
| D.E. Publicado em 04/03/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo legal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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AGRAVO LEGAL EM APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004943-50.2014.4.03.6111/SP
RELATÓRIO
Trata-se de agravo legal interposto pela Autora em face de decisão monocrática de fls. 120/122 que, com fulcro no caput do artigo 557 do Código de Processo Civil, negou seguimento à apelação da parte autora, mantendo a sentença recorrida.
Sustenta, em síntese, que a renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo vigente não pode ser o único parâmetro a ser analisado para a concessão do benefício assistencial.
É o relatório.
VOTO
Trata-se de ação em que a parte autora pleiteia a concessão do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição Federal, à pessoa portadora de deficiência ou incapacitada para o trabalho.
As razões ventiladas no presente recurso não são capazes de infirmar a decisão impugnada, pelo que submeto o seu teor à apreciação deste colegiado:
"Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício assistencial de prestação continuada (LOAS) previsto pelo inciso V do artigo 203 da Constituição Federal à pessoa idosa. |
A sentença recorrida julgou improcedente o pedido sob o fundamento de ausência do requisito de miserabilidade. |
Apela a parte autora, pleiteando pela a reversão do julgado por entender que preenche os requisitos legais para a obtenção do benefício. |
Sem a apresentação de contrarrazões pelo INSS, os autos vieram a este Tribunal. |
É o relatório. |
O art. 557, "caput", do Código de Processo Civil estabelece que o relator "negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior". Da mesma forma, o § 1º-A do artigo prevê que o relator poderá dar provimento ao recurso se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com a súmula ou com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal ou de Tribunal Superior. Tendo em conta a jurisprudência dominante, tornam-se desnecessárias maiores digressões a respeito, configurando-se, pois, hipótese de apreciação do recurso. |
A questão vertida nos presentes autos diz respeito à exigência de comprovação dos requisitos legais para a obtenção do benefício assistencial previsto no artigo 203, V, da Constituição Federal. |
Com efeito, o benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93. |
Verifico que, conforme cópia do documento de identidade acostada aos autos às fls. 27, tendo nascido em 29 de setembro de 1947, a autora possui, atualmente, 68 anos, estando, portanto, compreendida no conceito legal de idosa, para fins de concessão do benefício assistencial. |
Assim, restando atendido um dos critérios fixados no caput do artigo 20 da Lei nº 8.742/93 com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011 c/c o art. 34 da Lei nº 10.741/2003, necessário averiguar-se o preenchimento do requisito da miserabilidade, uma vez que a lei exige a concomitância de ambos para que o benefício assistencial possa ser concedido. |
O artigo 20, § 3º da Lei 8742/93 considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011). |
Com relação ao cálculo da renda per capita, a Lei 10.741/03 assim preceitua: |
"Art. 34. Aos idosos, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de 1 (um) salário-mínimo, nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social - Loas. (Vide Decreto nº 6.214, de 2007) |
Parágrafo único. O benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do caput não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a Loas." |
Entretanto, a Suprema Corte, no RE 580.963/PR, sob regime de repercussão geral, declarou a inconstitucionalidade parcial, por omissão, sem pronúncia de nulidade da norma em comento, ante a inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em, relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de um salário mínimo. |
Indo mais além, a constitucionalidade do próprio § 3º, artigo 20 da Lei 8742/93, também foi questionada na ADI 1.232-1/DF, que, todavia, foi julgada improcedente. |
Embora reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20 da Lei 8.742/93, a jurisprudência evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelece situação objetiva pela qual se deve presumir pobreza de forma absoluta, mas não impede o exame de situações específicas do caso concreto, a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Ou seja, a verificação da renda per capita familiar seria uma das formas de aferição de miserabilidade, mas não a única. |
Neste sentido decidiu o E. Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.112.557-MG: |
RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. |
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei. |
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo. |
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001). |
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável. |
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo. |
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar. |
7. Recurso Especial provido. |
(STJ, Terceira Seção, REsp 1112557/MG, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 28/10/2009, DJe 20/11/2009) |
O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da miserabilidade e o entendimento firmado no julgamento da ADI 1.232-DF levou a Corte Suprema a enfrentar novamente a questão no âmbito da Reclamação 4374 - PE que, julgada em 18/04/2013, reconheceu a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º, art. 20 da Lei 8.742/1993. O julgado reconheceu a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). |
O reconhecimento da inconstitucionalidade parcial sem nulidade do § 3º, art. 20 da Lei 8742/93 indica que a norma só é inconstitucional naquilo em que não disciplinou, não tendo sido reconhecido a incidência taxativa de qualquer critério para aferição da hipossuficiência. |
Cabe ao legislador fixar novos parâmetros e redefinir a política pública do benefício assistencial, e suprimir a inconstitucionalidade apontada. |
Desta forma, até que o assunto seja disciplinado, é necessário reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência é através da própria natureza de seus males, de seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades. |
Não há como enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar e entender que somente aqueles que contam com menos de um quarto do salário-mínimo possam fazer jus ao benefício assistencial. |
Tecidas tais considerações, no caso concreto, o mandado de constatação de fls. 55/63 revela que a parte autora residia com seu marido e um filho. A casa em que moram é própria, de alvenaria, em mal estado de conservação. Constatou-se que no mesmo terreno há outra casa, onde mora a filha da requerente, e ainda, à frente do imóvel existe um salão comercial que pertence à requerente. |
No momento da realização da visita da Sra. Oficiala de Justiça a renda da família era composta pelo benefício assistencial recebido pelo marido da autora e pela aposentadoria recebida por seu filho, ambos no importe de um salário mínimo. Posteriormente a requerente informou o óbito de seu marido. |
Informaram despesas em torno de R$ 950,00, sendo que foram relatados gastos com alimentação (R$ 400,00), Plano Mútuo (R$ 40,20), medicação e fraldas (R$ 100), empréstimo consignado (R$ 182,00), IPTU (R$ 103,04 parcela única) e cigarros (R$ 60,00). |
Em que pesem as dificuldades financeiras por que possa estar passando a autora, as provas trazidas aos autos não foram hábeis à demonstração de que a renda familiar não esteja suprindo suas necessidades básicas. Nem mesmo a cessação do benefício assistencial recebido por seu marido tem o condão de conferir-lhe a condição de miserabilidade. |
O imóvel em que a autora mora é próprio e conta com um salão comercial que também pertence à ela. A família possui também um veículo automotor modelo Parati. |
Nota-se que Maria Aparecida possui patrimônio constituído e está amparada por sua família. Verifica-se ainda que o estado de saúde da autora é estável, e recebe boa parte da medicação necessária da rede pública, necessitando comprar medicamentos apenas eventualmente. |
Importante ressaltar que o benefício assistencial não deve se prestar à complementação de renda. |
Assim, ainda que se lhe fosse aplicado por analogia o parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso, as provas trazidas aos autos não foram hábeis à demonstração da impossibilidade de sustento, como exige o art. 20 da Lei 8.742/1993. |
Desta forma, diante do conjunto probatório que se apresenta nos presentes autos, não restaram preenchidos os requisitos necessários à concessão do benefício assistencial pleiteado. |
Do exposto, com fundamento no art. 557, caput, do CPC, NEGO SEGUIMENTO à apelação da parte autora, mantendo a sentença recorrida. |
Tratando-se a presente demanda de direito individual e disponível, e ainda, ausente interesse de incapazes, desnecessária a intervenção do Ministério Público Federal. |
Decorrido o prazo legal, baixem os autos ao juízo de origem. |
Publique-se. Intime-se. |
São Paulo, 23 de novembro de 2015." |
Como se vê, a decisão agravada resolveu de maneira fundamentada as questões discutidas na sede recursal. O recurso ora interposto não tem, em seu conteúdo, razões que impugnem com suficiência a motivação exposta na decisão monocrática, que merece ser mantida.
Ante o exposto, nego provimento ao agravo legal.
É como voto.
PAULO DOMINGUES
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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| Data e Hora: | 29/02/2016 17:44:16 |
