
7ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5081255-74.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - JUIZ CONVOCADO MARCUS ORIONE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: SANDRA MARIA DA SILVA MELO
Advogado do(a) APELADO: NATTAN MENDES DA SILVA - SP343841-A
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5081255-74.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - JUIZ CONVOCADO MARCUS ORIONE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: SANDRA MARIA DA SILVA MELO
Advogado do(a) APELADO: NATTAN MENDES DA SILVA - SP343841-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Juiz Federal Convocado Marcus Orione (Relator):
Trata-se de agravo interno, interposto pelo INSS, contra decisão monocrática que negou provimento à sua apelação contra r. sentença proferida nos autos da ação de ressarcimento ao erário n° 1009403-85.2015.8.26.0604, que julgou improcedente o pedido formulado pelo ente previdenciário de restituição de valores recebidos indevidamente a título de pensão por morte. O feito foi sujeito ao reexame necessário.
Alega o agravante, em apertada síntese, o dever de ressarcimento ao erário das parcelas pagas indevidamente.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
7ª Turma
AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5081255-74.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - JUIZ CONVOCADO MARCUS ORIONE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: SANDRA MARIA DA SILVA MELO
Advogado do(a) APELADO: NATTAN MENDES DA SILVA - SP343841-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Juiz Federal Convocado Marcus Orione (Relator):
O recurso não merece prosperar.
Quanto à matéria em tela, registre-se que o E. Superior Tribunal de Justiça, à luz da redação do art. 115, III, da Lei n.º 8.213/91, assentou a possibilidade de devolução de valores pagos indevidamente (Tema 979/STJ). Fez constar, porém, a ressalva quanto à prova da boa-fé objetiva, especialmente quando o segurado não tinha condições de constatar o pagamento indevido.
Com efeito, no julgamento realizado em 10/03/2021, a questão da devolução de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social, Tema 979 daquela Corte, verbis:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 979. ARTIGO 1.036 DO CPC/2015. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ARTIGOS 884 E 885 DO CÓDIGO CIVIL/2002. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211 DO STJ. ART. 115, II, DA LEI N. 8.213/1991. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA E MÁ APLICAÇÃO DA LEI. NÃO DEVOLUÇÃO. ERRO MATERIAL DA ADMINISTRAÇÃO. POSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO SOMENTE NA HIPÓTESE DE ERRO EM QUE OS ELEMENTOS DO CASO CONCRETO NÃO PERMITAM CONCLUIR PELA INEQUÍVOCA PRESENÇA DA BOA-FÉ OBJETIVA.
1. Da admissão do recurso especial: Não se conhece do recurso especial quanto à alegada ofensa aos artigos 884 e 885 do Código Civil, pois não foram prequestionados. Aplica-se à hipótese o disposto no enunciado da Súmula 211 do STJ. O apelo especial que trata do dissídio também não comporta conhecimento, pois não indicou as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os precedentes colacionados e também por ausência de cotejo analítico e similitude entre as hipóteses apresentadas. Contudo, merece conhecimento o recurso quanto à suposta ofensa ao art. 115, II, da lei n. 8.213/1991.
2. Da limitação da tese proposta: A afetação do recurso em abstrato diz respeito à seguinte tese: Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social.
3. Irrepetibilidade de valores pagos pelo INSS em razão da errônea interpretação e/ou má aplicação da lei: O beneficiário não pode ser penalizado pela interpretação errônea ou má aplicação da lei previdenciária ao receber valor além do devido. Diz-se desse modo porque também é dever-poder da Administração bem interpretar a legislação que deve por ela ser aplicada no pagamento dos benefícios. Dentro dessa perspectiva, esta Corte Superior evoluiu a sua jurisprudência passando a adotar o entendimento no sentido de que, para a não devolução dos valores recebidos indevidamente pelo beneficiário da Previdência Social, é imprescindível que, além do caráter alimentar da verba e do princípio da irrepetibilidade do benefício, a presença da boa-fé objetiva daquele que recebe parcelas tidas por indevidas pela administração. Essas situações não refletem qualquer condição para que o cidadão comum compreenda de forma inequívoca que recebeu a maior o que não lhe era devido.
4. Repetição de valores pagos pelo INSS em razão de erro material da Administração previdenciária: No erro material, é necessário que se averigue em cada caso se os elementos objetivos levam à conclusão de que houve boa-fé do segurado no recebimento da verba. Vale dizer que em situações em que o homem médio consegue constatar a existência de erro, necessário se faz a devolução dos valores ao erário.
5. Do limite mensal para desconto a ser efetuado no benefício: O artigo 154, § 3º, do Decreto n. 3.048/1999 autoriza a Administração Previdenciária a proceder o desconto daquilo que pagou indevidamente; todavia, a dedução no benefício só deverá ocorrer quando se estiver diante de erro da administração. Nesse caso, caberá à Administração Previdenciária, ao instaurar o devido processo administrativo, observar as peculiaridades de cada caso concreto, com desconto no beneficio no percentual de até 30% (trinta por cento).
6. Tese a ser submetida ao Colegiado: Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.
7. Modulação dos efeitos: Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste representativo da controvérsia, em respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável interesse social que permeia a questão sub examine, e a repercussão do tema que se amolda a centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse modo somente deve atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão.
8. No caso concreto: Há previsão expressa quanto ao momento em que deverá ocorrer a cessação do benefício, não havendo margem para ilações quanto à impossibilidade de se estender o benefício para além da maioridade da beneficiária. Tratou-se, em verdade, de simples erro da administração na continuidade do pagamento da pensão, o que resulta na exigibilidade de tais valores, sob forma de ressarcimento ao erário, com descontos nos benefícios, tendo em vista o princípio da indisponibilidade do patrimônio público e em razão da vedação ao princípio do enriquecimento sem causa.
Entretanto, em razão da modulação dos efeitos aqui definidos, deixa-se de efetuar o descontos dos valores recebidos indevidamente pelo segurado.
9. Dispositivo: Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido.
Acórdão sujeito ao regime previsto no artigo 1.036 e seguintes do CPC/2015."
(STJ, REsp 1.381.734/RN, Relator Ministro BENEDITO GONÇALVES, Primeira Seção, j. 10/03/2021, DJe 23/04/2021; destacou-se)
Acerca do exame do mérito, peço vênia para destacar o seguinte excerto da decisão atacada, verbis:
"O benefício previdenciário de pensão por morte, previsto no artigo 201, V, da Constituição Federal e disciplinado pelos artigos 74 a 79 da Lei nº 8.213/1991, é devido ao conjunto de dependentes do segurado, sendo certo que a lei aplicável à concessão é aquela vigente na data do óbito do segurado, nos termos da Súmula nº 340 do C. Superior Tribunal de Justiça.
Para a obtenção do benefício da pensão por morte, faz-se necessária a comprovação do óbito ou da morte presumida de pessoa que ostenta a qualidade de segurado e da condição de dependência do beneficiário.
In casu, em sede de auditoria interna, o INSS constatou irregularidades na concessão do auxílio doença previdenciário (NB 31/126.529.474-4), que gerou a aposentadoria por invalidez (NB 32/505.505.544-4), ambos em nome de João Furtozo de Melo, que veio posteriormente a óbito, razão pela qual foi concedida, de maneira indevida, o benefício de pensão por morte (NB 21/151.147.984-9) em nome de sua esposa, ora apelada. Por conseguinte, a autarquia previdenciária enviou ofício de cobrança dos valores recebidos indevidamente no período de 01/06/2010 a 31/05/2011, que totalizavam a quantia de R$ 19.145,65 (dezenove mil, cento e quarenta e cinco reais e sessenta e cinco centavos) – fls. 16/17 - ID 267938417.
Cumpre esclarecer que a equipe de monitoramento de benefícios da Gerência Executiva em Campinas/SP verificou a irregularidade na concessão do auxílio-doença em decorrência do vínculo de trabalho com a empresa Belmiro Alves de Oliveira ME não ter sido confirmada e, em razão disso, foi constatado que o de cujus não possuía a qualidade de segurado e não fazia jus aos benefícios recebidos em vida, ocasionando, por consequência, a concessão indevida do benefício de pensão por morte ora em comento, que o teve como instituidor.
Ocorre que as concessões do referidos benefícios foram realizadas em âmbito administrativo e o equívoco no tocante à constatação da qualidade de segurado do instituidor do benefício percebido pela recorrida se deu exclusivamente por erro do órgão previdenciário.
Importa ressaltar que a autarquia federal não se desincumbiu de demonstrar alguma conduta praticada pela beneficiária que demonstrasse omissão intencional de informações capazes de modificar o entendimento do INSS sobre a concessão do benefício.
Dessa forma, o conjunto probatório constante do feito revela que a apelada entendia que lhe era devido o benefício da pensão por morte e, em vista disso, recebeu os valores de suas parcelas de boa-fé, já que seu esposo percebeu, sem qualquer protesto do INSS, os benefícios de auxílio-doença e de aposentadoria por invalidez que originaram o benefício que passou a receber com o seu óbito.
Não obstante os argumentos da autarquia previdenciária, conforme ressalvado nesta fundamentação erigida, a qual perquire o assentado pelo C. Superior Tribunal de Justiça sob o rito dos recursos repetitivos (REsp 1.381.734/RN), à míngua da ocorrência de má-fé, resta a impossibilidade da devolução pleiteada pelo INSS dos valores percebidos pela beneficiária."
(destacou-se)
Assim, deve ser observado o entendimento sufragado pelo C. STF no sentido do descabimento da referida devolução em razão da irrepetibilidade de verba de natureza alimentar, mormente quando recebido de boa-fé (MS 31244 AgR-segundo, Rel. Min. LUIZ FUX, DJe 18/06/2020; RE 661256 ED-segundos, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Rel. p/ acórdão: ALEXANDRE DE MORAES, DJe 13/11/2020).
Por tais fundamentos, nego provimento ao agravo interno interposto pelo INSS.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO. CONCESSÃO IRREGULAR DE BENEFÍCIO POR RESPONSABILIDADE DA ADMINISTRAÇÃO. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. BOA FÉ DO SEGURADO. NÃO CABIMENTO.
1. Quanto à matéria em tela, registre-se que o E. Superior Tribunal de Justiça, à luz da redação do art. 115, III, da Lei n.º 8.213/91, assentou a possibilidade de devolução de valores pagos indevidamente (Tema 979/STJ). Fez constar, porém, a ressalva quanto à prova da boa-fé objetiva, especialmente quando o segurado não tinha condições de constatar o pagamento indevido.
2. Com efeito, no julgamento realizado em 10/03/2021, a questão da devolução de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social, Tema 979 daquela Corte -STJ, REsp 1.381.734/RN, Relator Ministro BENEDITO GONÇALVES, Primeira Seção, j. 10/03/2021, DJe 23/04/2021.
3. No caso concreto, como visto, conforme firmado na r. decisão ora hostilizada, "(...) O benefício previdenciário de pensão por morte, previsto no artigo 201, V, da Constituição Federal e disciplinado pelos artigos 74 a 79 da Lei nº 8.213/1991, é devido ao conjunto de dependentes do segurado, sendo certo que a lei aplicável à concessão é aquela vigente na data do óbito do segurado, nos termos da Súmula nº 340 do C. Superior Tribunal de Justiça. Para a obtenção do benefício da pensão por morte, faz-se necessária a comprovação do óbito ou da morte presumida de pessoa que ostenta a qualidade de segurado e da condição de dependência do beneficiário. In casu, em sede de auditoria interna, o INSS constatou irregularidades na concessão do auxílio doença previdenciário (NB 31/126.529.474-4), que gerou a aposentadoria por invalidez (NB 32/505.505.544-4), ambos em nome de João Furtozo de Melo, que veio posteriormente a óbito, razão pela qual foi concedida, de maneira indevida, o benefício de pensão por morte (NB 21/151.147.984-9) em nome de sua esposa, ora apelada. Por conseguinte, a autarquia previdenciária enviou ofício de cobrança dos valores recebidos indevidamente no período de 01/06/2010 a 31/05/2011, que totalizavam a quantia de R$ 19.145,65 (dezenove mil, cento e quarenta e cinco reais e sessenta e cinco centavos) – fls. 16/17 - ID 267938417. Cumpre esclarecer que a equipe de monitoramento de benefícios da Gerência Executiva em Campinas/SP verificou a irregularidade na concessão do auxílio-doença em decorrência do vínculo de trabalho com a empresa Belmiro Alves de Oliveira ME não ter sido confirmada e, em razão disso, foi constatado que o de cujus não possuía a qualidade de segurado e não fazia jus aos benefícios recebidos em vida, ocasionando, por consequência, a concessão indevida do benefício de pensão por morte ora em comento, que o teve como instituidor. Ocorre que as concessões do referidos benefícios foram realizadas em âmbito administrativo e o equívoco no tocante à constatação da qualidade de segurado do instituidor do benefício percebido pela recorrida se deu exclusivamente por erro do órgão previdenciário. Importa ressaltar que a autarquia federal não se desincumbiu de demonstrar alguma conduta praticada pela beneficiária que demonstrasse omissão intencional de informações capazes de modificar o entendimento do INSS sobre a concessão do benefício. Dessa forma, o conjunto probatório constante do feito revela que a apelada entendia que lhe era devido o benefício da pensão por morte e, em vista disso, recebeu os valores de suas parcelas de boa-fé, já que seu esposo percebeu, sem qualquer protesto do INSS, os benefícios de auxílio-doença e de aposentadoria por invalidez que originaram o benefício que passou a receber com o seu óbito. Não obstante os argumentos da autarquia previdenciária, conforme ressalvado nesta fundamentação erigida, a qual perquire o assentado pelo C. Superior Tribunal de Justiça sob o rito dos recursos repetitivos (REsp 1.381.734/RN), à míngua da ocorrência de má-fé, resta a impossibilidade da devolução pleiteada pelo INSS dos valores percebidos pela beneficiária." - destacou-se.
4. Assim, deve ser observado o entendimento sufragado pelo C. STF no sentido do descabimento da referida devolução em razão da irrepetibilidade de verba de natureza alimentar, mormente quando recebido de boa-fé (MS 31244 AgR-segundo, Rel. Min. LUIZ FUX, DJe 18/06/2020; RE 661256 ED-segundos, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Rel. p/ acórdão: ALEXANDRE DE MORAES, DJe 13/11/2020).
5. Agravo interno do INSS desprovido.
ACÓRDÃO
JUIZ FEDERAL CONVOCADO
