
3ª Turma
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 0015400-78.2013.4.03.0000
RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR
AGRAVANTE: IRENE CORTINA
Advogado do(a) AGRAVANTE: MARIANA CORTINA PIRES REGADO - SP180395
AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, J PIRES REVESTIMENTO E POLIMENTO DE CONCRETO LTDA - ME, JOSE PIRES
OUTROS PARTICIPANTES:
3ª Turma
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 0015400-78.2013.4.03.0000
RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR
AGRAVANTE: IRENE CORTINA
Advogado do(a) AGRAVANTE: MARIANA CORTINA PIRES REGADO - SP180395
AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, J PIRES REVESTIMENTO E POLIMENTO DE CONCRETO LTDA - ME, JOSE PIRES
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de agravo de instrumento interposto em face de decisão (fl. 260) que deferiu o desbloqueio de apenas R$ 3.916,20, tendo em vista que o caráter alimentar da aposentadoria, ligado à sua impenhorabilidade, restringe-se ao seu valor mensal e não ao valor acumulado, em sede de execução fiscal.
Nas razões recursais, alegou a agravante IRENE CORTINA que a penhora eletrônica de ativos financeiros, via BACENJUD, bloqueou a totalidade de R$ 22.321,87, existentes na conta bancária nº 00.033805-2, agência 6807-1, Banco do Brasil S/A.
Aduziu que, embora sócia da pessoa jurídica executada, tal conta bancária é conta salário, ou seja, destina-se para o recebimento de seus vencimentos. Afirmou que iniciou o processo de pedido de aposentadoria em 3/7/2012 e como tal processo é lento, apenas em 7/5/2013 foi concedida. Ressaltou que, dessa forma, a concessão se deu desde a data do requerimento (3/7/2012).
Esclareceu que, em 31/5/2013, foi depositada em sua conta bancária a quantia de R$ 37.122,73, referente à aposentadoria concedida desde 3/7/2012, de forma retroativa. Destacou que o bloqueio ocorreu em 4/6/2013, ou seja, quatro dias após o depósito do benefício, de modo que não teve tempo hábil para usufruí-lo.
Argumentou que, conforme art. 649, IV, CPC/73, é impenhorável a aposentadoria.
Requereu a atribuição de efeito suspensivo ao agravo, para que a agravante não sofra maiores restrições de bens e, ao final, seu provimento, para que seja determinado o desbloqueio de todo o valor bloqueado na conta mencionada e que o montante penhorado seja liberado/levantado pela recorrente.
Deferiu-se a suspensividade postulada, para que a recorrente não sofresse maiores restrições de bens.
A agravada apresentou contraminuta, alegando que conforme movimentação parcial da conta-corrente acostada aos autos, houve o bloqueio judicial que atingiu somente a parcialidade dos valores encontrados em conta-corrente, sobejando ainda um saldo residual, cujo total era R$ 13.660,21 e, assim, não há qualquer comprovação de que o bloqueio esteja a prejudicar o sustento da agravada, pelo contrário, consubstanciado está a possibilidade de arcar com o ônus financeiro aplicado.
Sustentou que o saldo da conta-corrente advém de pagamentos já realizados e incorporados ao patrimônio em geral da executada, já que os valores recebidos a título de salário ou benefício previdenciário, no mês imediato, perdem tal natureza jurídica alimentar, salarial e impenhorável, passando a integra o patrimônio do executado enquanto ativo financeiro.
Argumentou que entendimento contrário seria a eternização do instituto da impenhorabilidade.
Quanto às demais questões (prescrição e responsabilidade tributária), deixou a recorrida de se pronunciar sobre elas, tendo em vista que não foram objeto de análise pelo Juízo de origem.
Em sessão de julgamento de 25/10/2013, o agravo foi provido, “tendo em vista o reconhecimento da prescrição intercorrente para o redirecionamento e a conseqüente exclusão dos então recorrentes, entre eles a ora agravante”, nos autos do Agravo de Instrumento 0015401-63.2013.4.03.0000, julgado na mesma oportunidade.
A agravada interpôs recurso especial.
A Vice-Presidência desta Corte determinou o sobrestamento do feito em razão do Tema 444/STJ, discutido nos autos do RESP 1.201.993/SP e, após o julgamento do mencionado paradigma qualificado, determinou a restituição dos autos à Turma julgadora, para verificação da pertinência de proceder-se a um juízo positivo de retratação.
É o relatório.
3ª Turma
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 0015400-78.2013.4.03.0000
RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR
AGRAVANTE: IRENE CORTINA
Advogado do(a) AGRAVANTE: MARIANA CORTINA PIRES REGADO - SP180395
AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, J PIRES REVESTIMENTO E POLIMENTO DE CONCRETO LTDA - ME, JOSE PIRES
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Trata-se de agravo de instrumento interposto em face de decisão que deferiu o desbloqueio apenas parcial dos valores atingidos pela penhora eletrônica.
No primeiro julgamento, o agravo de instrumento foi provido, para determinar o desbloqueio do valor remanescente, tendo em vista que reconhecida a prescrição intercorrente para o redirecionamento da execução fiscal nos autos do AI 0015401-63.2013.4.03.0000. Isto é, de fato, a questão da prescrição intercorrente não foi apreciada nestes autos recursais, mas naqueles.
Sendo assim e sobrevindo juízo de retratação positivo no AI 0015401-63.2013.4.03.0000, de modo a afastar o reconhecimento da prescrição intercorrente para o redirecionamento da execução fiscal, entendo pelo cabimento da apreciação do mérito deste recurso, concernente à alegada impenhorabilidade do valor bloqueado.
Quanto à impenhorabilidade alegada, o art. 833, CPC estabelece no inciso IV (art. 649, IV, CPC/73) como impenhoráveis “os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal” e no inciso X, “a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos”.
Destarte, a lei processual estabelece como impenhorável a quantia recebida como provento de aposentadoria.
Nesse sentido:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. PENHORA ON-LINE. DESBLOQUEIO DE VALORES RELATIVOS À APOSENTADORIA. IMPENHORABILIDADE ABSOLUTA. 1. Para a jurisprudência desta Corte Superior, à luz do art. 649, IV, do CPC, são impenhoráveis os vencimentos ou proventos de aposentadoria do executado, ainda quando depositados em conta-corrente bancária. 2. No julgamento do REsp 1.184.765/PA, pela Primeira Seção, sob o rito do art. 543-C do CPC, embora não fosse a tese principal do repetitivo, ficou assinalado no voto do relator, Min. Luiz Fux, que "a penhora eletrônica dos valores depositados nas contas bancárias não pode descurar-se da norma inserta no artigo 649, IV, do CPC (com a redação dada pela Lei n. 11.382/2006), segundo a qual são absolutamente impenhoráveis 'os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios; as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal'". 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ, AgRg no AREsp 765106 / RJ, Des. Fed. Convocada DIVA MALERBI , Segunda Turma, DJe 03/12/2015). (grifos)
Dito isto, compulsando os autos, verifica-se que, em 04/06/2013, houve o bloqueio nas contas de titularidade da agravante no total de R$ 22.341,92, sendo R$ 22.321,87, perante o Banco do Brasil , e R$ 20,05, perante o Banco Bradesco (Id 258250761, fl. 43).
Consta também que a aposentadoria foi concedida à agravante a partir de 3/7/2012, mas os proventos somente foram pagos, de forma acumulada, em 31/05/2013, conforme Carta de Concessão acostada (Id 258250761, fls. 55/56).
Neste contexto, o bloqueio ocorrido em 4/6/2013 abarcou o benefício previdenciário, como se denota do extrato bancário colacionado (Id 258250761, fl. 54).
Outrossim, o montante recebido a esse título ( aposentadoria ) deve ser respeitado, permitindo a livre disposição pela favorecida, ainda que a executada tenha mantido em depósito seu benefício, que persiste apresentando natureza alimentar .
Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO LEGAL. ARTIGO 557, § 1º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. DES BLOQUEIO DE CONSTRIÇÃO ELETRÔNICA VIA BACENJUD; VALORES ABSOLUTAMENTE IMPENHORÁVEIS ADVINDOS DE SALÁRIO. AGRAVO LEGAL IMPROVIDO. 1. Da prova documental existente nos autos não resta a menor dúvida de que foram bloqueados numerários correspondentes à contraprestação laborativa. E tais verbas, na sua inteireza, são absolutamente impenhoráveis porque a lei é clara e insofismável a respeito, não estabelecendo quaisquer graduações ou percentuais que permitam a incidência de penhora. 2. Cumpre ressaltar que no caso concreto a quantia eventualmente não consumida com as necessidades básicas não se torna "reserva de capital" passível de penhora, remanescendo o original caráter alimentar .3. Ademais, não há evidência que foram indisponibilizadas aplicações financeiras, receitas suntuárias ou "ganhos acumulados" de que o beneficiário pode se valer depois de decotar o necessário a sua manutenção; o que se vê é que o saldo resumia-se à verba salarial (proventos). Ora, tais verbas têm eminente caráter de subsistência, destinam-se a alimentar quem os recebe e seus dependentes. Por isso são impenhoráveis na forma do artigo649, IV do Código de Processo Civil. 4. Os numerários bloqueados não têm a feição de rendimentos em mercado financeiro ou de resultado de poupança; por isso sobre eles a impenhorabilidade é regra absoluta (STJ, AgRg no REsp 1154989/MS, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/10/2012, DJe 09/10/2012). 5. Nesse cenário, vale o alerta enunciado pelo Superior Tribunal de Justiça: "A impenhorabilidade absoluta de bens é norma cogente que contém princípio de ordem pública, cabendo ao magistrado, ex offício, resguardar o comando do art. 649 do CPC, razão pela qual não há vício no decisum que acolheu pedido formulado pela parte, ainda que sem a presença de advogado, para que fosse determinado o desbloqueio da conta salário então penhorada. Precedentes" "REsp 1189848/DF, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/10/2010, DJe 05/11/2010). 6. Recurso improvido. (TRF 3ª Região, AI 00386869020104030000, Relator Johonsom Di Salvo, Sexta Turma, e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/08/2015). (grifos)
Destarte , forçoso reconhecer a impenhorabilidade do valor atingido.
Ante o exposto, em juízo de retratação negativo, mantenho o julgado anterior, para dar provimento ao agravo de instrumento.
É o voto.
DECLARAÇÃO DE VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO:
Discute-se o bloqueio de ativos financeiros referentes a proventos de aposentadoria, bem como de valores em montante inferior a 40 (quarenta) salários mínimos, por força do artigo 833, X, do CPC.
Acompanho o i. Relator no que tange ao bloqueio de valores dos proventos de aposentadoria recebidos no mês, divergindo no que se refere a outros valores constritos.
É certo que o art. 833, IV, e §2º, do CPC, dispõe sobre a impenhorabilidade “dos vencimentos, dos subsídios, dos soldos, dos salários, as remunerações, dos proventos de aposentadoria, das pensões, dos pecúlios e dos montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal” (grifos nossos), em montantes inferiores a 50 (cinquenta) salários mínimos, salvo para pagamento de pensão alimentícia.
Por seu turno, o art. 833, X, do CPC, dispõe acerca da impenhorabilidade da “quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos”, a qual se estende também para valores depositados em conta corrente, em fundos de investimento ou guardados em papel-moeda, conforme orientação jurisprudencial (vide a esse respeito: STJ, AgInt no REsp n. 1.976.153/DF, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 2/5/2022, DJe de 6/5/2022).
Entretanto, referido instituto não se reveste de caráter absoluto, consoante entendimento que vem sendo construído pelo Superior Tribunal de Justiça ao longo do tempo. Confira-se os seguintes precedentes:
“AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. IMPENHORABILIDADE DOS VENCIMENTOS. REGRA GERAL. POSSIBILIDADE DE FLEXIBILIZAÇÃO A DEPENDER DA HIPÓTESE CONCRETA. PRESERVAÇÃO DA DIGNIDADE DO DEVEDOR E DE SUA FAMÍLIA. REEXAME DE FATOS E PROVAS. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. DISPOSITIVO. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO.
1. Ação de execução de título extrajudicial.
2. A jurisprudência desta Corte se firmou no sentido de que a regra geral de impenhorabilidade de salários e demais vencimentos (art. 649, IV, do CPC/73, correspondente ao art. 833, IV, do CPC/15) pode ser excepcionada quando for preservado percentual capaz de dar guarida à dignidade do devedor e de sua família (EREsp 1.582.475/MG, Corte Especial, DJe 16/10/2018).
3. O reexame de fatos e provas em recurso especial é inadmissível.
4. A falta de indicação do dispositivo legal sobre o qual recai a divergência jurisprudencial atrai o óbice da Súmula 284 do STF.
Ademais, Ademais, a incidência da Súmula 7 desta Corte acerca do tema que se supõe divergente impede o conhecimento da insurgência veiculada pela alínea "c" do art. 105, III, da CF.
5. Agravo interno não provido”.
(AgInt no REsp nº 2049880/SE, Rel. Ministra Nancy Andrighi, 3ª Turma, DJe 19/04/2023).
“RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. NATUREZA ALIMENTAR DA VERBA. IMPENHORABILIDADE (CPC, ART. 649, IV). MITIGAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIAS ESPECIAIS. ELEVADA SOMA. POSSIBILIDADE DE AFETAÇÃO DE PARCELA MENOR DE MONTANTE MAIOR. DIREITO DO CREDOR. RECURSO NÃO PROVIDO.
1. É firme nesta Corte Superior o entendimento que reconhece a natureza alimentar dos honorários advocatícios e a impossibilidade de penhora sobre verba alimentar, em face do disposto no art. 649, IV, do CPC.
2. Contudo, a garantia de impenhorabilidade assegurada na regra processual referida não deve ser interpretada de forma gramatical e abstrata, podendo ter aplicação mitigada em certas circunstâncias, como sucede com crédito de natureza alimentar de elevada soma, que permite antever-se que o próprio titular da verba pecuniária destinará parte dela para o atendimento de gastos supérfluos, e não, exclusivamente, para o suporte de necessidades fundamentais.
3. Não viola a garantia assegurada ao titular de verba de natureza alimentar a afetação de parcela menor de montante maior, desde que o percentual afetado se mostre insuscetível de comprometer o sustento do favorecido e de sua família e que a afetação vise à satisfação de legítimo crédito de terceiro, representado por título executivo. 4. Sopesando criteriosamente as circunstâncias de cada caso concreto, poderá o julgador admitir, excepcionalmente, a penhora de parte menor da verba alimentar maior sem agredir a garantia desta em seu núcleo essencial.
5. Com isso, se poderá evitar que o devedor contumaz siga frustrando injustamente o legítimo anseio de seu credor, valendo-se de argumento meramente formal, desprovido de mínima racionalidade prática.
6. Caso se entenda que o caráter alimentar da verba pecuniária recebe garantia legal absoluta e intransponível, os titulares desses valores, num primeiro momento, poderão experimentar uma sensação vantajosa e até auspiciosa para seus interesses. Porém, é fácil prever que não se terá de aguardar muito tempo para perceber os reveses que tal irrazoabilidade irá produzir nas relações jurídicas dos supostos beneficiados, pois perderão crédito no mercado, passando a ser tratados como pessoas inidôneas para os negócios jurídicos, na medida em que seus ganhos constituirão coisa fora do comércio, que não garante, minimamente, os credores.
7. Recurso especial a que se nega provimento”
(REsp 1356404/DF, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 04/06/2013, DJe 23/08/2013).
Por derradeiro, referido entendimento fora, recentemente, pacificado pela Corte Especial do mencionado Tribunal Superior, em decisão assim ementada:
“PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. PENHORA. PERCENTUAL DE VERBA SALARIAL. IMPENHORABILIDADE (ART. 833, IV e § 2º, CPC/2015). RELATIVIZAÇÃO. POSSIBILIDADE. CARÁTER EXCEPCIONAL.
1. O CPC de 2015 trata a impenhorabilidade como relativa, podendo ser mitigada à luz de um julgamento principio lógico, mediante a ponderação dos princípios da menor onerosidade para o devedor e da efetividade da execução para o credor, ambos informados pela dignidade da pessoa humana.
2. Admite-se a relativização da regra da impenhorabilidade das verbas de natureza salarial, independentemente da natureza da dívida a ser paga e do valor recebido pelo devedor, condicionada, apenas, a que a medida constritiva não comprometa a subsistência digna do devedor e de sua família.
3. Essa relativização reveste-se de caráter excepcional e só deve ser feita quando restarem inviabilizados outros meios executórios que possam garantir a efetividade da execução e desde que avaliado concretamente o impacto da constrição na subsistência digna do devedor e de seus familiares.
4. Ao permitir, como regra geral, a mitigação da impenhorabilidade quando o devedor receber valores que excedam a 50 salários mínimos, o § 2º do art. 833 do CPC não proíbe que haja ponderação da regra nas hipóteses de não excederem (EDcl nos EREsp n. 1.518.169/DF, relatora Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, DJe de 24.5.2019).
5. Embargos de divergência conhecidos e providos.
(EREsp n. 1.874.222/DF, relator Ministro João Otávio de Noronha, Corte Especial, julgado em 19/4/2023, DJe de 24/5/2023)”. (grifos nossos)
Alie-se como robusto elemento de convicção o fato de que parcela significativa dos brasileiros - cerca de 90% (noventa por cento) da população economicamente ativa - possui rendimentos de até R$3.000,00 (três mil reais) (Disponível em https://vocesa.abril.com.br/dinheiro/90-da-populacao-brasileira-ganha-menos-de-r-3-mil-por-mes-veja-o-grafico, acesso em 21.11.2023), razão pela qual o entendimento esposado pelo C. STJ viabilizou, sem prejuízo do sustento próprio do devedor, a efetiva satisfação dos compromissos assumidos voluntariamente ou resultantes de obrigações - tributárias ou não - impostas ao administrado.
No caso concreto, em execução de crédito de natureza tributária (iniciada em face da pessoa jurídica e, posteriormente, redirecionada para os sócios administradores) no valor, em 1999, de R$ 11.965,66, foram bloqueados ativos da executada depositados em contas, corrente e poupança, no total de R$ 22.341,92, em junho/2013.
No que tange aos valores atinentes aos proventos de aposentadoria do mês (R$ 3.916,20), conforme supramencionado, acompanho o i. Relator quanto à sua impenhorabilidade.
Os demais ativos bloqueados – ainda que decorrentes do pagamento, em atraso, de proventos de aposentadoria (PAB) - devem, ao menos em parte, garantir o crédito executado.
Tomando por base a idade da parte executada (nascida em 16.06.1946), sua profissão (enfermeira), o fato de que recebe mensalmente benefício previdenciário, bem como os documentos juntados aos autos, que não demonstram que a autora esteja em tratamento de determinada moléstia e que necessite de valores superiores a seus proventos para sua própria subsistência, entendo que a manutenção do bloqueio equivalente a 70% (setenta por cento) é medida que compatibiliza a dignidade humana e o dever de adimplemento de seus débitos.
Ante o exposto, pedindo vênias para divergir de Sua Excelência, dou parcial provimento ao agravo de instrumento, a fim de determinar o desbloqueio da integralidade dos ativos relativos aos proventos de aposentadoria recebidos no mês de junho de 2013 e, quanto ao restante dos ativos, determinar o desbloqueio do equivalente a 30% (trinta por cento), prosseguindo-se a execução com a garantia no percentual restante de 70% (setenta por cento).
É como voto.
E M E N T A
AGRAVO DE INSTRUMENTO – JUÍZO DE RETRATAÇÃO - EXECUÇÃO FISCAL - PENHORA ELETRÔNICA DE ATIVOS FINANCEIROS - BACENJUD - DESBLOQUEIO – AFASTADO O RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE PARA O REDIRECIONAMENTO – IMPENHORABILIDADE – ART. 833, IV, CPC – APOSENTADORIA.
1.Trata-se de agravo de instrumento interposto em face de decisão que deferiu o desbloqueio apenas parcial dos valores atingidos pela penhora eletrônica.
2.No primeiro julgamento, o agravo de instrumento foi provido, para determinar o desbloqueio do valor remanescente, tendo em vista que reconhecida a prescrição intercorrente para o redirecionamento da execução fiscal nos autos do AI 0015401-63.2013.4.03.0000. Isto é, de fato, a questão da prescrição intercorrente não foi apreciada nestes autos recursais, mas naqueles. Sendo assim e sobrevindo juízo de retratação positivo no AI 0015401-63.2013.4.03.0000, de modo a afastar o reconhecimento da prescrição intercorrente para o redirecionamento da execução fiscal, tem cabimento da apreciação do mérito deste recurso, concernente à alegada impenhorabilidade do valor bloqueado.
3.Quanto à impenhorabilidade alegada, o art. 833, CPC estabelece no inciso IV (art. 649, IV, CPC/73) como impenhoráveis “os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal” e no inciso X, “a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos”.
4.A aposentadoria foi concedida à agravante a partir de 3/7/2012, mas os proventos somente foram pagos, de forma acumulada, em 31/05/2013, conforme Carta de Concessão acostada (Id 258250761, fls. 55/56). Neste contexto, o bloqueio ocorrido em 4/6/2013 abarcou o benefício previdenciário, como se denota do extrato bancário colacionado (Id 258250761, fl. 54).
5.O montante recebido a esse título ( aposentadoria ) deve ser respeitado, permitindo a livre disposição pela favorecida, ainda que a executada tenha mantido em depósito seu benefício, que persiste apresentando natureza alimentar . Reconhecida a impenhorabilidade do valor atingido.
6.Juízo de retratação negativo, para manter o provimento ao agravo de instrumento.
