Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5012313-52.2019.4.03.6100
Relator(a)
Desembargador Federal HELIO EGYDIO DE MATOS NOGUEIRA
Órgão Julgador
1ª Turma
Data do Julgamento
02/12/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 06/12/2021
Ementa
E M E N T A
ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CIVEL. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. REPOSIÇÃO AO
ERÁRIO. ADICIONAL DE FÉRIAS PAGOS A MAIOR. ERRO DE INTERPRETAÇÃO DA LEI
PELA ADMINISTRAÇÃO. BOA-FÉ NO RECEBIMENTO. RESTITUIÇÃO DOS VALORES:
DESNECESSIDADE. RECURSO PROVIDO
1. Apelação interposta pela autora contra sentença julgou improcedente os pedidos de declaração
do direito de não devolução dos valores recebidos a título de adicional de um terço de férias aos
servidores que entrarem de férias no mês de outubro e demais meses de 2014, de declaração de
nulidade do Boletim Informativo CNEN nº 064/2014, e de condenação da CNEN a devolver a
parcela que foi descontada nos seus vencimentos. Condenada a autora ao pagamento de
honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído à causa,
devidamente atualizado.
2. A Administração pode e deve anular e revogar seus próprios atos, quando eivados de nulidade
e vícios, em razão do exercício da autotutela e em consonância com a Súmula 473 do STF.
3. Até a edição da Lei nº 9.784/99 o poder-dever da Administração de rever os próprios atos
quando eivados de ilegalidade, podia ser exercido a qualquer tempo, nos termos do art. 114 da
Lei nº 8.112/90. Intelecção das Súmulas 346 e 473 do STF. Com a edição da Lei nº 9.784/99, o
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
poder-dever de a Administração rever os atos praticados passou a ter prazo de cinco anos.
4. Impossibilidade de restituição de valores indevidamente percebidos em virtude de interpretação
errônea da lei, de erro operacional, ou de cálculo, por parte da Administração, quando existente a
boa-fé do servidor.
5. Desnecessidade da devolução de valores pagos, por erro da Administração, ao servidor, diante
da sua natureza alimentar e da presunção de boa-fé. Precedentes.
6. Tal silogismo restou adotado pela própria Fazenda, consoante se dessume do teor da Súmula
nº 34 da Advocacia Geral da União - que tem efeito vinculante para os procuradores federais, ex
vi do disposto no art. 28, II, da Lei Complementar nº 73/1993 -, bem como da Súmula nº 249 do
Tribunal de Contas da União.
7. Recentemente, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em análise de recursos
especiais repetitivos (tema 1009), fixou a tese de que os pagamentos indevidos a servidores
públicos, decorrentes de erro administrativo (operacional ou de cálculo) não embasado em
interpretação errônea ou equivocada da lei, estão sujeitos à devolução, a menos que o
beneficiário comprove a sua boa-fé objetiva, especialmente com a demonstração de que não
tinha como constatar a falha.
8. No caso em tela, restou demonstrado a ocorrência de erro de interpretação da lei por parte da
Administração, o caráter alimentar da verba e boa-fé no recebimento dos valores a maior. A
natureza alimentar dos valores recebidos pelo servidor é inconteste.
9. Apelação provida. Sentença reformada.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5012313-52.2019.4.03.6100
RELATOR:Gab. 03 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA
APELANTE: MARIA INES DOS SANTOS
Advogados do(a) APELANTE: DANIELA COLETO TEIXEIRA - SP275130-A, ELIANA LUCIA
FERREIRA - SP115638-A
APELADO: COMISSAO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região1ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5012313-52.2019.4.03.6100
RELATOR:Gab. 03 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA
APELANTE: MARIA INES DOS SANTOS
Advogados do(a) APELANTE: DANIELA COLETO TEIXEIRA - SP275130-A, ELIANA LUCIA
FERREIRA - SP115638-A
APELADO: COMISSAO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA (Relator):
Trata-se de Apelação interposta pela autora contra sentença julgou improcedente os pedidos de
declaração do direito de não devolução dos valores recebidos a título de adicional de um terço
de férias aos servidores que entrarem de férias no mês de outubro e demais meses de 2014, de
declaração de nulidade do Boletim Informativo CNEN nº 064/2014, e de condenação da CNEN
a devolver a parcela que foi descontada nos seus vencimentos. Condenada a autora ao
pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído
à causa, devidamente atualizado.
Em suas razões recursais, sustenta a autora não se justificar a devolução dos valores, pelos
seguintes argumentos:
a) a apelada tratou de forma diferenciada aqueles que gozaram de suas férias no primeiro
semestre de 2014, pois não determinando desconto algum aos seus vencimentos;
b) o Boletim Informativo CNEN 06/2014 que determinou os novos procedimentos quanto ao
gozo das férias e a reposição ao erário, não respeitou o princípio do contraditório e ampla
defesa garantido no artigo 5º, incisos LIV e LV, da CF e artigos 2º, 3º e 38 da lei 9.784/99;
c)a Apelante em momento algum colaborou para o entendimento perpetuado pela
Administração em conceder as férias semestrais de 20 dias para todos os servidores do
IPEN/CNEN, o que fere gravemente o princípio constitucional da segurança jurídica;
d)não pode ser admitido a cobrança dos valores, pois a Apelante sempre agiu de boa-fé e
jamais deu causa ao equívoco havido, razão pela qual, em respeito ao princípio da segurança
jurídica, não pode ser compelido a devolver qualquer quantia;
e) é indiscutível que os valores recebidos pela Apelante referentes ao adicional de um terço de
férias, que iriam ser gozadas as férias no mês de outubro de 2014, foram recebidos de boa-fé,
não devendo se falar em reposição ao erário;
f) consoante entendimento do STJ, Súmula nº 34 da AGU e Súmula 249 do TCU, os valores
pagos indevidamente com base em interpretação errônea, má aplicação da leiou equívoco da
Administração ao servidor de boa-fé não são passíveis de restituição;
g) os salários pagos possuem nítida natureza alimentar, o que impossibilita sua devolução em
atendimento ao princípio da irreparabilidade dos alimentos.
Com as contrarrazões da CNEN, subiram os autos a esta Corte Regional.
Dispensada a revisão, nos termos regimentais.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região1ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5012313-52.2019.4.03.6100
RELATOR:Gab. 03 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA
APELANTE: MARIA INES DOS SANTOS
Advogados do(a) APELANTE: DANIELA COLETO TEIXEIRA - SP275130-A, ELIANA LUCIA
FERREIRA - SP115638-A
APELADO: COMISSAO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA (Relator):
Da admissibilidade da apelação
Tempestivo o recurso, dele conheço.
Da revisão dos atos administrativos
A Administração pode e deve anular e revogar seus próprios atos, quando eivados de nulidade
e vícios, em razão do exercício da autotutela e em consonância com a Súmula 473 do STF.
Até a edição da Lei nº 9.784/99, que regula o processo administrativo no âmbito da
Administração Pública Federal, o poder-dever da Administração de rever os próprios atos
quando eivados de ilegalidade, podia ser exercido a qualquer tempo, nos termos do art. 114 da
Lei nº 8.112/90, em sintonia com a posição jurisprudencial do STF, expressa nas Súmulas 346
e 473, descritas a seguir:
Súmula 346: A administração pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos.
Súmula 473: A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os
tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de
conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os
casos, a apreciação judicial.
Com a edição da Lei nº 9.784/99, o poder-dever de a Administração rever os atos praticados
passou a ter prazo decadencial, qual seja, cinco anos, in verbis:
Art. 53. A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade,
e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos
adquiridos.
Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos
favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram
praticados, salvo comprovada má-fé.
§1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção
do primeiro pagamento.
§2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa
que importe impugnação à validade do ato.
A regulamentação legal objetiva proporcionar segurança às relações jurídicas que acabaram
por sedimentar-se em virtude do fator tempo. Salvo casos de má-fé, afirmando-se na confiança
legítima que deriva da segurança jurídica, se o ato, a despeito do vício, produziu efeitos
favoráveis ao beneficiário durante todo o quinquênio, sem que tenha havido iniciativa da
Administração para anulá-lo, deve ser alvo de convalidação, impedindo-se, então, seja exercida
a autotutela.
Da reposição ao erário de valores recebidos indevidamente
O Superior Tribunal de Justiça sedimentou entendimento, em sede de recurso repetitivo (tema
531), sobre a impossibilidade de devolução de valores indevidamente percebidos em virtude de
interpretação errônea da lei por parte da Administração, quando existente a boa-fé do servidor:
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. ART. 46, CAPUT, DA LEI
N. 8.112/90 VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE POR INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA
DE LEI. IMPOSSIBILIDADE DE RESTITUIÇÃO. BOA-FÉ DO ADMINISTRADO. RECURSO
SUBMETIDO AO REGIME PREVISTO NO ARTIGO 543-C DO CPC.
1. A discussão dos autos visa definir a possibilidade de devolução ao erário dos valores
recebidos de boa-fé pelo servidor público, quando pagos indevidamente pela Administração
Pública, em função de interpretação equivocada de lei.
2. O art. 46, caput, da Lei n. 8.112/90 deve ser interpretado com alguns temperamentos,
mormente em decorrência de princípios gerais do direito, como a boa-fé.
3. Com base nisso, quando a Administração Pública interpreta erroneamente uma lei,
resultando em pagamento indevido ao servidor, cria-se uma falsa expectativa de que os valores
recebidos são legais e definitivos, impedindo, assim, que ocorra desconto dos mesmos, ante a
boa-fé do servidor público.
4. Recurso afetado à Seção, por ser representativo de controvérsia, submetido a regime do
artigo 543-C do CPC e da Resolução 8/STJ.
5. Recurso especial não provido.
(REsp 1244182/PB, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em
10/10/2012, DJe 19/10/2012)
Tese firmada no Tema Repetitivo n. 531/STJ: Quando a Administração Pública interpreta
erroneamente uma lei, resultando em pagamento indevido ao servidor, cria-se uma falsa
expectativa de que os valores recebidos são legais e definitivos, impedindo, assim, que ocorra
desconto dos mesmos, ante a boa-fé do servidor público.
O Superior Tribunal de Justiça também já decidiu no sentido da desnecessidade da devolução
de valores pagos, por erro da Administração, ao servidor, diante da sua natureza alimentar e da
presunção de boa-fé:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. SERVIDOR PÚBLICO. VIOLAÇÃO AO ART. 1.022
DO CPC/2015. DEVOLUÇÃO AO ERÁRIO. VALORES INDEVIDAMENTE RECEBIDOS POR
SERVIDOR DE BOA-FÉ. RESTITUIÇÃO. DESNECESSIDADE. 1. No que se refere à alegada
afronta ao disposto no art. 1.022 do CPC/2015, o julgado recorrido não padece de omissão,
porquanto decidiu fundamentadamente a quaestio trazida à sua análise, não podendo ser
considerado nulo tão somente porque contrário aos interesses da parte. 2. O STJ firmou
entendimento no sentido de que é incabível a devolução de valores pagos, por erro da
Administração, ao servidor, diante da sua natureza alimentar e da presunção de boa-fé. 3.
Dessume-se que o acórdão recorrido está em sintonia com o atual entendimento do STJ, razão
pela qual não merece prosperar a irresignação. Incide, in casu, o princípio estabelecido na
Súmula 83/STJ.
4. Registre-se, por fim, que a boa-fé do servidor foi reconhecida pelas instâncias ordinárias,
soberanas na análise fática da causa, inviabilizando qualquer discussão, quanto ao ponto, ante
o óbice da Súmula 7/STJ.
5. Recurso Especial não conhecido.
(REsp 1686136/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em
03/10/2017, DJe 11/10/2017)
No mesmo sentido, colaciono os seguintes precedentes desta Corte Regional:
AGRAVO LEGAL. ART. 557. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. RECEBIMENTO DE VALORES
DE CARÁTER ALIMENTAR POR ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. BOA FÉ NO RECEBIMENTO.
RESTITUIÇÃO AO ERÁRIO. DESCABIMENTO.
O servidor não concorreu para o recebimento indevido da verba, de modo que não se mostra
razoável atribuir-lhe os ônus decorrentes do desacerto da Administração no pagamento dos
valores pagos a maior. Cabia à Administração efetuar os cálculos e verificar quando
exatamente a VPNI foi absorvida por eventuais gratificações para que fosse suprimido seu
pagamento. Valores recebidos de boa fé são irrepetíveis. Precedentes do STJ. O agravo legal,
em especial, visa submeter ao órgão colegiado a legalidade da decisão monocrática proferida,
afora isso, não se prestando à rediscussão de matéria já decidida. Agravo legal a que se nega
provimento.
(TRF-3 - AC: 130 MS 0000130-90.2012.4.03.6000, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL
JOSÉ LUNARDELLI, Data de Julgamento: 29/04/2014, PRIMEIRA TURMA,)
PROCESSO CIVIL. AGRAVO LEGAL EM APELAÇÃO CÍVEL. REPOSIÇÃO AO ERÁRIO.
DESCONTOS NOS PROVENTOS. VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE. RECEBIMENTO DE
BOA-FÉ .
1. O Superior Tribunal de Justiça firmara jurisprudência quanto à legitimidade das reposições ao
erário dos valores pagos indevidamente. Todavia, a Quinta Turma, a partir do julgamento do
REsp 488/905/RS, o qual foi publicado no DJ de 13/09/2004, revendo o entendimento anterior,
passou a consignar o não-cabimento das restituições dos valores pagos erroneamente pela
Administração em virtude de inadequadas interpretação e aplicação da lei, em face da
presunção da boa-fé dos servidores beneficiados, posição essa que atualmente encontra-se
pacificada na referida Corte. 2. Por se tratar de verba de natureza alimentar paga por equívoco
da Administração e recebida de boa-fé pelo servidor, não há de se falar em devolução do
quantum questionado. Precedente desta Corte. 3. Agravo legal a que se nega provimento.
(TRF-3 - AMS: 3396 SP 0003396-83.2011.4.03.6109, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL
LUIZ STEFANINI, Data de Julgamento: 02/12/2013, QUINTA TURMA)
Com efeito, tal silogismo restou adotado pela própria Fazenda, consoante se dessume do teor
da Súmula nº 34 da Advocacia Geral da União - que tem efeito vinculante para os procuradores
federais, ex vi do disposto no art. 28, II, da Lei Complementar nº 73/1993 -, bem como da
Súmula nº 249 do Tribunal de Contas da União:
Súmula 34/AGU: Não estão sujeitos à repetição os valores recebidos de boa-fé pelo servidor
público, em decorrência de errônea ou inadequada interpretação da lei por parte da
Administração Pública.
Súmula 249/TCU: É dispensada a reposição de importâncias indevidamente percebidas, de
boa-fé, por servidores ativos e inativos, e pensionistas, em virtude de erro escusável de
interpretação de lei por parte do órgão/entidade, ou por parte de autoridade legalmente
investida em função de orientação e supervisão, à vista da presunção de legalidade do ato
administrativo e do caráter alimentar das parcelas salariais.
Aliás, tais mandamentos de otimização têm aplicação no processo administrativo por expressão
disposição legal - i.e., artigo 2º, parágrafo único, XIII, da Lei nº 9.784/99 -, que veda aplicação
retroativa de novel interpretação.
Ressalte-se que, o mesmo silogismo se aplica para os casos de erro operacional ou de cálculo:
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. RECEBIMENTO DE
VALORES INDEVIDOS. ADICIONAL DE TEMPO DE SERVIÇO. ERRO OPERACIONAL.
DEVOLUÇÃO. BOA-FÉ. DESCABIMENTO.
1. Incabível a devolução de valores recebidos de boa-fé pelo servidor público se o pagamento
resultou de erro da administração.
Essa solução é aplicável mesmo se o equívoco for consequência de erro de cálculo ou falha
operacional. Precedentes.
2. Recurso especial provido.
(REsp 1704810/PE, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em
19/06/2018, DJe 26/06/2018)
Recentemente, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em análise de recursos
especiais repetitivos (tema 1009), fixou a tese de que os pagamentos indevidos a servidores
públicos, decorrentes de erro administrativo (operacional ou de cálculo) não embasado em
interpretação errônea ou equivocada da lei, estão sujeitos à devolução, a menos que o
beneficiário comprove a sua boa-fé objetiva, especialmente com a demonstração de que não
tinha como constatar a falha. O colegiado ainda modulou os efeitos da decisão para que ela
atinja apenas os processos distribuídos, na primeira instância, a partir da data de publicação do
acórdão.
Confira-se teor do Informativo de Jurisprudência do STJ nº 0688 (Publicação: 15 de março de
2021):
RECURSOS REPETITIVOS
Processo: REsp 1.769.306-AL, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Seção, por
unanimidade, julgado em 10/03/2021. (Tema 1009).
Ramo do Direito: DIREITO ADMINISTRATIVO
Tema: Servidor público. Devolução de valores recebidos. Artigo 46, caput, da Lei n. 8.112/1990.
Revisão da tese definida no Tema repetitivo 531/STJ. Ausência de alcance nos casos de
pagamento indevido decorrente de erro de cálculo ou operacional da administração pública.
Possibilidade de devolução. Salvo inequívoca presença da boa-fé objetiva. Tema 1009.
Destaque: Os pagamentos indevidos aos servidores públicos decorrentes de erro administrativo
(operacional ou de cálculo), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela
Administração, estão sujeitos à devolução, ressalvadas as hipóteses em que o servidor, diante
do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe
era possível constatar o pagamento indevido.
Informações do Inteiro Teor:
A controvérsia consiste em definir se a tese firmada no Tema 531/STJ seria igualmente
aplicável aos casos de erro operacional ou de cálculo, para igualmente desobrigar o servidor
público, de boa-fé, a restituir ao erário a quantia recebida a maior.
No julgamento do Recurso Especial Repetitivo n. 1.244.182/PB (Tema 531/STJ), definiu-se que
quando a Administração Pública interpreta erroneamente uma lei, resultando em pagamento
indevido ao servidor, de boa-fé, cria-se uma falsa expectativa de que os valores recebidos são
legais e definitivos, impedindo, assim, que ocorra desconto dos mesmos, o que está em
conformidade com a Súmula 34 da Advocacia Geral da União - AGU.
Assim, acerca da impossibilidade de devolução ao erário de valores recebidos indevidamente
por servidor público, de boa-fé, em decorrência de equívoco na interpretação de lei pela
Administração Pública, constata-se que o tema está pacificado.
O artigo 46, caput, da Lei n. 8.112/1990 estabelece a possibilidade de reposições e
indenizações ao erário. Trata-se de disposição legal expressa, plenamente válida, embora com
interpretação dada pela jurisprudência com alguns temperamentos, especialmente em
observância aos princípios gerais do direito, como boa-fé, a fim de impedir que valores pagos
indevidamente sejam devolvidos ao erário.
Diferentemente dos casos de errônea ou má aplicação de lei, onde o elemento objetivo é, por
si, suficiente para levar à conclusão de que o beneficiário recebeu o valor de boa-fé,
assegurando-lhe o direito da não devolução do valor recebido indevidamente, na hipótese de
erro material ou operacional deve-se analisar caso a caso, de modo a averiguar se o servido
tinha condições de compreender a ilicitude no recebimento dos valores, de modo a se lhe exigir
comportamento diverso, diante do seu dever de lealdade para com a Administração Pública.
Impossibilitar a devolução dos valores recebidos indevidamente por erro perceptível da
Administração Pública, sem a análise do caso concreto da boa-fé objetiva, permitiria o
enriquecimento sem causa por parte do servidor, em flagrante violação do artigo 884 do Código
Civil.
Por tudo isso, não há que se confundir erro na interpretação de lei com erro operacional, de
modo àquele não se estende o entendimento fixado no Recurso Especial Repetitivo n.
1.244.182/PB, sem a observância da boa-fé objetiva do servidor público, o que possibilita a
restituição ao Erário dos valores pagos indevidamente decorrente de erro de cálculo ou
operacional da Administração Pública.
Ademais, ainda que inaplicável ao caso em tela considerada a modulação dos efeitos da
decisão no julgamento do tema 1009, oportuno destacar que prescinde aguardar o trânsito em
julgado do acórdão paradigma para a aplicação de entendimento firmado na sistemática da
repercussão geral. Nesse sentido, já firmou posição o C. Supremo Tribunal Federal:
Direito Processual Civil. Agravo interno em reclamação. Aplicação imediata das decisões do
STF. Desnecessidade de aguardar o trânsito em julgado. 1. As decisões proferidas por esta
Corte são de observância imediata. Portanto, não é necessário aguardar o trânsito em julgado
do acórdão paradigma para aplicação da sistemática da repercussão geral. Precedentes. 2.
Agravo interno a que se nega provimento, com aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º,
do CPC/2015, em caso de decisão unânime. (Rcl 30003 AgR, Relator(a): ROBERTO
BARROSO, Primeira Turma, julgado em 04/06/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-116
DIVULG 12-06-2018 PUBLIC 13-06-2018).
Embargos de declaração no agravo de instrumento. Conversão dos embargos declaratórios em
agravo regimental. Trabalhista. Pressupostos recursais. Legislação infraconstitucional.
Repercussão geral. Ausência. Precedente Plenário. Aplicação imediata. Possibilidade.
Precedentes. 1. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental. 2. Ausência de
repercussão geral do tema relativo aos requisitos de admissibilidade de recursos de
competência de Cortes diversas. 3. A existência de precedente firmado pelo Tribunal Pleno
desta Corte autoriza o julgamento imediato de causas que versem sobre a mesma matéria,
independentemente da publicação ou do trânsito em julgado do paradigma. 4. Agravo
regimental não provido. (AI 752804 ED, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em
02/12/2010, DJe-053 DIVULG 21-03-2011 PUBLIC 22-03-2011 EMENT VOL-02486-02 PP-
00302).
Deveras, a invalidação administrativa sofre liames em virtude dos princípios gerais do direito,
seja o princípio constitucional da segurança jurídica, seja a cláusula geral de boa-fé que irradia
efeitos em todos os segmentos do ordenamento pátrio.
Por conseguinte, nos atos administrativos ampliativos de direitos, consoante os caracteres
fáticos, deve haver um sopesamento dos princípios administrativos para averiguar se a
aplicação de efeito ex nunc à invalidação não se coaduna mais corretamente com os objetivos
suprapositivos, o que entendo ser aqui o caso. Nesse sentido é o magistério do Professor Celso
Antônio Bandeira de Mello:
"Na conformidade desta perspectiva, parece-nos que efetivamente nos autos unilaterais
restritivos de direitos da esfera jurídica dos administrados serem inválidos, todas as razões
concorrem para que sua fulminação produza efeitos ex tunc, exonerando por inteiro quem fora
indevidamente agravado pelo Poder Público das consequências onerosas. Pelo contrário, nos
atos unilaterais ampliativos da esfera jurídica do administrado, se este não concorreu para o
vício do ato, estando de boa-fé, sua fulminação só deve produzir efeitos ex nunc, ou seja,
depois de pronunciada".
(Celso Antônio Bandeira de Mello. Curso de Direito Administrativo, 31ª ed., p. 488)
Isso porque a presunção de legitimidade dos atos administrativos não opera apenas efeitos
favoráveis à Administração - especialmente no âmbito probatório e da autoexecutoriedade -,
mas também estabelece limites à sua atuação, sendo vedada imputação retroativa que
prejudique administrado de boa-fé, em ofensa à proteção da confiança legítima (aspecto
subjetivo da segurança jurídica). Nesse viés, escólio de Maria Sylvia Zanella Di Pietro:
"princípio da proteção à confiança leva em conta a boa-fé do cidadão, que acredita e espera
que os atos praticados pelo Poder Público sejam lícitos e, nessa qualidade, serão mantidos e
respeitados pela própria Administração e por terceiros".
(Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Direito administrativo, 27. ed., p. 88).
Com efeito, no caso em tela, restaram demonstrados a ocorrência de erro de interpretação da
lei por parte da Administração, o caráter alimentar da verba recebida e a boa-fé no recebimento
dos valores a maior.
A autora, servidora pública federal, ocupante do cargo de Assistente em Ciência e Tecnologia,
lotada no IPEN/SEGAS – Serviço de Gestão de Assistência à Saúde, ajuizou ação buscando o
direito de não devolver os valores recebidos sobre o terço de férias sobre os 10 dias do
segundo semestre de 2014, sustentando ser indevida a restituição dos valores, uma vez que
foram recebidos de boa-fé, a natureza alimentar dos valores recebidos, que não contribuiu para
o erro, e que não foi observado o contraditório e ampla defesa no processo de devolução.
Narra que, no exercício de sua atividade laboral, fica exposta às radiações ionizantes emitidas
por fontes radioativas de naturezas diversas, seladas e não seladas, porém não menos nocivos
à saúde e à integridade física, e trabalha sob a efetiva exposição aos agentes nocivos químicos,
físicos e biológicos ou associação de agentes, ou seja, trabalham em caráter direto,
permanente e habitual em condições de insalubridade e periculosidade, razão pela qual recebe
Adicional de Irradiação Ionizante e possuía o direito a férias semestrais de vinte dias, não
cumuláveis, nos termos do art. 1º da Lei 1.234/50 e o art. 12 da Lei 8.270/91.
Informa que a Diretoria de Gestão Institucional - Coordenação Geral de Recursos Humanos
emitiu o Boletim Informativo 041/2010, em determinação contida na Portaria CNEN-PR n.
57/2010, de 07.04.2010, estendendo a todos os servidores da instituição o direito de gozar
férias semestrais de 20 dias.
Afirma que o Tribunal de Contas da União revisou o ato da concessão das férias, por meio do
acórdão 2527/2014, determinando que os servidores que não operem direta e
permanentemente com raio-X ou substâncias radioativas voltassem a cumprir as férias anuais
de 30 dias, e o IPEN/CNEN emitiu um Boletim Informativo nº 064/2014, de outubro de 2014,
comunicando a alteração da sistemática de concessão do benefício, consignando que a
concessão de férias semestrais de 20 dias "fica adstrita aos servidores indicados em portaria da
Diretoria de Radioproteção e Segurança Nuclear (DRS) para operar direta e permanentemente
com raios X ou substâncias radioativas", bem como da possibilidade de reposição ao erário dos
valores eventualmente pagos.
O CNEN sustentou a ausência e boa-fé, pois a autora estava ciente, através dos Boletins
Informativos, de que a questão atinente aos 20 dias de férias por semestre era objeto de litígio e
de medida cautelar perante o TCU, que a suspensão da medida cautelar era precária e que
haveria eventual necessidade de devolução da parcela do adicional de férias incidente sobre 10
dias de férias, já que ela deixaria de ter 20 dias por semestre (40 por ano) para ter apenas 30
dias anuais de férias; que a decisão do TCU foi prolatada em setembro e a autora gozou de
férias em outubro – portanto, após a rejeição dos embargos opostos pela CNEN.
Em contestação, o CNEN informou que a mudança ocorrida em relação às férias é oriunda de
determinação do TCU, no Acórdão n. 1.568/2014, de 11/06/2014, que decretou medida cautelar
para que apenas os servidores expostos direta e habitualmente a fontes de radiação pudessem
gozar de férias de 20 dias por semestre, conforme previsão do art. 79, da Lei nº 8.112/90. Uma
vez decretada a cautelar pelo TCU, foi elaborado o Boletim Informativo nº 044/2014, de
30/06/2014, quando foram informados todos os servidores acerca da decisão, da provável
alteração no regime de férias e da eventual necessidade de ressarcimento:
“Com a alteração, uma vez que todos os servidores que não operam direta e permanentemente
com raios X ou substâncias radioativas gozaram de 20 dias de férias durante o primeiro
semestre de 2014, resta pendente a concessão de mais 10 dias.
(...)
Quanto ao ressarcimento do pagamento do adicional de um terço de férias, realizado aos
servidores com férias no mês de julho, incidente sobre os 10 dias reduzidos em relação aos 20
que serviram de base de cálculo lançado na folha de junho/2014, ficam os servidores
informados que a reposição ao erário será processada em parcela única na folha de
julho/2014.”
A CNEN informou que opôs embargos declaratórios contra a decisão do TCU, o que motivou a
edição do Boletim Informativo nº 046/2014, de 10/07/2014, com as seguintes informações:
“...a Presidência da CNEN, assessorada pela Procuradoria Federal e Auditoria Interna, e,
fundamentada na existência de dúvidas e dificuldades quanto à forma de operacionalizar, de
imediato, tal medida, opôs embargos de declaração junto àquela Corte de contas, em face do
Acórdão nº 1568/2014 – TCU – Plenário.
Desta forma, os efeitos do precitado Boletim Informativo nº 044/20104 ficam temporariamente
sobrestados. Destaca-se, no entanto, que a manutenção temporária das férias semestrais de 20
dias (...) somente se faz possível, neste momento, em virtude dos efeitos suspensivos
promovidos pelos embargos de declaração protocolizados junto à Corte de Contas.
(...)
Portanto, até manifestação do TCU, quanto aos embargos de declaração opostos pela CNEN,
ficam mantidas as férias de 20 dias programadas no segundo semestre pelos servidores
alcançados pelo Acórdão nº 1568/2014 – TCU – Plenário”
O TCU rejeitou os embargos declaratórios opostos pela CNEN por meio do Acórdão nº
2527/2017, de 24/09/2014, tendo então a CNEN editado o Boletim Informativo nº 064/2014,
explicitando a nova decisão do TCU e as providências dela decorrentes:
“Com a alteração, aos servidoresque não operamdireta e permanentemente com raios X ou
substâncias radioativas foram configuradas duas situações:
I -Servidores que gozaram apenas 20 dias de férias durante o 1º semestre de 2014-resta
pendente a concessão de mais 10 dias de férias. As chefias desses servidores deverão
encaminhar memorando à área de recursos humanos da respectiva unidade de lotação,
informando se o servidor utilizará ou não período superior a 10 dias e, em caso positivo,
quantos e quais (dentro do período de férias anteriormente marcado) serão os dias excedentes
a serem compensados.Quanto ao ressarcimento do pagamento do adicional de um terço de
férias, realizado aos servidores com férias no mês de outubro, incidente sobre os 10 dias
reduzidos em relação aos 20 que serviram de base para o cálculo lançado na folha de
setembro/2014, ficam os servidores informados que a reposição ao erário será processada em
parcela única na folha de outubro/2014;
II -Servidores que já gozaram os dois períodos 20 dias de férias durante o exercício de 2014-
não resta nenhuma pendência, tampouco caberá qualquer tipo de ressarcimento, seja em
relação aos 10 dias a mais gozados em relação aos 30 a que têm direito, ou em relação ao
valor pecuniário relativo ao adicional do terço constitucional sobre férias.”
A CNEN informou que autora já havia gozado vinte dias de férias no mês de abril de 2014, e
recebeu adicional de férias em setembro daquele ano, sendo que gozou de mais dez dias de
férias em outubro de 2014, quando foi efetuado o ressarcimento na forma acima, ou seja, sobre
valor atinente aos dez dias excluídos por força da decisão do TCU.
A CNEN ainda afirmou que a autora trabalha no Serviço de Gestão de Assistência à Saúde,
desempenhando tarefas administrativas, que não trabalha direta e habitualmente com
substâncias radioativas, não se enquadrando no art. 79, da Lei nº 8.112/90, não fazendo jus às
férias de 20 dias por semestre, conforme decisão do TCU.
O juízo a quo julgou improcedente o pedido, ao ponderar que não se configurou a boa-fé no
recebimento do adicional, pois a autora tinha ciência do recebimento de forma precária dos
valores do adicional, e que não se configurou ilegalidade da cobrança administrativa mesmo se
tratando de verba alimentar, pois oriunda de cumprimento de decisão de Acórdão do TCU:
“Pretende a parte autora o direito da não devolução dos valores recebidos a título de adicional
de um terço de férias aos servidores que entrarem de férias no mês de outubro e demais meses
de 2014, considerando que referidos valores teriam sido recebidos de boa-fé e, portanto, não
seriam passíveis de devolução, em conformidade com as súmulas administrativas da AGU, bem
como com a jurisprudência pacífica dos Tribunais Superiores, tornando nulo o ato administrativo
da Ré, Boletim Informativo CNEN nº 064/2014; consequentemente,condenar o Réu a devolver a
parcela que foi descontada nos vencimentos da autora, tudo acrescido de juros de mora e
correção monetária.
Dispõe o art. 79, da Lei nº 8.112/90 que apenas o servidor que opera direta e permanentemente
com substâncias radioativas faz jus ao benefício:
‘Art.79.O servidor que opera direta e permanentemente com Raios X ou substâncias radioativas
gozará 20 (vinte) dias consecutivos de férias, por semestre de atividade profissional, proibida
em qualquer hipótese a acumulação.’
Nos termos do Boletim Informativo nº 064/2014, o CNEN informou as providências que seriam
tomadas a seu corpo de servidores, constando expressamente do Boletim Informativo nº
064/2014, de 02/10/2014, o seguinte:
‘Com a alteração, aos servidores que não operam direta e permanentemente com raios X ou
substâncias radioativas foram configuradas duas situações:
I – Servidores que gozaram apenas 20 dias de férias durante o 1º semestre de 2014 – resta
pendente a concessão de mais 10 dias de férias. As chefias desses servidores deverão
encaminhar memorando à área de recursos humanos da respectiva unidade de lotação,
informando se o servidor utilizará ou não período superior a 10 dias, e, em caso positivo,
quantos e quais (dentro do período de férias anteriormente marcado) serão dias excedentes a
serem compensados. Quanto ao ressarcimento do pagamento do adicional de um terço de
férias, realizado aos servidores com férias no mês de outubro, incidente sobre os 10 dias
reduzidos em relação aos 20 que serviram de base para o cálculo lançado na folha de
setembro/2014, ficam os servidores informados que a reposição ao erário será processada em
parcela única na folha de outubro/2014;” (destaques do original)’
A autora já havia gozado vinte dias de férias no mês de abril de 2014, e recebeu adicional de
férias em setembro daquele ano, sendo que gozou de mais dez dias de férias em outubro de
2014, quando foi efetuado o ressarcimento na forma acima, ou seja, sobre os dez dias
excluídos por força da decisão do TCU, quando a autora foi classificada para a devolução por
não estar em sua atividade incluído nos termos do art. 79, da Lei nº 8.112/90.
A autora recebeu o adicional de 1/3 sobre tal período ainda em setembro e, após a decisão
cautelar do TCU que determinou o gozo de trinta dias de férias por ano (e não vinte por
semestre) efetuou o ressarcimento do valor atinente aos dez dias excedentes no mês de
outubro, afastando a boa-fé suscitada na exordial.
Uma vez decretada a cautelar pelo TCU, foi elaborado o Boletim Informativo nº 044/2014, de
30/06/2014, quando foram informados todos os servidores acerca da decisão, da provável
alteração no regime de férias e da eventual necessidade de ressarcimento:
“Com a alteração, uma vez que todos os servidores que não operam direta e permanentemente
com raios X ou substâncias radioativas gozaram de 20 dias de férias durante o primeiro
semestre de 2014, resta pendente a concessão de mais 10 dias.
(...)
Destaca-se a ciência da parte autora do recebimento de forma precária dos valores do
adicional, sendo lícita a restituição, por ela, da parcela do adicional de 1/3 de férias sobre os
dez dias a que não fazia jus, conforme apurado administrativamente.
(...)
Assim, como não se configurou a boa-fé no recebimento do adicional não há reforma e também
não se configurou ilegalidade da cobrança administrativa mesmo se tratando de verba
alimentar, uma vez que a mesma não pode ser recebida sem boa-fé o que no caso dos autos
não se caracterizou, uma vez que se trata de cumprimento de decisão do V. Acórdão do TCU,
em Embargos de Declaração, Acórdão nº 2527/2014.
Diante de tais fatos, mister reconhecer a improcedência dos pedidos formulados pela autora.”
Com a devida vênia, a sentença é de ser reformada.
De início, observo que a autora não comprovou que exercia sua atividade laboral exposta a
substâncias radioativas, motivo pelo qual não faz jus ao sistema semestral de férias de vinte
dias consecutivos, nos termos do artigo 79 da Lei n° 8.112/90, não havendo que se falar em
ilegalidade na alteração do regime de férias.
Por outro lado, observo que o caso trata de restituição valores percebidos pelo servidor em
virtude de interpretação errônea da lei por parte da Administração.
Com efeito, a orientação para que todos os servidores da CNEN usufruíssem de férias
semestrais de 20 dias decorreu de interpretação equivocada da lei efetuada pela própria
administração, quando da emissão da Portaria CNEN-PR 57/2010, conforme se observa do teor
dos acórdãos TCU 1568/2014 e 2527/2014.
Dessa forma, não há que se falar em ausência de boa-fé no recebimento dos valores
decorrentes das férias semestrais de 20 dias, uma vez que todos os servidores da CNEN
passaram a gozar de férias semestrais de 20 dias desde 2010, por conta do cumprimento da
Portaria CNEN-PR 57/2010, emitida pelo Presidente da CNEN.
Registre-se que não há que se falar que o recebimento dos valores do adicional de férias
ocorreu de forma precária, revertida em decorrência de cumprimento de decisão de Acórdão
TCU nº 2527/2014, uma vez que a concessão de férias semestrais de 20 dias não decorreu de
cumprimento a decisão liminar, posteriormente revogada ou rescinda.
A Primeira Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.401.560/MT, realizado sob o rito dos
recursos repetitivos (art. 543-C, do Código de Processo Civil, e Resolução STJ 8/2008),
estabeleceu que, na hipótese de pagamento por força de provimentos judiciais liminares, ainda
que em se tratando de verbas decorrentes de benefícios previdenciários, não pode o
beneficiário alegar boa-fé para não devolver os valores recebidos, tendo em vista a
precariedade da medida concessiva, e, por conseguinte, a impossibilidade de se presumir a
definitividade do pagamento. Confira-se:
PREVIDÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA.
REVERSIBILIDADE DA DECISÃO. O grande número de ações, e a demora que disso resultou
para a prestação jurisdicional, levou o legislador a antecipar a tutela judicial naqueles casos em
que, desde logo, houvesse, a partir dos fatos conhecidos, uma grande verossimilhança no
direito alegado pelo autor. O pressuposto básico do instituto é a reversibilidade da decisão
judicial. Havendo perigo de irreversibilidade, não há tutela antecipada (CPC, art. 273, § 2º). Por
isso, quando o juiz antecipa a tutela, está anunciando que seu decisum não é irreversível. Mal
sucedida a demanda, o autor da ação responde pelo recebeu indevidamente. O argumento de
que ele confiou no juiz ignora o fato de que a parte, no processo, está representada por
advogado, o qual sabe que a antecipação de tutela tem natureza precária. Para essa solução,
há ainda o reforço do direito material. Um dos princípios gerais do direito é o de que não pode
haver enriquecimento sem causa. Sendo um princípio geral, ele se aplica ao direito público, e
com maior razão neste caso porque o lesado é o patrimônio público. O art. 115, II, da Lei nº
8.213, de 1991, é expresso no sentido de que os benefícios previdenciários pagos
indevidamente estão sujeitos à repetição. Uma decisão do Superior Tribunal de Justiça que
viesse a desconsiderá-lo estaria, por via transversa, deixando de aplicar norma legal que, a
contrario sensu, o Supremo Tribunal Federal declarou constitucional. Com efeito, o art. 115, II,
da Lei nº 8.213, de 1991, exige o que o art. 130, parágrafo único na redação originária
(declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal - ADI 675) dispensava. Orientação a
ser seguida nos termos do art. 543-C do Código de Processo Civil: a reforma da decisão que
antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente
recebidos. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 1401560/MT, Relator: Ministro
SÉRGIO KUKINA, Data de Julgamento: 12/02/2014, DJe: 13/10/2015).
Como se observa, referido repetitivo menciona a necessidade de devolução de valores
percebidos em virtude de decisão judicial precária, que venha a ser posteriormente revogada.
O caso em tela, porém, cuida de valores recebidos por conta de orientação da administração,
decorrente de interpretação equivocada da lei, que foi modificada por meio de acórdão do TCU.
Por fim, a natureza alimentar dos valores recebidos pelo servidor é inconteste.
Ressalte-se, ainda, que em caso similar, a Segunda Turma desta Corte Regional, reconheceu
que os servidores do CNEN receberam valores a maior por equívoco da Administração, não
ficando obrigados a restituí-la, não podendo sofrer descontos em suas remunerações:
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. ILEGITIMIDADE PASSIVA. PRELIMINAR
AFASTADA. EXPOSIÇÃO DOS AUTORES À SUBSTÂNCIAS RADIOATIVAS. NÃO
COMPROVAÇÃO. DESCONTO DE VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ. CARÁTER
ALIMENTAR. IRREPETIBILIDADE. APELO E REMESSA OFICIAL DESPROVIDOS.
I - Rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva "ad causam", tendo em vista que a ré possui
natureza jurídica de autarquia federal, dotada de autonomia administrativa e financeira. Embora
a ré sustente agir sob a orientação de normas expedidas por outros órgãos da Administração
Pública, isso não lhe retira a autonomia financeira e administrativa, motivo pelo qual deve
responder sobre questões que envolvam aspectos remuneratórios de seus servidores.
II - No mérito, restou incontroverso que os autores não comprovaram que exerciam suas
atividades laborais expostos a substâncias radioativas, motivo pelo qual não fazem jus ao
sistema semestral de férias de vinte dias consecutivos, nos termos do artigo 79 da Lei nº
8.112/90.
III - É pacífico na jurisprudência que os servidores que recebam uma vantagem de boa-fé, por
equívoco da Administração, não ficam obrigados a restituí-la, não podendo sofrer descontos em
suas remunerações.
IV - Apelação e remessa oficial desprovidas.
(TRF 3ª Região, SEGUNDA TURMA, ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA -
2256363 - 0020277-60.2014.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL COTRIM
GUIMARÃES, julgado em 12/07/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/07/2018 )
Nesse sentido, portanto, consoante entendimento consolidado na jurisprudência, tendo em vista
que se trata de valores indevidamente percebidos em virtude de interpretação errônea da lei por
parte da Administração, a boa-fé da servidora pública, o caráter alimentar da verba recebida,
mostra-se incabível o desconto de tal importância para restituição ao erário.
Registre-se, por derradeiro, que eventual cobrança pela Administração de valores pagos
indevidamente a servidor público deveria ser precedida de procedimento administrativo em que
seja assegurado ao servidor o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório, nos
termos do art. 5º, LV, da Constituição Federal, art. 2º da Lei n. 9.784/99, o que não ocorreu no
caso em tela. Nesse sentido:
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE MEDIDA
LIMINAR. POSTERIOR DENEGAÇÃO DA ORDEM. RESTITUIÇÃO DEVIDA. DECADÊNCIA.
INOCORRÊNCIA. TERMO INICIAL.
1. A Administração Pública possui o direito de obter a restituição dos valores indevidamente
pagos por força de decisão judicial liminar posteriormente revogada, desde que observados os
princípios da ampla defesa e do contraditório. Precedentes do STJ.
2. Apenas com a denegação definitiva da segurança, e a consequente cassação da liminar
anteriormente concedida, tem início o prazo decadencial estabelecido na Lei n. 9.784/99. A
partir deste momento surge para a Administração a possibilidade de instaurar procedimento
com vistas a obter o ressarcimento dos valores pagos e reconhecidos judicialmente como
indevidos.
3. Agravo regimental improvido.
(AgRg no RMS 23.746/SC, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em
01/03/2011, DJe 14/03/2011)
DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE
INSTRUMENTO. SERVIDOR PÚBLICO. VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE.
REPOSIÇÃO AO ERÁRIO. DEVIDO PROCESSO LEGAL. NECESSIDADE. PRECEDENTE DO
STJ. AGRAVO IMPROVIDO.
1. A atividade do Tribunal de Contas da União, órgão auxiliar do Poder Legislativo, é
meramente fiscalizadora e suas decisões têm caráter técnico-administrativo, sendo revestidas
de caráter opinativo, não fazendo coisa julgada. Precedente do STJ.
2. "Nos processos perante o Tribunal de Contas da União asseguram-se o contraditório e a
ampla defesa quando da decisão puder resultar anulação ou revogação de ato administrativo
que beneficie o interessado, excetuada a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial
de aposentadoria, reforma e pensão" (Súmula Vinculante 3/STF ? Grifo nosso).
3. "A cobrança pela Administração de valores pagos indevidamente a servidor público deve
observar o devido processo legal, com o imprescindível exercício da ampla defesa e do
contraditório" (AgRg no REsp 979.050/PE, Rel. Min. JORGE MUSSI, Quinta Turma, DJe
6/10/08).
4. Agravo regimental improvido.
(AgRg no Ag 1239482/RJ, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado
em 20/05/2010, DJe 21/06/2010)
DIREITO ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA.
SERVIDOR PÚBLICO APOSENTADO. SUPRESSÃO DE VERBA REMUNERATÓRIA. DEVIDO
PROCESSO LEGAL. INOBSERVÂNCIA. RECURSO PROVIDO. SEGURANÇA CONCEDIDA.
1. Consoante inteligência da Súmula 473/STF, a Administração, com fundamento no seu poder
de autotutela, pode anular seus próprios atos, desde que ilegais. Ocorre que, quando tais atos
produzem efeitos na esfera de interesses individuais, mostra-se necessária a prévia instauração
de processo administrativo, garantindo-se a ampla defesa e o contraditório, nos termos do art.
5º, LV, da Constituição Federal.
2. Hipótese em que a verba remuneratória denominada "Gratificação de Função de Direção" foi
excluída dos proventos do recorrente sem observância do devido processo legal.
3. Recurso ordinário provido.
(RMS 27.396/MT, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em
02/03/2010, DJe 29/03/2010)
Logo, de rigor a reforma da sentença para julgar procedente o pedido de declaração do direito
de não devolução dos valores recebidos a título de adicional de um terço de férias sobre 10 dias
que iriam ser gozadas no mês de outubro de 2014, bem como para condenar a CNEN a
devolver a parcela que foi descontada nos seus vencimentos.
Da atualização judicial do débito
No julgamento do RE nº 870.947, o Supremo Tribunal Federal rejeitou todos os embargos de
declaração opostos contra a decisão proferida em 20/09/2017, mantendo-a integralmente:
“Decisão: O Tribunal, por maioria e nos termos do voto do Relator, Ministro Luiz Fux,
apreciando o tema 810 da repercussão geral, deu parcial provimento ao recurso para,
confirmando, em parte, o acórdão lavrado pela Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da
5ª Região, (i) assentar a natureza assistencial da relação jurídica em exame (caráter não-
tributário) e (ii) manter a concessão de benefício de prestação continuada (Lei nº 8.742/93, art.
20) ao ora recorrido (iii) atualizado monetariamente segundo o IPCA-E desde a data fixada na
sentença e (iv) fixados os juros moratórios segundo a remuneração da caderneta de poupança,
na forma do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09. Vencidos,
integralmente o Ministro Marco Aurélio, e parcialmente os Ministros Teori Zavascki, Dias Toffoli,
Cármen Lúcia e Gilmar Mendes.
Ao final, por maioria, vencido o Ministro Marco Aurélio, fixou as seguintes teses, nos termos do
voto do Relator:
1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que
disciplina osjuros moratóriosaplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional
ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os
mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em
respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações
oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de
remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta
extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09;
e
2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que
disciplina a atualização monetáriadas condenações impostas à Fazenda Pública segundo a
remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucionalao impor restrição
desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica
como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a
promover os fins a que se destina.
Presidiu o julgamento a Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 20.9.2017.”
“Decisão: (ED) O Tribunal, por maioria, rejeitou todos os embargos de declaração e não
modulou os efeitos da decisão anteriormente proferida, nos termos do voto do Ministro
Alexandre de Moraes, Redator para o acórdão, vencidos os Ministros Luiz Fux (Relator),
Roberto Barroso, Gilmar Mendes e Dias Toffoli (Presidente). Não participou, justificadamente,
deste julgamento, a Ministra Cármen Lúcia. Ausentes, justificadamente, os Ministros Celso de
Mello e Ricardo Lewandowski, que votaram em assentada anterior. Plenário, 03.10.2019.”
E, com relação à aplicação das diversas redações do art. 1º-F da Lei 9.494/97, perfilho o
entendimento de que sobrevindo nova lei que altere os critérios da atualização monetária a
nova disciplina legal tem aplicação imediata, inclusive aos processos já em curso.
Desse modo, as condenações da Fazenda oriundas de relações jurídicas não-tributárias devem
ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros moratórios, quando houver, da seguinte
forma:
a) até a MP n. 2.180-35/2001, que acresceu o art. 1º-F à Lei n. 9.494/97, deve incidir correção
monetária pela variação dos indexadores previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal e,
se houver, juros de mora à razão de 1% ao mês;
b) a partir da MP n. 2.180-35/2001 e até a edição da Lei n. 11.960/2009 deve incidir correção
monetária pela variação dos indexadores previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal e,
se houver, juros de mora à razão de 0,5% ao mês;
c) a partir de 01/07/2009, nos termos definidos no julgamento do RE 870.947, é constitucional o
art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/09, no que alude à fixação de
juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança (TR), porém, na
parte em que disciplina a atualização monetária, é inconstitucional por ser inadequado a
capturar a variação de preços da economia, aplicando, portanto, o índice IPCA-E, previsto no
Manual de Orientação de Cálculos da Justiça Federal e que melhor reflete a inflação acumulada
no período.
A aplicação das diretrizes traçadas no RE 870.947/SE para a atualização do débito decorre do
reconhecimento de sua repercussão geral. Aliás, a não observância ao posicionamento nele
expresso levaria ao desrespeito da decisão da Suprema Corte.
Das verbas de sucumbência
Em relação à verba de sucumbência, o art. 85 do Código de Processo Civil/2015 é claro ao
estabelecer que a sentença deverá condenar o vencido a pagar ao vencedor as despesas que
antecipou e os honorários advocatícios.
A fixação da verba honorária deve observar o princípio da causalidade, segundo o qual aquele
que deu causa à instauração do processo ou ao incidente processual deve se responsabilizar
pelas despesas dele decorrente.
Ademais, a condenação em honorários advocatícios e despesas processuais é consequência
da sucumbência
Nesses termos, considerada a procedência do pedido da parte autora, inverto o ônus da
sucumbência para condenar a CNEN ao pagamento de honorários advocatícios em favor do
advogado da autora que ora fixo em 10% sobre o valor atribuído à causa, considerando o
trabalho realizado e o tempo exigido para o serviço (art. 85, § 3º, do CPC).
Custas ex lege.
Dispositivo
Ante o exposto, douprovimento ao recurso da autora para julgar procedente o pedido de
declaração do direito de não devolução dos valores recebidos a título de adicional de um terço
de férias sobre 10 dias que iriam ser gozadas no mês de outubro de 2014, bem como para
condenar a CNEN a devolver a parcela que foi descontada nos seus vencimentos.
É o voto.
E M E N T A
ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CIVEL. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. REPOSIÇÃO AO
ERÁRIO. ADICIONAL DE FÉRIAS PAGOS A MAIOR. ERRO DE INTERPRETAÇÃO DA LEI
PELA ADMINISTRAÇÃO. BOA-FÉ NO RECEBIMENTO. RESTITUIÇÃO DOS VALORES:
DESNECESSIDADE. RECURSO PROVIDO
1. Apelação interposta pela autora contra sentença julgou improcedente os pedidos de
declaração do direito de não devolução dos valores recebidos a título de adicional de um terço
de férias aos servidores que entrarem de férias no mês de outubro e demais meses de 2014, de
declaração de nulidade do Boletim Informativo CNEN nº 064/2014, e de condenação da CNEN
a devolver a parcela que foi descontada nos seus vencimentos. Condenada a autora ao
pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído
à causa, devidamente atualizado.
2. A Administração pode e deve anular e revogar seus próprios atos, quando eivados de
nulidade e vícios, em razão do exercício da autotutela e em consonância com a Súmula 473 do
STF.
3. Até a edição da Lei nº 9.784/99 o poder-dever da Administração de rever os próprios atos
quando eivados de ilegalidade, podia ser exercido a qualquer tempo, nos termos do art. 114 da
Lei nº 8.112/90. Intelecção das Súmulas 346 e 473 do STF. Com a edição da Lei nº 9.784/99, o
poder-dever de a Administração rever os atos praticados passou a ter prazo de cinco anos.
4. Impossibilidade de restituição de valores indevidamente percebidos em virtude de
interpretação errônea da lei, de erro operacional, ou de cálculo, por parte da Administração,
quando existente a boa-fé do servidor.
5. Desnecessidade da devolução de valores pagos, por erro da Administração, ao servidor,
diante da sua natureza alimentar e da presunção de boa-fé. Precedentes.
6. Tal silogismo restou adotado pela própria Fazenda, consoante se dessume do teor da
Súmula nº 34 da Advocacia Geral da União - que tem efeito vinculante para os procuradores
federais, ex vi do disposto no art. 28, II, da Lei Complementar nº 73/1993 -, bem como da
Súmula nº 249 do Tribunal de Contas da União.
7. Recentemente, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em análise de
recursos especiais repetitivos (tema 1009), fixou a tese de que os pagamentos indevidos a
servidores públicos, decorrentes de erro administrativo (operacional ou de cálculo) não
embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei, estão sujeitos à devolução, a menos
que o beneficiário comprove a sua boa-fé objetiva, especialmente com a demonstração de que
não tinha como constatar a falha.
8. No caso em tela, restou demonstrado a ocorrência de erro de interpretação da lei por parte
da Administração, o caráter alimentar da verba e boa-fé no recebimento dos valores a maior. A
natureza alimentar dos valores recebidos pelo servidor é inconteste.
9. Apelação provida. Sentença reformada.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Primeira Turma, por
unanimidade, deu provimento ao recurso da autora para julgar procedente o pedido de
declaração do direito de não devolução dos valores recebidos a título de adicional de um terço
de férias sobre 10 dias que iriam ser gozadas no mês de outubro de 2014, bem como para
condenar a CNEN a devolver a parcela que foi descontada nos seus vencimentos, nos termos
do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
