
9ª Turma
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5012645-10.2024.4.03.0000
RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES
AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) AGRAVANTE: MARIA CAMILA COSTA DE PAIVA - SP252435-N
AGRAVADO: PEDRO JUVENTINO CASSIMIRO
Advogado do(a) AGRAVADO: MARCELO DE SOUZA ALMEIDA - SP478730-A
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5012645-10.2024.4.03.0000
RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES
AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) AGRAVANTE: MARIA CAMILA COSTA DE PAIVA - SP252435-N
AGRAVADO: PEDRO JUVENTINO CASSIMIRO
Advogado do(a) AGRAVADO: MARCELO DE SOUZA ALMEIDA - SP478730-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Cuida-se de agravo de instrumento interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em face de decisão proferida no processo nº 5006109-90.2023.4.03.6119, ajuizado por Pedro Juventino Cassimiro, que, em julgamento parcial de mérito realizado com base no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, reconheceu como especial o período laboral de 03/05/2004 a 26/07/2013, com prosseguimento do feito quanto à data de reafirmação da DER, com vistas à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
Aduz a autarquia previdenciária, em síntese, o descabimento da medida, ao fundamento de não ter ficado comprovada a habitualidade e permanência da exposição do segurado a níveis excessivos de ruído. Insurge-se quanto aos critérios metodológicos de avaliação do aludido agente nocivo, remarcando a impossibilidade de se reconhecer especial período posterior à emissão do PPP.
Postula a concessão de efeito suspensivo e, ao final, o provimento do recurso.
Foi indeferido o pedido de efeito suspensivo ao recurso (id. nº 293184608).
Sem contraminuta, os autos retornaram a este Gabinete.
É o relatório.
9ª Turma
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5012645-10.2024.4.03.0000
RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES
AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) AGRAVANTE: MARIA CAMILA COSTA DE PAIVA - SP252435-N
AGRAVADO: PEDRO JUVENTINO CASSIMIRO
Advogado do(a) AGRAVADO: MARCELO DE SOUZA ALMEIDA - SP478730-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O presente agravo de instrumento, interposto pelo INSS, objetiva reformar a decisão proferida no processo nº 5006109-90.2023.4.03.6119, que, em julgamento parcial de mérito, reconheceu como especial o período laboral de 03/05/2004 a 26/07/2013 exercido por Pedro Juventino Cassimiro, com prosseguimento do feito quanto à data de reafirmação da DER, com vistas à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
Do cabimento do agravo de instrumento.
O presente agravo de instrumento foi interposto contra decisão proferida em julgamento parcial de mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, segundo o qual "Haverá resolução de mérito quando o juiz: I - acolher ou rejeitar o pedido formulado na ação ou na reconvenção".
A medida encontra-se prevista no artigo 356Código de Processo Civil de 2015, que tem a seguinte redação:
"Art. 356. O juiz decidirá parcialmente o mérito quando um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles:
I - mostrar-se incontroverso;
II - estiver em condições de imediato julgamento, nos termos do art. 355.
§ 1º A decisão que julgar parcialmente o mérito poderá reconhecer a existência de obrigação líquida ou ilíquida.
§ 2º A parte poderá liquidar ou executar, desde logo, a obrigação reconhecida na decisão que julgar parcialmente o mérito, independentemente de caução, ainda que haja recurso contra essa interposto.
§ 3º Na hipótese do § 2º, se houver trânsito em julgado da decisão, a execução será definitiva.
§ 4º A liquidação e o cumprimento da decisão que julgar parcialmente o mérito poderão ser processados em autos suplementares, a requerimento da parte ou a critério do juiz.
§ 5º A decisão proferida com base neste artigo é impugnável por agravo de instrumento."
Verifica-se que a sistemática processual em vigor prevê o julgamento antecipado de parte do mérito da demanda, quando um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles mostrar-se incontroverso ou estiver em condições de imediato julgamento, por não necessitar de produção probatória. Prossegue-se o feito quanto aos demais pedidos, a serem resolvidos por sentença, que só então porá fim ao processo.
Inegável que o primeiro julgamento, que aprecia a parte incontroversa dos pedidos, tem natureza de decisão interlocutória, impugnável, portanto, por agravo de instrumento, cujo cabimento encontra previsão no artigo 356, § 5º, do Código de Processo Civil.
Assim, cabível o agravo de instrumento, nos termos dos artigos 356, § 5º, e 1.015, II, do diploma processual civil.
Da atividade especial.
Condições especiais de trabalho são aquelas às quais o segurado se acha sujeito, ao ficar exposto, no exercício do trabalho, a agentes químicos, físicos e biológicos, sós ou combinados, capazes de prejudicar a saúde ou a integridade física do obreiro.
Lado outro, agentes nocivos são aqueles, existentes no ambiente de trabalho, que podem provocar dano à saúde ou à integridade física do segurado, tendo em vista sua natureza, concentração, intensidade ou fator de exposição.
Com relação ao reconhecimento da atividade exercida em condições especiais – e sobre isso não há mais questionamento –, interessa a lei vigente à época em que prestada, em respeito ao direito adquirido do segurado.
Sob tal moldura, ressalte-se que, para o tempo de labor efetuado até 28/04/95, quando vigente a Lei nº 3.807/60 e suas alterações e, posteriormente, a Lei nº 8.213/91, em sua redação original, a simples prova, por qualquer meio em Direito admitido, de que a atividade profissional enquadra-se no rol dos Decretos nos 53.831/64 ou 83.080/79 (seja por agente nocivo, seja por categoria profissional) é suficiente para a caracterização da atividade como especial, exceto para ruído, frio e calor, sempre exigentes de aferição técnica.
Com a vigência da Lei nº 9.032/95, que deu nova redação ao § 3º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91, passou a ser necessária a comprovação da real exposição de forma habitual (não ocasional) e permanente (não intermitente) aos agentes nocivos à saúde ou integridade física do segurado, independentemente da profissão exercida. Exige-se, para tanto, a apresentação de formulário para todo e qualquer agente nocivo, o qual não precisa estar embasado, porém, em laudo técnico, ressalvadas as hipóteses de exposição a ruído, frio e calor (PET 9.194 – STJ; AREsp 2070641, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJe de 13/09/2023).
Desde 06/03/97, com a entrada em vigor do Decreto nº 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da Lei nº 8.213/91 pela MP nº 1596-14 (convertida na Lei nº 9.528/97), a comprovação da exposição às condições especiais passou a ser realizada mediante a apresentação de laudo técnico (AREsp nº 1.963.281, Ministro Francisco Falcão, DJe de 22/06/2023).
A partir de 01/01/2004, o único documento exigido para comprovação da exposição a agentes nocivos é o PPP, documento que substituiu o formulário anterior e o laudo técnico pericial (artigo 256, inciso IV, e artigo 272, § 1º, da Instrução Normativa INSS/PRES nº 45/2010).
Por outra via, não tem lugar limitação à conversão de tempo especial em comum, mesmo que posterior a 28/05/98, segundo o decidido no REsp nº 956.110/SP.
Mas com a entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 103/2019 ficou vedada a conversão em tempo de serviço comum do tempo especial, para fim de concessão de aposentadoria. É o que se extrai de seu artigo 25, §2°, a seguir copiado:
“Art. 25. Será assegurada a contagem de tempo de contribuição fictício no Regime Geral de Previdência Social decorrente de hipóteses descritas na legislação vigente até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional para fins de concessão de aposentadoria, observando-se, a partir da sua entrada em vigor, o disposto no § 14 do art. 201 da Constituição Federal.
(...)
§ 2º Será reconhecida a conversão de tempo especial em comum, na forma prevista na Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, ao segurado do Regime Geral de Previdência Social que comprovar tempo de efetivo exercício de atividade sujeita a condições especiais que efetivamente prejudiquem a saúde, cumprido até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, vedada a conversão para o tempo cumprido após esta data.
(...)”
Do ruído.
Sobre ruído, cabe considerar especial a atividade exposta permanentemente a ruído acima de 80 dB, consoante o anexo do Decreto nº 53.831/64 (item 1.1.6), para os períodos laborados até 05/03/1997, véspera da entrada em vigor do Decreto nº 2.172/1997. Este último diploma passou a exigir a exposição a nível superior a 90 dB, nos termos do seu anexo IV. E a partir de 19/11/2003, com a vigência do Decreto nº 4882/03, que alterou o anexo IV do Decreto nº 3.048/1999, o limite de exposição ao agente ruído foi diminuído para 85 dB.
Recapitulando: acima de 80 decibéis até 05/03/1997, superior a 90 decibéis de 06/03/1997 a 18/11/2003 e superior a 85 decibéis a partir de 19/11/2003, encontrando-se a questão pacificada no âmbito do E. STJ (Tema 694 daquela Corte).
No que se refere à utilização de EPI – equipamento de proteção individual –, há que se observar o decidido pelo E. STF no julgamento do ARE – Recurso Extraordinário com Agravo nº 664.335/SC, com repercussão geral reconhecida, à luz do qual o Plenário negou provimento ao recurso extraordinário, fixando duas relevantes teses, a saber:
“(...) o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial" e;
“(...) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual – EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria” (vide itens 10 e 14 da ementa do acórdão).
Vale acrescer ainda que, ao teor da Súmula nº 87 da TNU, “a eficácia do EPI não obsta o reconhecimento de atividade especial exercida antes de 03/12/1998, data de início da vigência da MP 1.729/98, convertida na Lei nº 9732/98”.
Não custa deixar remarcado, ainda neste capítulo, a desnecessidade de prévia fonte de custeio (para reconhecimento de tempo de trabalho especial) quando se tratar de benefício diretamente criado pela Constituição Federal, como no caso se dá (STF - ADI 352-6, Plenário, Rel. o Min. Sepúlveda Pertence, j, de 30/10/1997 e Tema 555/STF).
Do caso concreto.
Na hipótese vertente, analisada a prova carreada aos autos, sobre o período controverso, durante o qual o autor teria exercido atividade especial, tem-se o seguinte:
Período: de 03/05/2004 a 26/07/2013
Empresa: Rios Unidos Logística e Transporte de Aço
Funções/atividades: Operador de ponte rolante
Agente nocivo: Ruído
Prova: PPP (ID 295681013 - processo subjacente, págs. 1/3)
CONCLUSÃO: ESPECIALIDADE COMPROVADA
Conforme se extrai do PPP acostado aos autos, o autor, durante o desempenho de suas funções, ficou exposto a ruídos acima do limite de tolerância admitido à época do serviço: 85,96 dB (A).
A avaliação por dosimetria, na forma da NR-15 (Anexo I - limites de tolerância para ruído contínuo ou intermitente), é obtida por meio da composição das várias atividades desenvolvidas pelo trabalhador durante a jornada laboral, de modo que resta demonstrada a habitualidade e permanência. Não se apurou exposição do segurado a níveis variáveis de efeitos sonoros. Frise-se que a utilização de metodologia diversa da contida na NHO-01 da FUNDACENTRO não desnatura a especialidade do período. Importa é ter sido constatada a exposição a ruído superior ao limite considerado por meio de PPP, na forma do artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91. É do empregador e não do segurado empregado a obrigação de providenciar documento técnico que retrate as condições do ambiente de trabalho, sob a fiscalização dos órgãos públicos competentes, da autarquia previdenciária inclusive. Não faz sentido penalizar o segurado por irregularidade na metodologia de aferição do agente nocivo. Precedentes desta Corte: Ap – Apelação Cível - 2306086 0015578-27.2018.4.03.9999, Desembargadora Federal Inês Virgínia – 7ª Turma, e-DJF3 Judicial 1 Data: 7/12/2018; Ap – Apelação Cível - 3652270007103-66.2015.4.03.6126, Desembargador Federal Baptista Pereira – 10ª Turma, e-DJF3 Judicial 1 Data: 19/7/2017.
Admitida a especialidade pela exposição, de forma habitual e permanente, a ruídos acima do limite de tolerância, conforme código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79, código 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e código 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99.
Correto, portanto, o reconhecimento da especialidade do período de 03/05/2004 a 26/07/2013.
Descabida a alegação genérica da autarquia previdenciária quanto ao reconhecimento de período posterior à expedição do laudo. E isto porque o termo final reconhecido na decisão impugnada coincide com a data do PPP.
Isso posto, nego provimento ao agravo de instrumento.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. JULGAMENTO PARCIAL DE MÉRITO. TEMPO ESPECIAL. RUÍDO. CABIMENTO. RECURSO NÃO PROVIDO.
I - Cabível o agravo de instrumento contra decisão que julga parcialmente o mérito, nos termos dos artigos 356, § 5º, e 1.015, II, do Código de Processo Civil.
II - Condições especiais de trabalho são aquelas às quais o segurado se acha sujeito, ao ficar exposto, no exercício do trabalho, a agentes químicos, físicos e biológicos, sós ou combinados, capazes de prejudicar a saúde ou a integridade física do obreiro.
III - Ao reconhecimento da atividade exercida em condições especiais, interessa a lei vigente à época em que prestada.
IV - Para o tempo de labor até 28/04/95, a caracterização da atividade como especial se dá pela categoria profissional, quando a atividade se enquadra no rol dos Decretos nos 53.831/64 ou 83.080/79, exceto para ruído e calor (necessidade de aferição técnica).
V - Com a vigência da Lei nº 9.032/95, que deu nova redação ao § 3º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91, passou a ser necessária a comprovação da real exposição de forma habitual (não ocasional) e permanente (não intermitente) aos agentes nocivos à saúde ou integridade física do segurado, mediante a apresentação de formulários para todo e qualquer agente nocivo.
VI - Desde 06/03/97, com a entrada em vigor do Decreto nº 2.172/97, a comprovação da exposição às condições especiais passou a ser realizada mediante a apresentação de laudo técnico; e a partir de 01/01/2004, o único documento exigido para comprovação da exposição a agentes nocivos é o PPP (artigo 256, inciso IV, e artigo 272, § 1º, da Instrução Normativa INSS/PRES nº 45/2010).
VII - Sobre ruído: acima de 80 decibéis até 05/03/1997, superior a 90 decibéis de 06/03/1997 a 18/11/2003 e superior a 85 decibéis a partir de 19/11/2003, encontrando-se a questão pacificada no âmbito do E. STJ (Tema 694 daquela Corte).
VIII - Admitida a especialidade pela exposição, de forma habitual e permanente, a ruídos acima do limite de tolerância, conforme código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79, código 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e código 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99, correto, portanto, o reconhecimento da especialidade do período de 03/05/2004 a 26/07/2013.
IX - Agravo de instrumento não provido.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
