D.E. Publicado em 14/08/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001401-58.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Cuida-se de ação proposta em 03/05/2016 com vistas à concessão de benefício assistencial, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal.
Documentos acostados à exordial (fls. 10-33).
Deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 34).
Citação, em 23/05/2016 (fl. 41).
Estudo socioeconômico (fls. 82-85 e fls. 96-102).
A r. sentença, prolatada em 26/10/2017, julgou improcedente o pedido (fls. 122-124).
Apelação da parte autora, pela reforma integral do julgado (fls. 126-137).
Com contrarrazões (fl. 142), subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001401-58.2018.4.03.9999/SP
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de recurso interposto pela parte autora sentença que julgou improcedente pedido de benefício assistencial a pessoa idosa.
O benefício de assistência social foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência em que se acham, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias.
Neste aspecto está o lastro social do dispositivo inserido no artigo 203, V, da Constituição Federal, que concretiza princípios fundamentais, tais como o de respeito à cidadania e à dignidade humana, ao preceituar o seguinte:
De outro giro, os artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/93, com redação dada pela Lei 12.435, de 06 de julho de 2011, e o art. 34, da Lei 10.741 (Estatuto do Idoso), de 1º de outubro de 2003 rezam, in verbis:
O apontado dispositivo legal, aplicável ao idoso, procedeu a uma forma de limitação do mandamento constitucional, eis que conceituou como pessoa necessitada, apenas, aquela cuja família tenha renda inferior à 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, levando em consideração, para tal desiderato, cada um dos elementos participantes do núcleo familiar, exceto aquele que já recebe o benefício de prestação continuada, de acordo com o parágrafo único, do art. 34, da Lei 10.741/2003.
De mais a mais, a interpretação deste dispositivo legal na jurisprudência tem sido extensiva, admitindo-se que a percepção de benefício assistencial, ou mesmo previdenciário com renda mensal equivalente ao salário mínimo, seja desconsiderada para fins de concessão do benefício assistencial previsto na Lei 8.742/93.
Ressalte-se, por oportuno, que os diplomas legais acima citados foram regulamentados pelo Decreto 6.214/07, o qual em nada alterou a interpretação das referidas normas, merecendo destacamento o art. 4º, inc. VI e o art. 19, caput e parágrafo único do referido decreto, in verbis:
A inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da mencionada Lei 8.742/93 foi arguida na ADIN nº 1.232-1/DF que, pela maioria de votos do Plenário do Supremo Tribunal Federal, foi julgada improcedente. Para além disso, nos autos do agravo regimental interposto na reclamação n.º 2303-6, do Rio Grande do Sul, interposta pelo INSS, publicada no DJ de 01.04.2005, p. 5-6, Rel. Min. Ellen Gracie, o acórdão do STF restou assim ementado:
Evidencia-se que o critério fixado pelo parágrafo 3º do artigo 20 da LOAS é o único apto a caracterizar o estado de necessidade indispensável à concessão da benesse em tela. Em outro falar, aludida situação de fato configuraria prova inconteste de necessidade do benefício constitucionalmente previsto, de modo a tornar dispensáveis elementos probatórios outros.
Assim, deflui dessa exegese o estabelecimento de presunção objetiva absoluta de estado de penúria ao idoso ou deficiente cuja partilha da renda familiar resulte para si montante inferior a 1/4 do salário mínimo.
Não se desconhece notícia constante do Portal do Supremo Tribunal Federal, de que aquela Corte, em recente deliberação, declarou a inconstitucionalidade dos dispositivos legais em voga (Plenário, na Reclamação 4374, e Recursos Extraordinários - REs 567985 e 580963, estes com repercussão geral, em 17 e 18 de abril de 2013, reconhecendo-se superado o decidido na ADI 1.232-DF), do que não mais se poderá aplicar o critério de renda per capita de ¼ do salário mínimo para fins de aferição da miserabilidade.
Em outras palavras: deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante a renda informada, caso a caso.
In casu, a parte autora, nascida em 09/01/1940, logrou comprovar o requisito etário, ao demonstrar possuir 76 anos de idade, já à época do aforamento da demanda (fl. 10).
Por sua vez, o estudo social (e respectiva complementação) relativo a visita realizada em 28/11/2015 (fls. 82-85 e fls. 96-102) revela que o núcleo familiar era constituído pela própria autora, à época com 77 anos de idade, e por seu cônjuge, Pedro Barboza de Souza, 92 anos de idade (D.N.: 18/04/1924), aposentado.
A autora informou a assistente social de que a renda familiar se restringia ao valor do benefício de aposentadoria percebido pelo seu cônjuge, no valor de um salário mínimo mensal, que na ocasião estava fixado em R$ 937,00.
Ressalto que, consoante fundamentado acima, a renda de um salário mínimo mensal percebido pelo cônjuge da requerente deve ser desconsiderada para fins de apuração da renda per capita.
Não obstante, compulsando os autos, bem como o estudo socioeconômico realizado, constatei que não subsistem nele elementos caracterizadores de que a parte autora se encontrasse em situação de hipossuficiência. Senão, vejamos.
A família residia em casa cedida pela filha Julia de Souza Vera, construído em alvenaria, constituída por dois quartos, sala, cozinha, banheiro, e ainda, um quartinho de despensa nos fundos, e na frente uma pequena área ambos construídos pela família.
A residência encontrava-se guarnecida com eletrodomésticos suficientes ao bem estar e conforto da família, embora antigos: uma geladeira com mais ou menos 15 anos de uso, um fogão com 20 anos de uso, um aparelho de televisão (de tubo) com 15 anos de uso, um aparelho de micro-ondas. No local havia uma linha de telefonia fixa.
Já a despesa mensal do núcleo familiar compreendia gastos com alimentação (R$ 480,00), energia elétrica (R$ 40,00), água (R$ 32,00), serviço de telefonia fixa (R$ 40,00), medicamentos (R$ 238,07), e prestação de financiamento de imóvel (R$ 91,00), totalizando R$ 921,07.
Ainda que não informado e quantificado qualquer auxílio ofertado pela filha da promovente, que reside em imóvel cedido pela primeira, o conjunto probatório permite perceber que a autora usufrui de uma vida sem privações.
Observo que a jurisprudência desta corte é pacífica ao considerar que a ajuda financeira prestada pelos filhos a seus pais deve ser considerada para fins de aferição da miserabilidade destes. Confira-se:
Em suma, o cotidiano familiar da autora, permeado eventualmente por alguma hipossuficiência econômica, neste caso, ocorre por pura opção pessoal. Ademais, se real fosse a precariedade econômica aventada nos autos, o casal não pagaria a prestação do imóvel (R$ 91,00 por mês) em que residem, que é propriedade da própria filha, nem manteria serviço de telefonia fixa (R$ 40,00), despesas que podem ser classificadas como totalmente prescindíveis em situação de penúria econômica extrema.
Também merece relevo o fato de que além de não terem sido comprovados os gastos declarados com medicamentos (R$ 238,07 por mês), também não restou esclarecida a razão daqueles de uso contínuo estarem sendo adquiridos em estabelecimentos privados, ao invés de ser acessada a rede pública de saúde para tanto, ou ainda, exigido (ainda que judicialmente) do Estado seu fornecimento gratuito.
Cabe ressaltar, por fim, que a concessão de benefício assistencial não tem caráter de complementação de renda familiar, o que, por certo, traria distorção ao propósito da instituição do benefício no universo da assistência social. Ademais, a assistência social estatal é subsidiária àquela que deve ser prestada pelos familiares, notadamente pelos filhos aos pais idosos.
Assim, conclui-se que os recursos obtidos pela família da parte requerente são, pois, suficientes para cobrir os gastos ordinários e os cuidados especiais que lhe seriam imprescindíveis, do que se reconhece indevida a concessão do benefício assistencial, tornando imperiosa a manutenção da r. sentença, na íntegra.
É COMO VOTO.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 30/07/2018 16:57:23 |