
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000511-23.2022.4.03.6142
RELATOR: Gab. 50 - DES. FED. SILVIA ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: APARECIDA DE FATIMA GONCALVES
Advogado do(a) APELADO: CARLOS MIGUEL NAVE - SP475867-A
OUTROS PARTICIPANTES:
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000511-23.2022.4.03.6142
RELATOR: Gab. 50 - DES. FED. SILVIA ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: APARECIDA DE FATIMA GONCALVES
Advogado do(a) APELADO: CARLOS MIGUEL NAVE - SP475867-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Exma. Desembargadora Federal SILVIA ROCHA (Relatora):
Trata-se de agravo interno interposto pela parte autora contra decisão monocrática (ID 287789492) que julgou prejudicada a apelação do INSS e reformou, de ofício, a r. sentença do juízo a quo para julgar extinto o feito sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, IV, do CPC e da tese fixada no Tema nº 629 do STJ.
Sustenta a agravante, em apertada síntese, que há nos autos início de prova material corroborada com prova testemunhal apta a reconhecer o exercício de atividade rural na qualidade de segurado especial (ID 289721452).
Requer a reconsideração da decisão ou o envio para julgamento do recurso pela C. 8ª Turma desta Corte. Requer o provimento do recurso.
Sem contrarrazões.
É o relatório.
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000511-23.2022.4.03.6142
RELATOR: Gab. 50 - DES. FED. SILVIA ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: APARECIDA DE FATIMA GONCALVES
Advogado do(a) APELADO: CARLOS MIGUEL NAVE - SP475867-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Exma. Desembargadora Federal SILVIA ROCHA (Relatora):
O presente recurso não merece provimento.
A controvérsia dos autos restringe-se à comprovação de efetivo exercício de atividade rural, na qualidade de segurado especial, pela parte autora, para fins de reconhecimento de tempo de serviço rural nos períodos de 10/07/1970 a 12/06/1973 e 13/06/1973 a 30/06/2016.
A r. decisão monocrática, após análise do conjunto probatório constante nos autos, assim o sintetizou:
Para comprovar o alegado exercício de atividade rural em regime de economia familiar, de modo a preencher a carência exigida de 180 meses, a autora juntou aos autos as cópias dos seguintes documentos:
1. Cópia da CTPS do ex-cônjuge com anotações de vínculos empregatícios na qualidade de “empregado rural” nos seguintes períodos: de 10/10/77 a 30/01/78; de 07/04/78 a 30/10/79; de 21/11/79 a 20/11/82; de 01/02/89 a 06/12/94; de 02/01/95 a 02/01/00; de 08/07/02 a 08/03/06; de 01/06/06 a 08/05/07; de 19/11/07 a 05/01/09; de 13/07/09 a 27/09/09; de 10/11/09 a 15/02/11; de 01/04/11 a 24/04/11; de 28/05/11 a 23/11/11; de 03/02/14 a 19/04/14 (ID’s 281293994 a 281294006);
2. Cópia da CTPS do genitor com anotações de alterações salariais referentes à função de “empregado rural” nos anos de 1983 a 1985 (ID 281294049);
3. Certidão de casamento realizado em 13/06/1973, emitida em 22/06/1982, onde consta a profissão do cônjuge como “lavrador” (ID 281294055);
4. Certidão Inteiro Teor de Casamento com averbação de divórcio realizado em 15/02/2016 (ID 281294072)
5. Certidões de nascimento dos filhos ocorridos nos anos de 1975 e 1976, onde constam a profissão do genitor como “lavrador” (ID 281294075 – pág. 01/02);
6. Livro de matrícula da escola rural do ano de 1969, onde consta a profissão do genitor da autora como “lavrador” (ID’s 281294148, 281294151 e 281294152).
Em depoimento pessoal, a autora informou que trabalhava com seus pais na roça quando era solteira e, após seu casamento, trabalhou em atividades rurais com seu cônjuge. Disse que em 1995 o esposo passou a trabalhar na prefeitura como “tratorista” onde ficou até 2015 e ela seguiu trabalhando de “boia-fria”, especialmente em lavouras de café. Cessou o labor em 2016 (ID 281294197).
A testemunha Joana Lourenço Fernandes informou que conheceu a autora em 1990, quando a ela morava com os pais e trabalhava no “Silvão”. Informou que a autora e o cônjuge foram para Sabino/SP e o esposo trabalhava na prefeitura da cidade. Questionada quanto à divergência em relação ao ano do casamento da autora, proferiu informações confusas e imprecisas (ID 281294199).
A testemunha Francisco Alves da Costa afirmou que conheceu a autora em 1973, mas não soube explicar as circunstâncias em que isso ocorreu. Não sabe informar se a autora era casada nesta época. Questionado sobre os locais onde a autora exerceu atividades rurais, citou alguns nomes, mas sem apontar os períodos (ID 281294230).
A testemunha Gislaine Sanches R. Miranda afirmou que conheceu a autora entre 1990 a 1991, pois trabalhavam na fazenda da “Antonia Bertin”. Não mais trabalhou com a autora e não via a mesma exercendo atividades rurais. Não sabe informar outros locais em que a autora trabalhou. Informou que o cônjuge da autora trabalhou na prefeitura na época e já estavam separados, inclusive, ele com outra família. Questionado quanto à época da separação do casal, não soube informar (ID 281294235).
Como se nota, a agravante não logrou êxito em comprovar o efetivo desempenho de atividades rurícolas necessário ao enquadramento como segurado especial pelo tempo exigido à concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.
Em relação à demonstração da atividade rural, de acordo com o art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/91, a comprovação do tempo de atividade rural para fins previdenciários exige, pelo menos, um início de prova material (documental), complementado por prova testemunhal idônea (Recurso Especial Repetitivo nº 1.133.863/RN, Rel. Des. Convocado Celso Limongi, 3ª Seção, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011).
Ademais, quanto à necessidade de início de prova material, importante mencionar a Súmula 149, do STJ que dispõe: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário.
Em relação à prova material apresentada nos autos, com poucas exceções, referem-se aos vínculos empregatícios do ex-cônjuge como “empregado rural”.
Isto, por si só, não se apresenta como um óbice ao reconhecimento de tais provas, uma vez que os documentos apresentados em nome de algum dos integrantes da mesma família podem consubstanciar início de prova material do labor rural dos demais.
Ocorre que, no presente caso, a prova testemunhal, que deveria corroborar as supostas atividades exercidas pela agravante em regime de economia familiar, são contraditórias e indicam provável separação de fato do casal.
Neste ponto, transcrevo as razões de decidir da decisão agravada:
A prova testemunhal mostrou-se frágil e, até mesmo, contraditória à prova material apresentada.
Verifica-se pelos registros constantes na CTPS do ex-cônjuge da autora que após o ano de 2000, quando extinto seu vínculo empregatício com a prefeitura municipal de Sabino/SP, o mesmo desempenhou atividades laborais em várias cidades como Guaiçara/SP (de 2002 a 2006), Nipoã/SP (de 2006 a 2007), Planalto/SP (de 2007 a 2009), Monte Aprazível/SP (de 2009 a 2011).
Desta forma, mostra-se pouco verossímil os relatos feitos pelas testemunhas aqui apresentadas, cujo objetivo era corroborar o suposto exercício de atividade rural pela parte autora juntamente com seu esposo em regime de economia familiar.
Primeiro, porque alegaram presenciar os trabalhos exercidos pelo casal em conjunto, sendo pouco crível que os acompanharam durante as diversas mudanças domiciliares. Segundo, porque há registros empregatícios como “tratorista” e “auxiliar de tratorista”, funções que, rotineiramente, são exercidas de forma personalíssima, diametralmente oposta ao regime de economia familiar.
Ademais, a testemunha Gislaine Sanches R. Miranda noticiou que à época do trabalho exercido pelo ex-cônjuge junto à Prefeitura de Sabino/SP o casal já estava separado de fato, tendo o empregado rural constituído outra família, inclusive.
Soma-se a isto o fato de que, em seu depoimento pessoal, a parte autora afirmou que o ex-cônjuge trabalhou na Prefeitura de Sabino/SP até o ano de 2015, restando evidente que há tempos não mais o acompanhava.
Conforme apontado acima, após o ano de 2000, o ex-cônjuge da autora trabalhou em diferentes municípios, tornando pouco crível que a mesma tenha se equivocado quanto ao período de labor exercido em Sabino/SP. Tal situação assemelha-se mais à separação de fato do casal, o que, por si só, impossibilitaria a extensão dos vínculos empregatícios do ex-cônjuge à apelada.
A condição de empregado rural, que se amolda ao caso do ex-cônjuge da agravante, é incompatível com a possibilidade de extensão da condição de lavrador do marido à mulher, em vista do caráter individual e específico que tais atividades laborais são exercidas, especialmente no caso sob análise, em que o referido labor ocorreu junto à Administração Pública municipal, o que retira por completo seu exercício em caráter de regime familiar.
Neste sentido é o recente entendimento deste E. Tribunal:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHO RURAL SEM REGISTRO. PROVA MATERIAL. PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO.
1. Os requisitos para a concessão da aposentadoria por idade ao trabalhador rural compreendem a idade e a comprovação de efetivo exercício de atividade no campo.
2. Não é possível estender a condição de trabalhador rural de um cônjuge ao outro quando o início de prova material apresentado se restringir, tão só, à CTPS, uma vez que os contratos de trabalho nela registrados não significam que o postulante tenha trabalhado no meio rural, dado o seu caráter pessoal, ou seja, somente o contratado pode prestar o serviço ao empregador.
3. Não havendo nos autos documentos hábeis, contemporâneos ao período que se quer comprovar, admissíveis como início de prova material, é de ser extinto o feito sem resolução do mérito, face a ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo.
4. Honorários advocatícios de 10% sobre o valor atualizado dado à causa, observando-se o disposto no § 3º, do Art. 98, do CPC, por ser beneficiária da justiça gratuita, ficando a cargo do Juízo de execução verificar se restou ou não inexequível a condenação em honorários.
5. Remessa oficial, havida como submetida, e apelação prejudicadas.
(TRF3, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS 5003666-69.2023.4.03.9999. Relator (a) Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA. Órgão Julgador: 10ª Turma. Data do Julgamento: 26/03/2024) (grifos meus)
Desta feita, se mostra escorreita a aplicação do Tema nº 629 do STJ ao caso concreto, ante a ausência/insuficiência de prova material, causa de extinção do processo sem resolução de mérito.
Diante de todo o exposto, nego provimento ao agravo interno da parte autora, para manter na íntegra a r. decisão monocrática agravada.
É como voto.
E M E N T A
AGRAVO INTERNO. MANUTENÇÃO DA DECISÃO MONOCRÁTICA. INSUFICIÊNCIA DE PROVA MATERIAL DO LABOR RURAL NA QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. APLICAÇÃO DO TEMA 629 DO STJ. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO.
1. De acordo com o art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/91, a comprovação do tempo de atividade rural para fins previdenciários exige, pelo menos, um início de prova material (documental), complementado por prova testemunhal idônea (Recurso Especial Repetitivo nº 1.133.863/RN, Rel. Des. Convocado Celso Limongi, 3ª Seção, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011).
2. Quanto à necessidade de início de prova material, a Súmula 149, do STJ dispõe que: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário.
3. Em relação à prova material apresentada nos autos, com poucas exceções, referem-se aos vínculos empregatícios do ex-cônjuge como “empregado rural”. Tal qualidade é incompatível com a possibilidade de extensão da condição de lavrador do marido à mulher, em vista do caráter individual e específico que tais atividades laborais são exercidas, especialmente no caso sob análise, em que o referido labor ocorreu junto à Administração Pública municipal, o que retira por completo seu exercício em caráter de regime familiar.
4. Diante da ausência/insuficiência de prova material, imperiosa a extinção do processo sem resolução de mérito, nos termos do Tema 629, do STJ. Consequentemente, a manutenção na íntegra da r. decisão monocrática é medida que se impõe.
5. Agravo interno não provido.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADORA FEDERAL
