Processo
AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO / SP
5005898-15.2022.4.03.0000
Relator(a)
Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES
Órgão Julgador
2ª Turma
Data do Julgamento
24/08/2022
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 27/08/2022
Ementa
E M E N T A
AGRAVO DE INSTRUMENTO. COVID-19. GESTANTES. AFASTAMENTO. LEI 14.151/21.
EXTENSÃO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DO SALÁRIO-MATERNIDADE SEM BASE
LEGAL PARA ALCANÇAR HIPÓTESES NÃO EXPRESSAMENTE PREVISTAS.
IMPOSSIBILIDADE.
1 - Tendo em consideração os fundamentos jurídicos no sentido da possibilidade de ocorrência
de AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE, DA PRECEDÊNCIA DA FONTE DE
CUSTEIO E DO EQUILÍBRIO FINANCEIRO E ATUARIAL, bem como ao PRINCÍPIO DA
SEPERAÇÃO DE PODERES, em virtude do acolhimento do pleito agravada para que um
benefício previdenciário (salário-maternidade) seja estendido, sem base legal alguma, para
alcançar hipóteses não expressamente previstas, pelo Poder Judiciário, o qual não pode decidir
com base em valores jurídicos abstratos (LINDB, art. 20) como o Princípio da Solidariedade,
desconsiderando os efeitos práticos altamente deletérios para a Previdência Social de pretensões
como a da agravada, deve serprovido o agravo de instrumento.
2 - Agravo de instrumento provido, agravo legal prejudicado.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº5005898-15.2022.4.03.0000
RELATOR:Gab. 05 - DES. FED. COTRIM GUIMARÃES
AGRAVANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
AGRAVADO: TRAIL INFRAESTRUTURA LTDA.
Advogado do(a) AGRAVADO: LUIZ EDUARDO AMARAL DE MENDONCA - SP187146-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região2ª Turma
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº5005898-15.2022.4.03.0000
RELATOR:Gab. 05 - DES. FED. COTRIM GUIMARÃES
AGRAVANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
AGRAVADO: TRAIL INFRAESTRUTURA LTDA.
Advogado do(a) AGRAVADO: LUIZ EDUARDO AMARAL DE MENDONCA - SP187146-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Sr. Desembargador Federal COTRIM GUIMARÃES (Relator):Trata-se de agravo de
instrumento interposto pelaUnião, com origem em mandado de segurança impetrado para
garantir a dedução do valor dessa remuneração paga às gestantes afastadas impossibilitadas
de trabalharem pela via remota quando do recolhimento das contribuições sociais
previdenciárias, durante todo o período de emergência de saúde pública decorrente da Covid-
19.
O pedido de efeito suspensivo foi deferido.
Com contraminuta.
Interposto agravo legal, também com contraminuta.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região2ª Turma
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº5005898-15.2022.4.03.0000
RELATOR:Gab. 05 - DES. FED. COTRIM GUIMARÃES
AGRAVANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
AGRAVADO: TRAIL INFRAESTRUTURA LTDA.
Advogado do(a) AGRAVADO: LUIZ EDUARDO AMARAL DE MENDONCA - SP187146-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Sr. Desembargador Federal COTRIM GUIMARÃES (Relator):A decisão que deferiu o
pedido de efeito suspensivo foi proferida nos seguintes termos:
"O Exmo. Sr. Desembargador Federal COTRIM GUIMARÃES (Relator):Trata-se de agravo de
instrumento interposto pelaUnião, com origem em mandado de segurança impetrado para
garantir a dedução do valor dessa remuneração paga às gestantes afastadas impossibilitadas
de trabalharem pela via remota quando do recolhimento das contribuições sociais
previdenciárias, durante todo o período de emergência de saúde pública decorrente da Covid-
19. Requer atribuição de efeito suspensivo. É o relatório. Decido. Anoto, de início, que aprecio o
pedido de liminar deste feito em razão de ter sido designado para a apreciação de medidas
urgentes no CC 5000143-10.2022.4.03.0000, sem prejuízo de posterior declínio da competência
após apreciação da matéria pelo Órgão Especial desta Corte Regional Federal. O deferimento
do efeito suspensivo, na forma do art. 1.019, I, do CPC de 2015, está condicionado à
verificação de possível existência de lesão grave e irreparável ou de difícil reparação com a
manutenção da decisão agravada. Os argumentos alinhados nas razões do agravo são hábeis,
ao menos neste primeiro juízo de cognição provisória, a justificar a suspensão da decisão
recorrida. Tendo em consideração a relevância dos fundamentos jurídicos aduzidos pela
agravante,no sentido da ocorrência deAFRONTA AOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE, DA
PRECEDÊNCIA DA FONTE DE CUSTEIO E DO EQUILÍBRIO FINANCEIRO E ATUARIAL, bem
como ao PRINCÍPIO DA SEPERAÇÃO DE PODERES, em virtude do acolhimento do pleito
autora para que um benefício previdenciário seja estendido, sem base legal alguma,
paraalcançar hipóteses não expressamente previstas, pelo Poder Judiciário, o qual não pode
decidir com base em valores jurídicos abstratos (LINDB, art. 20) como o Princípio da
Solidariedade, desconsiderando os efeitos práticos altamente deletérios para a Previdência
Social de pretensões como a da Autora, deve ser concedido o efeito suspensivo pleiteado. Ante
o exposto, defiro o pedido de efeito suspensivo."
O juízo de origem deferiu o pedido de tutela de urgência com base nos seguintes fundamentos:
"D E C I S Ã O
Trata-se de ação de procedimento comum, ajuizada por TRAIL INFRAESTRUTURA EIRELI, em
face da UNIÃO FEDERAL, objetivando a concessão de tutela de urgência para: a) possibilitar à
autora enquadrar, como salário-maternidade, os valores pagos às empregadas gestantes
afastadas em razão da atual pandemia de Covid-19, nos termos da Lei nº 14.151/2021,
enquanto durar o afastamento; b) excluir os pagamentos feitos às gestantes afastadas da base
de cálculo das contribuições previdenciárias patronais e das contribuições destinadas a
terceiros. A impetrante foi intimada para comprovar o recolhimento das custas (id nº
171194846) e juntou aos autos emenda à inicial, na qual atribui à causa o valor de R$
48.886,31 (id nº 239817540). Na decisão id 239929608, foi concedido à parte autora o prazo de
quinze dias, sob pena de indeferimento da petição inicial (artigo 321 do Código de Processo
Civil), para: a) trazer a cópia de seu comprovante de inscrição no CNPJ; b) comprovar que as
empregadas relacionadas na petição inicial estão grávidas; c) esclarecer quais as funções
desempenhadas pelas ajudantes gerais, pela assistente administrativa e pela encarregada de
serviços, que não podem ser desenvolvidas por meio de trabalho a distância.A parte autora
juntou cópia do comprovante de inscrição no CNPJ; documentos comprobatórios de gravidez
das empregadas; documento com a descrição das funções desempenhadas pelas gestantes e,
ao final, esclareceu que a empregada Jussara Marques Fernandes, que exerce a função de
Assistente Administrativa, não se encontra impedida de exercer as suas atividades
remotamente (id 242523694). A parte autora narra queé uma empresa fornecedora de mão de
obra para prestação de serviços a terceiros, em áreas administrativas e operacionais, portanto,
a grande maioria de seus empregados são contratados especificamente para desempenhar
suas atividades nas dependências das empresas tomadoras. Descreve que assegura às
empregadas gestantes o direito à licença maternidade pelo prazo de cento e vinte dias, sem
prejuízo do emprego e do salário, percebido mediante o salário-maternidade, na forma do artigo
71 e seguintes da Lei nº 8.213/91. Relata que, em 13 de maio de 2021, foi publicada a Lei nº
14.151/2021 que dispõe acerca do afastamento da empregada gestante das atividades
presenciais, durante a pandemia de Covid-19, devendo trabalhar à distância, sem prejuízo de
sua remuneração. Afirma que a lei foi omissa com relação ao afastamento das empregadas
gestantes que não podem realizar suas atividades à distância e sobre o responsável pelo
pagamento da remuneração das empregadas afastadas. Argumenta que possui empregadas
gestantes que não podem exercer suas atividades à distância, estando obrigada a arcar com os
custos do salário-maternidade e da contratação de outro profissional para substituir as
trabalhadoras afastadas, acarretando um gasto excessivo para a empresa. Sustenta que o
artigo 392 da Consolidação das Leis do Trabalho determina que o empregador deve afastar as
empregadas gestantes e assegurar o emprego e o recebimento do salário-maternidade, cujo
valor poderá ser compensado com as contribuições previdenciárias devidas, na forma do artigo
72, parágrafo 1º, da Lei nº 8.213/91. Aduz que a Convenção nº 103 da Organização
Internacional do Trabalho estabelece que cabe ao Estado, jamais ao empregador, arcar com os
custos sociais da proteção à maternidade, evitado discriminações às mulheres e protegendo
sua inserção no mercado de trabalho. Alega que a Receita Federal do Brasil, na Solução de
Consulta – Cosit nº 287, reconheceu a possibilidade de compensação do salário-maternidade
antecipado em razão de atividade insalubre, mesmo sem a expressa previsão legal. Ao final,
requer a confirmação da tutela de urgência. A inicial veio acompanhada da procuração e de
documentos.É o relatório. Fundamento e decido. Recebo a petição id nº 242523683 como
emenda à inicial. O Código de Processo Civil, em seu artigo 300, prevê que a tutela de urgência
será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo
de dano ou risco ao resultado útil do processo. Ademais, a tutela de urgência de natureza
antecipatória não poderá ser concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da
decisão (art. 300, parágrafo 3º, do Código de Processo Civil). Assim determina o artigo 1º da Lei
nº 14.151/2021, que dispõe sobre o afastamento da empregada gestante das atividades de
trabalho presencial durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente
do novo coronavírus:“Art. 1º Durante a emergência de saúde pública de importância nacional
decorrente do novo coronavírus, a empregada gestante deverá permanecer afastada das
atividades de trabalho presencial, sem prejuízo de sua remuneração.Parágrafo único. A
empregada afastada nos termos do caput deste artigo ficará à disposição para exercer as
atividades em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de
trabalho a distância”. O artigo acima transcrito impõe o afastamento da empregada gestante de
suas atividades de trabalho presencial,sem prejuízo de sua remuneração, durante a atual
pandemia de Covid-19, ficando a empregada à disposição do empregador para exercício das
atividades em seu domicílio, por meio de trabalho a distância. No caso em análise, os
documentos juntados aos autos comprovam que as empregadas da empresa autora: Avanilce
Maria Nunes Costas, Luciana Laurentino Barros e Monica Rozilene (exercem função de
Varredora); Marie Floresie Gervais, Priscilayen Maria da Silva (exercem função de Ajudante
Geral), e Rafaela do Carmo Rodrigues (exerce função de Encarregada de Serviços Junior),
conforme atestam os documentos id 170224790, exercem funções, cujas atividades descritas
(id 242524264 e 242524269) somente podem ser desempenhadas presencialmente, sendo
impossível o exercício dessas atividades profissionais à distância, no domicílio das funcionárias.
Embora determine que o afastamento da empregada gestante de suas atividades presenciais
deve ocorrer sem prejuízo da remuneração, a Lei nº 14.151/2021 não definiu a quem compete o
pagamento da remuneração da trabalhadora gestante, cuja atividade profissional seja
incompatível com o trabalho a distância. A Constituição Federal previu os direitos sociais, com
as mesmas garantias dos direitos fundamentais, aos trabalhadores urbanos e rurais, visando à
melhoria de sua condição social, entre os quais a licença gestante, sem prejuízo do emprego e
do salário, com a duração de cento e vinte dias (art. 7º, XVIII, CF). Estabeleceu, ainda, a Lei
Maior especial proteção, assegurando o direito de todos à saúde, a proteção à maternidade, à
família e à sociedade, conforme artigos 196, 201, II, 226 e 227 da Constituição, cabendo
destacar, também, a previsão constitucional do dever do Estado de promover ações e políticas
sociais e econômicas para alcançar tais fins, especialmente, por meio do Sistema de
Seguridade Social. A Saúde, a Previdência Social e a Assistência Social foram eleitas pelo
Constituinte Originário como principais instrumentos de efetivação do Estado de Direito Social,
a fim de garantir bem-estar e justiça sociais, por meio da redução de desigualdades sociais e
regionais, objetivo fundamental do Estado Democrático de Direito, consoante prevê o artigo 3º,
inciso III, da Constituição. Ou seja, ao Estado compete a consecução do bem público, sendo
essa a justificativa da existência do Estado: a promoção do bem público. A justiça social
concretiza-se por meio do princípio constitucional da solidariedade, que, no âmbito da
Previdência Social, atua na promoção da dignidade da pessoa humana, de modo a atender,
equitativamente, as necessidades vitais de cada indivíduo. A solidariedade social pressupõe a
interdependência entre cada indivíduo com os demais membros da sociedade e com a própria
sociedade e caracteriza-se pela cooperação mútua, igualdade de oportunidades e consecução
do bem-estar comum. O princípio da solidariedade, na essência, fundamenta e garante o
cumprimento do dever coletivo da sociedade de financiar, direta ou indiretamente, a Seguridade
Social, possibilitando o acesso e o atendimento dos cidadãos aos benefícios da Seguridade
Social. Para tanto, e com base no princípio da solidariedade, todas as pessoas jurídicas são
contribuintes da Seguridade Social, conforme determinam os artigos 194 e 195, “caput” e inciso
I, da Constituição, havendo fundamentos e condições econômicas e financeiras suficientes,
para fazer frente à necessidade de custeio e cobertura de sinistros, inclusive de eventos não
previstos, no caso, decorrentes da crise emergencial causada pela Pandemia de Covid-19. A
propósito, segue o entendimento jurisprudencial, de interpretação e aplicação do princípio da
solidariedade. Confira-se:“TRIBUTÁRIO. ART. 195, I DA C.F. CSLL. SUJEIÇÃO PASSIVA.
PESSOA JURÍDICA SEM EMPREGADOS. LEGITIMIDADE. RECURSO NÃO PROVIDO. - O
Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que o termo "empregadores", contido no
art. 195, I, não pode ser interpretado estritamente, pois as contribuições para a seguridade
social assentam na solidariedade geral, conforme o caput do mencionado artigo. - Para uma
correta aplicação das normas constitucionais, deve-se interpretá-las em contraste com os
princípios que regem a tributação social. -As contribuições sociais devem ser financiadas por
todas as empresas empregadoras ou não, com o escopo de atender aos princípios da
universalidade, da equidade e da solidariedade social, ex vi dos artigos 194 e 195 da CF. -Ao
adotar a expressão "empregadores", a Carta Magna não pretendeu reduzir o alcance da
sujeição passiva somente àqueles que contratam mão-de-obra vinculada por relação de
emprego, eis que determinou a incidência de contribuição sobre fatos geradores e bases de
cálculo que não dependem da existência de contrato de emprego, tal como ocorre com o
faturamento, o lucro, a receita e os rendimentos pagos à pessoa física que preste serviço, ainda
que, sem vínculo empregatício. - Apelação não provida”.(TRF3 - Apelação Cível - ApCiv
0049166-16.2007.4.03.6182 - 4ª Turma, Intimação via sistema: 31/03/2021). O salário-
maternidade, que substitui a remuneração da empregada gestante, é garantia prevista no artigo
7º, inciso XVIII, da Constituição. Estabeleceu a Lei nº. 8.213/1991 que é devido o salário-
maternidade, nos seguintes termos:“Art. 71. O salário-maternidade é devido à segurada da
Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito)
dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições
previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade. (Redação dada pala Lei nº
10.710, de 2003)”. São requisitos para concessão do benefício de salário-maternidade, a
demonstração da maternidade e a comprovação da qualidade de segurada da Previdência,
estando a empregada-gestante afastada do trabalho, em razão da gravidez (art. 71-C, L.
8.213/91). No caso em tela, em que vigora determinação legal de que não haverá prejuízo dos
vencimentos para as empregadas gestantes, pelo afastamento das suas atividades
profissionais, em razão do risco à gravidez (art. 1º, L. 14.151/2021), não pode a empregadora
ser obrigada a arcar com tais encargos, na impossibilidade do exercício da profissão
ocasionada pela crise emergencial de saúde pública. Considerando o arcabouço legal e
infralegal que regulamenta o custeio, por toda a sociedade, dos benefícios previdenciários,
como corolário do princípio da solidariedade social, não é outra, a não ser a de benefício
previdenciário, a natureza dos valores devidos à empregada gestante, em substituição ao seu
salário, durante o período em que ficar afastada do trabalho, em razão do risco à gravidez.
Ressalte-se que, como bem exposto pela parte autora, e nos termos do artigo 4º, §8º, da
Convenção nº 103 da Organização Internacional do Trabalho Relativa ao Amparo à
Maternidade, incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro por meio do Decreto nº
10.088/2019, “Em hipótese alguma, deve o empregador ser tido como pessoalmente
responsável pelo custo das prestações devidas às mulheres que ele emprega”. Deveras, ao
imputar-se aos empregadores o custeio de tais encargos, cria-se dificuldade de emprego,
aumentam-se as dispensas e reduz-se oportunidades empregatícias para mulheres, no
mercado de trabalho já tão escasso. Assim, os valores correspondentes ao salário-maternidade
pago pela empresa autora às empregadas gestantes afastadas de suas atividades presenciais,
em razão da atual pandemia de Covid-19, devem ser compensados, nos termos do artigo 72,
§1º, da Lei nº 8.213/91, abaixo transcrito:“Art. 72. O salário-maternidade para a segurada
empregada ou trabalhadora avulsa consistirá numa renda mensal igual a sua remuneração
integral.§ 1º Cabe à empresa pagar o salário-maternidade devido à respectiva empregada
gestante, efetivando-se a compensação, observado o disposto no art. 248 da Constituição
Federal, quando do recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e
demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste
serviço”. Nesse ponto, relevante transcrever o voto do e. ministro Mauro Campbell Marques, no
julgamento do REsp 1.309.251/RS (STJ, Segunda Turma, julgado em 21/05/2013, DJe
28/05/2013) que, “mutatis mutandis”, aplica-se na situação destes autos:“Em uma relação de
emprego sob a normalidade jurídica, a responsabilidade pelo pagamento das prestações
relativas ao benefício salário-maternidade competiria ao empregador.Todavia, a recorrida, sob a
condição de gestante, foi demitida do emprego sem justa-causa e somente obteve o
reconhecimento da relação empregatícia, por força de sentença trabalhista, pela qual foi
indenizada.Com efeito, não houve desvinculação previdenciária. A legislação previdenciária
garante a manutenção da qualidade de segurado, independentemente de contribuições, àquele
que deixar de exercer atividade remunerada pelo período mínimo de doze meses.( ...
)Acrescente-se orientação jurisprudencial de que a exação referente à maternidade,
originariamente, cabia ao empregador, circunstância que revelava seu caráter salarial,
constituindo obrigação trabalhista.Posteriormente, assumiu seu ônus a Previdência Social, com
a edição da Lei n. 6.136/1974, seguindo tendência mundial, por sugestão da OIT, alçando
referido salário-maternidade a categoria de prestação previdenciária. Assim, referido benefício é
custeado pelos cofres da Autarquia previdenciária. ( ... ) O ônus pelo pagamento do salário-
maternidade recai sobre a Previdência Social, embora o recolhimento da contribuição
previdenciária deva ser efetuado pelo empregador. A Autarquia é responsável pelo pagamento
do salário-maternidade e ainda que referido pagamento seja feito pelo empregador, sua
compensação é efetuada de forma integral quando do recolhimento das contribuições
previdenciárias. Em outra oportunidade, essa premissa foi reforçada quando do julgamento do
Recurso Especial 237.202/CE, em que se asseverou “in verbis”: por força da auto-aplicabilidade
do art. 7º, XVIII, da Constituição Federal de 1988, o empregador deve ser ressarcido
integralmente, pela Previdência Social, do pagamento efetuado à empregada gestante durante
os 120 dias de licença. ( ... ) Outrossim, merece menção o Recurso Especial 1.244.621/RJ, de
Relatoria da Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 27/4/2012, em que a Sexta Turma, ao
interpretar a legislação referente ao salário-maternidade, consignou que a Lei 10.710/2003 ao
alterar o art. 72 da sistemática do pagamento do benefício em questão pelo empregador, para
facilitar e agilizar o pagamento, não alterando a natureza do benefício previdenciário, não
constituindo óbice a que o pagamento seja feito diretamente pelo INSS, no caso das seguradas
não empregadas. É certo que, de acordo com o art. 72, § 2º, da Lei 8.213/1991, na redação
dada pela Lei 10.710/2003, cabe à empresa pagar o salário-maternidade devido à respectiva
empregada gestante, efetivando-se a compensação, observado o disposto no art. 248 da
Constituição Federal de 1988, quando do recolhimento das contribuições incidentes sobre a
folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados a qualquer título, à pessoa física
que lhe preste serviço. ( ... ) Em verdade, merece ser mantida a interpretação dada ao caso
pelas instâncias ordinárias. O fato de ser atribuição da empresa pagar o salário-maternidade no
caso da segurada empregada não afasta a natureza de benefício previdenciário da prestação
em discussão. A responsabilidade final pelo pagamento do benefício é do INSS, na medida que
a empresa tem direito a efetuar compensação com as contribuições incidentes sobre a folha de
salários e demais rendimentos. Não há razão para eximir o INSS de pagar o que, em última
análise, é de sua responsabilidade. A segurada, ora recorrida, não pode ser penalizada com a
negativa do benefício previdenciário, que lhe é devido pelo fato de ter sido indevidamente
dispensada do trabalho, quando gestante. Eventuais pendências de ordem trabalhista ou
eventual necessidade de acerto entre empresa e o INSS a título tributário não constituem óbice
ao reconhecimento do direito da segurada”. No caso destes autos, é imperiosa a conclusão no
sentido de que a pessoa jurídica autora deve pagar a remuneração prevista no contrato de
trabalho em vigor, diretamente às suas empregadas gestantes, assumindo tais pagamentos,
extraordinariamente, a natureza de salário-maternidade, cabendo ao réu-INSS a
responsabilidade final pelos pagamentos, por meio da compensação com as contribuições
incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos. Ressalte-se, consoante o
entendimento jurisprudencial supratranscrito, que, ao efetuar o pagamento do benefício, o
empregador atua, tão-somente, como facilitador da obrigação devida pelo INSS, a quem
incumbe suportar o encargo previdenciário. Por tais fundamentos, e considerando que a Lei nº
14.151/2021 não estabeleceu a efetiva responsabilidade da empresa pelo pagamento dos
salários no período do afastamento das empregadas gestantes, impossibilitadas de trabalhar à
distância pela própria natureza das suas atividades, entendo que não é incompatível com o
ordenamento jurídico vigente o pagamento do salário-maternidade, durante o período de
afastamento, em razão do risco para a gravidez, ocasionado pela Pandemia de Covid-19. Os
documentos juntados aos autos comprovam as funções desempenhadas pelas empregadas
gestantes: Avanilce Maria Nunes Costas, Luciana Laurentino Barros e Monica Rozilene
(Varredoras); Marie Floresie Gervais, Priscilayen Maria da Silva (ajudantes gerais) e Rafaela do
Carmo Rodrigues (encarregada de serviços Junior), as quais não podem ser realizadas por
meio de trabalho à distância, razão pela qual a tutela de urgência deve restringir-se tão somente
a essas funcionárias. Em face do exposto,defiro parcialmente a tutela de urgência, para: a)
afastar das suas atividades as empregadas gestantes: Avanilce Maria Nunes Costas, Luciana
Laurentino Barros e Monica Rozilene (varredoras); Marie Floresie Gervais, Priscilayen Maria da
Silva (ajudantes gerais) e Rafaela do Carmo Rodrigues (encarregada de serviços junior), em
razão da impossibilidade de realização do trabalho a distância; b) determinar o pagamento do
salário-maternidade para as empregadas gestantes afastadas, durante todo o período de
emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus; c)
possibilitar a compensação dos valores correspondentes ao salário-maternidade pago pela
empresa autora às mencionadas empregadas gestantes, afastadas de suas atividades
presenciais, em razão da atual pandemia de Covid-19, nos termos do artigo 72, parágrafo 1º, da
Lei nº 8.213/91."
Dessa forma, não vejo motivos para alterar o posicionamento adotado.
Ante o exposto, voto por dar provimento ao agravo de instrumento, prejudicado o agravo legal.
É o voto.
E M E N T A
AGRAVO DE INSTRUMENTO. COVID-19. GESTANTES. AFASTAMENTO. LEI 14.151/21.
EXTENSÃO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DO SALÁRIO-MATERNIDADE SEM BASE
LEGAL PARA ALCANÇAR HIPÓTESES NÃO EXPRESSAMENTE PREVISTAS.
IMPOSSIBILIDADE.
1 - Tendo em consideração os fundamentos jurídicos no sentido da possibilidade de ocorrência
de AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE, DA PRECEDÊNCIA DA FONTE DE
CUSTEIO E DO EQUILÍBRIO FINANCEIRO E ATUARIAL, bem como ao PRINCÍPIO DA
SEPERAÇÃO DE PODERES, em virtude do acolhimento do pleito agravada para que um
benefício previdenciário (salário-maternidade) seja estendido, sem base legal alguma, para
alcançar hipóteses não expressamente previstas, pelo Poder Judiciário, o qual não pode decidir
com base em valores jurídicos abstratos (LINDB, art. 20) como o Princípio da Solidariedade,
desconsiderando os efeitos práticos altamente deletérios para a Previdência Social de
pretensões como a da agravada, deve serprovido o agravo de instrumento.
2 - Agravo de instrumento provido, agravo legal prejudicado. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma
decidiu, por unanimidade, dar provimento ao agravo de instrumento, prejudicado o agravo legal,
nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
