Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0006727-20.2013.4.03.6104
Relator(a)
Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO
Órgão Julgador
2ª Turma
Data do Julgamento
03/06/2021
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 11/06/2021
Ementa
E M E N T A
AGRAVO INTERNO. APELAÇÃO. AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRATOS DE ABERTURA DE
CRÉDITO EXTRAVIADOS. ADMITIDA A COMPROVAÇÃO DAS OPERAÇÕES POR OUTROS
MEIOS. LIMITAÇÃO DOS ENCARGOS ÀS PRESCRIÇÕES LEGAIS. ATUALIZAÇÃO DO
CRÉDITO PELO MANUAL DE CÁLCULOS DA JUSTIÇA FEDERAL. RECURSO IMPROVIDO
- Na hipótese de extravio do instrumento contratual, a existência de relação jurídica havida entre
as partes poderá ser demonstrada por outros meios de prova admitidos no Direito, conforme
disposto no artigo 369 do CPC/2015 (correspondente ao artigo 332 do CPC/1973).
- Incide o ônus da prova segundo as regras do artigo 373 do CPC/2015 (correspondente ao artigo
333 do CPC/1973), cabendo ao agente financeiro provar a realização do empréstimo de valores
ao correntista, nos termos que alega na petição inicial, não estando o cliente bancário dispensado
do cumprimento das avenças que forem comprovadas, ainda que sob invocação de normas do
direito do consumidor, sob pena de enriquecimento ilícito.
- Não se conhecendo exatamente os termos dos contratos firmados quanto aos juros
remuneratórios e demais acréscimos que estiverem estipulados para o caso de inadimplência,
não deveser acolhida, nesta parte, a pretensão da autora, cabendo ao juízo sua fixação segundo
os parâmetros legais aplicáveis, sendo correta a aplicação do Manual de Cálculos da Justiça
Federal para essa finalidade.
- A recorrente não demonstrou o desacerto da decisão monocrática proferida, cujos fundamentos
estão escorados em textos normativos validamente positivados e em jurisprudência pertinente,
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
devidamente relacionadas ao caso concreto sub judice.
- Agravo interno ao qual se nega provimento.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0006727-20.2013.4.03.6104
RELATOR:Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
ESPOLIO: MARCELINA MEJIAS CAMACHO
REPRESENTANTE: FERNANDA CAMACHO VENTURA
Advogado do(a) ESPOLIO: ANTONIO CARLOS TRINDADE RAMAJO - SP78926,
APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0006727-20.2013.4.03.6104
RELATOR:Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
ESPOLIO: MARCELINA MEJIAS CAMACHO
REPRESENTANTE: FERNANDA CAMACHO VENTURA
Advogado do(a) ESPOLIO: ANTONIO CARLOS TRINDADE RAMAJO - SP78926,
APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Desembargador Federal CARLOS FRANCISCO (Relator): Cuida-se de agravo
interno interposto em face de decisão monocrática proferida pelo Relator que me antecedeu,
Desembargador Souza Ribeiro, que negou provimento à apelação interposta por Marcelina
Mejias Camacho - Espólio, para manter a sentença proferida pelo juízo de origem, que julgou
parcialmente procedente a ação de cobrança movida pela Caixa Econômica Federal,
condenando a parte ré ao pagamento de dívida proveniente de Contrato de Crédito Direto Caixa
e Contrato de Crédito Rotativo, aplicando-se correção monetária e juros na forma do Manual de
Cálculos da Justiça Federal, haja vista o extravio dos respectivos instrumentos, com a
compensação dos valores pagos administrativamente.
Sustenta a parte agravante que o caso sob análise não se adequa a nenhuma das hipóteses
legais que autorizam a apreciação do recurso de apelação por decisão monocrática, razão pela
qual pugna pela deliberação pela Turma Julgadora, sob pena de violação ao duplo grau de
jurisdição. Assevera ainda, terem sido ignorados pela decisão recorrida os seguintes aspectos
veiculados nos autos: i. período de incidência da correção monetária; ii. cumulatividade de taxa
Selic com correção monetária; iii. ausência de instrução da inicial com memória de cálculo; iv.
dedução, em cumprimento de sentença, dos valores pagos pela devedora.
Regularmente intimada, a parte agravada deixou de se manifestar.
É o breve relatório. Passo a decidir.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0006727-20.2013.4.03.6104
RELATOR:Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
ESPOLIO: MARCELINA MEJIAS CAMACHO
REPRESENTANTE: FERNANDA CAMACHO VENTURA
Advogado do(a) ESPOLIO: ANTONIO CARLOS TRINDADE RAMAJO - SP78926,
APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
V O T O
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Carlos Francisco (Relator): Inicialmente deve ser
indeferido o pedido de substituição da Caixa Econômica Federal pela Empresa Gestora de
Ativos – EMGEA, formulado nas petições id’s nº. 133128734 e nº. 155101406, já que foi a CEF
quem atuou como agente financeiro responsável pelo contrato firmado entre as partes.
Ademais, considerando-se a hipótese de cessão do crédito objeto da ação, dispõe o art. 109, do
Código de Processo Civil, que a alienação da coisa ou do direito litigioso por ato entre vivos, a
título particular, não altera a legitimidade das partes, sendo admitido o ingresso do adquirente
ou cessionário, sucedendo o alienante ou cedente, apenas com o consentimento da parte
contrária, o que não se observa dos autos.
Assim, a renúncia noticiada não produz efeitos em face da presente ação, na medida em que a
Caixa Econômica Federal figura nos autos como parte, e não como representante da EMGEA.
Sendo assim, resta indeferido o pedido de substituição da parte, autorizada tão somente o
ingresso da Empresa Gestora de Ativos, na condição de assistente litisconsorcial, conforme
dispõe o art. 109, §3º, do CPC.
Indo adiante, observo que, nos Tribunais, a celeridade e a eficiência na prestação jurisdicional
(escoradas na garantia da duração razoável do processo e refletidas no art. 932 do Código de
Processo Civil) permitem que o Relator julgue monocraticamente casos claros no ordenamento
e pacificados na jurisprudência. Para que o feito seja analisado pelo colegiado, caberá agravo
interno no qual devem ser explicitadas as razões pelas quais a decisão agravada não respeitou
os requisitos para o julgamento monocrático (notadamente o contido no art. 932 do Código de
Processo Civil), não servindo a mera repetição de argumentos postos em manifestações
recursais anteriores.
De todo modo, alegações de nulidade da decisão monocrática são superadas com a apreciação
do agravo interno pelo órgão colegiado competente, conforme orientação do E.STJ (AgInt no
REsp 1.688.594/SP, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, j. 05/12/2017, DJe
15/12/2017) e deste E.TRF da 3ª Região (AC 5787532-70.2019.4.03.9999, Rel. Des. Federal
David Dantas, j. 30/04/2020, e - DJF3 06/05/2020).
No caso dos autos, a decisão monocrática agravada foi proferida pelo e. Desembargador
Federal Souza Ribeiro em 22 de fevereiro de 2019, com o seguinte conteúdo (id nº. 95080324,
pág. 211 e nº. 95080326, págs. 1 a 7):
“Trata-se de apelação interposta pela parte ré, MARCELINA MEJIAS CAMACHO ESPÓLIO,
contra sentença (fls. 118/120, complementada pela decisão que rejeitou embargos declaratórios
a fls. 129/130) que julgou parcialmente procedente a ação de cobrança movida pela CAIXA
ECONÔMICA FEDERAL - CEF, condenando a ré ao pagamento dos montantes de R$
10.000,00 na data de fevereiro/2011 e de R$ 7.200,00 na data de novembro/2011, relativos
respectivamente a Contrato de Crédito Direto Caixa e a contrato de crédito rotativo, tidos por
demonstrados nos autos apesar da inexistência dos respectivos contratos escritos (que a CEF
alegou haverem-se extraviado), observados os limites do artigo 1.792 do Código Civil,
aplicando-se correção monetária e juros na forma do Manual de Cálculos da Justiça Federal, e
compensando-se com os valores já pagos na via administrativa. Dispôs que diante da
sucumbência recíproca cada parte arcará com os honorários de seus respectivos patronos.
Sustenta a apelante (fls. 133/163): 1) preliminar de nulidade da sentença por falta de análise e
decisão de argumentos de sua defesa relacionados ao descabimento de incidência e/ou forma
de cálculo de juros de qualquer espécie, inclusive os moratórios, conforme item 3 de suas
razões recursais; 2) no mérito, que a ação deve ser julgada improcedente, à vista da
inexistência de contratos escritos que fundamentem a cobrança , conforme item 5 de suas
razões recursais; e 3) caso mantida a condenação, que haja a diminuição do valor da
condenação segundo os itens 6, 7, 8 e 9 de suas razões recusais.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
A CEF manifestou desistência da ação, tendo a parte ré/apelante não concordado por já haver
sido proferida a sentença (CPC, art. 485, § 5º), vindo a CEF então a pedir a desconsideração
de sua manifestação de desistência (fls. 178/9, 182/3 e 186/191).
É o relatório.
DECIDO.
De início, cumpre explicitar que o art. 932, IV e V do CPC de 2015 confere poderes ao Relator
para, monocraticamente, negar e dar provimento a recursos.
Ademais, é importante clarificar que, apesar de as alíneas dos referidos dispositivos elencarem
hipóteses em que o Relator pode exercer esse poder, o entendimento da melhor doutrina é no
sentido de que o mencionado rol é meramente exemplificativo.
Manifestando esse entendimento, asseveram Marinoni, Arenhart e Mitidiero:
Assim como em outras passagens, o art. 932 do Código revela um equívoco de orientação em
que incidiu o legislador a respeito do tema dos precedentes. O que autoriza o julgamento
monocrático do relator não é o fato de a tese do autor encontrar-se fundamentada em
"súmulas" e "julgamento de casos repetitivos" (leia -se, incidente de resolução de demandas
repetitivas, arts. 976 e ss., e recursos repetitivos, arts. 1.036 e ss.) ou em incidente de
"assunção de competência". É o fato de se encontrar fundamentado em precedente do
Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça ou em jurisprudência formada nos
Tribunais de Justiça e nos Tribunais Regionais Federais em sede de incidente de resolução de
demandas repetitivas ou em incidente de assunção de competência capaz de revelar razões
adequadas e suficientes para solução do caso concreto. O que os preceitos mencionados
autorizam, portanto, é o julgamento monocrático no caso de haver precedente do STF ou do
STJ ou jurisprudência firmada em incidente de resolução de demandas repetitivas ou em
incidente de assunção de competência nos Tribunais de Justiça ou nos Tribunais Regionais
Federais. Esses precedentes podem ou não ser oriundos de casos repetitivos e podem ou não
ter adequadamente suas razões retratadas em súmulas.("Curso de Processo Civil", 3ª e., v. 2,
São Paulo, RT, 2017)
Os mesmos autores, em outra obra, explicam ainda que "a alusão do legislador a súmulas ou a
casos repetitivos constitui apenas um indício - não necessário e não suficiente - a respeito da
existência ou não de precedentes sobre a questão que deve ser decidida. O que interessa para
incidência do art. 932, IV, a e b, CPC, é que exista precedente sobre a matéria - que pode ou
não estar subjacente a súmulas e pode ou não decorrer do julgamento de recursos repetitivos"
("Novo Código de Processo Civil comentado", 3ª e., São Paulo, RT, 2017, p. 1014, grifos
nossos).
Também Hermes Zaneti Jr. posiciona-se pela não taxatividade do elenco do art. 932, incisos IV
e V (Poderes do Relator e Precedentes no CPC/2015: perfil analítico do art. 932, IV e V, in "A
nova aplicação da jurisprudência e precedentes no CPC/2015: estudos em homenagem à
professora Teresa Arruda Alvim", Dierle José Coelho Nunes, São Paulo, RT, 2017, pp. 525-
544).
Nessa linha, o STJ, antes mesmo da entrada em vigor do CPC/2015, aprovou a Súmula 568
com o seguinte teor: "O relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar
ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema".
Veja-se que a expressão entendimento dominante aponta para a não taxatividade do rol em
comento.
Além disso, uma vez que a decisão singular do relator é recorrível por meio de agravo interno
(art. 1.021, caput, CPC/15), não fica prejudicado o princípio da colegialidade, pois a Turma pode
ser provocada a se manifestar por meio do referido recurso. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO (ART. 1.021, DO CPC). APOSENTADORIA
ESPECIAL. APLICAÇÃO DO ART. 932 DO CPC PERMITIDA. TERMO INICIAL FIXADO NA
DATA DA CITAÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL COMPROVADA COM LAUDO JUDICIAL.
INTERPOSIÇÃO CONTRA DECISÃO SINGULAR DO RELATOR. CABIMENTO. - O
denominado agravo interno (artigo Art. 1.021 do CPC/15) tem o propósito de impugnar
especificadamente os fundamentos da decisão agravada e, em caso de não retratação, possa
ter assegurado o direito de ampla defesa, com submissão das suas impugnações ao órgão
colegiado, o qual, cumprindo o princípio da colegialidade, fará o controle da extensão dos
poderes do relator e, bem assim, a legalidade da decisão monocrática proferida, não se
prestando, afora essas circunstâncias, à rediscussão, em si, de matéria já decidida, mediante
reiterações de manifestações anteriores ou à mingua de impugnação específica e
fundamentada da totalidade ou da parte da decisão agravada, objeto de impugnação. - O termo
inicial do benefício foi fixado na data da citação, tendo em vista que a especialidade da
atividade foi comprovada através do laudo técnico judicial, não havendo razão para a
insurgência da Autarquia Federal. - Na hipótese, a decisão agravada não padece de qualquer
ilegalidade ou abuso de poder, estando seus fundamentos em consonância com a
jurisprudência pertinente à matéria devolvida a este E. Tribunal. - Agravo improvido.(ApReeNec
00248207820164039999, DESEMBARGADOR FEDERAL GILBERTO JORDAN, TRF3 - NONA
TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/10/2017)
Assim, passo a proferir decisão monocrática, com fulcro no artigo 932, IV e V do Código de
Processo Civil de 2015.
Rejeito a preliminar de nulidade da sentença, posto confundir-se com o mérito da questão
controvertida nos autos, tendo a sentença trazido fundamentação suficiente no sentido de que
seriam devidos juros e correção monetária na forma ali discriminada, cabendo neste recurso o
reexame das questões aduzidas pela parte apelante.
No mérito, verifica-se que a CEF ajuizou a presente ação de cobrança ao argumento de que os
dois contratos de empréstimo firmados com a ré extraviaram-se, mas pretendendo reaver os
valores com todos os acréscimos contratuais pertinentes a juros, correção monetária e demais
taxas pactuadas, apresentando como prova de sua pretensão, no valor de R$ 25.533,83, um
Demonstrativo de Débito contendo extratos e demonstrativo da evolução dos dois contratos
citados (fls. 22/44) e cópias dos contratos padrão que teriam originado a dívida em cobrança
(fls. 09/12 e 13/17).
A ré, em sua contestação:
a) admite que obteve o crédito de R$ 10.000,00, quantia depositada em sua conta aos
15/02/2011, com 9 das 36 parcelas pagas, conforme consta dos documentos juntados, mas
nega que tivesse efetuado os contratos por escrito com a CEF, por isso mesmo arguindo
impossibilidade de cobrança de juros remuneratórios e/ou moratórios, pela ausência dos
respectivos contratos e aplicação do Código de Defesa do Consumidor - CDC, art. 46, não se
aplicando ao caso o art. 591 do Código Civil/2002;
b) que os juros moratórios não podem ser superiores a 12% ao ano, conforme artigos 397 e 406
do Código Civil e somente devem incidir a partir da citação conforme art. 219 do antigo
CPC/1973;
c) a correção monetária somente deve incidir a partir do ajuizamento da ação, conforme Lei nº
6.899/1981, art. 1º, § 2º;
d) que os demonstrativos juntados não se prestam para explicar o valor cobrado pela autora;
e) o valor devido, segundo seus cálculos, seria de apenas R$ 4.838,24, atualizado para
28/10/2014 (fl. 98).
Primeiramente, o contrato bancário não tem forma especial prevista em lei, podendo ser
aperfeiçoado por qualquer forma (verbal, contrato particular, escritura pública), conforme
dispõem os artigos 104 e 107 do Código Civil, pelo que sua realização pode ser demonstrada
por outros meios de prova admitidos no Direito, conforme disposto no artigo 369 do CPC/2015
(correspondente ao artigo 332 do CPC/1973).
Incide o ônus da prova segundo as regras do artigo 373 do CPC/2015 (correspondente ao
artigo 333 do CPC/1973), portanto, no caso em exame, cabendo ao agente financeiro provar a
realização do empréstimo de valores ao correntista, nos termos que alega na petição inicial, não
estando o cliente bancário dispensado do cumprimento das avenças que forem comprovadas,
ainda que sob invocação de normas do direito do consumidor, sob pena de enriquecimento
ilícito.
Nesse sentido a jurisprudência a seguir colacionada:
PROCESSO CIVIL. CIVIL. APELAÇÃO EM AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRATO BANCÁRIO.
CRÉDITO DIRETO. EXTRAVIO. EXTRATOS BANCÁRIOS. RELAÇÃO JURÍDICA
COMPROVADA. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
I - O instrumento contratual não se confunde com o contrato em si e não é a única maneira de
se provar a existência de um negócio jurídico se a lei não faz exigência nesse sentido. Nas
hipóteses em que o instrumento contratual é extraviado, o credor tem o ônus de provar por
outros meios a existência do negócio jurídico, cabendo ao magistrado formar sua convicção
com base nesses elementos. Entendimento diverso permitiria ao devedor enriquecer-se sem
fundamento.
II - Caso em tela a CEF apresentou extratos da conta da parte Ré, nos quais é possível
observar as datas em que os valores foram disponibilizados, bem como a evolução do saldo da
conta em questão. A parte Ré reconhece apenas a disponibilização de R$ 9.549,56 em
15/10/13, valor que não guarda correspondência com os extratos do período, representando,
antes sim, o valor da dívida inicial de R$ 8.435,28 atualizado para 13/02/14, sendo inverossímil
a defesa neste tópico, já que não demonstrou nenhuma outra prova que pudesse sustentar sua
alegação.
III - O que se pode observar é existência de um saldo negativo inicial de R$ 9.843,99 em
01/10/13. As sucessivas contratações pela parte Ré se explicam pela insuficiência do montante
contratado para, ao mesmo tempo, cobrir aquela dívida inicial, e outros valores debitados de
sua conta, tais como pagamento de boletos.
IV - Não se vislumbram razões que possam atingir a veracidade da documentação apresentada.
Na ausência de parâmetros contratuais para evolução da dívida, no entanto, mantida a
sentença no tocante aos critérios de atualização da dívida.
V - Apelação parcialmente provida.
(TRF3, 1ª Turma, v.u. Acórdão 0000063-14.2015.4.03.6100. Ap 2265049. Rel.
DESEMBARGADOR FEDERAL VALDECI DOS SANTOS. Julgado: 14/11/2017; Fonte da
publicação: e-DJF3 Judicial 1 DATA:30/11/2017)
AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO. AUSÊNCIA DE
INDISPENSABILIDADE. DÍVIDA QUE PODE SER COMPROVADA POR OUTROS MEIOS
IDÔNEOS.
1. Apelante, Caixa Econômica Federal (CEF ou Caixa), recorre da sentença pela qual o Juízo
Singular julgou extinto o processo, sem resolução do mérito (CPC, Art. 267, IV), diante da
ausência de documento essencial (contrato) à propositura da ação de cobrança por ela
ajuizada.
2. Apelante sustenta, em suma, que o contrato de abertura de crédito não foi juntado aos autos
porque está extraviado; que, no entanto, a documentação juntada aos autos comprova a
liberação e a utilização do crédito, bem como a consequente existência da dívida; e que a
planilha de evolução do débito contém todos os encargos incidentes devidamente
discriminados. Requer o provimento do recurso para determinar o prosseguimento do feito.
3. O Art. 283 do CPC determina que: "A petição inicial será instruída com os documentos
indispensáveis à propositura da ação." Por outro lado, o Art. 332 do CPC dispõe que: "Todos os
meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código,
são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa."
4. Nos termos da Súmula 530 do STJ, a "falta de juntada do instrumento aos autos" não impede
a cobrança de dívida decorrente de contrato bancário. Consequente licitude da conclusão de
que o contrato de abertura de crédito não constitui documento essencial à propositura de ação
de cobrança ou monitória, podendo a existência da dívida ser provada por outros meios. CPC,
Art. 283 e Art. 332. 5. Apelação provida.
(TRF1, 5ª Turma, v.u. Acórdão 0022375-34.2008.4.01.3400 (AC). Relator JUIZ FEDERAL
LEÃO APARECIDO ALVES. Data: 16/12/2015; Fonte: e-DJF1 18/02/2016 PAG 1009e-DJF1
18/02/2016, pag. 1009)
A Súmula nº 530 do C. Superior Tribunal de Justiça, aliás, corrobora esta compreensão, ao
estabelecer a regra de juros aplicáveis em contratos bancários que sejam de apresentação
impossível nos autos do processo.
Superior Tribunal de Justiça
Súmula nº 530 - Nos contratos bancários, na impossibilidade de comprovar a taxa de juros
efetivamente contratada - por ausência de pactuação ou pela falta de juntada do instrumento
aos autos -, aplica-se a taxa média de mercado, divulgada pelo Bacen, praticada nas operações
da mesma espécie, salvo se a taxa cobrada for mais vantajosa para o devedor.
(2ª Seção. Julgamento: 13/05/2015, Fonte: DJe 18/05/2015RSTJ vol. 243 p. 1070)
No caso em apreciação, a própria parte requerida confirmou haver recebido em empréstimo no
valor de R$ 10.000,00, quantia depositada em sua conta aos 15/02/2011, com 9 das 36
parcelas pagas, conforme consta dos documentos juntados pela própria CEF/autora. Não há,
então, controvérsia a respeito desse ponto, embora subsistam questionamentos da ré quanto
aos acréscimos de juros e correção monetária incidentes sobre tal valor.
Silenciou-se a parte ré, porém, quanto ao segundo contrato alegado pela CEF, qual seja, o
contrato de crédito rotativo, mas bem pontuou a sentença que a dívida oriunda deste contrato
também é devida, apurando-se dos extratos de fls. 24/42 e do demonstrativo de fl. 35 que o
valor disponibilizado pela CEF à cliente requerida era, inicialmente, de R$ 4.000,00, elevado
para R$ 7.200,00 em outubro de 2011, tratando-se de crédito de cheque especial que os
extratos demonstram que foi utilizado pela cliente, ao se verificar os diversos lançamentos a
débito na conta que geraram saldos negativos da conta bancária no período em exame.
Daí porque a sentença, corretamente, condenou a ré ao pagamento das dívidas decorrentes
dos dois contratos, no que deve ser inteiramente mantida.
Também deve ser mantida a sentença no ponto em que fixou o entendimento de que, à
ausência dos contratos escritos, portanto, não se conhecendo exatamente os termos dos
contratos firmados quanto aos juros remuneratórios e demais acréscimos que estivessem
estipulados para o caso de inadimplência, não deve ser acolhida nesta parte a pretensão da
autora, cabendo ao juízo sua fixação segundo os parâmetros legais aplicáveis.
Correta a sentença ao citar o Manual de Cálculos da Justiça Federal, assim ao menos pela
remissão ao mencionado normativo de cálculos fixando a incidência da correção monetária
desde a data dos indébitos especificados na sentença, pois se trata de ato ilícito, aplicando-se o
entendimento da súmula nº 43 do C. Superior Tribunal de Justiça, sendo que o inadimplemento
das obrigações gera tal efeito jurídico, conforme artigo 389 do Código Civil, sendo a atualização
monetária um imperativo de recomposição do valor real da dívida para evitar enriquecimento
ilícito do devedor em detrimento do credor.
Superior Tribunal de Justiça
Súmula nº 43 - Incide correção monetária sobre dívida por ato ilícito a partir da data do efetivo
prejuízo.
(CE - CORTE ESPECIAL. Julgamento: 14/05/1992; DJ 20/05/1992 p. 7074; RSTJ vol. 38 p. 91;
RT vol. 679 p. 188)
Os juros moratórios, igualmente, são devidos conforme o Manual de Cálculos da Justiça
Federal, o que significa sua incidência a partir da citação, conforme artigo 240 do CPC/2015.
Mereceria reparo a sentença quanto a deixar de aplicar uma taxa de juros remuneratórios dos
contratos bancários de empréstimo havidos por comprovados neste processo. Isso à vista do
disposto na súmula nº 530 do C. STJ, acima transcrita, que dispõe serem devidos os juros
remuneratórios mesmo nos contratos bancários que não sejam apresentados pela instituição
financeira, à taxa ali discriminada.
Todavia, não houve insurgência da CEF, que seria a parte interessada, contra a sentença
através de recurso próprio, pelo que deve a condenação ser mantida tal como constou na
sentença.
C O N C L U S Ã O
Ante o exposto, com fundamento no artigo 932, IV e V, do Código de Processo Civil de 2015,
NEGO PROVIMENTO à apelação da parte ré, mantendo a sentença tal como proferida, nos
termos da fundamentação supra.”
No agravo interno interposto, a recorrente não demonstrou o desacerto da decisão monocrática
proferida, cujos fundamentos estão escorados em textos normativos validamente positivados e
em jurisprudência pertinente, devidamente relacionadas ao caso concreto sub judice.
Cumpre registrar, em arremate, que a ora agravante assevera terem sido ignorados pela
decisão recorrida os seguintes aspectos: i. período de incidência da correção monetária; ii.
cumulatividade de taxa Selic com correção monetária; iii. ausência de instrução da inicial com
memória de cálculo; iv. dedução, em cumprimento de sentença, dos valores pagos pela
devedora.
Ocorre que, diferentemente do que alega a recorrente, as questões postas, ou foram
expressamente abordadas pela decisão, conforme transcrição supra, ou encontram solução a
partir da aplicação do Manual de Cálculos da Justiça Federal, consoante entendimento
igualmente consignado na sentença, e ratificado por esta Corte, ainda que que
monocraticamente.
Ante o exposto, nego provimento ao agravo interno.
E M E N T A
AGRAVO INTERNO. APELAÇÃO. AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRATOS DE ABERTURA DE
CRÉDITO EXTRAVIADOS. ADMITIDA A COMPROVAÇÃO DAS OPERAÇÕES POR OUTROS
MEIOS. LIMITAÇÃO DOS ENCARGOS ÀS PRESCRIÇÕES LEGAIS. ATUALIZAÇÃO DO
CRÉDITO PELO MANUAL DE CÁLCULOS DA JUSTIÇA FEDERAL. RECURSO IMPROVIDO
- Na hipótese de extravio do instrumento contratual, a existência de relação jurídica havida entre
as partes poderá ser demonstrada por outros meios de prova admitidos no Direito, conforme
disposto no artigo 369 do CPC/2015 (correspondente ao artigo 332 do CPC/1973).
- Incide o ônus da prova segundo as regras do artigo 373 do CPC/2015 (correspondente ao
artigo 333 do CPC/1973), cabendo ao agente financeiro provar a realização do empréstimo de
valores ao correntista, nos termos que alega na petição inicial, não estando o cliente bancário
dispensado do cumprimento das avenças que forem comprovadas, ainda que sob invocação de
normas do direito do consumidor, sob pena de enriquecimento ilícito.
- Não se conhecendo exatamente os termos dos contratos firmados quanto aos juros
remuneratórios e demais acréscimos que estiverem estipulados para o caso de inadimplência,
não deveser acolhida, nesta parte, a pretensão da autora, cabendo ao juízo sua fixação
segundo os parâmetros legais aplicáveis, sendo correta a aplicação do Manual de Cálculos da
Justiça Federal para essa finalidade.
- A recorrente não demonstrou o desacerto da decisão monocrática proferida, cujos
fundamentos estão escorados em textos normativos validamente positivados e em
jurisprudência pertinente, devidamente relacionadas ao caso concreto sub judice.
- Agravo interno ao qual se nega provimento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma
decidiu, por unanimidade, negar provimento ao agravo interno, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
