (art. 557, §1º
do C.P.C). (AC 00183007320144039999, Desembargador Federal SERGIO NASCIMENTO,
TRF3 – 10ª Turma, e-DJF3 Judicial 1, 19/11/2014)”.
ATIVIDADE RURAL. CORTE DE CANA-DE-AÇÚCAR. CONVERSÃO DE ATIVIDADE
ESPECIAL EM TEMPO COMUM APÓS 28.05.1998. POSSIBILIDADE. EPI EFICAZ.
INOCORRÊNCIA. [...] IV – Em regra, o trabalho rural não é considerado especial, vez que a
exposição a poeiras, sol e intempéries não justifica a contagem especial para fins
previdenciários, contudo, tratando-se de atividade em que o corte cana-de-açúcar é efetuado de
forma manual, com alto grau de produtividade e utilização de defensivos agrícolas, é devida a
contagem especial. (AC 00357274920154039999 AC – APELAÇÃO CÍVEL – 2101681
Relator(a) DESEMBARGADOR FEDERAL SERGIO NASCIMENTO Sigla do órgão TRF3 Órgão
julgador DÉCIMA TURMA Fonte e-DJF3 Judicial 1 DATA:25/05/2016) – grifei.
Esse entendimento, importante referir, continua sendo parcialmente aplicado neste Tribunal,
mesmo depois de o C. STJ ter julgadoo Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei nº
452-PE (2017/0260257-3), pelo qual firmou orientação no sentido de “não equiparar a categoria
profissional de agropecuária à atividade exercida pelo empregado rural na lavoura da cana-de-
açúcar”.
Nesse sentido, julgados recentes desta Corte:
"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. ESPECIALIDADE.
CORTADOR DE CANA DE AÇÚCAR. PRESENÇA DO INTERESSE DE AGIR. EXISTÊNCIA
DE PEDIDO ADMINISTRATIVO COM ANÁLISE DA MATÉRIA CONTROVERTIDA. TERMO
INICIAL DOS EFEITOS FINANCEIROS DA BENESSE.
- As atividades relacionadas ao cultivo e corte manual de cana-de-açúcar em empreendimento
agroindustrial destacam-se como insalubres e devem ser enquadradas, pela categoria
profissional, no item 2.2.1 do Decreto nº 53.831/64.
- Necessário esclarecer que a atividade rurícola desenvolvida pode ser considerada especial
(atividade prevista no código 2.2.1, do quadro a que se refere o art. 2º, do Decreto nº
53.831/64) pois referida expressamente à "agropecuária ", abrangendo-se rurícolas que se
encontrassem expostos, de forma habitual e permanente, a agentes agressivos à saúde.
- Rejeitada a alegação de falta de interesse de agir ao caso concreto, considerando que houve
prévio requerimento administrativo, com pedido de reconhecimento da atividade nocente no
interstício controverso. Em análise administrativa negou-se a pretensão, o que caracteriza o
interesse de agir da parte autora, que não está obrigada a esgotar a via administrativa para
somente depois buscar amparo judicial.
- Eventual deficiência instrutória do pedido administrativo não é obstáculo para a fixação dos
efeitos financeiros na data em que o segurado requereu a benesse, desde que, é claro, tenha
tempo suficiente para se aposentar.
- Agravo interno desprovido".
(TRF 3ª Região, ApelRemNec - 5003103-14.2019.4.03.6120, Rel. Des. Fed. David Dantas, 8ª
Turma, julgado em 09.11.2020, v.u).
"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AGRAVO INTERNO. ATIVIDADE ESPECIAL NA
LAVOURA. LAUDO PERICIAL. COMPROVADA. EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS.
HIDROCARBONETO.
I - Restou consignado no decisum agravado, que em regra, o trabalho rural não é considerado
especial, vez que a exposição a poeiras, sol e intempéries não justifica a contagem especial
para fins previdenciários, contudo, tratando-se de atividade em agropecuária, cuja contagem
especial está prevista no código 2.2.1 do Decreto 53.831/64, presunção de prejudicialidade que
vige até 10.12.1997, advento da Lei 9.528/97.
II - Sobre o reconhecimento de atividade especial de trabalhador rural em corte de cana-de-
açúcar, por equiparação à categoria profissional prevista no código 2.2.1 do Decreto
53.831/1964, não se olvida da tese fixada pelo C.STJ, no julgamento referente ao Tema 694,
Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei nº 452-PE (2017/0260257-3), no sentido de
não equiparar à categoria profissional de agropecuária a atividade exercida por empregado rural
na lavoura de cana-de-açúcar.
III - O decisum agravado mencionou que o caso analisado se distinguia do leading case acima
transcrito, uma vez que o laudo pericial judicial constante dos autos apurou que, nos períodos
de 10.02.1984 a 22.04.1984 (CARPA COMPANHIA AGROPECUARIA RIO PARDO),
06.06.1984 a 29.04.1988 (SANTA MARIA AGRICOLA LTDA), o autor trabalhava com o cultivo e
corte de cana-de-açúcar, tendo o perito identificado que esteve exposto a agrotóxicos que
continha compostos de fósforo e a fuligens (hidrocarbonetos aromáticos e outros compostos de
carbono existentes) decorrentes da queima incompleta das palhas da cana de açúcar, cujo
contato se dava através das mucosas da boca, narinas e tecidos dos pulmões.
IV - Mantidos os termos da decisão agravada que reconheceu a especialidade dos períodos de
10.02.1984 a 22.04.1984 e de 06.06.1984 a 29.04.1988, por exposição a agentes químicos
(hidrocarbonetos aromáticos) previstos nos códigos 1.2.11 do Decreto 53.831/1964, 1.2.10 do
Decreto 83.080/1979 (Anexo I) e 1.0.19 do Decreto 3.048/1999.
V - Agravo interno (art. 1.021, CPC) interposto pelo INSS improvido". (TRF 3ª Região, ApCiv -
6088302-87.2019.4.03.9999, Rel. Des. Fed. Sérgio Nascimento, 10ª Turma, julgado em
08.06.2021, v.u).
Em prosseguimento, transcrevo as conclusões expostas no laudo:
"(...) este perito conclui que as atividades exercidas pelo requerente conforme preconizam a Lei
de nº. 6.514, /1977 por intermédio da Portaria 3.214/1978 que aprovou as Normas
Regulamentadoras, NR-15 considera-se INSALUBRES pela exposição ao Ruído de 88,3 dB
(A), 91,8 dB (A e 95,6 dB (A) acima dos limites de tolerância em grau médio 20%, sendo
passíveis de enquadramento COMO ESPECIAL. Servirão este de paradigmas para as
empresas já baixadas ou sem atividade fls. 225. (...) Pela a exposição à agente radiação não
ionizante - ultravioleta (radiação solar), no período laboral, e poeira vegetal posso afirmar que o
requerente executava atividades consideradas insalubres, grau médio (20%). Ocorre a
exposição ao agente nocivo radiação não ionizante ultravioleta durante suas atividades diárias,
com exposição de maneira habitual e permanente e, pela não comprovação de fornecimento e
uso dos EPIs adequados e corretos. Dessa maneira, o agente nocivo não foi neutralizado,
caracterizando insalubridade, conforme anexo 3 da NR 15. fls. 225. (...) Pela exposição aos
agentes Biológicos, o reclamante executava atividades consideradas insalubres conforme
anexo 14 da NR 15, pela exposição qualitativa a agentes biológicos, em grau médio 40%. Este
só faz presente na função Serviços Gerais conforme quadro de funções. (...) Pela exposição à
poeira mineral, este perito, por falta de aparelho bomba gravimétrica, não realizou avaliações
quantitativas. Todavia, foi observada que o ambiente é extremamente empoeirado em
decorrência do processo de desprendendo do solo uma grande quantidade de poeira, e cal,
Cimentos e corte de tijolos na construção civil. Pelo fato de o autor não receber os EPI's
adequados este perito concluiu, por avaliação qualitativa, que o autor exerce suas funções em
ambiente insalubre (conforme NR 15 anexo 13 - Operações Diversas). (...) Pela manipulação de
produtos químicos acima citados na aplicação e herbicidas nas plantações grau médio 20%,
sendo passíveis de enquadramento COMO ESPECIAL, servindo este de paradigma para as
outras empresas relacionadas. Este só se faz presente nas funções de Rurícola e Trabalhador
Rural Polivalentes conforme quadro de funções" - grifei.
Assim, independentemente de os demais agentes nocivos alegados, como calor, radiação solar
e outras intempéries, no exercício de atividade rural,também terem sido considerados no laudo -
circunstância já rechaçada pela jurisprudência nacional -, é possível afirmar haver subsídios
suficientes no laudo técnico que amparam o reconhecimento da especialidade nos períodos
alegados, tendo em vista o manuseio pelo requerido dos produtos químicos supramencionados
durante toda a sua jornada, oquefoi devidamente sopesadopelo MMº Juízo "a quo".
Da mesma forma, quanto ao trabalho como pedreiro e serviços gerais, o laudo pericial é
conclusivo quanto ao contato e à manipulação pelo requerido de substâncias como poeira
mineral proveniente do cal e do cimento, e também ruído acima do limite legal (trabalho como
pedreiro), além de germes, vírus e bactérias, quando no exercício de suas atividades gerais de
limpeza do lixão, em quemovimentava lixo, executava roçada manual e remoção de materiais
sólidos nacaixa de decantação e nas lagoas de tratamento do "chorume"(fls. 209/210, ID
153441837), agentes insalubres que afetam a saúde do trabalhador.
Portanto, não há qualquer dúvida de que a r. sentença rescindenda baseou-se em prova técnica
devidamente fundamentada por profissional nomeado pelo juízo, a fim de concluir pela
especialidade dos períodos reconhecidos, não havendo, nesse aspecto, qualquer teratologia na
conclusão judicial, que pudesse ensejarferimento a dispositivo de lei ou da Constituição
Federal.
Não se trata, pois, de decisão que tenha desbordado do razoável ou agredido a literalidade ou o
propósito da norma aplicável ao caso, restando claro, assim, o intuito recursal da autarquia, a
fim de rediscutir os critérios adotados pelo julgado rescindendo na apreciação das provas, o que
é manifestamente vedado pela via da ação rescisória.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, em juízo rescindendo, julgo improcedente a presente ação rescisória.
Condeno o INSS em honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.000,00 (um mil reais),
consoante precedentes desta C. Terceira Seção.
É como voto.
E M E N T A
AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO MANIFESTA DE NORMA JURÍDICA. REDISCUSSÃO DO
QUADRO PROBATÓRIO. INVIABILIDADE. SÚMULA 343 DO STF. AÇÃO IMPROCEDENTE.
1.Para a maciça doutrina processual, violar literal disposição de lei significa desbordar por
inteiro do texto e do contexto legal, importando flagrante desrespeito à lei, em ter a sentença de
mérito sido proferida com extremo disparate, completamente desarrazoada.
2. Relativamente à alegação de manifesta violação de norma jurídica na certificação do trânsito
em julgado,não verifico ilegalidade na r. decisão "a quo", ratificada por decisão monocrática
desta Corte, já que é evidente que problemas técnicos "interna corporis" na procuradoria do
INSS não tem como ensejar a desconstituição da coisa julgada, à míngua de previsão legal
nesse sentido, até porque o próprio INSS reconheceu que a Subsecretaria do juízo "a quo"
procedeu corretamente nos atos de intimação das partes acerca da sentença.
3. Aautarquia não demonstrou que o valor da condenação na ação subjacente realmente
ultrapassaria mil salários mínimos, e que, portanto, a r. sentença deveria ter sido submetida ao
reexame necessário, ônus que lhe competia.
4.Relativamente à alegação de nulidade do laudo pericial, pelo fato de o perito nomeado pelo
juízo ser técnico em segurança do trabalho, com infringência, segundo aduz, aoartigo 58, § 1º,
da Lei nº 8.213/91,que exige que o laudo seja elaborado por engenheiro ou médico do
trabalho,este Tribunal já reconheceu a possibilidade de nomeação, como perito, de técnico em
segurança do trabalho.
5. Assim,forçoso concluir, quanto ao ponto, que a r. sentença "a quo" não está baseada em
fundamentos absolutamente errôneos ou sem qualquer amparo legal e/ou jurisprudencial, de
maneira que a alegação do INSS não comporta acolhimento, com aplicação ao caso da Súmula
343 do STF.
6. No que concerne à alegada ilegalidade no reconhecimento de períodos rurais como especiais
e a sua conversão em tempo de atividade comum, é possível extrair do laudo pericial de
fls.204/233, ID 153441837, que em relação aos períodos trabalhados pelo requerido na área
ruralcomo rurícola e trabalhador rural polivalente em atividade de agropecuária, a partir de
02.01.1981,manipulava ele produtos químicos como algicidas,herbicidas, fungicidas e
praguicidas,para aplicação nas lavouras, sendo considerados especiais os períodosdescritos na
inicial e àfl. 208 do laudo técnico, exatamente sob esse fundamento, conforme conclusão do
perito às fls. 209e 226, ID 153441837.
7. Assim, ao contrário do afirmado pelo INSS, não se tratava de trabalho na lavoura de cana-de-
açúcar, mas de labor em atividade de agropecuária, em que o requerido tinha contato direto
com diversos agentes químicos insalubres. Por outro lado, ainda quefosse o caso de atividade
na lavoura de cana, tal fato não ensejaria a rescisão do r. julgado "a quo", porquanto é cediço
que a jurisprudência, inclusive deste Tribunal, até hoje ainda não é uníssona quanto ao
reconhecimento da especialidade de referido trabalho rural, o que ensejaria a aplicação da
Súmula 343 do STF. Precedentes desta Corte.
8. Quanto ao trabalho como pedreiro e serviços gerais, o laudo pericial é conclusivo quanto ao
contato e à manipulação pelo requerido de substâncias como poeira mineral proveniente do cal
e do cimento, e também ruído acima do limite legal (trabalho como pedreiro), além de germes,
vírus e bactérias, quando no exercício de suas atividades gerais de limpeza do lixão, em
quemovimentava lixo, executava roçada manual e remoção de materiais sólidos nacaixa de
decantação e nas lagoas de tratamento do "chorume"(fls. 209/210, ID 153441837), agentes
insalubres que afetam a saúde do trabalhador.
9. Portanto, não há qualquer dúvida de que a r. sentença rescindenda baseou-se em prova
técnica devidamente fundamentada por profissional nomeado pelo juízo, a fim de concluir pela
especialidade dos períodos reconhecidos, não havendo, nesse aspecto, qualquer teratologia na
conclusão judicial, que pudesse ensejarferimento a dispositivo de lei ou da Constituição
Federal.
10. Não se trata, pois, de decisão que tenha desbordado do razoável ou agredido a literalidade
ou o propósito da norma aplicável ao caso, restando claro, assim, o intuito recursal da
autarquia, a fim de rediscutir os critérios adotados pelo julgado rescindendo na apreciação das
provas, o que é manifestamente vedado pela via da ação rescisória.
11. Ação rescisória improcedente. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Seção, por
unanimidade, decidiu, em juízo rescindendo, julgar improcedente a presente ação rescisória,
nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
