Processo
AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO / SP
5002026-60.2020.4.03.0000
Relator(a)
Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO
Órgão Julgador
2ª Turma
Data do Julgamento
20/08/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 21/08/2020
Ementa
E M E N T A
AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÕES
PREVIDENCIÁRIAS PATRONAIS. CONTRIBUIÇÕES DEVIDAS A TERCEIROS. SALÁRIO E
GANHOS HABITUAIS DO TRABALHO. VERBAS INDENIZATÓRIAS. RECURSO IMPROVIDO.
- O texto constitucional confiou à União Federal amplo campo de incidência para exercício de sua
competência tributária no tocante à contribuição previdenciária patronal, compreendendo o
conjunto das verbas remuneratórias habituais (salários e demais rendimentos do trabalho), cuja
conformação normativa está essencialmente consolidada na Lei 8.212/1991 (notadamente em
seu art. 22). Todavia, não estão no campo constitucional de incidência e nem nas imposições
legais verbas com conteúdo indenizatório, em face das quais não pode incidir contribuição
previdenciária.
- Os valores pagos a título de horas extras, horas extras incorporadas e respectivos adicionais
integram a remuneração do empregado. Afinal, constituem contraprestação devida pelo
empregador, por imposição legal, em decorrência dos serviços prestados pelo obreiro em razão
do contrato de trabalho. Constituem, portanto, salário-de-contribuição, para fins de incidência da
exação prevista no art. 22, I, da Lei nº 8.212/1991.
- Agravo de instrumento improvido.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº5002026-60.2020.4.03.0000
RELATOR:Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
AGRAVANTE: BRASIL LAU-RENT - LOCACAO DE MAQUINAS E EQUIPAMENTOS LTDA.
Advogados do(a) AGRAVANTE: LARISSA OLIVEIRA DO PRADO SOUZA - PR58121-A,
CRISTINA TIELAS MADUREIRA - SP408185-S, PAULO SERGIO PIASECKI - PR20930-A
AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº5002026-60.2020.4.03.0000
RELATOR:Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
AGRAVANTE: BRASIL LAU-RENT - LOCACAO DE MAQUINAS E EQUIPAMENTOS LTDA.
Advogados do(a) AGRAVANTE: LARISSA OLIVEIRA DO PRADO SOUZA - PR58121-A,
CRISTINA TIELAS MADUREIRA - SP408185-S, PAULO SERGIO PIASECKI - PR20930-A
AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO: Trata-se de Agravo de
Instrumento interposto por BRASIL LAU-RENT - LOCACAO DE MAQUINAS E EQUIPAMENTOS
LTDA contra decisão proferida nos autos do mandado de segurança impetrado contra o
DELEGADO DA DELEGACIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM SÃO JOSÉ DOS
CAMPOS – SP, tendo por objeto, em síntese, o afastamento da incidência da contribuição
previdenciária a cargo da empresa, RAT e devida a terceiros sobre os valores pagos a título de
horas extras, horas extras incorporadas e respectivos adicionais.
A decisão agravada foi proferida nos seguintes termos:
“Trata-se de mandado de segurança, com pedido liminar, ajuizado inicialmente perante a
Subseção Judiciária de Guarulhos, no qual a impetrante requer seja declarado o direito de não
recolher contribuições sociais (cota patronal, RAT e entidades terceiras) incidentes sobre os
valores pagos a título de hora extra, hora extra incorporada e adicionais respectivos, bem como a
restituição ou compensação dos valores recolhidos a este título no quinquênio anterior à
propositura da ação.
O pedido liminar é para que a autoridade coatora se abstenha de praticar qualquer ato de
cobrança dos referidos valores, ainda que indiretamente. Alternativamente, pugna pela
suspensão da exigibilidade das referidas contribuições.
Preferida decisão declinando da competência (ID 22722987), o feito foi redistribuído para este
Juízo.
Suscitado conflito de competência negativo (ID 22851246 e ID 23573923), foi designado este
Juízo como competente para apreciar medidas urgentes (ID 26152243).
É a síntese do necessário.
Fundamento e decido.
Sobre a liminar, dispõe o inciso III do artigo 7.º da Lei n.º 12.016/2009, que o juiz, ao despachar a
petição inicial, ordenará que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando for relevante o
fundamento e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja deferida ao final
do processo. Portanto, para a concessão da liminar, esses requisitos devem estar presentes
conjuntamente.
A Previdência Social é o instrumento de política social do governo, cuja finalidade precípua é a
manutenção do nível de renda do trabalhador em casos de infortúnios ou de aposentadoria,
abrangendo atividades de seguro social, definidas como aquelas destinadas a amparar o
trabalhador nos eventos previsíveis ou não, como velhice, doença, invalidez (aposentadorias,
pensões, auxílio-doença e auxílio-acidente do trabalho, além de outros benefícios ao trabalhador).
A concessão dos benefícios restaria inviável se não houvesse uma contraprestação que
assegurasse a fonte de custeio. Consectariamente, o fato ensejador da contribuição
previdenciária não é a relação custo-benefício e sim a natureza jurídica da parcela percebida pelo
trabalhador, que encerra a verba recebida em virtude de prestação do serviço.
A Constituição Federal revela os contornos da base de cálculo das contribuições previdenciárias,
em seu art. 195, I, “a” e art. 201, § 11º:
Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos
termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
I – do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:
a) folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física
que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício;
Art. 201. (...)
§ 11º. Os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para
efeito de contribuição previdenciária e conseqüente repercussão em benefícios, nos casos e na
forma da lei.
Assim, para fins de recolhimento de contribuição previdenciária, a Constituição Federal ampliou o
conceito de salário, pois incorporou os rendimentos do empregado, a qualquer título, ou seja, sua
própria remuneração.
A Lei nº 9.876, de 26 de novembro de 1999, alterou dispositivos da Lei n.º 8.212/91, ao
discriminar a base de cálculo e alíquota da contribuição do artigo 195, I “a” da Constituição
Federal:
Art. 22. A contribuição a cargo da empresa, destinada à Seguridade Social, além do disposto no
art. 23, é de:
I - vinte por cento sobre o total das remunerações pagas, devidas ou creditadas a qualquer título,
durante o mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos que lhe prestem serviços,
destinadas a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, inclusive as gorjetas, os ganhos
habituais sob a forma de utilidades e os adiantamentos decorrentes de reajuste salarial, quer
pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à disposição do empregador ou tomador
de serviços, nos termos da lei ou do contrato ou, ainda, de convenção ou acordo coletivo de
trabalho ou sentença normativa.
Inclusive, nesse sentido também se orientou a Lei nº 8.212/91 em seu artigo 28, ao definir salário-
de-contribuição:
Art. 28. Entende-se por salário-de-contribuição:
I – para o empregado e trabalhador avulso: a remuneração auferida em uma ou
mais empresas, assim entendida a totalidade dos rendimentos pagos, devidos ou creditados a
qualquer título, durante o mês, destinados a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma,
inclusive as gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades e os adiantamentos
decorrentes de reajuste salarial, quer pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à
disposição do empregador ou tomador de serviços nos termos da lei ou contrato ou, ainda, de
convenção ou acordo coletivo de trabalho ou sentença normativa.
A própria redação da CLT enquadra esta verba no conceito de salário:
Art. 457. Compreendem-se na remuneração do empregado para todos os efeitos legais, além do
salário devido e pago diretamente pelo empregador, como contraprestação do serviço, as
gorjetas que receber.
§ 1º. Integram o salário, não só a importância fixa estipulada, como também as comissões,
percentagens, gratificações ajustadas, diárias para viagem e abonos pagos pelo empregador.
Desta forma, resta claro que somente as verbas com caráter nitidamente indenizatório estão
excluídas da incidência, pois não se enquadram nos conceitos de “folha de salários” ou “demais
rendimentos do trabalho”.
O próprio legislador expressamente previu as exclusões de incidência de contribuição social pelo
§ 9º do art. 28 da Lei 8.212/91.
Entende-se por indenização a reparação de danos. As partes, muitas vezes, por mera liberalidade
denominam verbas de cunho salarial com este nome - indenização. Entretanto, não é o nome
jurídico dado à parcela que enseja sua caracterização como tal e sim sua natureza.
Portanto, todos os valores pagos, além do salário, de cunho não indenizatório constituem
remuneração indireta e nos termos da legislação em vigor constituem base de cálculo da
contribuição previdenciária, pois são rendimentos pagos, devidos ou creditados a qualquer título,
durante o mês, destinados a retribuir o trabalho.
Passo à análise das verbas em questão.
As verbas à título de hora extra, hora extra incorporada e seus respectivos adicionais tem
natureza remuneratória do trabalho. Portanto, devem integrar a base de cálculo das contribuições
previdenciárias.
Com efeito, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial nº 1.358.281/SP,
submetido ao rito do art. 543-C do Código de Processo Civil de 1973, firmou entendimento
segundo o qual incide contribuição previdenciária sobre hora extra.
Também neste sentido recente julgado do TRF3, o qual acolho:
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO.
CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS E CONTRIBUIÇÕES DEVIDAS A OUTRAS ENTIDADES
E FUNDOS. 1. O entendimento pacificado no REsp. nº 1230957/RS não se estende aos
eventuais reflexos do aviso prévio indenizado que, in casu, possuem natureza salarial.
Precedentes. 2. Nos termos do art. 487, § 5º, da CLT e da súmula 60 do TST, o valor da hora
extraordinária e do adicional noturno habituais integram o aviso prévio indenizado. Referidos
valores já estão incluídos no aviso prévio indenizado pago pelo empregador aos empregados que
cumpriram jornada extraordinária e/ou noturna habituais. 3. Os demais argumentos aduzidos nos
recursos dos quais foram tirados os presentes embargos declaratórios não têm o condão de
modificar o acórdão combatido, de vez que aqueles de maior relevância à elucidação do julgado
foram devidamente apreciados (artigo 1022, parágrafo único, inciso II, do CPC/2015). 4.
Embargos de declaração opostos pela União e pela parte autora parcialmente acolhidos para
sanar o vício apontado e fazer constar o seguinte dispositivo: Pelo exposto, nego provimento à
apelação da parte autora e do SESI/SENAI; dou parcial provimento à apelação do SEBRAE-SP
para acolher a preliminar de ilegitimidade passiva, excluindo-o da lide; dou parcial provimento à
apelação da União para reconhecer a incidência das contribuições previdenciárias e das
contribuições destinadas a outras entidades e fundos sobre os valores pagos pela parte autora a
título de reflexos do aviso prévio indenizado incidentes sobre o 13º salário, horas extras e
adicional noturno; e dou parcial provimento à remessa oficial para: (i) declarar a ilegitimidade
passiva ad causam das entidades terceiras SESI, SENAI, FNDE e INCRA, excluindo-as da lide;
(ii) determinar que eventual compensação, sujeita à apuração da administração fazendária, seja
realizada nos termos do art. 26-A da Lei nº 11.457/2007 (introduzido pela Lei 13.670/18) e da
Instrução Normativa RFB n. 1.717/17 (com as alterações da Instrução Normativa RFB 1.810/18),
observados a prescrição quinquenal, o trânsito em julgado e a atualização dos créditos, nos
termos supramencionados. Sucumbência recíproca nos termos do art. 21 do Código Buzaid
(enunciado Administrativo nº 7/STJ). Custas ex lege. (TRF3, ApelRemNec 0002942-
95.2014.4.03.6110, DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA, PRIMEIRA TURMA, e-
DJF3 Judicial 1 DATA:09/10/2019.)
Assim, em exame de cognição sumária, típica deste momento processual, verifico não haver
plausibilidade jurídica nas alegações da impetrante.
Diante do exposto, indefiro a medida liminar.
Aguarde-se o julgamento do Conflito de Competência nº 5030257-34.2019.403.0000.
Publique-se.”
Alega a agravante, em síntese, que as verbas em discussão possuem caráter
compensatório/indenizatório e deve ser afastada a incidência de contribuição previdenciária
patronal, RAT/SAT e sobre terceiros. Destaca a publicação da Lei nº 13.485/2017, através da
qual ocorrerá a renegociação do débito previdenciário discutido nos autos. No mais, sustenta a
ausência de fundamentação da decisão interlocutória e o desrespeito ao artigo 489, §1º IV do
CPC.
Foi proferida decisão que indeferiu o pedido de antecipação de tutela.
Foram apresentadas contrarrazões.
O Ministério Público Federal manifestou-se pelo não provimento do agravo.
É o relatório.
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº5002026-60.2020.4.03.0000
RELATOR:Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
AGRAVANTE: BRASIL LAU-RENT - LOCACAO DE MAQUINAS E EQUIPAMENTOS LTDA.
Advogados do(a) AGRAVANTE: LARISSA OLIVEIRA DO PRADO SOUZA - PR58121-A,
CRISTINA TIELAS MADUREIRA - SP408185-S, PAULO SERGIO PIASECKI - PR20930-A
AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO:
A lide posta nos autos versa sobre a interpretação dos conceitos constitucionais de empregador,
trabalhador, folha de salários, e demais rendimentos do trabalho, e ganhos habituais, expressos
no art. 195, I e II, e art. 201, § 4º, ambos do ordenamento de 1988 (agora, respectivamente, no
art. 195, I, “a”, e II, e art. 201, § 11, com as alterações da Emenda 20/1998).
Para se extrair o comando normativo contido em dispositivo da Constituição Federal relativo à
Seguridade Social, vários elementos e dados jurídicos devem ser considerados no contexto
interpretativo, dentre os quais a lógica o caráter contributivo em vista da igualdade e da
solidariedade no financiamento do sistema de seguro estruturado no Regime Geral de
Previdência Social (RGPS).
Para o que importa ao presente recurso, os conceitos constitucionais de empregador, trabalhador,
folha de salários, rendimentos do trabalho e ganhos habituais gravitam em torno de pessoa física
que presta serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e
mediante salário, inserindo-se no contexto do art. 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Portanto, havendo relação de emprego, é imperioso discutir se os valores pagos se inserem no
âmbito constitucional de salário, demais rendimentos do trabalho e ganhos habituais.
Salário é espécie do gênero remuneração paga em decorrência de relação de emprego
tecnicamente caracteriza (marcada pela subordinação). O ordenamento constitucional de 1988
emprega sentido amplo de salário, de modo que está exposta à incidência de contribuição tanto o
salário propriamente dito quanto os demais ganhos habituais do empregado, pagos a qualquer
título (vale dizer, toda remuneração habitual, ainda que em montantes variáveis). Essa amplitude
de incidência é manifesta após a edição da Emenda 20/1998, que, introduzindo o art. 195, I, “a”,
da Constituição, previu contribuições para a seguridade exigidas do empregador, da empresa e
da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre a folha de salários e demais
rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste
serviço, mesmo sem vínculo empregatício. Essa amplitude se verifica também em relação a essa
exação exigida do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, em conformidade
com o art. 195, II, da Constituição (tanto na redação da Emenda 20/1998 quanto na da Emenda
103/2019).
Além disso, a redação originária do art. 201, § 4º, da Constituição de 1988, repetida no art. 201, §
11 do mesmo ordenamento (com renumeração dada pela Emenda 20/1998, prevê que a
previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de
filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, sendo
que “Os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para
efeito de contribuição previdenciária e conseqüente repercussão em benefícios, nos casos e na
forma da lei.”
Portanto, o texto constitucional confiou à União Federal amplo campo de incidência para exercício
de sua competência tributária, compreendendo o conjunto das verbas remuneratórias habituais
(ou seja, salários e demais ganhos), o que por si só não se traduz em exigência tributária
concreta, uma vez que caberá à lei ordinária estabelecer a hipótese de incidência hábil para
realizar as necessárias imposições tributárias, excluídas as isenções que a própria legislação
estabelecer.
Porém, nem tudo o que o empregador paga ao empregado pode ser tributado como salário ou
rendimento do trabalho, pois há verbas que não estão no campo constitucional de incidência (p.
ex., por terem natureza de indenizações), além das eventuais imunidades previstos pelo sistema
constitucional.
Atualmente, a conformação normativa da imposição das contribuições patronais para o sistema
de seguridade está essencialmente consolidada na Lei 8.212/1991 (notadamente em seu art. 22),
muito embora demais diplomas normativos sirvam para a definição e alcance da legislação
tributária (art. 109 e art. 110 do CTN), dentre ele os recepcionados arts. 457 e seguintes da CLT,
prevendo que a remuneração do empregado compreende o salário devido e pago diretamente
pelo empregador, como contraprestação do serviço, as gorjetas que receber, e demais
remunerações. É verdade que o art. 457-A, da CLT (introduzido pela MP 905/2019) estabelece
que gorjetas não são receitas do empregador, mas ainda assim estão no conteúdo amplo de
salário estabelecido pela pelo art. 195, I, “a”, e II, Constituição para a incidência de contribuições
previdenciárias (patronais e do trabalhador).
Para fins trabalhistas (que repercutem na área tributária em razão do contido no art. 110 do CTN),
integram o salário não só a importância fixa estipulada, como também as comissões,
percentagens, gratificações ajustadas, diárias para viagens e abonos pagos pelo empregador. O
meio de pagamento da remuneração pode ser dinheiro, alimentação, habitação, vestuário ou
outras prestações “in natura” que o empregador utilizar para retribuir o trabalho do empregado,
desde que o faça habitualmente (vedadas as bebidas alcoólicas e demais drogas).
Embora pessoalmente admita a possibilidade de a natureza jurídica de certas verbas não estarem
inseridas no conceito de salário em sentido estrito, estaremos diante de verba salarial em sentido
amplo quando se tratar de pagamentos habituais decorrentes da relação de emprego, abrigado
pelo art. 195 e pelo art. 201 da Constituição (nesse caso, desde sua redação originária) para a
imposição de contribuições previdenciárias. E tudo o que foi dito em relação à incidência de
contribuição previdenciária se aplica ao adicional dessa mesma exação calculado pelo segundo o
regramento do Fator Acidentário de Prevenção (FAP) e dos Riscos Ambientais de Trabalho
(RAT).
À evidência, não há que se falar em exercício de competência residual, expressa no § 4º do art.
195, da Constituição, já que a exação em tela encontra conformação na competência originária
constante desde a redação originária do art. 195, I, e do art. 201, ambos do texto de 1988 (não
alterados nesse particular pela Emenda 20/1998 ou pela Emenda 103/2019).
O E.STF, no RE 565160, Pleno, v.u., Rel. Min. Marco Aurélio, j. 29/03/2017, firmou a seguinte
Tese no Tema 20: “A contribuição social a cargo do empregador incide sobre ganhos habituais do
empregado, quer anteriores ou posteriores à Emenda Constitucional 20/1998”. Nesse RE 565160,
o Pretório Excelso cuidou da incidência de contribuição previdenciária sobre adicionais (de
periculosidade e insalubridade), gorjetas, prêmios, adicionais noturnos, ajudas de custo e diárias
de viagem (quando excederem 50% do salário recebido), comissões e quaisquer outras parcelas
pagas habitualmente (ainda que em unidades), previstas em acordo ou convenção coletiva ou
mesmo que concedidas por liberalidade do empregador não integrantes na definição de salário,
afirmando o sentido amplo de salário e de rendimento do trabalho.
Por sua vez, o art. 28, § 9º, da Lei 8.212/1991 traz rol de situações nas quais a contribuição ora
em tela não é exigida, contudo, sem apresentar rigoroso critério distintivo de hipóteses de não
incidência (p. ex., por se tratar de pagamento com natureza indenizatória) ou de casos de isenção
(favor fiscal). Por óbvio, o efeito prático de verba expressamente indicada nesse preceito legal é a
desoneração tributária, o que resulta na ausência de interesse de agir (salvo se, ainda assim, o
ente estatal resistir à legítima pretensão do contribuinte).
No caso dos autos, discute-se a incidência sobre os valores pagos a título de horas extras, horas
extras incorporadas e respectivos adicionais.
Deve-se considerar que tais verbas integram a remuneração do empregado. Afinal, constituem
contraprestação devida pelo empregador, por imposição legal, em decorrência dos serviços
prestados pelo obreiro em razão do contrato de trabalho. Constituem, portanto, salário-de-
contribuição, para fins de incidência da exação prevista no art. 22, I, da Lei nº 8.212/1991.
Tal entendimento prevalece no Colendo Superior Tribunal de Justiça, bem como nesta Corte.
Confira-se:
"TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA DOS EMPREGADORES. ARTS. 22 E 28 DA
LEI N.° 8.212/91. SALÁRIO . SALÁRIO -MATERNIDADE. DÉCIMO-TERCEIRO SALÁRIO .
ADICIONAIS DE HORA-EXTRA, TRABALHO NOTURNO, INSALUBRIDADE E
PERICULOSIDADE. NATUREZA SALARIAL PARA FIM DE INCLUSÃO NA BASE DE CÁLCULO
DA CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA PREVISTA NO ART. 195, I, DA CF/88. SÚMULA 207
DO STF. ENUNCIADO 60 DO TST. 1. A jurisprudência deste Tribunal Superior é firme no sentido
de que a contribuição previdenciária incide sobre o total das remunerações pagas aos
empregados, inclusive sobre o 13 º salário e o salário -maternidade (Súmula n.° 207/STF). 2. Os
adicionais noturno, hora-extra, insalubridade e periculosidade possuem caráter salarial. Iterativos
precedentes do TST (Enunciado n.° 60). 3. A Constituição Federal dá as linhas do Sistema
Tributário Nacional e é a regra matriz de incidência tributária. 4. O legislador ordinário, ao editar a
Lei n.° 8.212/91, enumera no art. 28, § 9°, quais as verbas que não fazem parte do salário -de-
contribuição do empregado, e, em tal rol, não se encontra a previsão de exclusão dos adicionais
de hora-extra, noturno, de periculosidade e de insalubridade. 5. Recurso conhecido em parte, e
nessa parte, improvido. (STJ. 1ª Turma. RECURSO ESPECIAL - 486697/ PR, Processo nº
200201707991. Relatora: Min. DENISE ARRUDA, Data da Decisão: 07/12/2004. Publicação: DJ,
17/12/2004 PG: 00420). – grifo nosso
MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRIBUIÇÃO AO SAT/RAT E DESTINADA AO SALÁRIO
EDUCAÇÃO INCIDENTES SOBRE AUXÍLIO-DOENÇA OU AUXÍLIO-ACIDENTE NOS
PRIMEIROS 15 DIAS DE AFASTAMENTO, HORAS EXTRAS, ADICIONAL DE HORAS EXTRAS,
HORAS IN ITINERE, ADICIONAL NOTURNO, ADICIONAL DE INSALUBRIDADE, ADICIONAL
DE PERICULOSIDADE, ADICIONAL DE TRANSFERÊNCIA, AJUDA DE CUSTO, DESCANSO
SEMANAL REMUNERADO, SALÁRIO MATERNIDADE, FALTAS JUSTIFICADAS POR
ATESTADOS MÉDICOS, HORAS PRÊMIO, HORAS PRODUTIVIDADE E GRATIFICAÇÃO POR
FUNÇÃO. COMPENSAÇÃO. I - As verbas pagas pelo empregador ao empregado nos primeiros
quinze dias do afastamento do trabalho em razão de doença ou acidente, não constituem base de
cálculo de contribuições previdenciárias, posto que tais verbas não possuem natureza
remuneratória mas indenizatória. Precedentes do STJ e desta Corte II - É devida a contribuição
sobre horas extras, horas in itinere, adicional noturno, adicional de periculosidade, adicional de
insalubridade, adicional de transferência, ajuda de custo, descanso semanal remunerado, salário-
maternidade, faltas justificadas por atestados médicos, horas prêmio, horas produtividade e
gratificação (função confiança), o entendimento da jurisprudência concluindo pela natureza
salarial dessas verbas. Precedentes. III - Recursos desprovidos e remessa oficial, tida por
interposta, parcialmente provida. (TRF3. AMS: 00180365020134036100 SP 0018036-
50.2013.4.03.6100. Órgão Julgador: Segunda Turma. Relator: Desembargador Federal Peixoto
Junior. Data de Julgamento: 23/02/2016. Publicação: e-DJF3 Judicial 1, 10/03/2016). – grifo
nosso
TRIBUTÁRIO - MANDADO DE SEGURANÇA - CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA - SAT/RAT
E TERCEIROS - 13º SALÁRIO INDENIZADO - SALARIO-MATERNIDADE - FÉRIAS GOZADAS -
ADICIONAL DE HORAS EXTRAS, NOTURNO, INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE - DSR -
EXIGIBILIDADE - PRIMEIROS QUINZE DIAS QUE ANTECEDEM A CONCESSÃO DO AUXÍLIO-
DOENÇA/ACIDENTE - TERÇO CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS - INEXIGIBILIDADE -
COMPENSAÇÃO - POSSIBILIDADE. I - A jurisprudência pátria tem entendimento de que o
regramento aplicado para analisar a incidência de contribuição previdenciária patronal deve ser
utilizado para apreciar a incidência da contribuição destinada às entidades terceiras, reconhecida
igualdade da base de cálculo das exações. II - A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça,
em 26.02.2014, por maioria, reconheceu que não incide contribuição previdenciária sobre as
verbas pagas a título de aviso prévio indenizado (tema 478), terço constitucional de férias (tema
479) e quinzena inicial do auxílio doença ou acidente (tema 738), bem como que incide sobre o
salário maternidade (tema 739). III - Incide contribuição previdenciária patronal, SAT/RAT, bem
como a devida a terceiros sobre os valores pagos a título de horas extras e seu respectivo
adicional (tema/repetitivo STJ nº 687), adicional noturno (tema/repetitivo STJ nº 688), adicional de
periculosidade (tema/repetitivo STJ nº 689), adicional de insalubridade, férias gozadas, descanso
semanal remunerado (DSR) e 13º salário indenizado. IV - Quanto às contribuições
previdenciárias, deve ser reconhecida a possibilidade de compensação, após o trânsito em
julgado (170-A, do CTN), com correção monetária mediante aplicação da taxa Selic desde a data
do desembolso, afastada a cumulação de qualquer outro índice de correção monetária ou juros
(REsp 1112524/DF, julgado sob o rito do artigo 543-C, do CPC/73), com contribuições
previdenciárias (aplicável a restrição prevista no art. 26 da Lei n. 11.457/07), considerando-se
prescritos eventuais créditos oriundos dos recolhimentos efetuados em data anterior aos 05 anos,
contados retroativamente do ajuizamento da ação (art. 168 do CTN c/c artigo 3º da Lei
Complementar nº 118/2005. RE 566621). V - Quanto às contribuições destinadas às entidades
terceiras, cumpre esclarecer que as recentes decisões do STJ vêm reconhecendo que as
previsões contidas nas instruções normativas RFB nº 900/08 e 1.300/12, em seus artigos 47 e 59,
respectivamente, extrapolaram a previsão contida no artigo 89, caput, da Lei 8.212/91, na medida
em que o dispositivo legal apenas reservou à Secretaria da Receita Federal estipular a forma
procedimental da restituição ou compensação, não lhe conferindo competência para vedar a
referida operação. VI - O indébito referente às contribuições destinadas a terceiros pode ser
objeto de compensação com parcelas vencidas posteriormente ao pagamento, relativas a tributo
de mesma espécie e destinação constitucional, observados a prescrição quinquenal, o trânsito
em julgado e o demais disposto no presente julgamento. VII - Remessa oficial parcialmente
provida. apelação da impetrante e da União Federal desprovidas. (TRF3. ApReeNec / SP
5005437-73.2018.4.03.6114. Órgão Julgador: Segunda Turma. Relator: Cotrim Guimarães. Data
do Julgamento: 23/10/2019. Data da Publicação/Fonte: e - DJF3 Judicial 1, 28/10/2019) – grifo
nosso
TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO
DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA.
ADICIONAIS NOTURNO, DE INSALUBRIDADE E DE HORA EXTRA. SALÁRIO-MATERNIDADE
. FÉRIAS GOZADAS. QUEBRA DE CAIXA. NATUREZA REMUNERATÓRIA. INCIDÊNCIA.
SÚMULA N. 568/STJ. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO
ATACADA. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 1.021, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE
2015. DESCABIMENTO. I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada
em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento
jurisdicional impugnado. In casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015. II - Esta Corte
sedimentou entendimento segundo o qual incide contribuição previdenciária sobre os valores
pagos a título de férias gozadas, adicional noturno, de periculosidade, de insalubridade e de
transferência, horas extras, salário maternidade e quebra de caixa. III - Em regra, descabe a
imposição da multa, prevista no art. 1.021, § 4º, do Código de Processo Civil de 2015, em razão
do mero improvimento do Agravo Interno em votação unânime, sendo necessária a configuração
da manifesta inadmissibilidade ou improcedência do recurso a autorizar sua aplicação, o que não
ocorreu no caso. IV - Agravo Interno improvido. (AgInt no REsp 1833891/RS, Rel. Ministra
REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 10/02/2020, DJe 12/02/2020)
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento.
É o voto.
E M E N T A
AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÕES
PREVIDENCIÁRIAS PATRONAIS. CONTRIBUIÇÕES DEVIDAS A TERCEIROS. SALÁRIO E
GANHOS HABITUAIS DO TRABALHO. VERBAS INDENIZATÓRIAS. RECURSO IMPROVIDO.
- O texto constitucional confiou à União Federal amplo campo de incidência para exercício de sua
competência tributária no tocante à contribuição previdenciária patronal, compreendendo o
conjunto das verbas remuneratórias habituais (salários e demais rendimentos do trabalho), cuja
conformação normativa está essencialmente consolidada na Lei 8.212/1991 (notadamente em
seu art. 22). Todavia, não estão no campo constitucional de incidência e nem nas imposições
legais verbas com conteúdo indenizatório, em face das quais não pode incidir contribuição
previdenciária.
- Os valores pagos a título de horas extras, horas extras incorporadas e respectivos adicionais
integram a remuneração do empregado. Afinal, constituem contraprestação devida pelo
empregador, por imposição legal, em decorrência dos serviços prestados pelo obreiro em razão
do contrato de trabalho. Constituem, portanto, salário-de-contribuição, para fins de incidência da
exação prevista no art. 22, I, da Lei nº 8.212/1991.
- Agravo de instrumento improvido. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu,
por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
