
| D.E. Publicado em 08/03/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001490-62.2010.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Juiz Federal Convocado OTAVIO PORT (RELATOR): Agravo Regimental interposto pelo autor contra decisão monocrática (fls. 277/281) que negou provimento à apelação, mantendo a improcedência do pedido.
Sustenta que preencheu todos os requisitos para a concessão do benefício. Requer o provimento do agravo para que seja reformada a decisão e julgado procedente o pedido.
Dada oportunidade de apresentação das contrarrazões (art. 1.021, § 2º, e 1.023, § 2º, ambos do CPC), o INSS não se manifestou.
É o relatório.
VOTO
O Juiz Federal Convocado OTAVIO PORT (RELATOR): Agravo Regiemntal interposto pelo autor contra decisão monocrática (fls. 277/281) que negou provimento à apelação, mantendo a improcedência do pedido.
Verifica-se que o fundamento do improvimento da apelação, deu-se em razão do não preenchimento do requisito da hipossuficiência econômica.
O § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93 estabelece que a renda per capita familiar deve ser inferior a ¼ do salário mínimo. A inconstitucionalidade desse dispositivo da LOAS foi arguida na ADIN nº 1.232-1, julgada improcedente por maioria de votos pelo Plenário do STF.
A questão não restou pacificada na jurisprudência do STJ e do próprio STF, que passaram a adotar o entendimento de que a ADIn nº 1.232-1 não retirou a possibilidade de aferição da necessidade por outros meios de prova que não a renda per capita familiar, mas, sim, que o § 3º do art. 20 estabeleceu uma presunção objetiva e absoluta de miserabilidade. Assim sendo, a família com renda mensal per capita inferior a ¼ do salário mínimo encontra-se em estado de penúria, configurando tal situação prova incontestável de necessidade do benefício, dispensando outros elementos probatórios. Daí que, caso suplantado tal limite, outros meios de prova poderiam ser utilizados para a demonstração da condição de miserabilidade, expressa na situação de absoluta carência de recursos para a subsistência.
Nesse sentido o entendimento do STJ (REsp 222778/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Edson Vidigal, j. 04.11.1999, DJU 29.11.1999, p. 190):
"A Lei 8742/93, Art. 20, § 3º, quis apenas definir que a renda familiar inferior a ¼ do salário-mínimo é, objetivamente considerada, insuficiente para a subsistência do idoso ou portador de deficiência; tal regra não afasta, no caso em concreto, outros meios de prova da condição de miserabilidade da família do necessitado".
A questão foi novamente levada a julgamento pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, que reconheceu a Repercussão Geral da matéria nos autos do Recurso Extraordinário 567985/MT, Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes, j. 18/04/2013, publicado em 03.10.2013:
"... O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS. Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento" (destaquei).
Continuo mantendo o entendimento anterior porque, a meu ver, a fixação da renda per capita familiar inferior ao salário mínimo é excludente do bem-estar e justiça sociais que o art. 193 da CF elegeu como objetivos da Ordem Social.
A fixação do salário mínimo como garantia do trabalhador e do inativo para fins de garantir sua manutenção e de sua família, com o mínimo necessário à sobrevivência com dignidade, representa um critério quantificador do bem-estar social que a todos deve ser garantido, inclusive aos beneficiários do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição.
Nessa linha de entendimento, o correto seria que a renda per capita familiar, para fins de concessão do BPC, não pudesse ser superior a 1 (um) salário mínimo. Esse critério traria para dentro do sistema de Assistência Social um número bem maior de pessoas idosas e com deficiência. Seria dar a todos, dentro e fora do sistema de Assistência Social, o mesmo grau de dignidade e de bem-estar, reduzindo desigualdades sociais.
A declaração de inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da LOAS, na prática, resulta na inexistência de nenhum critério, abrindo a possibilidade de o intérprete utilizar todos os meios de provas disponíveis para a verificação da situação de miséria que a lei quer remediar.
Cabe à legislação infraconstitucional a definição dos critérios e requisitos para concessão do benefício, conforme prevê o art. 203, V, da CF. Deve, para isso, obedecer aos princípios do art. 194, dentre eles a seletividade e distributividade. Ou seja, cabe ao legislador ordinário selecionar as contingências merecedoras de proteção e distribuí-las de acordo com o número de beneficiários e o orçamento de que dispõe.
A seletividade e a distributividade, contudo, por serem princípios setoriais, estão conformadas ao princípio geral do respeito à isonomia. Não pode a lei eleger como discrimen critério violador da isonomia.
A fixação do critério aferidor da necessidade é atribuição do legislador e não do juiz. Mas, diante do caso concreto, a jurisdição não pode ser negada por falta de critério legal.
A atividade legislativa não é do Poder Judiciário, de modo que não lhe cabe criar critério que substitua o previsto no § 3º do art. 20. Porém, parece razoável estabelecer presunção absoluta de miserabilidade quando a renda per capita familiar for inferior a metade do salário mínimo vigente, para que, em sendo superior, outras provas possam ser consideradas para averiguar a real necessidade de concessão do benefício.
O primeiro estudo social feito em 16.11.2011, às fls. 105/107, dá conta de que o autor reside com a mãe, Nerina Polydori Falasco, de 82, e os irmãos Lázaro Falasco, de 48, Ademar Falasco, e Adão Falasco, de 49, em casa própria, contendo dois quartos, sala, cozinha e dois banheiros. As despesas são: alimentação R$ 600,00; gás R$ 45,00; água R$ 48; energia elétrica R$ 140,00; IPTU R$ 45,00. A renda da família advém da pensão por morte e da aposentadoria por idade da mãe, ambas de valor mínimo, do trabalho autônomo do irmão Lázaro, no valor de R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais) mensais, do trabalho de Ademar, também, como autônomo, no valor de R$ 700,00 (setecentos reais) mensais, e do trabalho do irmão Adão, como servente de pedreiro, no valor de R$ 700,00 (setecentos reais) mensais.
O segundo estudo social feito em 20.06.2014, às fls. 180/182, dá conta de que o autor reside com a mãe e o irmão Lázaro. As despesas são: alimentação R$ 180,00; água R$ 52,01; energia elétrica R$ 89,20; gás R$ 45,00; IPTU R$ 51,40. A família conta com a ajuda de parentes para arcar com as despesas, uma vez que a única renda da família advém da pensão por morte que a mãe recebe, de valor mínimo.
O terceiro estudo social feito em 06.07.2016, às fls. 247/251, dá conta de que o autor continua residindo com a mãe e os irmãos Lázaro Falasco e Adão Falasco, na mesma casa. As despesas são: alimentação R$ 517,30; água R$ 43,34; energia elétrica R$ 109,75; gás R$ 55,00; IPTU R$ 54,20, remédios R$ 55,00. A renda da família advém da pensão por morte previdenciária e da aposentadoria da mãe, ambas de valor mínimo, e do salário do irmão Adão, no valor, aproximado, de R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais) mensais.
O § 1º do art. 20 da Lei 8.742/93, com a redação dada pela Lei 10.435/2011, dispõe que: "Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto".
Penso que a interpretação desse dispositivo legal não pode conflitar com a realidade que se extrai dos autos. A lei expressamente prevê que devem os membros do grupo familiar considerado viver sob o mesmo teto. Entretanto, não podem ser incluídos, a meu sentir, aqueles que, embora elencados na lei, estejam apenas transitoriamente sob o mesmo teto.
Assim, o grupo familiar do autor é formado por ele, pela mãe e pelos irmãos.
A consulta ao CINS (273/276) indica que a mãe do autor é beneficiária de pensão por morte previdenciária, desde 03.10.2006, e, também, recebe aposentaria por idade, desde 28.06.1989; e, quanto ao filho Lázaro, recebe aposentadoria por idade, desde 17.04.2012, todos de valor mínimo.
Dessa forma, ainda que se excluam um dos benefícios de valor mínimo que a mãe recebe e o do irmão, desde 10.06.2016, nos termos do par. único do art. 34 da Lei 10.741/03, a renda familiar per capita será superior à metade do salário mínimo.
Por isso, o autor não preenche os requisitos necessários para o deferimento do benefício.
A decisão agravada está de acordo com o disposto no art. 1.021 do CPC/2015, inclusive §3º, baseado no princípio da dialética recursal, seguindo jurisprudência dominante. Inexiste qualquer vício a justificar a sua reforma.
NEGO PROVIMENTO ao agravo regimental.
É o voto.
OTAVIO PORT
Juiz Federal Convocado
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| Data e Hora: | 27/02/2018 14:50:06 |
